RESUMO: Este artigo tem como foco abordar a inserção das penas alternativas dentro do ordenamento jurídico brasileiro e sua análise como instrumento indispensável no combate à reincidência criminal, instituto que quando aplicado, teria como consequência a redução da criminalidade. Na ordem brasileira, sua previsão legal ocorreu durante a reforma sistêmica do Código Penal no ano de 1984, e foi dividida basicamente em três vertentes: prestação de serviços à comunidade, limitação dos finais de semana e interdição temporária de direitos. Aqui analisaremos o sistema prisional brasileiro, descrevendo a evolução das penas até os dias atuais, onde observa-se uma maior preocupação com a inclusão de alternativas ao tradicional encarceramento, visando acompanhar a evolução social de punir quando da ocorrência de crimes de menor relevância.
PALAVRAS-CHAVE: Penas alternativas. Crimes de menor potencial ofensivo. Reforma.
ABSTRACT: This article focuses on the insertion of alternative penalties within the Brazilian legal system and its analysis as an indispensable instrument in the fight against criminal recidivism, an institute that, when applied, would result in the reduction of crime. In the Brazilian order, its legal provision occurred during the systemic reform of the Penal Code in 1984, and was basically divided into three aspects: provision of services to the community, limitation of weekends and temporary interdiction of rights. Here we will analyze the Brazilian prison system, describing the evolution of sentences until the present day, where there is a greater concern with the inclusion of alternatives to the traditional incarceration, aiming to follow the social evolution of punishing when crimes of lesser relevance occur.
KEYWORDS: Alternative for prisons. Lesser offenses. Remodeling
1 INTRODUÇÃO
O principal motivo para se pensar as penas alternativas parece ter sido a observação de que não só os juízes, ante as elaborações de suas decisões judiciais na esfera criminal, como a própria parcela de pessoas punidas viram o esvaziamento do objetivo de punir acontecer através do tempo, e para além disso, suas consequências negativas e improdutivas para sociedade.
Na linha do tempo, o instituto da pena viu-se inicialmente cercado de violência e desproporcionalidade, passando por razões de vingança divina até o caráter de vingança pública, enfrentou diversas reformas que trouxeram a atual configuração de afastamento que não parece se importar com as consequências do encarceramento.
“Os dados alarmantes chamam a atenção para a necessidade de estudos aprofundados sobre a função, ou não, ressocializadora das prisões, o fenômeno da reincidência criminal e seus fatores determinantes, bem como sobre a eficácia de dispositivos alternativos como meios de contornar esta crise no sistema prisional brasileiro.” (BRASIL. INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Reincidência criminal no Brasil: relatório de pesquisa. Rio de Janeiro: Ipea, 2015. p.11)
Na elaboração do instituto das penas alternativas procurou-se adequar a punição do criminoso que comete crimes de menor gravidade analisando em critérios como níveis de culpabilidade, antecedentes criminais, conduta de personalidade entre outros, o era ter um olhar diferente sobre o encarceramento porém ainda que o supramencionado ainda é pouco aplicação devido à falta de divulgação de estudos da área, e à cultura prisional no sistema de justiça do país.
É bem verdade que toda atitude criminosa merece uma punição, mas de acordo com as hipóteses de cabimento dispostas no artigo 44 do Código Penal, as penas restritivas de direitos podem substituir a prisão clássica em casos específicos, se a pena aplicada por exemplo for menor que quatro anos de prisão. Além disso, o crime não pode ter sido cometido com violência ou grave ameaça. Também há a previsão de penas alternativas nos casos de crime culposo.
Se a pena for de um ano ou menos de prisão, o condenado pode substituir a prisão por multa, ou por uma pena alternativa. Se superar um ano, a pena pode ser substituída pela combinação de multa mais uma pena alternativa; ou por duas penas alternativas.
Esta pesquisa busca compreender a eficiência das penas alternativas como instrumento alternativo à privação da liberdade e se funcionam como instrumento redutor de reincidência penal.
