RESUMO: O trabalho científico tem por finalidade demonstrar a inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil e o desprezo do legislador frente aos direitos já adquiridos e consolidados pela Constituição da República Federativa do Brasil, em razão da igualdade entre o companheiro e o cônjuge como instituição familiar. Necessitando, da interferência do Supremo Tribunal Federal para pôr fim no descaso para com os companheiros no direito sucessório, família essa, formada através da união estável. Também, tem como objetivo dirimir as divergências entre os doutrinadores, criadas pelo legislador, quando dispôs que o companheiro só viria a ter direito na sucessão em bens adquiridos onerosamente, gerando um colapso nas decisões e nos estudos. Percebe-se com essa ilegalidade, que os juristas devem se atentar a nossa Constituição e aos seus princípios fundamentais abarcados no texto, onde já foram consolidados o direito e a tutela do Estado, formados através da união estável. Devesse olhar com atenção, para com a instabilidade gerada no direito sucessório, podendo prejudicar os sujeitos de direitos, cidadãos que tem como direito a tutela da Carta Magna. É preciso considerar essa interpretação dada pelo STF, abrangente, no que concerne o companheiro no direito sucessório, visto que, até esse tempo, têm doutrinadores que se apoiam e fundamentam que o companheiro não faz jus a todos os direitos sucessórios pertencentes ao cônjuge, suscitando dúvidas nos estudos e complexidade nas decisões jurídicas. Espera-se com esse trabalho, dar ênfase e força aos direitos adquiridos e já consolidados através da CRFB e pela jurisprudência brasileira, na qual, se perfaz a equiparação do companheiro ao cônjuge como herdeiro necessário, e ainda, sendo sucessor legítimo no rol do artigo 1829 do Código Civil Brasileiro.
PALAVRAS-CHAVE: Art. 1790. Inconstitucionalidade. Supremo Tribunal Federal. União estável e casamento.
ABSTRACT: The scientific work aims to demonstrate the unconstitutionality of article 1790 of the Civil Code and the contempt of the legislator against the rights already acquired and consolidated by the Constitution of the Federative Republic of Brazil, due to the equality between the partner and the spouse as a family institution. Needing the interference of the Federal Supreme Court to put an end to the neglect towards the companions in the inheritance law, this family, formed through the stable union. Also, it aims to settle the differences between the scholars, created by the legislator, when it provided that the partner would only have the right to succession in goods acquired onerously, generating a collapse in decisions and studies. It can be seen with this illegality, that jurists must pay attention to our Constitution and its fundamental principles encompassed in the text, where the law and protection of the State have already been consolidated, formed through the stable union. Careful consideration should be given to the instability generated in succession law, which may harm the subjects of rights, citizens who are entitled to the protection of the Magna Carta. It is necessary to consider this interpretation given by the STF, comprehensive, with regard to the partner in inheritance law, since, until that time, there are scholars who support and substantiate that the partner is not entitled to all the inheritance rights belonging to the spouse, raising doubts in studies and complexity in legal decisions. It is expected with this work, the emphasis and strength to the acquired rights and already consolidated through the CRFB and the Brazilian jurisprudence, in which, the equalization of the partner to the spouse as necessary heir, and still, being a legitimate successor in the list of article 1829 of the Brazilian Civil Code.
KEYWORDS: Article 1790/CC. Unconstitutionality. Federal Court of Justice. Stable union and marriage.
1.INTRODUÇÃO
É de conhecimento geral que, a família vem sofrendo grandes mudanças, e com isso, vem, acarretando formações de diferentes entidades familiares, sendo apenas necessário que se tenha uma relação afetiva e, o intuito de formar família, Antigamente, antes do advento da Constituição de 1988 se considerava apenas as famílias constituídas pelo casamento, uma relação formal, porém, com a égide da CRFB, as entidades familiares formadas através da união estável passaram a ser tutelada pelo Estado, equiparando o companheiro ao cônjuge.
