RESUMO: Este trabalho faz uma análise sobre a recente tipificação do crime de perseguição e como impactou o mundo virtual. Numa primeira abordagem conceitua, explica a tipificação penal e os elementos penais do delito de perseguição. Na segunda abordagem discorre como o crime de perseguição vem sendo tratado no âmbito virtual (cyberstalking). Para numa última análise buscar-se identificar os possíveis prejuízos causadas ao Judiciário pela inespecificidade da norma e pontos obscuros que possam gerar interpretações amplas, dificultando o dimensionamento da norma em abstrato ao ato delituoso. A pesquisa do tipo bibliográfica, desenvolvida a partir do método dedutivo nos revela uma evolução significativa com a positivação deste instituto, no entanto, carece de necessária evolução para proteger com eficácia as vítimas desta agressão, buscando sempre informar acerca dos elementos que compõem esse fenômeno, recentemente tipificado na Legislação Brasileira.
PALAVRAS-CHAVE: Cyberstalking. Inespecificidade. Malefícios. Stalking.
ABSTRACT: This work analyzes the recent classification of the crime of persecution and how it impacted the virtual world. In a first conceptual approach, it explains the criminal classification and the criminal elements of the crime of persecution. In the second approach, it discusses how the crime of persecution has been treated in the virtual scope (cyberstalking). In order to ultimately seek to identify the possible damages caused to the Judiciary by the non-specificity of the norm and obscure points that can generate broad interpretations, making it difficult to dimension the norm in abstract to the criminal act. Bibliographical research, developed from the deductive method, reveals a significant evolution with the positivization of this institute, however, it lacks the necessary evolution to effectively protect the victims of this aggression, always seeking to inform about the elements that make up this phenomenon, recently typified in Brazilian legislation.
KEYWORDS: Cyberstalking. Non-specificity. Harm. Stalking.
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho incide sobre o estudo conceitual e elementar penal do delito de perseguição (stalking), analisando os impactos que a recente tipificação causou no meio virtual (cyberstalking), designadamente demonstrando as lacunas existentes no texto normativo e por consequência, prejuízos trazidos ao Judiciário e as vítimas desta infração penal.
O stalking (perseguição insistente), foi introduzido no Código Penal (Art.147-A) por meio da Lei n° 14.132/2021. Apesar da recente tipificação, não se trata de um modus operandi novel, mas de uma conduta que se perpetua através dos tempos. Exige-se a lei, para efeitos de consumação do crime, que o indivíduo realize atos persecutórios contra terceiro que denote hábito, ameaçando de forma física ou psicológica, restringindo a capacidade de locomoção e do usufruto do seu espaço particular, por qualquer meio utilizado pelo agressor.
O estudo deste comportamento no Brasil é recente e escassa, muito embora já amplamente tratado nos países desenvolvidos, suas primeiras abordagens remontam a década de 1990, por isso, esta pesquisa objetiva contribuir com o questionamento normativo tipificado na Legislação Penal, exaltando seus pontos positivos, apontando as falhas semânticas, obscuridades e omissões identificadas no tipo novel. De igual modo, buscamos auxiliar de forma positiva com o desenvolvimento científico do crime de perseguição (stalking) e como é tratado pelo Judiciário brasileiro a modalidade cibernética do delito (cyberstalking).
Neste sentido, iniciaremos por conceituar, com auxílio da doutrina nacional e internacional, dos institutos do stalking e cyberstalking, quer em termos nucleares de sua consumação, quer de sua tipificação, para posteriormente progredirmos para apresentação do questionamento semântico da norma (147 – A do Código Penal), realizado por meio de consultas bibliográficas, desenvolvida a partir do método dedutivo, nos aflora os sentidos, no direcionamento da proteção dos direitos fundamentais e sua necessária tutela pelo direito.
2 PERSEGUIÇÃO – LEI N° 14.132/2021 (ART. 147 – A, DO CÓDIGO PENAL)
Para melhor entendimento visual da problemática estudada, urge apresentar integralmente o instituto jurídico do delito de Perseguição, contido no Código penal brasileiro - Decreto de Lei N° 2.848 de 1940, inserido pela Lei N° 14.132/2021:
Art. 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade.
Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021)
§ 1º A pena é aumentada de metade se o crime é cometido: (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021)
I – contra criança, adolescente ou idoso; (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021)
II – contra mulher por razões da condição de sexo feminino, nos termos do § 2º-A do art. 121 deste Código; (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021)
III – mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas ou com o emprego de arma. (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021)
§ 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência. (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021)
§ 3º Somente se procede mediante representação (Brasil, 2021)
Segue-se agora, na dissecação do estudo desta tipificação novel e suas pormenorizações doutrinárias.