2 DAS PENAS ALTERNATIVAS
2.1 Abordagem Histórica das Penas Alternativas
De acordo com Nucci (2010, p.367) as penas alternativas constituem aquelas “expressamente previstas em lei, tendo por fim evitar o encarceramento de determinados criminosos, autores de infrações penais consideradas leves, promovendo-lhes a recuperação através de restrições a certos direitos.”
Já com um olhar de proporcionalidade, Beccaria (2001, p. 201) afirma que “para não ser um ato de violência contra o cidadão, a pena deve ser essencialmente pública, pronta, necessária, a menor das penas aplicáveis nas circunstâncias dadas.”
Martins (2002, p. 21-22) brilhantemente menciona que a discussão acerca da necessidade de criação de uma alternativa penal se iniciou a partir da constatação geral de que o modelo e tipos de prisão estavam em crise e que tampouco estavam atendendo às funções da pena para a sociedade.
Acerca da crise Ilanud (2006, p. 4), destacava que já no ano de 1955, as Regras Mínimas Para o Tratamento dos Presos (Organização das Nações Unidas - ONU) recomendam a aplicação de penas não privativas de liberdade e, que em 1966, ano de criação do Pacto Internacional dos Direitos Políticos e Civis, o instituto teve a ideia reforçada.
Assim descreve passo a passo o surgimento das Alternativas Penais o autor Bitencout:
Uma das Primeiras penas alternativas surgiu na Rússia, em 1926, a “prestação de serviço à comunidade”, mais tarde (1960) o diploma penal russo criou a pena de “trabalhos correcionais”, sem privação de liberdade; em 1953, a Alemanha adotou a mesma pena para infratores menores; em 1963, a Bélgica criou o “arresto de fim de semana”; em 1967, o Principado de Mônaco adotou uma “forma fracionada” da privativa de liberdade e, finalmente, em 1972, a Inglaterra instituiu a “prestação de serviços comunitários”, que, até hoje, é a mais bem sucedida alternativa à pena de prisão. (p.24.)
O autor Costa Jr (2007, p. 169) destaca outra inovação que ocorreu no ano de 1967 na Inglaterra, o país que instituiu o Community Service, no qual o delinquente passava parte de seu tempo realizando trabalhos úteis à comunidade, sendo utilizado inclusive como modelo para outros países.
Já no Brasil, foi instituída em caráter experimental no ano de 1966, a prisão albergue, através do Provimento XXV do Conselho Superior da Magistratura de São Paulo. Logo em 1972, foi apresentado ao Ministério da Justiça um anteprojeto de lei propondo a elevação da interdição de direitos como uma das penas principais.
Destaque especial ao Estado de Goiânia, que no ano seguinte, promoveu uma moção recomendando “a introdução de medidas humanísticas conducentes à reintegração social do condenado como a ampliação do perdão judicial, do sursis e do livramento condicional, além de outras medidas substitutivas da pena de prisão” Reale r. (1987, p. 137). Até o Código Penal de 1940, as penas eram de detenção, reclusão e multa.
A Reforma Penal de 1984 apresentou-se como grande marco na história das penas no Direito Penal brasileiro, uma vez que, foi responsável pela instituição de modalidades inéditas de penas e abriu-se o caminho, como afirma Martins, para uma “oxigenação do próprio pensamento dos profissionais do direito”. MARTINS, Jorge Henrique Shaefer, Penas Alternativas, (p. 23)
Muitos foram os fatores que levaram à mudança de enfoque na legislação penal, como, por exemplo, a preocupação com a integridade física e mental, bem como com a vida dos seres humanos. Vários pactos e legislações foram elaborados, visando à preservação da dignidade da pessoa humana, buscando eliminar de todos os ordenamentos jurídicos os tratamentos degradantes e cruéis.
2.2 Aplicabilidade
Costuma-se dizer que ninguém conhece verdadeiramente uma nação até que tenha estado dentro de suas prisões. Uma nação não deve ser julgada pelo modo como trata seus cidadãos mais elevados, mas sim pelo modo como trata seus cidadãos mais baixos. (NELSON MANDELA – Long Walk to Freedon, Little Brown, Lodres: 1994)
As “penas restritivas de direito” passaram a ser adotadas e aplicadas como penas substitutivas, estando ressalvadas no Código Penal e na Lei 9.714/98. Tendo em conta essas normas, o juiz está livre para escolher a sanção mais adequada, observando a personalidade do agente e demais elementos expostos no artigo 59, IV, do Código Penal, cabendo a ele analisar se estão presentes os requisitos para a substituição.