Sendo reconhecido uma série de direitos e princípios no qual eram garantidos somente ao cônjuge, passando também, a pertencer aos companheiros, sem discriminação e desigualdade, garantindo a todos direitos igualitários, objetivando a dignidade humana a toda e qualquer entidade familiar formada através da união estável.
Contudo, mesmo com a guarda e proteção dada pela Constituição, a união estável, garantindo o direito à propriedade privada, a função social e o direito de família, direitos esses, fundamentais as entidades familiares, visando promover a equidade entre as instituições, igualdade entre cônjuges e companheiros.
Com a criação do artigo 1.790 do CC de 2002 pelo legislador que, ao criar, promoveu e possibilitou a sociedade um enorme retrocesso nos direitos já abarcados pela Constituição Federal onde equiparava o cônjuge ao companheiro, sendo discriminatório e colocando as famílias formadas por relações afetivas através da união estável em posição de inferioridade em relação ao casamento.
Nesse contexto, no direito sucessório os companheiros passaram a ser afetados na sucessão hereditária, ficando em posição inferior ao do cônjuge, ocasionando grandes discordâncias doutrinárias e jurisprudenciais, necessitando de uma intervenção do Supremo Tribunal Federal.
Esse trabalho objetiva demonstrar os direitos do companheiro já assegurado pela CRFB/88 e a sua eficácia nos direitos sucessórios, contrapondo a inconstitucionalidade perante o artigo 1.790 do CC., e a necessidade da tutela do Supremo Tribunal Federal para a segurança jurídica dos direitos já adquiridos.
O trabalho tem como fundamento o direito sucessório na união estável, direito do Companheiro (a) na sucessão legítima e a tutela do Supremo Tribunal Federal à frente da inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil de 2002.
O objetivo primordial é demonstrar a equidade entre a união estável e o casamento já assegurados e tutelados na Magna Carta, e o tratamento dado pelo CC/2002, ao companheiro no direito sucessório em consequência do artigo 1.790.
Abordar de maneira precisa acerca dos princípios constitucionais violados e os direitos sucessórios, do qual o companheiro estava sendo privado em razão da iniquidade e injustiça do artigo supramencionado, com isso fomentando a necessidade desse tema, visando segurança jurídica dos direitos já almejados pelo companheiro e asseverado pela Excelsa Carta.
Portanto, se fez necessário para esclarecer, e primordial a utilização da legislação e de posicionamentos doutrinários visando a concretização da equidade entre companheiros e cônjuges no direito sucessório, sendo, já pacificado e determinado pelo Supremo Tribunal Federal.
2.A POSITIVAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL COMO ENTIDADE FAMILIAR NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
O Brasil antes de 1988 tinha como família apenas o homem e mulher que se casavam formalmente e, instituíam família através do casamento civil, somente a partir de 1988 que veio incorporar no seio da CRFB o conceito abrangente de família, sendo a união estável considerada e tutelada pelo Estado a sua legalidade no âmbito jurídico, ensejando assim, os seus direitos igualmente ao do casamento.
Com o advento da Constituição de 1988 foi abarcado em seu bojo a proteção familiar de toda e qualquer tipologia dada a entidades familiares formadas sem a instituição do casamento civil, independentemente de como se constituiu, se por formalidades ou informalidades. A desígnio de proteger toda e qualquer entidade familiar formada entre sujeitos que vivem em união com intuito de formar família (MENDES; GONET, 2020, p.1027).
Observe-se como dispõe o artigo 226 §3º da Constituição da República Federativa do Brasil:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
Desse modo, com a instauração do artigo 226 da CRFB, o companheiro passou a ter os mesmos direitos do cônjuge, não cabendo qualquer forma de discriminação.
Três importantes direitos foram tutelados equiparados pela Constituição Federal de 1.988, as famílias instituídas por união estável quais sejam: 1) direito a propriedade privada; 2) função social; 3) direito de família.
O direito à propriedade privada, será regido através do regime da comunhão parcial, ao qual prevalece na união estável.