2.1 Concepção Doutrinária sobre o Crime de Perseguição (Stalking)
2.1.1 Compreensões Iniciais:
O stalking, objeto de estudo, é o termo em inglês popularizado pelas redes sociais acerca do crime de perseguição, é entendido como prática intencional persecutória e recorrente, provocando estado de temor, receio ou até mesmo terror à vítima sobre sua integridade física ou psíquica, ferindo diretamente sua dignidade, liberdade e privacidade. Segundo Amiky (2014, p. 92):
Se a pessoa é protegida como um todo, na sua integridade psíquico-física, e se para se desenvolver a ter uma vida digna, como almeja o ordenamento jurídico brasileiro, a pessoa precisa de saúde tanto física como psíquica, tem-se que o stalking atinge a pessoa humana no seu âmago, pois os danos causados são de tamanha gravidade que impedem o próprio desenvolvimento da personalidade, já que nenhum ser humano pode se desenvolver livre, plena e dignamente sob o jugo de outro (AMIKY, 2014, p. 92).
Greco (2021), ao discorrer sobre o tema, adverte que, para que seja apontado o crime de perseguição em determinado ato, faz-se necessário a identificação da habitualidade da conduta perseguidora, ou seja, um caso isolado, mesmo sendo desagradável a pessoa, não bastará para a configuração do delito em comento.
Sua finalidade busca resguardar a liberdade individual, que fora abalada por conduta reiterada e persecutória, ameaçando sua integridade física ou psicológica de forma severa, a ponto de restringir seus meios de locomoção e sua esfera particular em níveis mais básicos, como: ir ao trabalho, comprar mantimentos para o lar, praticar esportes em vias públicas, entre outros. Acerca do tema, o doutrinador Flavio Augusto Monteiro de Barros leciona:
A conduta típica consiste em perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio. Trata-se, pois, de um terrorismo psicológico. O núcleo do tipo é o verbo perseguir, que significa, procurar ou incomodar com frequência ou insistência. O delito é habitual, pois exige a reiteração do comportamento, a ponto de caracterizar que realmente se trata de uma perseguição. Um ou alguns atos isolados não caracterizam o delito em análise (BARROS, 2022, p. 912).
O termo “perseguição”, foi a denominação adotada e introduzida ao debate do Direito Penal Brasileiro, pelo projeto de Lei n° 1.369/2019, o qual foi submetido à aprovação por Votação nominal do Substitutivo da Câmara dos Deputados, que por unanimidade, aprovou o projeto. Por conseguinte, a Lei n° 14.132/2021 foi gerada, entrando em vigência em 1° de abril, acrescentando o Art. 147 – A, ao Código Penal, com pena de reclusão de 6 meses a 2 anos e multa (SENADO FEDERAL, 2019).
As expressões, stalking (prática ilícita) e seu agente causador o stalker (criminoso) e o cyberstalking (modalidade virtual do delito de perseguição) que abordaremos melhor no próximo tópico, foram mantidos na língua inglesa no decorrer deste trabalho, buscando aproximar o leitor a um entendimento mais íntimo desses termos, que, em uma tradução menos lapidada podemos defini-los como “perseguição incessante”, “perseguidor à espreita” e “perseguição cibernética”, respectivamente.
Sobre o stalking, os autores Castro e Sydow (2021, p. 44), conceituam:
Curso de conduta, caracterizado pela insistência, impertinência e habitualidade, desenvolvido por qualquer meio de importunação, vigilância perseguição, ou assédio, e que acarrete à vítima temor de mal injusto ou grave, ou resulte perda significativa da tranquilidade diante de violação a sua dignidade, privacidade, intimidade ou liberdade (CASTRO E SYDOW, 2021).
Para Amiky (2014, p.15), por sua vez, entende que stalker é:
Stalker é o perseguidor, aquele que escolhe uma vítima, pelas mais diversas razões, e a molesta insistentemente, por meio de atos persecutórios – diretos ou indiretos, presenciais ou virtuais – sempre contra a vontade da vítima. Em outras palavras, stalker é quem promove uma ‘caçada’ física ou psicológica contra alguém (AMIKY, 2014).
Um icônico exemplo de stalking, é retratado no assassinato do artista John Lennon, em 1980, o Beatle foi baleado na frente de seu apartamento por um admirador, identificado por Mark Chapman, o assassino já havia pedido um autógrafo ao artista no dia do crime, quando abordou John de saída do seu apartamento, após algumas horas, Mark abordou novamente o artista ao retornar para seu prédio e efetuou os disparos fatais. O crime foi motivado pela obsessão pelo trabalho do artista e crenças religiosas do perseguidor.
Observa-se, uma definição interessante proposta por Bocij (2004, apud Castro e Sydow, 2021, p. 45) acerca do cyberstalking, vejamos:
Um conjunto de comportamentos em que indivíduo, grupo de indivíduos ou organização, use de informação e tecnologia de comunicação para assediar outro indivíduo, grupo de indivíduos ou organização. Tal comportamento pode incluir, mas não está limitado a envio de ameaças e falsas acusações, usurpação de identidade, furto de dados, danos a dados ou equipamentos, monitoramento informáticos, solicitação de favores sexuais a menores ou qualquer outro tipo de agressão (CASTRO E SYDOW, 2021).
