RESUMO: O presente trabalho, baseado em pesquisa bibliográfica nacional, bancos de dados e pesquisas na Internet, teve por objetivo analisar o cenário legislativo brasileiro no que se refere à questão da herança digital, instituto que considera a extensão do sofrimento causado ao indivíduo que é desconectado dos ativos digitais quando membros da família morrem ou ficam incapacitados. Dessa forma, a partir das mudanças de hábitos sociais, questiona-se a necessária adequação (atualização) do ordenamento jurídico vigente e, por conseguinte, a discussão e legislação acerca de assuntos, como o da herança digital, a fim de se acomodar o Direito à realidade atual, tendo em vista sua capacidade de evolução e adaptação. Para esse fim, utilizando-se do método dedutivo, partiu-se da análise histórica dos direitos e garantias fundamentais no Brasil, a fim de estipular o nascimento e afirmação dos direitos, até o surgimento do meio digital e a evolução tecnológica alcançada.
PALAVRAS-CHAVE: Artigo Científico. Direito Sucessório. Internet. Herança Digital.
ABSTRACT: The present work, based on national bibliographic research, databases and internet research, aimed to analyze the Brazilian legislative scenario regarding the issue of digital heritage, an institute that considers the extent of suffering caused to the individual who is disconnected from the digital assets when family members die or become disabled. Thus, based on changes in social habits, the necessary adequacy (updating) of the current legal system is questioned and, therefore, the discussion and legislation on subjects, such as digital inheritance, in order to accommodate the Law to the current reality, in view of its capacity for evolution and adaptation. To this aim, using the deductive method, it started with the historical analysis of fundamental rights and guarantees in Brazil, in order to stipulate the birth and affirmation of rights, until the emergence of the digital medium and the technological evolution achieved.
KEYWORDS: Scientific article. Succession Law. Internet. Digital Heritage
1 INTRODUÇÃO
O avanço tecnológico das últimas décadas que, resultou no desenvolvimento de equipamentos cada vez mais eficazes de armazenamento de dados, possibilitou a expansão global e popularização da rede mundial de computadores: a Internet. Dentre as plataformas virtuais destinadas à comunicação, surgem as chamadas “redes sociais” que, no ambiente online, são sites e aplicativos que operam em níveis diversos (tais como relacionamento, profissional e outros), sempre permitindo o compartilhamento de informações entre pessoas e/ou empresas.
As redes sociais assumem grande relevância na sociedade moderna pois, além de serem utilizadas como forma de comunicação e relação social, sua popularização entre as massas aumentou de forma exponencial o alcance das informações compartilhadas dentro de cada plataforma.
Nesse contexto, surge uma espécie de propriedade intelectual até então pouco regulada pelo ordenamento jurídico brasileiro, referente aos perfis destas redes que adquirem valor especial conforme o engajamento gerado pelas interações.
No âmbito jurídico, um dos termos utilizados para se referir a esta espécie de propriedade intelectual é o de “bens virtuais” e o presente estudo vista discutir a relevância destes bens virtuais na sociedade atual e a sua destinação após o falecimento do proprietário da respectiva conta na plataforma, a chamada Herança Digital.
Considerando que esses bens digitais estão presentes em quantidade cada vez maior em nossa sociedade, cresce a relevância do debate sobre a melhor destinação para as contas e dados armazenados virtualmente após o falecimento do proprietário.
Portanto, busca-se através da presente pesquisa realizar um levantamento quanto à herança digital no Brasil e o direito de sucessão dos bens virtuais, especificamente no que se refere às redes sociais e dados pessoais do de cujus.
A problemática principal que surge nessa temática refere-se aos questionamentos em relação à transmissão dos ativos digitais dos indivíduos post mortem, vez que a legislação brasileira é escassa e não abrange de forma satisfatória as demandas que surgiram com os avanços tecnológicos.
Importante, assim, realizar o presente estudo sobre a maneira com que as normas da atual legislação brasileira tutelam o direito de herança digital das redes sociais, buscando-se identificar em quais pontos essa tutela é bem-sucedida e onde se faz necessária sua atualização normativa.