O nosso ilustre autor Rolf Madaleno (2022, p. 59) dispõe o seguinte:
O direito patrimonial carrega quatro subtítulos, começando com o regime de bens, com suas disposições gerais, pacto antenupcial, regime da comunhão parcial, da comunhão universal, de participação final nos aquestos e regime da separação de bens; trata ainda do usufruto e da administração dos bens de filhos menores, dos alimentos, e do bem de família.
Direito esses no qual garante aos companheiros a concorrência o gozo e a posse aos bens do de cujus.
A família é considerada a base da sociedade, vem assegurada ao bojo da CRFB, no seu artigo 226, em vista disso, como a sociedade está em constante mudança, o direito a função social permite e possibilita a atuação da família, com a finalidade de concretizar a sua função, na realização das expectativas almejadas por todos os integrantes da família, no qual, é de suma importância para as transformações, igualdade e respeito a evolução familiar dentro da sociedade, fomentando o desenvolvimento e a concretização de todos a sociedade.
Com o advento da Magna Carta teve um alcance no Direito de família numa proporção na qual deu ensejo a várias diferentes estruturações familiares dentro da qual se intitulava a família formada através da união estável, garantindo a tutela do Estado.
Nas palavras de Rolf Madaleno (2022, p. 54), ponderamos suas palavras a respeito do direito de família, percebamos:
Auspiciado pela Constituição Federal de 1988 o Direito de Família sofreu uma profunda reformulação e valores constitucionais fincaram as bases de um direito de família constitucional, sobrepondo direitos e princípios como verdadeiros vetores das relações familiares, estruturadas na igualdade dos filhos e das pessoas e na pluralidade das famílias, evoluindo abertamente para uma leitura constitucional do Direito de Família.
O direito de ter uma família é direito de todos, e a Constituição permitiu essas variedades, bastando ter o intuito e o desejo, não cabendo qualquer distinção ou discriminação entre as entidades familiares, por não se enquadrarem a padrões formais de antigamente, qual seja, o casamento.
Portanto, é de suma importância afirmar que, com o advento da Magna Carta permitiu a proteção do Estado as entidades familiares instituídas através de outas formas, ensejando e garantindo os direitos abarcados e intitulados na Constituição.
2.1 Conceito de União Estável
Hoje em dia a união estável não se aplica apenas a homens e mulheres, é garantido a todos que tem o intuito de compartilhar uma vida em casal e formar família.
Conforme Lenza (2021, p.2079) a união estável só veio ter sua validação como família na sociedade com o advento da Constituição Federal de 1.988: “ O conceito de família foi ampliado pelo texto de 1988, visto que, para efeito de proteção pelo Estado, foi reconhecida como entidade familiar também a união estável entre o homem e a mulher, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. ”
No mesmo sentido os autores Gagliano; Pablo Stolze e Filho; Rodolfo Pamplona (2022, p. 1.912), dispõem o seguinte conceito; “ a união estável como uma relação afetiva de convivência pública e duradoura entre duas pessoas, do mesmo sexo ou não, com o objetivo imediato de constituição de família. ”
Percebe-se que vem tendo grandes mudanças no contexto dos tipos de relações, porém a união estável abrange todos os tipos de uniões afetivas constituídas, com o objetivo de formar uma família, possibilitando ao companheiro os direitos igualitários ao dos cônjuges, direitos esses adquiridos desde 1988 através da Carta Magna.
2.2 Direito adquirido
O Direito Adquirido é um ato inalterável e permanente, garantido ao sujeito, direitos já alcançados e perpetrados pela Constituição.
De acordo com Moraes (2020, p. 200 apud BASTOS, Celso, 1994, p. 43):
Constitui-se num dos recursos de que se vale a Constituição para limitar a retroatividade da lei. Com efeito, esta está em constante mutação; o Estado cumpre o seu papel exatamente na medida em que atualiza as suas leis. No, entretanto, a utilização da lei em caráter retroativo, em muitos casos, repugna porque fere situações jurídicas que já tinham por consolidadas no tempo, e esta é uma das fontes principais da segurança do homem na terra.
