GILSON RIBEIRO CARVALHO FILHO[1]
(orientador)
RESUMO: A alienação parental se caracteriza basicamente como um ato onde um pai ou uma mãe de um filho o instrui contra o outro genitor com o intuito de provocar o rompimento dos laços de afeto existentes entre eles, ou simplesmente impedindo que se forme afeição entre a criança e um dos seus genitores. Para além dos prejuízos sociais e psicológicos que a criança sofre em razão desta prática, há ainda em alguns casos a existência de falsa denúncia de alienação parental por parte do outro genitor. Frente a esse contexto, o presente estudo teve o objetivo de analisar as consequências jurídicas e sociais da falsa denúncia de alienação parental no Direito brasileiro. A metodologia utilizada foi a de revisão da literatura, com base em livros, artigos científicos, texto da lei e jurisprudência. O banco de dados foi a Scielo e Google Acadêmico, além de sites dos Tribunais Superiores. Nos resultados, encontrou-se posicionamentos doutrinários favoráveis a condenação daqueles que realizam uma falsa denúncia de alienação parental. Os tribunais e a doutrina acentuam que o genitor responde pelo crime de falsa denúncia quando se utiliza de falsas memórias para imputar ao outro genitor o cometimento de algum crime sexual contra o menor, ou até mesmo pelos crimes de calúnia, obstrução de visitas, desobediência judicial e abandono de incapaz.
Palavras-chave: Alienação. Denúncia. Falsa. Responsabilidade Jurídica.
ABSTRACT: Parental alienation is basically characterized as an act where a father or mother of a child instructs him against the other parent with the aim of causing the rupture of the existing bonds of affection between them, or simply preventing the formation of affection between the child and the child. one of your parents. In addition to the social and psychological damage that the child suffers as a result of this practice, there is still in some cases the existence of a false report of parental alienation by the other parent. In view of this context, the present study aimed to analyze the legal and social consequences of the false denunciation of parental alienation in Brazilian law. The methodology used was the literature review, based on books, scientific articles, text of the law and jurisprudence. The database was Scielo and Google Scholar, as well as websites of the Superior Courts. In the results, doctrinal positions favorable to the condemnation of those who make a false complaint of parental alienation were found. Courts and doctrine emphasize that the parent is liable for the crime of false reporting when using false memories to impute to the other parent the commission of some sexual crime against the minor, or even for the crimes of slander, obstruction of visits, judicial disobedience and abandonment of the incapable.
Keywords: Alienation. Complaint. false. Legal Responsibility.
Sumário: 1. Introdução. 2. Metodologia. 3. Síntese geral sobre a Alienação Parental. 4. A falsa denúncia no Direito Brasileiro. 5. A falsa denúncia na Alienação Parental: efeitos jurídicos. 6. Considerações Finais. 7. Referências Bibliográficas.
1. INTRODUÇÃO
A família representa o significado principal da sociedade, uma vez que é por meio da sua formação e expansão que se forma a comunidade. É tão importante e necessária a ponto de ser fundamental para a formação da personalidade, da sociabilidade e do intelecto do indivíduo. Dessa forma, sendo tão necessário, o Direito, enquanto ciência social abarca especificamente um sistema de normas jurídicas especial para a família, denominado de Direito de Família.
Como bem acentua o art. 226 da Constituição Federal de 1988, a família é considerada como a base da sociedade e do indivíduo. É na sua união que permeia todo o foco das normas. No entanto, numa sociedade que evolui e se modifica com bastante rapidez, existem situações onde há uma ruptura do núcleo familiar, e consequentemente uma série de efeitos surgem. Nesse ponto, cabe ao Direito dar o norteamento legal para cada situação apresentada (DIAS, 2017).
No presente trabalho, discute-se, dentre vários outros assuntos relacionados ao Direito de Família, um tema de extrema urgência: a alienação parental. A alienação consiste na circunstância em que a mãe ou o pai de uma criança a instrui contra o outro genitor com o intuito de provocar o rompimento dos laços de afeto existentes entre eles, ou simplesmente impedindo que se forme afeição entre a criança e um dos seus genitores (SOUZA, 2017).
Ocorre que em determinados casos, não se encontra a configuração da alienação parental. E mesmo não havendo qualquer indício dessa prática, o outro genitor realiza uma falsa denúncia. Com isso, nota-se uma situação complexa, uma vez que para se estabelecer que a denúncia de alienação parental seja falsa é preciso verificar a situação in loco.