2 BREVE HISTÓRICO NO BRASIL DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
O reconhecimento dos direitos fundamentais, a partir de sua positivação, encontrou guarida na condecoração da Constituição como norma suprema do ordenamento jurídico brasileiro. Além disso, segundo Bittar (2015), tal positivação ocorre por meio do entendimento de que “[...] a percepção de que os valores mais caros da existência humana merecem estar resguardados em documento jurídico com força vinculativa máxima”, era a forma de serem mantidos intactos tais direitos, ilesos às situações ou momentos históricos adversos ao devido respeito ao homem.
Para Barroso (2012), a cristalização dos direitos fundamentais como normas obrigatórias é resultado de maturação histórica, o que demonstra, também, que os direitos fundamentais não se mantêm os mesmos no decorrer do tempo, não correspondendo, meramente, a imperativos de coerência lógica. Desde a Constituição do Império, de 1824, o Brasil reconhece as Declarações de Direitos Individuais e Garantias, apesar da escravidão e das ditaduras. A Constituição de 1891 inovou ao trazer a indicação de que o seu rol de direitos não era exaustivo, o que continuou presente nas Constituições posteriores. No entanto, há de se frisar que até aquele momento só se tutelavam direitos e garantias individuais.
A Constituição de 1934, por sua vez, continha direitos de nacionalidade, políticos, econômicos e sociais. Logo após a Constituição de 1937, propositalmente descuidada em relação à proteção de direitos fundamentais (em especial, os políticos), a Constituição de 1946 emergiu bem estruturada nesse tocante, contendo um capítulo sobre nacionalidade e cidadania e outro sobre direitos e garantias individuais, assegurando, ainda, os direitos econômicos e sociais (RUARO w RODRIGUES, 2010).
Ainda, de maneira contraditória, as Constituições de 1967 e 1969 foram generosas quanto à previsão de direitos fundamentais, de maneira específica e setorizada em três títulos, sobre a Declaração de Direitos (com capítulos versando sobre a nacionalidade, os direitos políticos e os direitos e garantias individuais); outro sobre a ordem econômica e social; e um terceiro sobre a família, a educação e a cultura.
Por fim, a Constituição de 1988 deu mais relevo aos direitos fundamentais, albergando um número maior deles e assentando os logo no início, imediatamente após a apresentação dos princípios basilares da República. Em seu Título II – Dos direitos e garantias fundamentais, abriga os direitos e deveres individuais e coletivos (capítulo I), os direitos sociais (capítulo II), os direitos da nacionalidade (capítulo III) e os direitos políticos (capítulos IV e V). Ainda, se estabelecem fora do Título II outros direitos fundamentais, de natureza tributária (Título VI), econômica (Título VII) ou relacionados à saúde, à educação, à comunicação social, ao meio ambiente ou à família (Título VIII) (BITTAR, 2015).
Nesse sentido, percebe-se claramente que os direitos fundamentais estão dispersos na Constituição de 1988 e não somente no Título II. Tais direitos, dessa maneira, devem se basear, como esclarece Garcia (2020), na própria pré-compreensão que a comunidade tem da ideia de direito que a rege, ou seja, decorrem do próprio conceito de direito fundamental, sempre em consonância com o art. 5º, § 2º da Constituição. Assim, o traço de fundamentalidade de um direito não provém de sua localização na Constituição, mas sim em razão do fato de se tratar de um direito que, por sua natureza, configura parte integrante da estrutura fundamental do Estado.
Ainda abordando a questão dos direitos fundamentais na Constituição brasileira de 1988, Sarlet et al (2019, p. 102) afirmam que:
Talvez a inovação mais importante tenha sido a do art. 5º, § 1º da Constituição Federal, de acordo com o qual as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais possuem aplicabilidade imediata, excluindo, em princípio, o cunho programático destes preceitos, conquanto não exista consenso a respeito do alcance deste dispositivo. De qualquer modo, ficou consagrado o status jurídico diferenciado e reforçado dos direitos fundamentais na Constituição vigente. Esta maior proteção outorgada aos direitos fundamentais manifesta-se, ainda, mediante a inclusão deste no rol das ‘cláusulas pétreas’ (ou ‘garantias de eternidade’) do art. 60, § 4º da Constituição Federal, impedindo a supressão e erosão dos preceitos relativos aos direitos fundamentais pela ação do poder Constituinte derivado.
Assim sendo, na visão de Garcia (2020), a inserção do supracitado artigo na Constituição Federal de 1988 é, sem dúvida, uma das mais importantes inovações trazidas pela Constituição vigente, uma vez que a determinação da aplicabilidade imediata das normas de direito fundamental, fez com que essas normas assumissem posição superior à que ocupavam nas Constituições anteriores, no patamar de classificação da eficácia e aplicabilidade das normas constitucionais.