Note-se o artigo 5º da Constituição Federal:
Art.5 Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
Infelizmente muitos desses direitos foram suprimidos com a criação do artigo 1.790 do CC/2002, pois, lamentavelmente muitas sentenças transitaram em julgado até ser considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal o referido artigo, deixando os conviventes da união estável desamparados quanto aos bens do falecido e discriminando as instituições familiares formadas através da união estável, indo contra os princípios fundamentais da Constituição Federal de 1988.
3. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
Serão abordados a seguir, alguns princípios os quais foram afrontados e desprezados pelo legislador, com a criação do artigo 1.790 do Código Civil.
3.1 Proibição de Retrocesso Social
O princípio da proibição do retrocesso almeja à impossibilidade de redução do grau de concretização dos direitos sociais já obtido pelo Estado, ou seja, uma vez alcançado determinado direito social, o legislador não pode violar ou reduzir esse direito.
Esse princípio tem como objetivo a segurança jurídica no qual almeja garantir que com a evolução da sociedade frente aos direitos sociais, os direitos não se retrocedam impedindo com que novas normas sejam inconstitucionais.
3.2 Da Igualdade
O princípio da igualdade tem o objetivo de igualar os tratamentos entre os sujeitos de direito nas normas criadas pelo legislador e aplicá-las em conformidade com as garantias e direitos instituídos na Constituição Federal, que não se faça qualquer tipo de desigualdade ou afrontamento na referida. (MORAES, 2020, p.116).
É indiscutível a violação a este princípio, feita pelo legislador, ao discriminar o companheiro (união estável) do cônjuge (casamento) na sucessão, levando a desequiparação e possibilitando uma hierarquia na modalidade familiar, com consequente discriminação perante o afeto familiar constituído.
3.3 Da Dignidade Humana
Este princípio, o da dignidade humana vem a ser um dos maiores princípios da Constituição, visto que, se encontra em muitos princípios fundamentais, e tem como objetivo resguardar a dignidade da pessoa humana.
É essencial para garantia de uma sociedade justa e igualitária sem discriminações.
Segundo o pensamento do ilustre autor Tartuce (2022, p. 2.702). “ Em suma, a dignidade humana deve ser analisada a partir da realidade do ser humano em seu contexto social, ilustrando, pela vivência nacional. ”
Notável saber jurídico do mestre, por expor que a sociedade evolui e, com isso as famílias se transformam e se reinventam, no entanto, não perde o valor familiar, então não há o que se falar em hierarquização ente cônjuges e companheiros, ocasionando desigualdade e injustiça perante os seus direitos sucessórios.
4.A DECISÃO DO STF FRENTE A INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002
Ao decorrer do tempo, a família veio evoluindo e tomando contornos diferentes da família tradicional conhecida. Com isso a Constituição Federal de 1988 reconheceu como família, aquelas instituídas através da união estável.
Nesse contexto, seria viável o Código Civil de 2002 trazer em se bojo uma concordância com a CF/88, visto que implementando o artigo 1.790/CC, conduziu uma grande discriminação aos companheiros viúvos em relação aos cônjuges, privandoos em seus direitos sucessórios, visto que, a união estável já havia sido reconhecida plenamente por constituir laços de afeto, modalidade familiar.