Nesse sentido, a apresentadora Ana Hickmann, protagonizou momentos de terror, ao ser vítima de cyberstalking, realizado por um admirador. Ao se hospedar em um hotel em Belo Horizonte, Minas Gerais, no ano de 2016. O Stalker, um homem identificado como Rodrigo Auguto de Pádua, 30 anos, que alimentava um amor não correspondido pela famosa por meios virtuais, sabendo que Ana estaria hospedada em um hotel, conseguiu invadir o quarto onde a apresentadora se encontrava com o seu cunhado e a esposa dele. Com o intuito de matar Ana Hickmann, o fã, armado, declarou que os dois possuíam relação e que a apresentadora o havia rejeitado. A tentativa de homicídio apenas não se consumou, pois, o cunhado de Ana que estava ali presente, reagiu e tirou a vida do rapaz, o que mais tarde cominou em um ato de legítima defesa.
Assim, de forma alusiva, nota-se que o crime de perseguição, é de conhecimento comum da sociedade brasileira, perpetuando sobre o tempo, diversificando em modalidades de execução e ferramentas para sua concretização. Dito isso, podemos identificar que o delito de perseguir alguém atualmente, ganhou força com a possibilidade do anonimato virtual, facilidade do acesso de informações pessoais da vítima através do uso das redes sociais e a dificuldade da vítima de mensurar práticas que se enquadrem como ilícitas.
Castro e Sydow (2021, p.32), mencionam o delito do stalking e cyberstalking, como um ato de difícil compreensão para a vítima, a qual, deve identificar entre atos esporádicos de seu cotidiano, aparentemente lícitos e atos metódicos e repetitivos, que se enquadram como práticas nocivas e, portanto, ilícitas.
2.1.2 Cyberstalking
No mundo virtual, os cyberstalkers, fazem uso de aparelhos eletrônicos para constranger, aterrorizar e assediar seus alvos. A diversidade de aplicativos de comunicação existentes atualmente, como as redes sociais, tornaram-se ferramentas importantes para esses criminosos, obtendo informações valiosas de maneira online e atualizada.
Segundo Crespo (2015 apud MACHADO; MOMBACH, 2016, p. 219): O cyberstalking, define-se pela manipulação tecnológica para efetuar o delito persecutório contra a vítima e divergindo do stalking, precisamente no que tange o modus operandi, que abrange o uso de equipamentos eletrônicos e o meio virtual.
Hodiernamente, o progresso tecnológico beneficiou a proximidade entre indivíduos, contudo, desenvolveu-se um ambiente propício para o perseguidor, por meio do anonimato que a internet lhe oferece, a praticidade do uso e a sensação da legislação não alcançar seus atos ilícitos (Bocij & McFarlane, 2003).
Eminente destacar, que o Stalking e o Cyberstalking, apesar de possuírem similaridades no seu resultado e na metodologia do agente de perseguir de forma reiterada sua vítima, possuem características independentes entre si.
Enquanto, no Stalking, a vítima receia à ameaça física de seu perseguidor, sentindo-se reprimida ao sair de casa, recebendo presentes indesejados, recebendo declarações inconvenientes ou constantemente “tropeçando” em encontros com seu perseguidor. Em outra definição, a vítima teme um ato lesivo a sua integridade física por parte do seu algoz, perdendo dessa forma, o seu direito de livre locomoção. Castro e Sydow (2021, p. 247).
Noutro giro, a vítima de Cyberstalking, teme a importunação psicológica que o agressor produz, temendo dessa vez, usar suas redes sociais, abrir sua caixa de e-mails, postar fotos ou opiniões nas redes sociais. Em resumo, a vítima sente-se apavorada pelas invertidas digitais de seu agressor (muitas vezes sendo alguém desconhecido), sobretudo, os danos causados a sua honra e imagem pública na internet, por exemplo, acesso a localização da sua residência e lugares que frequenta. Castro e Sydow (2021, p. 247).
Porém, apesar de divergirem em seu método, um stalker pode progredir de uma perseguição física para uma cibernética, a fim de obter maiores informações do seu alvo. Assim como, o mesmo pode iniciar sua perseguição pelo meio virtual e alimentar um intenso desejo de aproximação da sua vítima, passando a persegui-la presencialmente.
Brito (2013, p.146), entende sobre o exposto, que o stalker, foi agraciado por um instrumento que intensificou os danos causados as vítimas. Como exemplo direto, podemos citar Directs, Mensagens de texto ou perfis de usuários em uma rede social, todos usados pelo agressor como meio de perseguir suas vítimas, ato denominado como cyberstalking.
Dessa forma, vislumbra-se que, não necessariamente uma modalidade persecutória exclua a outra, ao contrário disso, a prática do delito poderá ser identificada muitas vezes de maneira progressiva, (iniciando de forma física e progredindo para modalidade virtual, sendo recíproco a relação) ou simultânea (onde o crime é cometido tanto de maneira presencial, quanto virtual).
Superados os esclarecimentos sobre o tema, posto que as palavras dos nobres doutrinadores citados e as situações fáticas demonstradas são suficientes para esclarecer os termos estrangeiros e sua conceituação geral. Passaremos, então, para o próximo tópico.