Nota-se, portanto, a constante evolução de tais direitos que, ao longo do tempo, vem ocupando e aumentando sua efetividade e reconhecimento, em especial, no caso do Brasil, como o supracitado exemplo na Constituição vigente.
Por sua vez, Bittar (2015, p. 66) destaca que:
os direitos fundamentais contêm elementos essenciais não só do sistema democrático (igualdade, liberdade opinião, liberdade de reunião, igualdade de oportunidades), mas também do próprio Estado de Direito (vinculação dos Poderes Públicos aos direitos fundamentais). Também as regras básicas sobre casamentos, família, propriedade e direito de sucessão configurariam, os fundamentos da ordem jurídica privada.
Assim, os direitos fundamentais acabam por estabelecer um conjunto especial de direitos que trazem, aos seus destinatários, consequências jurídicas próprias. Tanto as regras que conferem limitação – em amparo à liberdade individual – como as que promovem os direitos sociais e de solidariedade, destinam-se, sempre, à concretização do princípio da dignidade humana.
Sarlet et al (2019), também em uma tentativa de conceituação dos direitos fundamentais, em última análise, concluem que o elemento característico que poderia definir um direito fundamental seria a intenção de explicitar o princípio da dignidade humana.
Nesse contexto, pode-se afirmar que os direitos fundamentais compõem um grupo especial de direitos que atribuem, aos seus titulares, situações jurídicas específicas, ou seja, as normas impostas ao Estado (de limitação – em respeito à liberdade individual –, ou de promoção dos direitos sociais e de solidariedade), que se destinam, sempre, à realização do princípio da dignidade humana, visando atender às necessidades e condições mínimas para que sejam efetivados o desenvolvimento da liberdade e da dignidade, já que se encontram estabelecidos na Constituição Federal, sendo este documento considerado o núcleo para onde tudo deve convergir, e não o centro de onde tudo deriva.
3 DEFINIÇÃO DE REDES SOCIAIS
Para a compreensão eficiente de redes sociais é fundamental compreender o estabelecimento de relações entre pessoas e grupos. Para Castells (2003), rede social pode ser entendida como uma metáfora estrutural para a compreensão dos grupos expressos na internet, para a observação das conexões de grupos sociais a partir das conexões estabelecidas entre seus diversos atores.
Em sentido semelhante, Lara (2016, p. 47) afirma que é possível falar-se em redes sociais como “estruturas que não apresentam um tipo específico de organização física, mas que se tornam visíveis pelos relacionamentos estabelecidos entre os sujeitos ou grupos que assim se organizam”. Sendo, pois, esses relacionamentos entre indivíduos e grupos possibilitados pelo uso da internet, alguns autores, como Medina (2013), preferem utilizar a expressão “sites de redes sociais” (social network sites), que alude à conjunção do meio utilizado (internet) com as estruturas sociais (redes, comunidades) que se edificam a partir desse meio.
Castells (2003) entende que a rede se projeta para suportar qualquer grau de destruição de componentes individuais, sem perder a comunicação “ponto a ponto”. Assim, uma vez que se tem vários computadores conectados em rede, se qualquer ligação venha a falhar, não se “perde o controle” da mesma, justamente por não haver um “controle central”. Com efeito, a rede é mantida por seus diversos nós, ganhando estruturas diferenciadas. Medina (2019) levanta a formação de três estruturas distintas: centralizada, descentralizada e distribuída.
Lara (2016) sustenta que essas três estruturas básicas propostas por Baran são “possíveis de serem encontradas em redes na internet e já foram aplicadas a estudos de outros autores, de uma forma especial, nos recentes trabalhos da chamada ‘teoria das redes”. Uma percepção como essa sobre a internet acaba servindo de apoio a uma tese de Pierre Lévy[1], quando este afirma que a melhor forma de manter e desenvolver uma coletividade “não é mais construir, manter ou ampliar fronteiras, mas alimentar a abundância e melhorar a qualidade das relações” no seio dessas coletividades.
Assim, o poder e a identidade de um grupo na internet passam a depender mais da qualidade e da intensidade de sua conexão consigo mesmo do que da sua resistência em se comunicar com o seu meio.