Segundo Rezende apud por Stolze, Gagliano e Pamplona (2022, p.2.212), demonstram o quanto este artigo é desrespeitoso com a Carta Magna junto a evolução da sociedade, e os seus direitos almejados ao passar do tempo, gerando uma insegurança jurídica e discriminatória aos companheiros, confira:
Pensamos que o artigo 1.790, do Código Civil, deve ser destinado à lata do lixo, sendo declarado inconstitucional e, a partir daí, simplesmente ignorado, a não ser para fins de estudo histórico da evolução do direito. Tal artigo, num futuro não muito distante, poderá ser apontado como exemplo dos estertores de uma época em que o legislador discriminava a família que se formava a partir da união estável, tratando-a como se fosse família de segunda categoria
Nesse diapasão, vêm logrando enormes divergências jurisprudenciais e doutrinárias, ocasionando uma instabilidade geral na sociedade, ao se tratar de sucessão hereditária do companheiro. Com isso, o Supremo Tribunal Federal, através do Recurso Extraordinário 878.694/MG, em 10 de maio de 2017 foi declarado inconstitucional o referido artigo supramencionado:
Direito constitucional e civil. Recurso extraordinário. Repercussão geral. Inconstitucionalidade da distinção de regime sucessório entre cônjuges e companheiros. 1. A Constituição brasileira contempla diferentes formas de família legítima, além da que resulta do casamento. Nesse rol incluem-se as famílias formadas mediante união estável. 2. Não é legítimo desequiparar, para fins sucessórios, os cônjuges e os companheiros, isto é, a família formada pelo casamento e a formada por união estável. Tal hierarquização entre entidades familiares é incompatível com a Constituição de 1988. 3. Assim sendo, o art. 1790 do Código Civil, ao revogar as Leis nºs 8.971/94 e 9.278/96 e discriminar a companheira (ou o companheiro), dando-lhe direitos sucessórios bem inferiores aos conferidos à esposa (ou ao marido), entra em contraste com os princípios da igualdade, da dignidade humana, da proporcionalidade como vedação à proteção deficiente, e da vedação do retrocesso. 4. Com a finalidade de preservar a segurança jurídica, o entendimento ora firmado é aplicável apenas aos inventários judiciais em que não tenha havido trânsito em julgado da sentença de partilha, e às partilhas extrajudiciais em que ainda não haja escritura pública. 5. Provimento do recurso extraordinário. Afirmação, em repercussão geral, da seguinte tese: “No sistema constitucional vigente, é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime estabelecido no art. 1.829 do CC/2002”. (STF - RE: XXXXX MG, Relator: ROBERTO BARROSO, Data de Julgamento: 10/05/2017, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 06/02/2018)
Ademais, tendo em vista que a união estável é considerada uma instituição familiar, portanto, não pode haver hierarquização entre os institutos familiares, ou seja, entre companheiro e cônjuge, cabendo-lhe todos os direitos sucessórios garantido aos cônjuges. Por fim, devendo ser aplicado o artigo 1.829 do Código Civil de 2002.
O autor Tartuce (2022, p.3.423), aborda, que este foi um dos assuntos mais comentados e criticado do atual sistema civil brasileiro ocasionando um grande choque entre as doutrinas e jurisprudências em detrimento da desequiparação e a hierarquização entre cônjuge e companheiro no direito sucessório. Frisa ainda, a importância da aplicação do art. 1.829 do CC/02 para a segurança jurídica.
Vejamos o que consta no art.1829 do Código Civil:
Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:) ((Vide Recurso Extraordinário nº 878.694)
I - Aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens
Particulares;
II - Aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III - Ao cônjuge sobrevivente;
IV - Aos colaterais.
Dessa forma, o Supremo, ao analisar o Recurso Extraordinário nº 878.694, determinou que o companheiro deve se equiparar ao cônjuge na sucessão legitima do artigo referenciado.
5 DIREITO SUCESSÓRIO
O direito sucessório é tratado no Código Civil em sua parte final, regulando e disciplinando como deve acontecer a sucessão, ou seja, a transmissão aos sucessores do de cujus.
Tem o seu respaldo no direto constitucional, visando através dos direitos fundamentais, como: propriedade privada, função social e o direito familiar, a garantia e a continuidade da relação sucessória, objetivando respaldar os herdeiros do de cujus, pressupondo segurança econômica e patrimonial, mas também, dando continuidade aos direitos e deveres do morto.