De acordo com Capez (2011, p. 445), os requisitos de aplicabilidade são cirúrgicos e muito eficazes quando aplicados corretamente.
A aplicabilidade das penas alternativas obedece a uma linha de requisitos objetivos ou subjetivos conforme ensina Bitencourt:
A aplicação da pena restritiva de direitos em substituição à pena privativa de liberdade está determinando pressupostos (ou requisitos) – uns objetivos e outros subjetivos – que devem estar presentes simultaneamente. (BITENCOURT, Cesar Roberto. Novas Penas Alternativas. São Paulo: Saraiva, 1999.p.83)
Essas penas se dividem em prestação pecuniária, perda de bens e valores, prestação de serviços à comunidade, interdição temporária de direitos e limitação dos finais de semana, assim como define o artigo 43 do CP:
Art 43. As penas restritivas de direitos são:
I-Prestação pecuniária
II- Perda de bens e valores
III- Vetado
IV- Prestação de serviços à comunidade ou à entidade pública
V- Interdição temporária de direitos
VI- Limitação dos finais de semana
A imposição das penas alternativas possibilitará ao apenado a continuação da convivência em família, com a sociedade, dando-lhe sustento e possibilitando a reparação do dano causado de um modo menos agressivo.
3 AS PENAS ALTERNATIVAS E O REGRAMENTO INTERNACIONAL
Fragoso (1981, p. 5), argumenta que o crime se deve a vários fatores sociais e que sua profundidade perpassa para além da punição, na elaboração de um plano político e econômico capaz de arcar com as consequências geradas:
A pena não se funda na retribuição nem tem qualquer outro fundamento metafísico. Destina-se à proteção de bens jurídicos e deflui, para o Estado, de sua função de tutor e mantenedor da ordem jurídica. Como se diz na exposição de motivos do projeto alternativo alemão (1966), a pena é a amarga necessidade de um sistema social de seres imperfeitos. Como Alf Ross demonstrou, a tradicional contraposição entre retribuição e prevenção constitui um falso problema, pois se refere a questões diversas (fundamento do sistema punitivo e escopo da pena). A retribuição nada tem a ver com o escopo da pena.
Na visão de Pimentel (1986, p. 275), o destaque vem através da ampliação do fato de que as sanções penais podem além de punir e intimidar passando a fortificar os contornos internos do condenado e ressocializá-lo.
3.1 Regras de Tokyo enquanto instituto recepcionado
Segundo a Série de tratados internacionais de direito humanos publicada pelo CNJ em 2016:
Estas Regras Mínimas Padrão enunciam uma série de princípios básicos que visam promover o uso de medidas não privativas de liberdade, assim como garantias mínimas para os indivíduos submetidos a medidas substitutivas ao aprisionamento. (Regras de Tóquio: regras mínimas padrão das Nações Unidas para a elaboração de medidas não privativas de liberdade/ Conselho Nacional de Justiça; Coordenação: Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi - Brasília: CNJ, 2016., p.8)
Este regramento visou promover o envolvimento e a participação da coletividade no processo da justiça criminal, especificamente no tratamento dos infratores, assim como desenvolver nestes o sentido de responsabilidade para com a sociedade.
Sua aplicação deve levar em consideração a situação política, econômica, social e cultural de cada país e os objetivos de seu sistema de justiça criminal.
Nesse sentido, destaca-se a participação dos Estados-Membros que devem desenvolver em seus sistemas jurídicos medidas não privativas de liberdade para proporcionar outras opções e assim reduzir a utilização do encarceramento e racionalizar as políticas de justiça criminal, levando em consideração a observância aos direitos humanos, as exigências da justiça social e as necessidades de reabilitação dos infratores.
E isso inclui, obviamente, desde as medidas tomadas na fase pré-julgamento até as da fase pós-sentença. O número e as espécies de medidas não privativas de liberdade disponíveis devem ser determinados de modo que seja ainda possível a fixação coerente da pena.