4 VIDA DIGITAL POST MORTEM
Assim como poucos se lembram de fazer backups regulares de seu computador para evitar uma perda desastrosa de dados, ninguém pensa sobre para onde os nossos perfis, e-mails, fotos, músicas, Facebook e tweets vão quando morrermos, uma questão que envolve direitos de personalidade.
Entretanto, uma coisa é certa: esses dados e bens digitais não vão embora com seu dono, como gostariam alguns, quando este vem a falecer. Esta vida digital permanece livre e disponível para acesso, inclusive para os membros da família ou herdeiros que podem buscar judicialmente preservar e/ou ter acesso a seu legado digital. Entretanto, com a morte física e seu prolongamento no plano digital, surgem alguns inconvenientes, uma vez que esta situação traz consigo problemas complexos em relação à privacidade, propriedade e valor dos seus dados – seja no âmbito sentimental ou no financeiro. Nas palavras de Medina (2019, p. 32):
A morte não é um facto bruto, um fenômeno puramente biológico. A biografia humana não é a morte biológica. É precisamente a morte que revela que o homem não é prisioneiro do espaço-tempo, separando do seu despojo corporal, única parte submetida ao tempo. A morte é a observância de um rito de despojamento do ‘eu’ enquanto ‘ter’. O homem, compreendido através das suas funções, desaparece no momento da morte. Mas, se for levado em conta o ser e não o ter, a vida é também a morte.
Percebe-se que, mesmo com a morte, muitos dos direitos do falecido continuam vivos, especialmente os direitos da personalidade. Nesse mesmo sentido, inclusive, entende o Superior Tribunal de Justiça que, mesmo aceitando que os direitos da personalidade são intransmissíveis, estes não deixam de merecer proteção, já que materializam a memória daquele que morreu, lembrança esta que permanece imortal e se prolonga para além da vida da pessoa falecida.
No tocante ao intenso processo de digitalização pelo qual temos passado, importa destacar que, em face da exposição pública da vida promovida por todos na internet, temos que ter em foco também seus reflexos em relação à morte.
O que se percebe, nesse sentido, é que, a partir da extensão da vida no plano digital, a morte tem reflexos transformados que, a nosso ver, superam a barreira da existência do indivíduo. Segundo Pereira e Costa (2019), hoje se morre e, além da memória e bens de valoração patrimonial, se deixam bens personalíssimos que perduram à morte do titular, como por exemplo, seu perfil em uma rede social que materializava, justamente, a extensão de sua vida no plano virtual. A partir disso, nos deparamos com novas situações não regulamentadas pelo direito que merecem atenção, como é o caso do objeto do presente trabalho.
Nesse diapasão, o que se testemunha, cada vez mais, são exposições de sentimentos (saudade, dor da perda de um ente querido etc.) alocadas em redes sociais, que permitem aos usuários exibirem, demonstrarem, exteriorizarem publicamente seus sentimentos acerca de seus mortos, o que, sob um olhar mais atento, demonstra que a privacidade que diminuiu em relação à vida, também está valendo para a morte; o que, para alguns serve como forma de se exorcizar a dor da perda, ainda que se expondo de tal maneira, aponta uma mudança socio comportamental das pessoas a partir de uma nova maneira de se encarar o luto em que, através da internet se compartilha e se presta suas homenagens.
A forma como a morte é encarada no decorrer da história viveu grandes transformações: enquanto era vivenciada nos séculos XVIII e XIX como uma cerimônia pública, com cortejos e visitas carregados por fortes demonstrações como choro e jejum, a partir do século XX, tais demonstrações tornaram-se mais comedidas e constrangedoras (MEDINA, 2013).
Dessa forma, ainda que lentas, tais transformações têm mudado a maneira como as pessoas encaram a morte e como experimentam seu luto; nesse contexto, a internet tem se mostrado uma ferramenta essencial de exteriorização e publicação àqueles que desejam prestar homenagens, discutir ou, simplesmente, expor a todos seus sentimentos, transformando o modo como os indivíduos dão forma a seu sofrimento, antes comumente com rituais tradicionais (como por exemplo, uma missa), hoje com exposições na rede (como por exemplo, a criação de um perfil no Facebook).