Sobre o direito das sucessões, de acordo com Tartuce (2022, p. 3.349, apud, HIRONAKA, 2007, p. 05), “a necessidade de alinhar o Direito de Família ao direito de propriedade, eis que “o fundamento da transmissão causa mortis estaria não apenas na continuidade patrimonial, ou seja, na manutenção pura e simples dos bens na família como forma de acumulação de capital que estimularia a poupança, o trabalho e a economia, mais ainda e principalmente no ‘fator de proteção, coesão e de perpetuidade da família”.
5.1 Conceito de sucessão
Dentro dos pressupostos teóricos de Gagliano e Filho, (2022, p. 2.076) a sucessão se dá a partir da morte do de cujus ou do autor da herança, transferindo aos seus sucessores, ou seja, seus herdeiros legítimos ou testamentário os seus bens ou direitos, cabendo a estes suceder a titularidade do falecido.
Nesse sentido, podemos elencar que a sucessão tem proteção na Constituição
Federal de 1988, garantindo que a família, seus herdeiros legítimos fiquem resguardados quanto aos seus direitos sucessórios, impossibilitando que terceiros se apropriem da herança.
Em conformidade com o pensamento de (GONÇALVES,2020, p. 20), entende que “a palavra “sucessão”, em sentido amplo, significa o ato pelo qual uma pessoa assume o lugar de outra, substituindo-a na titularidade de determinados bens”.
5.1.1 Princípio de saisine
Para Tepedino (2021, p. 66), os bens corpóreos e incorpóreos do falecido se tornam heranças unitárias e impartilháveis aos seus sucessores, sendo no primeiro momento da transferência pós morte, o monte mor é de todos os herdeiros até a divisão do quinhão pertencente a cada um sucessor, isso se dá pelo princípio de saisine, dando a posse de imediato aos herdeiros do espólio, transmitindo desde logo a herança. Surgimento deste princípio se deu com o intuito de evitar que os bens fossem considerados abandonados ou que outros sujeitos se apossassem sem o conhecimento dos verdadeiros sucessores.
De acordo com o autor Gonçalves (2020, p. 24), entende o seguinte:
O princípio da saisine foi introduzido no direito português pelo alvará de 9 de novembro de 1754, reafirmado pelo Assento de 16 de fevereiro de 1786. O Código Civil português de 1867, já revogado, dizia, no art. 2.011: A transmissão do domínio e posse da herança para os herdeiros, quer instituídos, quer legítimos, dá-se no momento da morte do autor dela.
Com isso, o princípio de saisine vem garantir que após a morte do autor da herança, sejam imediatamente transferidos aos seus herdeiros e sucessores o monte mor, mesmo sem a anuência destes.
5.2 Sucessão hereditária do companheiro e sua legitimidade no direito sucessório
Como bem sabemos e vem sendo abordado ao decorrer do trabalho o companheiro já era equiparado ao cônjuge pela nossa Constituição de 1.988, cabendo, portanto, ao legislador, dar o tratamento adequado igualando-o ao do cônjuge na sucessão hereditária, ao invés disso, houve a violação ao princípio do retrocesso social, ocasionando aos companheiros frente aos seus direitos sucessórios uma lesividade, gerando uma comoção social.
Nesse diapasão, o STF se posicionou e determinou aos companheiros o mesmo tratamento e direitos sucessórios estipulados no Código Civil, garantindo a concorrência do companheiro com os descendentes, vide art. 1.829 do CC.
A sucessão legitima é respaldada por lei, tendo o legislador garantindo aos herdeiros legítimos a sua cota parte, entende-se que a vontade do autor da herança seria a de amparar os seus familiares mais próximos, ou seja, os que teriam laço de afetividade com o morto
Em conformidade, entende Tepedino (2021, p. 27), nestas palavras, “Atualmente, grande parte da doutrina fundamenta a sucessão legítima no conceito de interesse superior da família, entendida como instituição de importância social. ”
Com a mesma linha de pensamento entende Gonçalves (2020, p. 167), in verbis:
Conclui o referido autor, sendo os herdeiros distribuídos em classes, dependendo a organização dessas classes dos laços de família, como toda a sucessão legítima, exceção feita ao fisco, esses laços são reduzidos ao vínculo do casamento e do parentesco, aos quais devemos atender para a coordenação preferencial dos grupos sucessíveis.