Desse modo, procura-se no decorrer do trabalho responder: qual as consequências jurídicas da falsa denúncia de alienação parental?
Diante desse contexto, esse estudo se objetivou em apresentar os efeitos que a falsa denúncia de prática de Alienação Parental possui no âmbito jurídico brasileiro. Também se apresenta os seus efeitos para a criança, vítima desse ato.
2. METODOLOGIA
Na metodologia empregada, foi realizada uma revisão da literatura, onde baseou na atual Constituição Federal, em revistas jurídicas, em livros e artigos, dentre outros. A coleta das informações foi feita em sites de busca de dados, tais como: Scielo; Google, dentre outros, entre os meses de outubro e novembro. Os descritores foram: Alienação Parental. Falsa denúncia. Legislação Brasileira. Jurisprudência.
3. SÍNTESE GERAL SOBRE A ALIENAÇÃO PARENTAL
Antes de discorrer sobre o tema específico desse tópico é preciso pincelar de modo geral o que seja família, uma vez que tal instituto está inserido nesse grupo. No entanto, conceituar família, apesar de nos remeter a uma simples definição, não é de todo modo um conceito único. Isso porque o conceito de família foi se aperfeiçoando e mudando ao longo da evolução humana.
Se nos primórdios da sociedade, a família era caracterizada pelo pátrio poder (onde o homem detinha todo e qualquer poder e direito sobre os demais membros familiares), nos dias atuais ela é caracterizada além da vertente biológica, agrupando também a afetividade entre os entes (LOPES, 2018).
Nesse sentido, em contraponto ao pátrio poder, a família representa o conjunto de direitos e obrigações dos pais em relação aos filhos menores, ou seja, o pólo ativo do poder familiar seria representado por ambos os pais (IBIAPINA, 2015).
Do mesmo modo, entende-se que a família seja um conjunto de pessoas unidas por vínculo jurídico de natureza familiar. Na visão de Ribeiro (2018, p. 30), “designa-se por família o conjunto de pessoas que possuem grau de parentesco entre si e vivem na mesma casa formando um lar”.
Conforme já mencionado, o entendimento acerca do que seja uma família vai se moldando de acordo com os avanços sociais. Na atualidade a família é um complexo emaranhado de relações sociais e principalmente afetivas entre as pessoas. O afeto, nesse sentido possui tanta importância quanto os laços consanguíneos.
Frente a estrutura familiar, em muitos casos, o matrimônio representa o modelo ‘ideal’ do que seja uma família. Ainda que existam hoje muitos arranjos familiares, conhecida como pluralidade familiar, é no matrimônio que está a principal base para a formação de uma família.
Ocorre que quando há uma ruptura desse vínculo matrimonial, os menores, além dos dissabores inerentes a essa situação, são vítimas de Alienação Parental. Originado do latim “alienato” que significa alienação, venda, loucura, o termo alienação está ligado diretamente a ideia de ‘outro’. Já o termo parental, também provém do latim “parentalis” e representa tanto o pai quanto a mãe, como relativo a parente. Em outras palavras: pessoa que pertence a mesma família (ROCHA, 2019).
Assim, entende-se que a junção dos dois termos acima descritos está ligado à alienação de um parente/familiar. Conceitualmente, a alienação parental pode ser entendida como a destruição da figura de um dos pais com o propósito deliberado de obter a guarda dos filhos. No entendimento de Perelli (2020, p. 02) “ocorre quando o pai ou a mãe tenta afastar o filho do outro genitor, gerando, em relação a ele, desafeição no consciente da criança por meio de pequenas sutilezas ou também por atos expressos”.
Warshak (2001 apud SILVA, 2019, p. 30) explica que o termo alienação é como “um distúrbio no qual as crianças sofrem uma aversão irracional a um genitor, com quem eles anteriormente desfrutavam de relações normais ou com quem normalmente desenvolviam afeições”.
O foco da Alienação Parental é sempre denegrir, prejudicar o outro, tendo resultado a total perda de contato com o genitor-vítima. Não importa a forma e a maneira como essa alienação é feita, o resultado é sempre o afastamento e em alguns casos a anulação total de convívio com o outro.