5 HERANÇA DIGITAL
Quando se admite que, dentro do conceito de vida digital, esta suplanta a vida física, é visível a ocorrência de eventuais discussões patrimoniais, em especial, na área de direito de família e sucessões, o que concede ao tema em apreço extrema relevância e urgência na definição e positivação a fim de haver regulamentação que elucide entendimento acerca do mesmo – inclusive para, em casos onde não exista declaração de última vontade do de cujus, saber como se deve proceder.
O instituto da herança, de acordo com Diniz (2020, p. 50), é “[...] o patrimônio do falecido, isto é, o conjunto de direitos e deveres transmitidos aos herdeiros legítimos ou testamentários, exceto se forem inerentes à pessoa do de cujus”.
Nesse sentido, no âmbito jurídico, entende-se que o patrimônio pode ser entendido como um conjunto de bens e direitos que pertence a alguém e que, ao falecer, é transferido aos herdeiros, materializando, dessa maneira, a herança que deve ser inventariada (DINIZ, 2020). Já por herança digital podemos compreender como o conteúdo, imaterial, intangível, incorpóreo, de titularidade do falecido, composto pelo acervo de bens digitais, acumulados e armazenados pelo de cujus no plano virtual, no decorrer de sua vida (GARCIA, 2020).
Entretanto, quando o assunto é herança digital, não se mostra possível a admissão ou restrição da discussão apenas aos bens que possuem valoração econômica. De acordo com Pereira e Costa (2019), ainda que seja difícil de perceber, cada indivíduo, em conjunto com milhões de outras pessoas, cria e coleciona um rico acervo digital. Isso ocorre sem que seja tão perceptível, talvez, porque esses bens digitais não ocupam praticamente nenhum espaço físico, mas em razão da contínua (e cada vez mais acentuada) digitalização de nossas vidas, essa coleção de bens aumenta a cada dia.
Como exemplos desses bens que constituem o patrimônio digital de uma pessoa, além de coleções de livros e músicas, domínios de internet, sistemas adquiridos, transações bancárias, contratos eletrônicos de compra e venda; pode-se utilizar como exemplo também, filmes e fotos pessoais, postagens feitas em blogs, documentos, e-mails, códigos fonte, ou seja, bens de caráter pessoal que não possuem valor patrimonial.
Inserido nesse universo de pertences digitais criados e colecionados por todos nós, vale destacar que a tecnologia mudou o modo de criação das coisas, a maneira como produzimos. Naturalmente, com a facilidade e ferramentas proporcionadas pela tecnologia, hoje se cria muito mais, por exemplo, fotos, músicas, obras de arte etc. que, certamente, fazem parte do conteúdo digital de cada um (MEDINA, 2013).
Nesse diapasão, a nosso ver, podemos incluir outros bens como, por exemplo, o perfil do Facebook, os tweets, os e-mails que compõem formas de expressão do titular, cujos sites sequer existiriam sem a contribuição de seus usuários que os criam. Dessa maneira, individualmente e cumulativamente, as pequenas criações de cada um, passam a ser parte importante de seu conteúdo digital.
Lara (2016) ressalta que na maioria dos casos, o conteúdo digital sobre o qual aqui ora se comenta, não é criado no isolamento e está sempre ligado aos demais usuários dentro de um ecossistema digital e, ainda, que tais interações não são oriundas de um processo profundo de análise, ou seja, esta interação acontece rapidamente. O Twitter é um grande exemplo disso; para muitos, o Twitter é uma rede de informação, é como permanecem conectados com os acontecimentos entre os seus amigos e ao redor do mundo. Assim, novas formas de comunicação continuam a quebrar a separação entre criação e reflexão e esses atos de criação de conteúdo digital fogem à nossa compreensão da posse.
Ocorre que, pelo que se pôde observar durante a realização deste trabalho, a maioria das pessoas não tem por objetivo acumular pertences digitais, sendo que esse fenômeno de criação e acúmulo desses bens acontece naturalmente e, diferentemente de quem coleciona moedas, placas, carros, por exemplo, no caso desse acervo, o tema é o próprio indivíduo.
Lara (2016) aponta que a mudança de hábitos sociais oriundos das intensas transformações tecnológicas ocorridas nos últimos anos, mostra-se necessária a adequação (atualização) do ordenamento jurídico vigente e, por conseguinte, a discussão e legislação acerca de assuntos, como o da herança digital, a fim de se acomodar o direito à realidade atual.