Após a decisão do Supremo Tribunal Federal em relação ao artigo 1.790 CC/2022, onde sua inconstitucionalidade foi declarada, os companheiros formados por uniões estáveis passaram a dispor dos mesmos direitos conferidos aos cônjuges.
Mesmo com iniquidade do legislador, os companheiros passaram a suceder na mesma classe dos cônjuges, ocupando em equidade a posição conferida no artigo 1.829 CC.
Nesse contexto, por terem adquirido a legitimidade sucessória, os companheiros passaram a dispor dos seguintes direitos: a) da vocação hereditária em concorrência com os descendentes; b) de serem herdeiros únicos; c) de lograr a sub-rogação de contrato de locação e d) de adquirirem a concessão ao direito real de habitação.
5.2.1 Da vocação hereditária em concorrência com os descendentes
Nessa ordem de vocação, o companheiro passa a concorrer em primeiro lugar em concordância com os descendentes, ou seja, está na primeira linha de concorrência, tendo direito ao mesmo quinhão dos filhos em relação a herança.
Há um entendimento majoritário no qual os companheiros concorrem somente nos bens particulares do autor da herança.
Veja-se a decisão da Segunda Seção do Tribunal da Cidadania no ano de 2015.
Recurso especial. Civil. Direito das sucessões. Cônjuge sobrevivente. Regime de comunhão parcial de bens. Herdeiro necessário. Existência de descendentes do cônjuge falecido. Concorrência. Acervo hereditário.
Existência de bens particulares do de cujus. Interpretação do art. 1.829, I, do Código Civil. Violação ao art. 535 do CPC. Inexistência. (...). 2. Nos termos do art. 1.829, I, do Código Civil de 2002, o cônjuge sobrevivente, casado no Regime de comunhão parcial de bens, concorrerá com os descendentes do cônjuge falecido somente quando este tiver deixado bens particulares. 3. A referida concorrência dar-se-á exclusivamente quanto aos bens particulares constantes do acervo hereditário do de cujus. 4. Recurso especial provido” (STJ, Resp. 1.368.123/SP, 2.ª Seção, Rel. Min. Sidnei Beneti, Rel. p/ Acórdão Ministro Raul Araújo, j. 22.04.2015, DJe 08.06.2015).
Essa decisão prolatada pelo Superior Tribunal de Justiça sanou com as divergências que estavam tendo bastante no decorrer dos anos pondo fim as divergências doutrinarias e jurisprudenciais.
5.2.2. De serem herdeiros únicos
Quando não houver concorrentes em nenhum grau de hereditariedade o companheiro poderá herdar sozinho, independentemente dos bens terem sido obtidos por meios onerosos ou não, sendo possível ser o único herdeiro, ou seja, sucessor legitimo do de cujus.
5.2.3. De lograr a sub-rogação de contrato de locação
Havendo contrato de locação em nome do falecido, o companheiro passa a suceder o contrato (sub-rogação de contrato de locação), tendo todo o direito de continuar na moradia alugada, não sendo possível seu despejo.
5.2.4. De adquirirem a concessão ao direito real de habitação
No direito real de habitação, o companheiro tem a concessão vitalícia do uso do bem, quando se tratar de imóvel único para o fim de moradia familiar, não podendo ser possível exigência de remuneração ou sua retirada.
Pensa os ilustres autores Gagliano e Filho (2022, p. 2204), e dispõe:
Pretende-se, com isso, na perspectiva do direito constitucional à moradia (art. 6º da CF), impedir que a viúva (ou viúvo) — mormente aquele de idade mais avançada — seja alijado do único imóvel integrante do monte partível, em que residiu durante toda uma vida com o falecido.