No Brasil, a legislação pátria tem promulgado leis que regem sobre essa matéria, sendo a mais notável a Lei nº. 12.318/2010, que em seu art. 2º, caput, traz de forma sucinta a definição de Alienação Parental:
Art. 2º. Considera-se ato de alienação parental interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avôs ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie o genitor ou cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. (BRASIL, 2010)
Essa lei foi importante porque “tampou” um buraco existente nas relações familiares em relação à segurança psicológica do filho, a ponto de trazer o garantismo por meio dessa norma de que essa ação lesiva não comprometa a formação da criança e do adolescente (LOPES, 2018).
Machado (2017, p. 01) acentua que “a conduta adotada pelo alienador atinge diretamente o comportamento da criança e na sua formação psíquica, muitas vezes sem fundamento algum, implanta na criança dúvidas sobre o caráter e conduta do alienado, trazendo para si a criança e, em conjunto, agem para prejudicar de forma direta o outro genitor”.
A criança nem sempre consegue discernir o que é o certo do errado, e é nessa fraqueza que o alienador consegue impor suas verdades de forma incessante à prole, tomando tudo o que lhe é dito como verdadeiro (MACHADO, 2017).
Ao referir-se a tal assunto, Correia (2019, p. 02) diz que “os atos alienatórios provocam em crianças e adolescentes uma exposição negativa da ambiência familiar, tornando-os adultos inseguros e hostis quanto ao afeto”. Pode ocorrer inclusive como consequência, uma desvalorização dos valores familiares.
Tendo com figura central o filho, na alienação parental os danos às vítimas podem recair na saúde, tanto na esfera mental quanto física. A falta de afeto produzida em decorrência da sua alienação acarreta efeitos nas pessoas alienadas, todos eles prejudiciais.
O Direito buscou medidas que pudessem prevenir e/ou punir a prática da Alienação Parental. Tem-se como exemplo dessas medidas a busca e apreensão da criança; regulamentação de visitas e maior rigor da lei em relação à alienação.
A busca e apreensão da criança “pode ser requerida quando um genitor não devolve os filhos no dia fixado judicialmente ou impede o convívio dos filhos com o outro genitor” (FIGUEIREDO, 2016, p. 176). Essa é uma medida traumática, pois exige em muitos casos a intervenção de força policial, o que gera constrangimento às partes e estresse à criança, devendo ser utilizada como último recurso.
Da mesma forma a regulamentação de visitas também é uma medida protetiva contra a Alienação Parental, já que se tem um controle maior sobre a convivência dos pais em relação aos filhos, evitando qualquer situação constrangedora (MONTEZUMA; PEREIRA; MELO, 2017).
4 A FALSA DENÚNCIA NO DIREITO BRASILEIRO
Um crime bastante recorrente na era moderna, ainda que já normatizado há décadas, é a falsa denúncia. Como explicita Souza (2017) a pessoa que faz a comunicação de um crime que de fato não ocorreu, tendo como consequência a ação de uma autoridade no objetivo de investigar o falso crime, pode ser responsabilizada pelo crime de comunicação falsa de crime, previsto no artigo 340 do Código Penal, e está sujeita a uma pena de até 6 meses de detenção e multa.
Art. 340 - Provocar a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime ou de contravenção que sabe não se ter verificado:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.(BRASIL, 1940)
O criminoso, por meio de uma mentira, movimenta vários órgãos do Estado, para investigar um crime que não existiu, como: delegacia, fórum, Ministério Público, entre outros (SOUZA, 2017).
Cabe destacar que tal crime se difere do crime de denunciação caluniosa. Como explica Batista (2020) para sua configuração, a denunciação caluniosa exige que seja atribuído crime a uma pessoa inocente, e que seja instaurado um processo ou investigação contra essa pessoa. No caso da comunicação falsa, basta que seja comunicado à autoridade um crime fictício, sem indicar o suposto criminoso ou indicando pessoa que não existe.
Mas há na doutrina o alinhamento de tais crimes. Batista (2020) também acentua que a acusação falsa na denunciação caluniosa deve ser objetiva e subjetivamente falsa. Em outras palavras, diversa aos fatos reais e com a objetividade clara, por parte do acusador, sobre a inocência da pessoa à qual se atribui o crime. O dolo, nesse caso, é representado pelo objetivo de começar uma investigação policial ou um processo em desfavor da vítima.
Bottini (2019) deixa claro que a caracterização do crime depende de prévio conhecimento da inocência do acusado. Para esse autor, esse crime deve ser amplamente combatido, uma vez que não se pode buscar o acionamento da máquina judiciária para compartilhar injustiças e criar discórdias, uma vez que o agente passivo da ação penal é inocente.