2.2 Elementares do Tipo Penal
2.2.1 Sujeitos do Crime
Cunha (2022, p. 247) entende que, o crime tem natureza comum, não se pleiteia em sua tipificação que o sujeito ativo (agressor) possua qualquer qualidade específica, muito menos há indicações a respeito do sujeito passivo (vítima). Em outras palavras, o crime pode ser cometido por qualquer pessoa sem restrições e de igual modo, direcionado a qualquer pessoa.
2.2.2 Voluntariedade e Consumação
O crime só será executado se cometido com dolo. O agente deve ter a intenção de perseguir sua vítima de forma habitual, provocando estado de medo e limitando sua liberdade. Greco (2021), explana que, o meio tentado não se enquadra nesse delito, uma vez que o agente provoca a vítima insistentemente com suas perseguições de maneira sistemática, dessa forma, consumando-se o crime.
Gonçalves (2022) explica que, por se tratar de crime de ato vinculado, o delito apenas se consumará quando o agente exercer conduta expressa na tipificação penal, em outros termos, quando houver conduta persecutória oposta ao que foi redigido na norma, a conduta será considerada atípica ou interpretada a luz de outro artigo penal que melhor interprete o ato.
Entre as modalidades de perseguição descritas no tipo penal do Art. 147 - A, estão:
· Ameaçar a integridade física ou psicológica da vítima;
· Restringir a capacidade de locomoção;
· Invadir ou perturbar a esfera de liberdade ou privacidade da vítima.
Tais modalidades incidem diretamente na configuração do crime, rejeitando qualquer possibilidade de que o crime se conjecture com uma conduta isolada.
2.2.3 Ação penal
O delito é enquadrado como menor potencial ofensivo, pois sua pena máxima não ultrapassa 02 (dois) anos, sendo em regra de competência dos Juizados Especiais Criminais.
A ação penal é pública condicionada a representação do ofendido, sendo assim, a procedência do delito se dá mediante representação da vítima (ato formal de processar o acusado), nos temos do § 3° do Art. 147- A. A pena cominada ao delito permite o usufruto dos Institutos benéficos da Lei 9.099/1995 (transação penal – Art.76 e suspensão condicional do processo – Art. 89).
Cunha (2022, p. 253) descreve sobre as majorantes, encontra-se no § 1°, do Art. 147 – A, do Código Penal, o aumento da pena pela metade se o crime for cometido contra: crianças, adolescentes ou idosos; contra mulher por razões da condição de sexo feminino e mediante concurso de duas ou mais pessoas ou emprego de qualquer tipo de arma.
2.3 Teoria Tripartite - Fato Típico, Antijuridicidade e Culpabilidade
2.3.1 Fato Típico
Segundo Sena (2017), o Fato típico, possui quatro elementos, são eles: Conduta (ato comissivo ou omissivo; doloso ou culposo), Resultado (conduta com relevância jurídica), Nexo de Causalidade (elo entre a conduta e o resultado) e Tipicidade (descrição normativa do crime advinda de uma Lei anterior a conduta humana em questão).
Insta a ressalva, que não entraremos na conceituação de cada elemento subsidiário em nenhum dos tópicos, pois o presente trabalho visa apenas buscar responder ao leitor se há dubiedade interpretativa na redação normativa do Artigo 147 – A do Código Penal e com o escopo de demonstrar ao caro leitor, como o meio virtual foi impactado com a nova norma.
Por conseguinte, Sena (2017), o fato típico está assentado no princípio penal da anterioridade da lei penal, que de forma resumida, aponta que um crime não poderá ser configurado, caso não haja Lei anterior para defini-lo. Este princípio corrobora o que dita o Art. 1° do Decreto-Lei n° 2.848/40.
Assim dito, quando se analisa o crime de perseguição, podemos afirmar que há a normatização do delito por meio do Art. 147 – A do Código Penal. Destarte, demonstra-se que a presença da Tipicidade de forma escrita e proveniente de Lei se faz presente no âmbito penal brasileiro.
A Conduta estará identificada quando houver o ato de perseguir alguém de forma comissiva e dolosa nos termos do artigo.
O Resultado trará consequências negativas a esfera de liberdade e privacidade da vítima, causando-lhe sentimento de temor pela sua integridade física ou psicológica e restringindo sua capacidade de locomoção.
Por fim, o Nexo Causal, será identificado quando, unir a conduta humana de perseguir alguém de forma sistemática e o resultado danoso causado pela conduta.
2.3.2 Antijuridicidade
Brandão, C. (1997, p. 23), descreve Antijuridicidade como a controvérsia do fato humano em relação as normas do Direito. De forma sucinta, a Antijuridicidade ou a ilicitude pode ser entendida como a prática contrária a norma imposta pela ordem jurídica que proíba indivíduos de realizar determinadas ações.
Dessa forma, o crime de perseguição enquadra-se nos termos da Antijuridicidade, a conduta contraria os princípios do ordenamento jurídico, ressalta-se, que é ilícito perseguir alguém de forma habitual e reiterada por qualquer meio que seja, de forma a ameaçar a integridade física ou psicológica da vítima, restringir sua capacidade de locomoção e invadir sua esfera de liberdade ou privacidade (Art. 147 – A, Código Penal Brasileiro).