3.2 Da Supervisão
No quesito da aplicabilidade do sistema alternativo, vemos surgir a necessidade da supervisão, tem por objetivo diminuir os casos de reincidência e facilitar a reintegração do infrator na sociedade de modo a reduzir ao máximo as oportunidades de reincidência.
Quando uma medida não privativa de liberdade requer supervisão, esta deve ser exercida por uma autoridade competente, nas condições definidas pela lei. 10.3 Em relação a determinada medida não privativa de liberdade, convém estipular o regime de supervisão e tratamento mais adaptado ao infrator visando ajudá-lo em sua correção. Este regime deve ser periodicamente examinado e revisto. (Regras de Tóquio: regras mínimas padrão das Nações Unidas para a elaboração de medidas não privativas de liberdade/ Conselho Nacional de Justiça; Coordenação: Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi - Brasília: CNJ, 2016., p.10)
O importante destaque se faz para a oferta da assistência psicológica, social e material que deverá, se necessário, ser dada aos infratores, além da geração de oportunidades para fortalecer os vínculos com a sociedade visando facilitar sua reintegração.
3.3 Pesquisa, planejamento, elaboração e avaliação das políticas
De modo geral, o aspecto do planejamento, mostra-se essencial como esforço para envolver entidades tanto públicas e privadas na organização e na promoção da pesquisa sobre o tratamento dos infratores em meio aberto.
A pesquisa sobre os problemas que enfrentam os clientes, os profissionais, a comunidade e os responsáveis, deve ser feita regularmente. 20.3 Os mecanismos de pesquisa e informação devem ser criados dentro do sistema de justiça criminal para a coleta e análise de dados e estatísticas a fim de implementar o tratamento não institucionalizado de infratores. (Regras de Tóquio: regras mínimas padrão das Nações Unidas para a elaboração de medidas não privativas de liberdade/ Conselho Nacional de Justiça; Coordenação: Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi - Brasília: CNJ, 2016., p.12)
O CNJ ainda destaca a necessidade de e desenvolver mecanismos apropriados para os diversos níveis, de modo a fomentar a criação de vínculos entre serviços responsáveis por medidas não privativas de liberdade, outros setores do sistema de justiça criminal, desenvolvimento social e organismos do bem-estar, tanto governamentais quanto não governamentais, em áreas como saúde, moradia, educação e trabalho e os meios de comunicação.
E ainda na ordem internacional que a cooperação científica é indispensável entre países. Pesquisa, treinamento, assistência e troca de informações devem ser fortalecidas por meio dos institutos das Nações Unidas para a prevenção ao crime e o tratamento de infratores, tudo em estreita colaboração com a Seção de Prevenção ao Crime e Justiça Criminal do Centro de Desenvolvimento Social e Assuntos Humanitários do Secretariado das Nações Unidas.
4 AS ESPECIFICIDADES DE CADA TIPO
Após vermos sobre o histórico da criação adentraremos em cada tipo descrito no Art. 43 do Código Penal brasileiro, buscando demonstrar para além de sua conceituação, o que o estado da arte vem coletando de informações a respeito deste fato jurídico e para além disso, adentrar em especificidades pouco exploradas.
4.1 Prestação Pecuniária
Segundo o site do CNJ, a pena pecuniária pune aqueles crimes de menor potencial ofensivo com o pagamento em moeda e é aplicada, em regra, em sentença inferior a quatro anos de reclusão, de crimes cometidos sem violência ou grave ameaça, sem previsão de regime fechado. A prioridade são as vítimas dos crimes ou seus dependentes, porém a opção mais utilizada é doar para projetos sociais.
No ano de 2012, o próprio Conselho ficou a política do Poder Judiciário para o uso de recursos com a Resolução de nº154. Desde então, os recursos são depositados em conta bancária vinculada às Varas de Execução Penal (VEPs) ou Varas de Penas e Medidas Alternativas (VEMEPAs), em vez de serem distribuídas em várias entidades. Neste caso, movimenta-se o dinheiro apenas através de alvará judicial.
A norma proíbe que as entidades cadastradas sejam escolhidas de forma aleatória. Assim promovem-se convênios a fim de atender um número maior de beneficiários regularmente constituídos.