A denunciação é um crime diferente da simples calúnia. Nesse caso, tem-se que observar três elementos para a sua efetivação: i) individualização da pessoa acusada, ii) definição dos delitos falsamente imputados e o denunciante tenha a ciência prévia da inocência do denunciado (BATISTA, 2020).
A jurisprudência brasileira tem ao longo das últimas décadas julgando casos de falsa denúncia e punindo os sujeitos ativos. Tem-se como exemplo o seguinte julgado:
JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL. DIREITO PENAL. CRIME DE COMUNICAÇÃO FALSA DE CRIME OU DE CONTRAVENÇÃO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. ERRO DE TIPO. INOCORRÊNCIA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. IMPOSIÇÃO E DOSIMETRIA DA PENA ADEQUADAS. REGIME INICIAL MANTIDO. SUSBSTITUIÇÃO DA PENA POR RESTRITIVA DE DIREITOS NEGADA. SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Presentes os pressupostos específicos, conhecido o recurso. 2. Trata-se de recurso interposto pelo acusado contra a sentença que julgou procedente a pretensão punitiva estatal constante na denúncia, atinente ao crime de comunicação falsa de crime ou contravenção, tipificado no artigo 340 do Código Penal, para condenar o denunciado à pena de 02 (dois) meses e 15 (quinze) dias de detenção, com regime inicial semiaberto, não tendo havido a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito. [...] 5. O agente que provoca a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de roubo, que sabe não ter ocorrido, de forma livre e conscientemente, comete o crime tipificado no art. 340 do Código Penal. Tutela-se o regular funcionamento da Administração Pública, atingido pela movimentação indevida dos órgãos de persecução penal. [...] 11. Assim, as provas produzidas na instrução criminal são aptas a fundamentar a certeza da autoria e da materialidade do crime imputado ao réu/recorrente na denúncia, eis que os depoimentos se mostraram harmônicos e coerentes com os demais elementos constantes dos autos, descrevendo adequadamente a dinâmica dos fatos, inexistindo dúvida quanto ao elemento objetivo e subjetivo do tipo, este último consistente na consciência de informar à autoridade policial a ocorrência de crime que não havia sido praticado. 12. O fato é típico, ilícito e culpável, não havendo causas excludentes de ilicitude ou de culpabilidade. O acusado é imputável, uma vez que não provou sua inconsciência na ilicitude dos fatos, de forma que deve ser mantida a sentença. [...]. (07124666920218070004 - (0712466-69.2021.8.07.0004 - Res. 65 CNJ). TJDFT. Segunda Turma Recursal. Relatora: SILVANA DA SILVA CHAVES. Data de Julgamento: 25/07/2022. Publicado no PJe: 11/08/2022). (grifo meu)
Conforme aludido na jurisprudência acima, o agente que provoca a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de algum crime, que sabe não ter ocorrido, de forma livre e conscientemente, comete o crime tipificado no art. 340 do Código Penal. Tutela-se o regular funcionamento da Administração Pública, atingido pela movimentação indevida dos órgãos de persecução penal.
Mais recentemente foi promulgada a Lei nº 14.110/2020 que modificou a definição encontrada no Código Penal sobre o crime cometido por quem faz denúncias falsas contra pessoas sabidamente inocentes, a denominada denunciação caluniosa (BRASIL, 2020).
Tendo como origem o Projeto de Lei nº 2.810/2020, a nova lei traz a possibilidade de punição para acusações falsas de infrações disciplinares e atos ímprobos e torna a definição do crime mais objetiva. Como acentua Coronel (2020) a denunciação caluniosa é um delito em desfavor da administração da Justiça. Com o novo texto legal, retirou-se a expressão “investigação administrativa”.
In casu, o crime será configurado, de acordo com a nova lei, quando denúncias falsas levem efetivamente à instauração de processos, ações ou investigações policiais contra quem foi injustamente denunciado (BRASIL, 2020).
Com isso, esta norma passou a estabelecer que denúncias falsas de infrações éticas e disciplinares também possam ser consideradas crime de denunciação caluniosa se resultarem em processos (BRASIL, 2020).
De acordo com Coronel (2020, p. 01):
Não é mais todo e qualquer expediente administrativo, como uma notícia de fato ou sindicância, que pode ser enquadrado como ‘investigação’ para fins de caracterização da denunciação caluniosa. Agora será necessário que o procedimento, o processo, a ação instaurada em decorrência da denúncia falsa tenha caráter sancionador e acusatório, e não meramente investigativo.