2.3.3 Culpabilidade
Junqueira, G. (2020) acerca do tema leciona, que para que o agente possa ser responsabilizado juridicamente, o mesmo deve estar apto e capaz para tal, devendo compreender os impedimentos que a ele são impostos durante sua vida e ínfima cognição, diante dos seus atos, para dialogar acerca de uma conduta delituosa.
Portanto, ausentes os elementos de excludentes de ilicitude, imputabilidade, Potencial Consciência Sobre a Ilicitude do Fato ou Exigibilidade de Conduta Diversa, deverá o agente infrator, passar por uma avaliação necessária, para saber se era capaz de entender as consequências de suas ações, se a conduta poderá ser imposta a ele ou se existia uma alternativa senão o caminho ilícito no momento do crime.
3 ANÁLISE SEMÂNTICA DA TIPIFICAÇÃO PENAL DO CRIME DE PERSEGUIÇÃO.
O tipo penal (Art. 147 - A do Código Penal) surgiu sob a justificativa de corresponder um apelo da sociedade, o qual, clamava por uma resposta do Poder Legislador, frente a uma constante evolução das interações sociais que ocasionaram um aumento significativo de casos que antes podiam ser enquadrados como constrangimento ilegal, mas que adquiriram elementos mais expressivos e danosos, com o surgimento das redes sociais e com a diversificação de ações de perseguição empregadas no meio virtual. Rogério Sanches Cunha, elucida:
[...] a maior parte dos atos de perseguição se inseriam no art. 65 do Decreto-lei 3.688/41, cuja pena de prisão simples variando de quinze dias a dois meses era considerada insuficiente, um claro exemplo de proteção deficiente. Com a Lei 14.132/21, a contravenção foi revogada e a perseguição passou a ser punida com reclusão de seis meses a dois anos (CUNHA, 2021).
Assim, age de forma assertiva o Poder Legislativo, ao estipular a tipificação penal do crime de perseguição, garantindo maior segurança jurídica e tutela dos direitos fundamentais, os quais estão assentados nos princípios da privacidade e segurança pública.
No que tange a tutela ao direito fundamental da privacidade e a honra, podemos transcrever o texto contido no inciso X, do artigo 5°, da Constituição Federal de 1988, vejamos: “São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.” (BRASIL, 1988).
Porém, com a devida vênia ao Legislador, o recém artigo do Código Penal, não traduz com especificidade a conduta delituosa do que se conhece como stalking, tão pouco, atenta-se ao Princípio Penal da Taxatividade. Ao nosso entender, há uma interpretação restrita e obscura do crime ao ler o atual regulamento penal. Paulo César da Silva Melo, pontua sobre a Taxatividade:
O princípio da taxatividade ou da determinação exige clareza quando da criação de infração penal porque a norma incriminadora deve ser de fácil entendimento por todos, ou seja, as condutas criminosas precisam ser redigidas com clareza pelo legislador para facilitar o entendimento da população em geral, portanto, não se admite tipos penais com expressões vagas (MELO, 2021).
Dessa forma, cabe ressaltar que o tipo penal em hipótese nenhuma poderá abrir margens a dúvidas, porquanto, a sociedade como um todo, carece obter o pleno entendimento da infração penal ao ler o texto normativo.
Apesar de ser considerada um desenvolvimento normativo para conter o avanço do Stalking e Cyberstalking no Brasil, parece-nos que o Legislador se equivocou ao redigir a tipificação penal do crime de perseguição no Código Penal Brasileiro, como explicaremos nos próximos itens.
3.1 Inespecificidade do termo Perseguição
O termo “Perseguição” escolhido pelo Legislador para traduzir o termo em inglês, apresenta em sua essência, carência de especificidade, frente a um delito plurissubsistente como Stalking. De acordo com Castro e Sydow (2021, p.93): “Os Stalkes variam de perfil e modus operandi, conforme os respectivos traços biopsicológicos, o grau de patologia e as influências recebidas do meio social com o qual se identificam”. Dessa forma, limitar a conduta diversificada de um Stalker com o termo “perseguição”, abre margem para que outras formas de importunação sejam praticadas sem o aparo legal da norma.
Perseguir, segundo o dicionário Dicio (PERSEGUIR, 2020), é verbo detentor de diversas definições. Mas, fundamentalmente, define o verbo perseguir, associado ao plano físico. Definições emblemáticas como “Ir no encalço de”, “seguir alguém ou correr atrás dessa pessoa”, “Tentar encontrar”, “alcançar” e, ainda “procurar”, figuram no imaginário popular a necessidade de se estar presente para que a ação ocorra, o que demonstra anacronismo frente a globalização virtual. Definições que mais se assemelham a conduta do Stalking ou Cyberstalking, aparecem em segundo plano, trazendo significados alternativos como “Atormentar alguém com pedidos inconvenientes e insistentes”, “importunar” ou “atormentar”.