A utilização em nível global e de forma massiva dos computadores, que tem proporcionado relacionamento entre pessoas separadas fisicamente por quilômetros de distância, ainda sente a falta de legislações específicas.
Por outro lado, o Direito mostra-se como um fenômeno cultural e histórico com capacidade de evolução e adaptação infinita. Nesse sentido, nas palavras de Alarcón (2004, p. 97):
O Direito, como toda construção do homem, não é perfeito, mas é perfectível, é dizer, susceptível de ser reconstruído, levando em conta a inteligência, a prudência e reflexão do ser humano, que é seu artífice e, simultaneamente, seu objeto. É o ser humano que lhe outorga razão de ser, mas também quem o torna possível com a sua genialidade. Ainda que seja um fenômeno que acompanhe o decurso da história, o que o faz singular é que, embora seu incrível caudal, a cálida angústia e pretensão do Direito consista sempre em ordenar normativamente a realidade. E a realidade é a realidade viva, é dizer, a realidade da vida, do admirável mundo do passado e do presente, e também, o prognóstico do futuro.
Nessa linha, o presente artigo buscou analisar o vácuo legislativo existente, em especial no tocante à herança digital: o que está sendo feito diante da ausência de lei específica; quais as medidas que as pessoas têm tomado em vida em relação à destinação de seus bens digitais; a possibilidade de se fazer um inventário digital; o dissenso quanto ao tratamento de bens passíveis de valoração econômica e afetiva; o respaldo que esse tema tem em leis já existentes e o aparente conflito entre o direito sucessório e os direitos da personalidade do de cujus.
6 A HERANÇA DIGITAL NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
A legislação brasileira não tem previsão expressa em relação ao tema da herança digital, no entanto, em específico ao seu conceito e a possibilidade de esta ser albergada por analogia à legislação constitucional pátria vigente, podemos citar a menção constante do art. 5º, incs. XXVII e XXX da Constituição Federal.
Já em relação ao Código Civil, do art. 1.784 ao art. 1.828 – que corresponde ao Livro V, Do Direito das Sucessões –, encontra-se regulamentado o instituto da herança. Da mesma maneira, o citado código não traz definição explícita sobre o tema da herança digital, haja vista que tal legislação vigora desde 2002, mostrando-se desatualizada neste aspecto (MEDINA, 2019).
6.1 Marco Civil da Internet
Nos últimos anos, o crescente aumento do acesso à internet pelos brasileiros e os inúmeros casos concretos levados ao Judiciário trouxeram a necessidade de regulamentação do seu uso. Uma extensa discussão ocorreu na própria rede entre o último trimestre de 2009 e maio de 2010, para que a sociedade participasse da elaboração de um projeto de lei sobre o assunto.
Antes da discussão sobre o assunto, já havia sido criado o Comitê Gestor da Internet no Brasil – CGI.br – por meio do Decreto 4.829, de 03.09.2003. O projeto foi apresentado em outubro de 2009 e ficou parado por mais de dois anos na Câmara dos Deputados. No entanto, as denúncias relacionadas à espionagem realizada por órgãos ligados ao governo dos Estados Unidos deram destaque ao tema, fazendo com que o projeto tramitasse em regime de urgência, nos termos do art. 64, § 1º da Constituição Federal (AMORIM, 2020).
Em seu art. 3º, o Marco Civil da Internet determina quais são os princípios que disciplinam o uso da internet no Brasil, quais sejam:
Art. 3º. [...]
I – garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, nos termos da Constituição Federal;
II – proteção da privacidade;
III – proteção dos dados pessoais, na forma da lei;
IV – preservação e garantia da neutralidade de rede;
V – preservação da estabilidade, segurança e funcionalidade da rede, por meio de medidas técnicas compatíveis com os padrões internacionais e pelo estímulo ao uso de boas práticas;
VI – responsabilização dos agentes de acordo com suas atividades, nos termos da lei;
VII – preservação da natureza participativa da rede;
VIII – liberdade dos modelos de negócios promovidos na internet, desde que não conflitem com os demais princípios estabelecidos nesta lei.
Nesse sentido, o CGI possui papel de grande relevância para a viabilização e aplicação dos citados princípios, uma vez que o órgão tem como propósito realizar estudos, debates e promover resoluções e orientações sobre a utilização da internet. No entanto, conforme aponta Lara (2016), tais resoluções e orientações, bem como as demais normas previstas, não são suficientes para esgotarem os inúmeros casos concretos que surgem sobre a utilização da internet, fazendo-se necessário a criação de normas mais específicas, como é o caso do tema objeto do presente trabalho (a herança digital e a proteção dos direitos da personalidade após a morte do indivíduo).