Ao tentar entender as motivações que esse tipo de crime é praticado, Batista (2020) entende que a vingança é a motivação primordial para a maioria dos casos de falsa denúncia. As situações que mais geram esse tipo de denúncia são as acusações falsas de empregador contra empregado para evitar ações trabalhistas e credores que acusam seus devedores inadimplentes de estelionato.
Além destas, encontra-se as falsas denúncias encontradas em sede familiar, como por exemplo, nas relações matrimoniais e que tenham relações com os filhos. Sobre esse último, discute-se os seus efeitos no tópico seguinte.
5. A FALSA DENÚNCIA NA ALIENAÇÃO PARENTAL: EFEITOS JURÍDICOS
Uma das ações mais impactantes no que concerne ao tema aqui analisado, diz respeito à falsa denúncia com base no crime de Alienação Parental. Mônica Guazzelli (2018) ao discorrer sobre essa questão afirma que a falsa denúncia de abuso retrata o lado mais sórdido de uma vingança, pois vai sacrificar a própria prole.
A supracitada autora ainda afirma que esse tipo de conduta delituosa é mais comum do que se imagina em sede familiar. Isso se deve sobretudo, em casos de separação mal resolvida, onde se constata o fato de que muitas vezes a ruptura da vida conjugal gera na mãe sentimentos de abandono, de rejeição de traição, surgindo uma tendência vingativa muito grande (GUAZZELLI, 2018, p. 43).
A falsa denúncia em casos de Alienação Parental se encontra normatizada na Lei nº 12.318 de 2010 ao qual traz em seu inciso VI, a sua previsão objetiva. Pelo texto deste artigo, apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente (BRASIL, 2010).
Silva (2015, p. 40) afirma que:
Denegrir a imagem moral de genitor alienado perante os filhos é uma forma de abuso psicológico – sutil subjetivo e difícil de mensurar objetivamente –, mas que poderá trazer sérias consequências psicológicas e provocar problemas psiquiátricos pelo resto da vida.
Trindade (2019) aduz que a dita denúncia pode ser decorrente da Síndrome de Alienação Parental e ter gerado uma falsa acusação de abuso. Nesses casos, quando acontece a falsa denúncia, teremos várias sequelas e danos tanto para a criança como para o acusado.
A jurisprudência tem se posicionado no sentido de punir aqueles que realizam a falsa denúncia de alienação parental. Nesse sentido, cita-se:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. GENITOR PROIBIDO DE MANTER CONTATO COM A FILHA. SUPOSTA PRÁTICA DE VIOLÊNCIA SEXUAL PERPETRADA CONTRA A INFANTE. DECISÃO AGRAVADA QUE AUTORIZA A VISITAÇÃO DAS TIAS E AVÓ PATERNAS À MENINA. MANUTENÇÃO. CASO CONCRETO ONDE FORAM EVIDENCIADAS A IMPLANTAÇÃO DE FALSAS MEMÓRIAS NA CRIANÇA E VIOLÊNCIA PSÍQUICA PRATICADA PELAS FAMÍLIAS MATERNA E PATERNA, EVOLVIDAS EM INTENSA HOSTILIDADE. INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE QUE A FAMÍLIA PATERNA ESTEJA FACILITANDO O CONTATO ENTRE O GENITOR E A MENINA OU QUE AS VISITAS REALIZADAS TENHAM SIDO PREJUDICIAIS À MENOR. LAUDO PERICIAL QUE SUGERE SEJA ESTIMULADO O CONVÍVIO DA INFANTE COM A FAMÍLIA PATERNA E QUE AS VISITAS ÀS TIAS E AVÓ SEJAM RETOMADAS. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (TJ-RS - AI: 70068273382 RS, Relator: Sandra Brisolara Medeiros, Data de Julgamento: 29/06/2016, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 01/07/2016). (grifo meu)
Os efeitos de uma falsa denúncia por Alienação Parental trazem efeitos negativos principalmente nas crianças. Guazzelli (2018) descreve que os filhos apresentam quadros de agressividade (verbal ou física, justificada pelo filho por motivos fúteis ou absurdos; sentimento de ódio, expresso sem ambivalência sem demonstrar culpa pode denegrir o genitor alienado e parentes; afirma que chegou sozinha ás suas conclusões e adota a defesa do genitor alienador de forma racional; conta casos que não viveu e guarda na memória fatos considerados “negativos” sobre o genitor alienado, de que ela não se lembraria sem a ajuda de outra pessoa; e não quer se encontrar com o genitor alienado.