A carência de especificidade do termo, denota que não haveria crime caso não houvesse condutas praticadas initerruptamente. No exemplo, citado por Greco (2021): na hipótese, durante uma festa, um indivíduo que se interessa amorosamente por uma mulher, abordando-a repetidas vezes, tentando a todo custo conquistá-la e sendo rejeitado todas as vezes. Apesar da situação ser extremamente constrangedora para a mulher, não há o que falar em Stalking neste caso.
Como demonstrado, atitudes constrangedoras podem ser tão indesejadas quanto o ato de perseguir insistentemente. Com a revogação do art. 65 do Decreto-lei 3.688/41 (Lei das Contravenções Penais), norma antecessora, da norma de perseguição. Inúmeras maneiras de constranger a vítima foram deixadas de lado, por não serem compatíveis aos conceitos de uma perseguição habitual, ficando o Judiciário limitado ao tipo normatizado no Artigo 147 – A, do Código Penal.
Como bem nos assegura Amiky (2014, p.23): “Para que fique configurada a prática do stalking, no entanto, não basta haver um stalker e uma vítima. Devem também ser percebidos danos sofridos pela vítima ou deve haver, pelo menos, a ameaça real e fundada da ocorrência do dano”.
É de suma importância a observância do Princípio Penal da Taxatividade, que exige que a tipificação de um delito seja precisa, clara e específica, sendo de fácil entendimento a todos, facilitando a identificação dos agressores e punidos corretamente.
Portanto, demonstraremos uma definição que melhor se traduz em relação a conduta diversa do Stalking. O termo “Importunação Obsessiva”, abrange de maneira mais efetiva as condutas ilícitas praticadas em casos concretos. Tal mudança, afetaria o texto normativo do Art. 147 – A do Código Penal, cuja solução também exemplificaremos para que melhor se adequasse a problemática interpretativa, vejamos o novo tipo:
Importunação Obsessiva
Exercer de livre vontade importunação obsessiva a alguém, de maneira habitual e por qualquer meio, quer importunando sua esfera de liberdade ou privacidade, quer restringindo sua capacidade de locomoção em razão de ameaça ou condutas lesivas nas esferas físicas ou psicológicas.
A efetiva reformulação do Termo e da norma penal do delito, auxiliaria no melhor entendimento do Stalking, para os operadores do direito, assim como para a sociedade como um todo.
3.2 Ausência de majoração pelo uso da tecnologia como ferramenta para prática do cyberstalking
Atualmente, é impensável imaginar que com o avanço tecnológico que a sociedade brasileira vivência nas últimas décadas, as normas penais não se adequem para evitar que possíveis lesões ao direito derivem do meio virtual.
Entretanto, ao analisar o Art. 147 – A do Código Penal, o Legislador com o devido respeito, agiu de forma omissa ao não dimensionar com afinco os malefícios que o Cyberstalking provocaria para a sociedade moderna.
Castro e Sydow (2021, p. 249 e 250) elucidam, que enquanto no Stalking, necessita por parte do agressor, a disponibilidade de tempo, deslocamento físico e relativo gasto econômico. No Cyberstalking, não há tanto gasto de energia por parte do agressor, a qual, a maior parte das ações não demandam gasto econômico muito elevado, não necessitam deslocamento do agente e há a possibilidade de automatizar determinados processos para a facilidade do delito.
Se mostra evidente, que a rede virtual amplifica o delito, sua lesividade as vítimas e exacerbando alcance ao público de maneira célere e destrutiva. Castro e Sydow (2021, p. 254) alertam que, os atos praticados dentro do meio virtual em termos econômicos são relativamente ínfimos, a possibilidade do anonimato, somados a sensação de segurança entregues ao criminoso é muitas vezes encorajadora para que se realize a conduta ilícita.
Dessa forma, cabe ao Poder Legislativo, incluir com urgência a pena majorada para o uso tecnológico como ferramenta na prática do Cyberstalking. Para melhor ilustrar, traremos um exemplo final, com a inclusão do inciso IV, do Parágrafo 1° (majorantes) de como o Art. 147 – A do Código Penal deveria ser restruturado, vejamos:
Importunação Obsessiva
Exercer de livre vontade importunação obsessiva a alguém, de maneira habitual e por qualquer meio, quer importunando sua esfera de liberdade ou privacidade, quer restringindo sua capacidade de locomoção em razão de ameaça ou condutas lesivas nas esferas físicas ou psicológicas.
Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021)
§ 1º A pena é aumentada de metade se o crime é cometido: (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021)
I – contra criança, adolescente ou idoso; (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021)
II – contra mulher por razões da condição de sexo feminino, nos termos do § 2º-A do art. 121 deste Código; (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021)
III – mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas ou com o emprego de arma. (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021)
IV – mediante uso de tecnologia informática para intrusão, roubo de dados ou prática lesiva a honra em âmbito virtual.