A previsão para utilização da verba é na aplicação de atividades de cunho social, saúde e educação e a prestação de contas na forma prevista deve ser realizada para o respectivo tribunal.
4.2 Perda de bens e valores
Esta pena possui inclusive regramento próprio instituído pele lei Lei nº 9.714 de 1998. Segundo Damásio E. de Jesus, no cálculo: “Considera-se o prejuízo causado pela infração penal ou o proveito obtido pelo autor do fato ou terceiro. E, se houver diferença entre o prejuízo da vítima e o montante do proveito obtido pelo sujeito? Ex.: crime de estelionato. Considera-se o maior”.
De acordo com tais indicações, percebe-se o cuidado do legislador em fornecer meios para a aplicação dessa substitutiva como tentativa de reparar o dano causado e retirar do autor o equivalente ao proveito auferido com o crime, atingindo para isso, patrimônio lícito do agente. Sendo esse o objetivo querido pelo legislador com a pena de perda de bens e valores, outra figura ingressa gerando confusão, o confisco.
Bem, apesar da distinção estar mais do que defendida, a aplicabilidade da perda de bens e valores encontra-se desviada de uma teoria mais do que cabível. Atualmente, sentenças condenatórias não trouxeram, ou minimamente, a referida pena alternativa em suas decisões, bem como não há jurisprudência formulada que revele o entendimento do judiciário brasileiro sobre o tema, além do conflito doutrinário existente.
Logo, foi possível alcançar diversos mecanismos que fossem suficientes para compreensão da recente aplicada perda de bens e valores como pena substitutiva a privativa de liberdade, entretanto, a falta de estudos aprofundados e a pertinência de sua aplicação, uma vez que há outro instituto que faz muitas vezes seu papel, acaba por tornar a pena de perda de bens e valores inaplicável, gerando sua ineficiência.
4.3 Limitação de fim de semana
Este parece ser um instituto que fica restrito apenas ao sentido material, pois a limitação de fim de semana, como pena restritiva de direitos, consiste na obrigação de permanecer, aos sábados e domingos, por 05 (cinco) horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado. Citada modalidade de pena quase não é aplicada devido à falta de casa de albergado e de profissionais qualificados para ministrar os cursos e palestras estabelecidos no artigo 48, parágrafo único do Código Penal e artigo 152 da Lei das Execuções Penais.
O juiz, diante da impossibilidade da execução da pena de limitação de fim de semana por ausência de condições materiais, poderá conceder a suspensão da pena nos termos do artigo 77 do Código Penal.
4.4 Prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas
Conhecida pela sigla PSC, esta é a pena alternativa mais aplicada dentro das sentenças penais condenatórias. A prestação de serviço à comunidade é duplamente benéfica, pois serve tanto como uma forma de punição como principalmente uma forma de reeducação do sentenciado, que através dos valores implícitos da prática de tais atividades, pode ser que realmente consiga se conscientizar sobre o mal anteriormente praticado e assim para de delinquir.
Se cumprir com eficiência essa função, tal punição, tem um caráter mais educativo, sendo, portanto, mais benéfica para população em geral e pode tornar-se uma solução mais hábil para a prevenção de crimes.
A Lei de Execução Penal (lei n. 7.210/84) dispõe em seu artigo 149, as atribuições principais do juiz de execução quanto à aplicação da pena de prestação de serviço à comunidade.
Os principais problemas na aplicação da pena de prestação de serviço são a falta de investimentos, de fiscalização, de adequação do condenado ao trabalho, e da organização dos locais disponíveis para a sua realização. “Inúmeras são as dificuldades levantadas, e vão desde a inexistência de entidades apropriadas e pessoais especializadas até a dificuldade na fiscalização do cumprimento e a aceitação pelo condenado da referida sanção.”
Os gastos com a aplicação da pena de prestação de serviço à comunidade são menores do que os gastos para a manutenção de cadeias públicas ao redor do Brasil, porém mesmo assim o governo ainda não investiu o suficiente para criação de órgãos especializados na aplicação deste tipo de pena em todas as cidades do país.