6.2 Projetos de Lei 4.099/2012 e 4.847/2012 – Alteração de Artigos do Código Civil
Segundo Lobo (2019), uma das mais festejadas mudanças da parte geral do novo Código Civil brasileiro, quando da sua promulgação em 2002, consistiu na inserção de um capítulo próprio, a tratar dos direitos da personalidade – arts. 11 a 21 – ainda que, a bem da verdade, não se tratava bem de uma novidade, tendo em vista a Constituição Federal trazer uma proteção até mais abrangente, principalmente no seu art. 5º, caput, que consagra alguns dos direitos fundamentais da pessoa natural
Um dos projetos de lei a que se faz menção é o Projeto de Lei 4.099-A de 2012, proposto pelo Deputado Federal Jorginho Mello, cujo tema principal é a herança digital. Tal projeto teve sua tramitação encerrada em face do término da legislatura de seu autor, em 21.12.2018 e tinha por objetivo a alteração do art. 1.788 do Código Civil, a fim de se fazer constar a herança digital, por meio da expressa garantia de transmissão de todo o acervo digital do de cujus aos seus herdeiros.
Dessa forma, caso o citado projeto fosse aprovado, o art. 1.788, passaria a ter o acréscimo de um parágrafo, ficando com a seguinte disposição: “Art. 1.788. [...]. Parágrafo único. Serão transmitidos aos herdeiros todos os conteúdos de contas ou arquivos digitais de titularidade do autor da herança”.
A justificativa sustentada pelo Deputado Jorginho Mello mencionava a necessidade de adequações da legislação à nova realidade tecnológica que vivenciamos e as inúmeras situações levadas à apreciação do Poder Judiciário pelos herdeiros acerca do acervo digital deixado por seu ente falecido. Nesse sentido, o deputado ainda faz menção à disparidade testemunhada entre as decisões judiciais proferidas e vislumbra na alteração legislativa, um meio de pacificação de conflitos sociais crescentes (AMORIM e OLIVEIRA, 2020).
O segundo projeto de lei mencionado é o Projeto de Lei 4.847, de 2012 de autoria do Deputado Federal Marçal Filho, e que, no mesmo sentido do PL 4.099/2012, visava fazer constar a previsão expressa da herança digital, por meio do acréscimo do capítulo II-A e os arts. 1.797-A, 1.797-B e 1.797-C ao Código Civil, cujo teor era o seguinte:
Capítulo II-A
Da Herança Digital
Art. 1.797-A.
A herança digital defere-se como o conteúdo intangível do falecido, tudo o que é possível guardar ou acumular em espaço virtual, nas condições seguintes:
I – senhas
II – redes sociais;
III – contas da internet;
IV – qualquer bem e serviço virtual e digital de titularidade do falecido.
Art. 1.797-B. Se o falecido, tendo capacidade para testar, não o tiver feito, a herança será transmitida aos herdeiros legítimos.
Art. 1.797-C. Cabe ao herdeiro:
I – definir o destino das contas do falecido;
a) transformá-las em memorial, deixando o acesso restrito a amigos confirmados e mantendo apenas o conteúdo principal ou;
b) apagar todos os dados do usuário ou;
c) remover a conta do antigo usuário.
No mesmo sentido do PL 4.099/2012, a justificativa então defendida pelo Deputado Marçal Filho enfocava a importância do tema devido ao alto grau de digitalização em que vivemos e se fundamenta na necessidade de aperfeiçoamento da legislação civil, no tocante aos bens digitais e sua sucessão (LOBO, 2019).
Vale destacar que, ainda que ambos os projetos tenham o mesmo objetivo – herança digital – o PL 4.847/2012, apesar de ser menos genérico no tocante ao conceito do tema, fora desapensado do PL 4.099/2012 e teve seu arquivamento anteriormente determinado pela Mesa Diretora da CCJC (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania) da Câmara dos Deputados. No entanto, apesar de seu arquivamento, verifica- -se que, a partir do caput e incisos do art. 1.797-A teríamos a previsão legal do conceito de herança digital. E mais, ainda, a partir do constante do caput do art. 1.797-B, teríamos a expressa menção e materialização da figura do testamento digital.