§ 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência. (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021)
§ 3º Somente se procede mediante representação (grifo nosso)
Por todo o exposto, urge o Legislador observar sua omissão e retificar a norma para que se torne clara, tutelando de forma eficaz os direitos a honra e a privacidade dos cidadãos, evitando assim, possíveis interpretações inespecíficas em decisões judiciais.
3.3 Malefícios
É possível que haja decisões conflitantes entre os julgadores quando se tratar do instituto jurídico do crime de Perseguição. Como exaustivamente descrito nesta pesquisa, podemos identificar algumas problemáticas, as quais as vítimas e os tribunais podem enfrentar em casos referentes a stalking e cyberstalking. Obstáculos de cunho interpretativo (entender que a conduta vivenciada remete-se ao delito), dificuldade da vítima comprovar sua lesão (insuficiência comprobatória).
Ao observar de maneira minuciosa o Art. 147 – A do Código Penal, identificamos que o tipo penal demanda que a conduta do criminoso dentro de uma situação concreta, deverá estar amplamente demonstrada ao Julgador, que necessariamente houve o dano sofrido pela vítima em um dos elementos do crime e que tenha sido praticada com recorrências.
William Garcez, leciona sobre o tema:
Nesse ponto, frisamos a dificuldade, realisticamente falando, que a polícia judiciária e a acusação terão em demonstrar algumas dessas circunstâncias. Não basta apenas a reiteração da ação por parte do sujeito ativo, será necessário demonstrar que o sujeito passivo experimentou uma ou outra situação prevista como consequência da perseguição reiterada. Na esteira desse argumento, quando não houver ameaça à integridade física, v.g., tentativa de agressão (que é facilmente verificável), como demonstrar a ameaça à integridade psicológica da vítima? Trata-se, nos parece, de uma exigência à tipificação. Não será tarefa fácil. Garcez, W. (2021).
É notório, a exigência de uma ampla interpretação de maneira subjetiva quando se lê o Art. 147 – A do Código Penal, para que possa ser estabelecido os critérios de perseguição em acordo com o estabelecido pela norma. Tal subjetividade interpretativa, criará decisões conflitantes entre os Julgadores, impasses na identificação do crime pela inespecificidade da norma ou pela dificuldade que a própria vítima encontra em comprovar o crime. Nesse sentindo, a jurisprudência:
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE PERSEGUIÇÃO. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER. AUTORIA E MATERIALIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. 1. Apelação criminal do Ministério Público contra sentença que absolveu o réu pela prática do delito previsto no artigo 147-A do Código Penal, combinado com o art. 5º, III, da Lei nº 11.340/06. 2. Apesar das declarações da vítima se revestirem de especial valor probatório nos delitos cometidos em sede de violência doméstica, necessário que sejam corroboradas pelas demais provas coligidas nos autos. 3. Não tendo o conjunto probatório comprovado que o réu agiu com dolo específico de perseguir a vítima, não é possível a condenação, aplicando-se o princípio do in dubio pro reu. Absolvição mantida. 4. Recurso conhecido e desprovido.
(TJ-DF 07086706420218070006 1427539, Relator: CESAR LOYOLA, Data de Julgamento: 02/06/2022, 1ª Turma Criminal, Data de Publicação: 14/06/2022)
Neste julgado, a vítima sentindo-se perseguida pelo seu ex-companheiro, através de mensagens de texto, ligações e abordagens presenciais, juntou aos autos todas as situações devidamente comprovadas. Entretanto, não foram suficientes para comprovação do delito, no entendimento do Tribunal de Justiça do Distrito Federal.
De maneira contrária, decidiu o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao condenar o réu, vejamos a jurisprudência pacificada:
RESPONSABILIDADE CIVIL.STALKING. DANO MORAL. 1.- A conduta da parte ré permite a caracterização de STALKING. Intromissão indevida na vida íntima da autora. 2.- Dano moral passível de caracterização e a na sua fixação se deva observar além de outros elementos a extensão da perda de privacidade por parte da autora e a condição econômica do réu. Recurso de apelação provido. (Apelação Cível Nº 70074154501, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Kraemer, Julgado em 30/08/2017).
(TJ-RS - AC: 70074154501 RS, Relator: Eduardo Kraemer, Data de Julgamento: 30/08/2017, Nona Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 08/09/2017)
Dessa vez, a Justiça entende que há o crime de Perseguição, indicando pela vítima, a qual, comprovou sua agressão com as mensagens de texto que o réu enviou para seu celular, comprovando o cyberstalking.
Cabe a menção, que na maioria dos casos de stalking e cyberstalking, as mulheres figuram no polo passivo do delito. Mais uma vez, cabe ao Legislador, a necessária reforma normativa do Artigo 147 – A, do Código Penal, em acordo com os princípios estipulados pelo Decreto nº 1.973/96 – Convenção de Belém do Pará: “Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher”.
Desse modo, o Artigo 1°, da Convenção de Belém do Pará (1994), normatiza: “Para os efeitos desta Convenção, entender-se-á por violência contra a mulher qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada”.