4.5 Interdição temporária de direitos
De acordo com os ensinamentos de Cezar Bittencourt:
Das modalidades alternativas esta é, sem dúvida nenhuma, a que maior impacto causa na população que recebe, com certo gosto, a efetividade da Justiça Penal. E, ao mesmo tempo, pela gravidade das consequências financeiras que produz, é de grande potencial preventivo geral, inibindo abusos e desrespeitos aos deveres funcionais e profissionais, próprios de cada atividade. (Tratado, p.580)
As espécies de interdição temporária de direitos estão previstas nos incisos do art. 47 do CP. Como o próprio nome diz, são temporárias as interdições. Portanto sua duração corresponderá ao tempo da pena privativa de liberdade substituída. A seguir se apresenta cada uma delas.
4.5.1. Proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo (art. 47, I, CP)
Essa é uma punição aplicada àqueles que se enquadram no conceito de funcionário público, determinado no art. 327 do Código Penal. Deve estar no exercício efetivo do cargo e a infração penal cometida deve ter como ação principal a violação dos deveres inerentes ao cargo, função ou atividade.
4.5.2 Proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público (art. 47, II, CP)
Neste caso, a punição tem pôr fim a repressão, no sentido de punir o profissional por ter agido sem a observância dos deveres inerentes ao ofício e, também a prevenção, pois, no momento em que aquele profissional é afastado temporariamente do seu labor, evita-se a possível ocorrência de outras infrações semelhantes.
Frise-se que a sanção se restringe apenas à profissão na qual o agente atuou em desacordo com os deveres que lhe eram inerentes. Caso ele exerça duas profissões, e for afastado temporariamente de uma, continuará a exercer a outra normalmente.
Por fim, a Lei de Execução Penal, em seu art. 154, §2° determina que o juiz da execução apreenda os documentos que autorizam o profissional a exercer a função a qual está temporariamente afastado.
4.5.3. Suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo (Art. 47, III, CP)
Esta sanção é destinada àqueles que foram condenados por crime culposo de trânsito. O tempo de duração será o mesmo da pena privativa de liberdade substituída.
O aumento da criminalidade no trânsito hoje é um fato incontestável. O veículo transformou-se em instrumento de vazão da agressividade, da prepotência, do desequilíbrio emocional, que se extravasam na direção perigosa de veículos. E uma das finalidades dessa sanção é afastar do trânsito os autores de delitos culposos, que, no mínimo, são uns descuidados.81
Desta forma, àquele que comete uma infração de trânsito de natureza culposa poderá ter a sua autorização ou habilitação para dirigir veículo temporariamente suspensa. Observe-se que aquele que possui apenas a permissão para dirigir veículo, prevista no §2° do art. 148 do Código de Trânsito Brasileiro82 não estará sujeito a esta punição, tendo em vista não haver previsão expressa no inciso para tanto.83
4.5.4. Proibição de frequentar determinados lugares (Art. 47, IV, CP)
Esta sanção, muito criticada pela doutrina, determina que em certos crimes poderá ser aplicada esta pena em substituição à privativa de liberdade, que consiste na privação que o agente possui de frequentar lugares que, de alguma forma, fizeram parte do delito. Assim nos explica Cezar Bittencourt,
Precisa-se ter presente que, para se justificar a proibição de frequentar determinados lugares, é indispensável que exista, pelo menos em tese, uma relação de influência criminógena com o lugar em que a infração penal foi cometida e a personalidade e/ou conduta do apenado e que, por essa razão, se pretende proibir a frequência do infrator-beneficiário da alternativa à pena privativa de liberdade. (Tratado, p.580)
Em momento posterior, o eminente doutrinador afirma que, para adquirir a eficácia esperada da sanção, deve-se combinar o lugar do delito com o próprio delito, bem como com o sujeito ativo, pois a pena deve exercer certa influência em quem praticou o crime, de tal forma que possa prevenir a ocorrência de outros..