Os dois projetos estipulam a sucessão do acervo digital como o acesso irrestrito a todos os bens do falecido, inclusive os personalíssimos e sem valor econômico (já exemplificados linhas atrás), o que, a nosso ver, mostra-se absurdo.
Além desses projetos acima delimitados, há dois projetos de lei em andamento atualmente: um deles é o projeto de lei 5.820/2019, que prevê a instrumentalização da disposição de última vontade no que tange à transmissibilidade dos bens digitais, visando com isso alterar, atualizar e tornar comum o codicilo[2] (ZAMPIER, 2020).
O mais recente destes projetos é o projeto de lei nº 3050/2020, que tem como intuito acrescentar um parágrafo único ao art. 1.788 do Código Civil, dispondo sobre a transmissibilidade aos herdeiros de todos os conteúdos de qualidade patrimonial, inclusive as contas ou arquivos digitais de titularidade do autor da herança (ZAMPIER, 2020).
7 CONCLUSÃO
O presente artigo teve como objetos de estudo os temas referentes ao direito sucessório, direito na internet e herança digital, visando atender ao cumprimento dos objetivos propostos anteriormente na pesquisa, especialmente relacionando-os com a doutrina e normas vigentes em território nacional.
O trabalho demonstrou que, a partir do advento e maior acesso à internet, novas situações foram criadas, como o fato do prolongamento da vida humana no plano digital, mesmo após a morte física, bem como suas consequências, em especial, e foco desta pesquisa, no plano sucessório de bens digitais.
Demonstrou-se que a tutela de pessoas falecidas é plenamente protegida no direito brasileiro e, em se tratando de direitos da personalidade póstuma, é já reconhecida a possibilidade de determinar a extensão de alguns direitos para além da morte (como o nome, a honra, a imagem, a privacidade, a intimidade etc.).
Nesse diapasão, a presente pesquisa analisou o cenário legislativo existente, em especial no tocante à herança digital e demonstrou, de forma exemplificativa, o que está sendo feito diante da ausência de lei específica, o dissenso quanto ao tratamento de bens passíveis de valoração econômica e afetiva e o respaldo que esse tema tem em leis já existentes.
Foi discutido, assim, questão importante ainda não pacificada, que diz respeito aos bens que não possuem valoração econômica e que também configuram parte do acervo digital do de cujus requerido pelos herdeiros, como é o caso do acesso a contas com informações pessoais (e-mails e redes sociais, por exemplo).
Ficou claro que, considerando que a herança digital abrange todo o conteúdo imaterial, de titularidade do falecido, composto pelo acervo de seus bens digitais e que estes bens abarcam senhas, perfis em redes sociais, e-mails e outros bens personalíssimos não suscetíveis de valoração econômica, permitir o acesso irrestrito a todo esse acervo pode ofender os direitos da personalidade do falecido.
8 REFERÊNCIAS
ALARCÓN, Pietro de Jesús Lora. Patrimônio genético humano e sua proteção na Constituição Federal de 1998. São Paulo: Método, 2004.
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BARROSO, Luis Roberto. A Dignidade da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo: a construção de um conceito jurídico à luz da jurisprudência mundial. Belo Horizonte: Fórum, 2012.
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[1] Filósofo e sociólogo francês. Pesquisador em ciência da informação e da comunicação, Lévy tem como foco a inteligência coletiva focando em um contexto antropológico, e é um dos principais filósofos da mídia atualmente. Suas pesquisas se concentram principalmente na área da cibernética. (WIKIPEDIA, 2022).
[2] O codicilo, ou pequeno codex, é disciplinado nos artigos 1.881 a 1.885 do Código Civil (Lei 10.406/02) e pode então ser compreendido com um escrito em vida que terá efeitos após a morte (CASTELLS, 2003).
graduanda do curso de Direito pelo Centro Universitário Fametro (FAMETRO).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ISABELLY PACHECO BRANDãO, . Herança digital no Brasil: a sucessão de direitos relativos às redes sociais no ordenamento jurídico brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 nov 2022, 04:25. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60067/herana-digital-no-brasil-a-sucesso-de-direitos-relativos-s-redes-sociais-no-ordenamento-jurdico-brasileiro. Acesso em: 23 dez 2024.
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