Em vista disso, a legislação resguardou o companheiro no qual sempre sofria e era desamparado ao ficar viúvo, agora podendo ficar no imóvel até seu falecimento de acordo com o art.1.831 CC.
Por conseguinte, a sucessão hereditária foi declarada e amparada pelo STF, visto que, tanto a união estável quanto o casamento visam apenas um fim, qual seja: a constituição familiar e, esta vem desde os meados de 1.988, sendo equiparada ao casamento, não cabendo a injustiça, o retrocesso fomentado pelo legislador.
6.CONCLUSÃO
Dada à importância da presente pesquisa, o assunto abordado visa o direito sucessório na união estável, no qual foi imprescindível a atuação do Supremo Tribunal Federal, onde atingiu milhares de sujeitos de direito sucessório, infringiu vários princípios constitucionais e fundamentais para a sociedade, qual seja: a dignidade humana, a igualdade e a proibição do retrocesso. Indo contra a Constituição que já havia efetivado a entidade familiar formada por meio de união estável onde equiparava o companheiro ao cônjuge, através dos direitos fundamentais da propriedade, da função social e do direito familiar.
Direitos e princípios violados pelo legislador ao elaborar o artigo 1.790 CC/2002, no qual alcançou os direitos sucessórios como: vocação hereditária, de serem herdeiros únicos, de lograr de uma sub-rogação de locação e o direito real de habitação. Com a criação desse artigo, foi discriminada a família formada por união estável, a toda e qualquer relação afetiva com o intuito de formar uma entidade familiar, excluindo e impossibilitando o companheiro do seu direito sucessório.
Não podemos deixar de elencar também o, retrocesso que o nosso ordenamento teve durante o período de validação desse artigo fazendo com que muitos companheiros ficassem impossibilitados de receber a herança, em igual ao do cônjuge, a discriminação o desprezo e a exclusão exposto em apenas um artigo.
Com isso afetando os direitos sucessórios, modificando no bojo do Código Civil a posição do companheiro na sucessão hereditária inferiorizando a sua posição em comparação ao do cônjuge, direitos esses já instituídos e perpetrados pela Magna Carta ferindo a segurança jurídica dos direitos tutelados pelo Estado, atos inalteráveis e permanentes.
A Constituição, preza por uma sociedade justa e igualitária onde todos devem ser tratados de maneira digna, por isso, a união estável, ou seja, duas pessoas com o intuito de formar família, se juntam informalmente, são amparadas e consideradas uma entidade familiar, não devendo de forma alguma se descriminar as diferentes instituições familiares.
Depois de muitas divergências doutrinarias e jurisprudenciais onde acarretou uma enorme repercussão social, abalando a segurança jurídica de direitos já resguardados pela Carta Magna, o STF se posicionou e declarou inconstitucional o artigo 1.790 CC/2002, pelo fato deste artigo promover um retrocesso no qual já se equiparava as relações da união estável com o casamento e, também promovendo a discriminação e inferiorizando os companheiros, famílias formadas por laços afetivos através da união estável.
Diante disso, com o posicionamento do Supremo, não mais, poderá existir diferença entre cônjuges e companheiros para fins de sucessão hereditária, pondo fim as divergências jurisprudenciais e garantindo a segurança jurídica às famílias formadas por união estável e ocupando, em equidade, com o cônjuge a mesma posição no artigo 1.829 CC/2002, posição esta que garante a primeira posição em concorrência com os descendentes.
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Graduanda do Curso de Direito do Centro Universitário Fametro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Giselle Medeiros da. União estável: direito do companheiro (a) diante dos direitos sucessórios na sucessão legítima e a tutela do Supremo Tribunal Federal à frente da inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil de 2002 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 dez 2022, 04:03. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60421/unio-estvel-direito-do-companheiro-a-diante-dos-direitos-sucessrios-na-sucesso-legtima-e-a-tutela-do-supremo-tribunal-federal-frente-da-inconstitucionalidade-do-artigo-1-790-do-cdigo-civil-de-2002. Acesso em: 23 dez 2024.
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