4.5.5. A eficácia para o apenado
Quando olhamos para a reincidência específica, retratada pelo parágrafo terceiro, do Art.44 do Código Penal, se verifica a contradição do legislador que num primeiro momento considera o delito cometido passível de recuperação por meio de aplicação das Medidas Alternativas, no entanto quando do cometimento reiterado do mesmo delito a postura torna-se punível mediante aplicação do meio mais gravoso, seja a privação de liberdade.
O que se questiona quando da aplicação do instituto da Reincidência como determinante na substituição do meio de cumprimento de pena, é o quanto se espera que o indivíduo que não recebeu as condições básicas elencadas da Carta Magna a Leis infraconstitucionais, egresso e estigmatizado pela sociedade apresente de maneira efetiva o que se entende por finalidade de punir, anteriormente caracterizado. Barrata (1999, p. 187) expõe:
Partindo da análise fática do sistema penal, vê-se um esgotamento de meios físicos que estão longe da estrutura adequada para o resultado que se espera. Parte da descrença social se funda na falência do sistema que não efetiva o cumprimento literal do texto legal.
Torna-se fundamental, seguindo pela trilha de raciocínio, a conscientização pública acerca da importância da humanização do sistema penitenciário, esclarecendo-se que a cidadania somente se preserva num modelo que corrija as distorções existentes, sob pena de perpetuar-se uma falácia (LEAL, 1998).
Assim, a existência do Estado se justifica mediante promoção de meios eficientes em assegurar o exercício dos direitos fundamentais, elencados na Constituição Federal. Como sociedade organizada torna-se necessária a postura por parte do legislador de impor ao indivíduo deveres, justamente para evitar um prejuízo coletivo social ainda maior, em contrapartida, as Políticas Públicas fornecem condições materiais na execução de qualquer medida.
Portanto, quando o Estado não alcança a efetividade no cumprimento da sua parcela de responsabilidade frente à sociedade, não há como materializar a própria finalidade da pena.
5 CONCLUSÃO
Ainda que existam posicionamentos divergentes quanto a efetividade de se punir no sistema atual, nenhum ato é verdadeiramente executado para mudar o cenário da falta de investimento em políticas públicas, que além de não são bem vistas pelo núcleo social, geram a expectativa de recuperação do indivíduo recluso.
O estudo demonstrou que há um distanciamento da ideia do legislador da verdadeira execução, pois quando o Estado não encontra meios de suprir o que a própria Lei estabelece, não é possível projetar expectativas além da realidade que se apresenta.
Ao final, como obtivemos fundamentos que demonstram a necessidade de fiscalização que o Estado precisa suprir, envidando esforços para promover políticas eficientes a garantir a finalidade da pena.
Ainda, há que se considerar a necessidade da prevenção, tendo em vista que em todos os parâmetros estudados para elaboração deste trabalho, a pena alternativa ainda mancha a reputação do indivíduo que volta ao contato social rotulado como condenado, mesmo em se tratando de medidas diferentes da tradicional privação de liberdade.
Concluiu-se também que a mudança de consciência sobre o tema é dever não só do Estado, mas da sociedade como um todo, posto que ainda está eivada de uma carga altíssima de preconceito para com essa parcela de pessoas.
Com relação à letra da Lei, questiona-se aqui a seletividade de quais partes do texto legal são executadas. Quando se espera o devido cumprimento, explicar às partes envolvidas que não existe condições para execução é deveras lastimável, inclusive por ser uma exigência para o cumprimento de direitos básicos como a dignidade humana, condição que está além da execução de qualquer pena.
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SUXBERGER, Antonio; GOMES DE AMARAL, Marianne. A execução provisória da pena e sua compatibilidade com a presunção de inocência como decorrência do sistema acusatório (Provisional Execution of Criminal Sentence and Its Conformity to the Presumption of Innocence as a Consequence of the Accusatory System). Revista de Direito Brasileira, v. 16, n. 7, p. 186-210, 2017.]
Graduando do Curso de Direito do Centro Universitário Fametro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, João Cláudio de Sousa da. Uma análise do sistema prisional brasileiro e a evolução da pena até chegar aos dias atuais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 nov 2022, 04:36. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60292/uma-anlise-do-sistema-prisional-brasileiro-e-a-evoluo-da-pena-at-chegar-aos-dias-atuais. Acesso em: 23 dez 2024.
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