Na investigação de uma falsa denúncia envolvendo Alienação Parental, se mostra muito complexo, principalmente porque envolve crianças e sua subjetividade. Por conta disso, é preciso se dispor de vários mecanismos e meios de prova para de fato estabelecer uma falsa denúncia.
Brandt (2019) afirma que o laudo pericial deve ser considerado mais um elemento de prova dentro dos autos e não se constitui no julgamento final do caso. Esse relatório, como todas as outras provas, está sujeito ao princípio do contraditório e da ampla defesa. Portanto, pode e deve ser questionado sempre que necessário, para garantir em última instância da justiça.
Neste liame, Azambuja (2017, p. 174), destaca que diante da dificuldade na produção de provas, visto que muitos casos inexistem vestígios físicos, o “depoimento da vítima é de suma importância para elucidação do caso, sendo tal depoimento revestido de credibilidade quase absoluta para o julgador”.
Destaca-se que, visando coibir a prática da alienação parental o artigo 6º, da Lei 12.318/2018 prevê sanções para aqueles genitores e também para os familiares que cometerem a alienação parental. Cumpre referir que tais sanções podem ser impostas cumulativamente ou não, cabendo também responsabilização na esfera civil e/ou criminal a depender da situação ocasionada (BRASIL, 2018).
Conforme disposto pela presente norma as medias punitivas estão previstas nos incisos I, III, IV e VII do artigo acima mencionado. Estas devem ser impostas somente ao genitor alienador e consistem em advertência, multa, obrigatoriedade de acompanhamento psicológico ou biopsicossocial e suspensão da autoridade parental (BRASIL, 2018).
Já os casos dos incisos II, V e VI podem ser consideradas medidas protéticas a criança ou adolescente vítima da alienação, sendo elas: ampliação do regime de convivência familiar em favor do genitor alienado, fixação de guarda compartilhada ou inversão de guarda, fixação cautelar do domicílio da criança e do adolescente (BRASIL, 2018).
De todo modo, o genitor responde pelo crime de falsa denúncia quando se utiliza de falsas memórias para imputar ao outro genitor o cometimento de algum crime sexual contra o menor, ou até mesmo pelos crimes de calúnia, obstrução de visitas, desobediência judicial e abandono de incapaz (DIAS, 2017).
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
As separações, que dificilmente ocorrem de forma consensual, trazem turbulência e conflitos para a relação familiar. Agressões verbais ou até mesmo físicas entre os ex-cônjuges, disputa por dinheiro e principalmente a muitos são os genitores que, no intuito de prejudicar o outro genitor, presta uma falsa denúncia de Alienação Parental.
Cabe destacar que, independentemente de qual efeito a alienação parental possa trazer, o importante é a análise in loco de cada situação familiar. Somente com uma observação mais aprofundada e com base em relatórios técnicos é que se pode chegar a uma decisão justa e que respeite o melhor interesse do filho.
O poder judiciário conta com o apoio de uma equipe multidisciplinar própria (psicólogos, assistente sociais, juízes), para realizar o diagnóstico da existência da alienação parental, ao que se refere a este fato está cada vez mais difícil fazer uma analise da sua existência em virtude dos acontecimentos e situações em que são implantadas as memórias falsas e logo se tem a manifestação da síndrome de alienação.
Assim, o processo de apurar o que realmente foi vivenciado pelo menor se torna bastante complexo. Nessa perspectiva, observa-se que o juiz, em diversos casos, deve se manifestar com prudência.
Por fim, pode-se dizer que mesmo após as averiguações do relato onde houve a alienação parental, e dessa decorreu a falsa denúncia, infelizmente as partes envolvidas já terão sofrido o dano causado pelo afastamento, principalmente a criança onde está tem o seu psicológico atingido, pois diversas vezes escutou o seu genitor/genitora sendo humilhado.
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TRINDADE, Jorge. Manual de psicologia jurídica para operadores do Direito. 9. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2019.
Bacharelanda em Direito pela Universidade de Gurupi – UnirG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COSTA, LUISA MARTINS MIRANDA. Aspectos jurídicos da falsa “denúncia” de alienação parental no convívio familiar Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 nov 2022, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60288/aspectos-jurdicos-da-falsa-denncia-de-alienao-parental-no-convvio-familiar. Acesso em: 23 dez 2024.
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