Nessa linha de raciocínio, há acervos substanciais para o Legislador reformular o texto normativo com intuito de evitar a identificação do delito, em especial, no âmbito virtual. Tomando como base Convenções e Tratados ratificados pelo Brasil nos cenários Nacionais e Internacionais que, em suma, tutelam direitos primordiais aos indivíduos, como direito a Liberdade, direito a vida e a saúde física e mental.
4 CONCLUSÃO
O presente estudo contribuiu para esclarecer sobre a recente tipificação do crime de perseguição e como impactou o meio virtual. Estes dados permitem-nos agregar conhecimento basilar sobre o delito recém normatizado pelo Código Penal, refletir sobre as modalidades em que o crime pode incidir dentro da sociedade e identificar a importância do questionamento normativo, buscando conhecer sua real aplicabilidade na prática judiciária e sua eficácia protecionista aos direitos fundamentais. De acordo, com os resultados obtidos é possível concluir que os delitos de Stalking e Cyberstalking foram devidamente demonstrados em seu conceito teórico e prático, ilustrada sua carência de especificidade em alguns quesitos do texto normativo brasileiro, identificando dificuldades enfrentadas pelas vítimas do delito e pelo Judiciário em âmbito judicial. Importa, por isso, adotar mecanismos e respostas intervencionistas que considere possíveis malefícios causados ao Judiciário e as vítimas como um todo.
O desconhecimento do fenômeno do stalking pela sociedade associados as problemáticas de sua tipificação no Código Penal Brasileiro, reforçam a importância que o Estado exerça ações informativas nas escolas, universidades e na população como um todo, bem como a promoção de instrução técnica jurídica aos profissionais (por exemplo, palestras, cursos especializados ao tema de stalking e cyberstalking, campanhas informativas) com o objetivo de viabilizar um melhor entendimento do crime, esclarecendo como identificar o agressor e como denunciar o delito as autoridades.
Para buscar o objetivo do presente trabalho foi necessário, inicialmente, discorrer acerca do surgimento do tipo penal no ordenamento jurídico brasileiro, sua conceituação e elementares penais acerca do delito. Por conseguinte, verificou-se como o delito (outrora conhecido por se consumar por meio de condutas persecutórias presenciais), impactou no meio virtual das pessoas e como o Poder Legislativo precisou se adequar as constantes alterações comportamentais sofridas pela sociedade, buscando englobar as diversas situações vivenciadas no mundo cibernético.
Por conseguinte, foi possível constatar exemplos fáticos de infrações penais sendo reverberados no meio virtual o que demandou que houvesse uma Lei que criminalizasse o crime de stalking e cyberstalking nas suas mais diversas modalidades de execução – Lei 14.132/2021. Ademais, pode-se constatar que o instituto do cyberstalking é exercido por meio de equipamentos tecnológicos e da internet (geralmente a distância) e evidenciou-se possuir independência da modalidade do stalking (perseguição física), apesar de assemelharem em seu objetivo ilícito.
Na tentativa de frear as práticas do stalking e cyberstalking no Brasil, o Legislador, tipificou as condutas como ato ilícito, passivo de penas e agravantes, dispostos no Art. 147 – A do Código Penal. Porém, demonstrado que ao redigir o tipo penal do crime de stalking, o Legislador cometeu alguns equívocos.
Desde o termo escolhido para a tradução da palavra inglesa (perseguição), causando obscuridade na interpretação normativa tanto para as vítimas, quanto para os operadores do Direito.
Passando pela visível omissão do Legislador, ao não reconhecer a capacidade danosa e célere do uso de aparelhos tecnológicos e da internet para a consumação do delito persecutório (cyberstalking), como majorante ao crime comum.
Destarte, resta explícito as divergências jurisprudenciais, ao tratar do crime de stalking e cyberstalking no Brasil, levando as vítimas a insegurança jurídica e cerceamento dos seus direitos fundamentais como direito a privacidade, a vida e a liberdade.
Por fim, conclui-se que o Legislador ao redigir a norma 147 – A do Código Penal, advinda da Lei 14.132/2021, agiu com assertividade ao direcionar seus esforços para o preenchimento do vazio normativo que outrora se encontrava o Brasil, frente as condutas destrutivas do stalking e cyberstalking.
Todavia, resta ao nobre Legislador reconhecer que o dispositivo padece de carências de cunho semântico, interpretativo e omissivo, que em suma, dificultam a eficácia das decisões judiciais e da pacificação ideal do delito na jurisprudência, desatende a esperada justiça ansiada pela vítima e da justa punição ao agressor, em especial, ao perseguidor cibernético.
4 REFERÊNCIAS
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Graduando do Curso de Direito do Centro Universitário Fametro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MAIA, Lucas Antônio Castelo Branco. Uma análise sobre a recente tipificação do crime de perseguição e como impactou o meio virtual Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 nov 2022, 04:06. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60317/uma-anlise-sobre-a-recente-tipificao-do-crime-de-perseguio-e-como-impactou-o-meio-virtual. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: LUIZ ANTONIO DE SOUZA SARAIVA
Por: Thiago Filipe Consolação
Por: Michel Lima Sleiman Amud
Por: Helena Vaz de Figueiredo
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