OSMAR ALVES DE OLIVEIRA NETO[1]
(coautor)
MARCUS VINÍCIUS DO NASCIMENTO LIMA[2]
(orientador)
RESUMO: O presente artigo tem como intuito a investigação do instituto da iniciativa popular no processo legislativo brasileiro, bem como os entraves que a impossibilitam, agregada a tecnologia no fomento da democracia e soberania popular. A análise decorre dos grandes avanços que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 traz, incluindo a possibilidade de propor leis pelos cidadãos, desse modo, questiona-se o uso da iniciativa popular e os desafios de sua eficácia e como o uso da atual tecnologia pode facilitar a participação desses cidadãos. Portanto, aborda-se pelo método indutivo, tendo como especificação de estudo o método bibliográfico do tipo narrativo de pesquisa em que pode-se constatar os problemas enfrentados pela iniciativa legislativa popular, de tal forma, estabelece no decorrer desse estudo a sua forma constitucional, bem como a inserção da tecnologia, seu desenvolvimento na contemporaneidade e como impulsioná-la. Por conseguinte, é válida a pesquisa de tais barreiras, sejam elas formais e materiais, identificando o que pode tornar a iniciativa popular eficaz com o apoio tecnológico, na perspectiva de propor mais leis no âmbito do Estado Democrático de Direito.
Palavras-chave: Iniciativa Popular, Tecnologia, Estado Democrático de Direito.
1 INTRODUÇÃO
O presente estudo visa analisar a estrutura da iniciativa popular no Brasil e, consequente a utilização das novas tecnologias e os entraves na inserção da participação democrática da iniciativa popular na propositura de projetos de lei. Desta forma, podemos aferir as dificuldades ainda enfrentadas pela população e sua tentativa na propositura de leis pelo legislativo federal brasileiro. Para tanto, procurou-se atentar às formas de participação tecnológica na criação de leis e destacar quais os obstáculos enfrentados pelos cidadãos brasileiros em sua participação direta nesse contexto.
Em um segundo momento, analisamos quais desafios tecnológicos impossibilitam a iniciativa popular na participação democrática em projetos de lei e sua real efetivação no Brasil. Partindo dessa premissa, utilizamos a pesquisa qualitativa e terá caráter jurídico- dogmático, tendo em vista que se trata de um objeto de estudo complexo e de natureza social, no qual será abordado algumas ideias para amenizar a problemática apresentada. Nessa toada, quanto ao método de abordagem, será utilizado a pesquisa bibliográfica, com consultas a fontes legislativas e científica, tendo em vista que será utilizada a linha de pensamentos de diversos autores acerca do tema em questão, bem como a utilização dessas ideias como uma forma elucidar o argumento apresentado e a formação de opiniões quanto as possíveis soluções apresentadas.
O estudo, portanto, irá se dividir em três partes, inicialmente será discutido acerca da soberania popular e como se dar a participação da sociedade brasileira, esta que se dará por meio por meio de representantes eleitos por votos ou exercida pelo povo de forma direta ou semidireta, através do plebiscito, referendo ou iniciativa popular. Após, será analisado a iniciativa popular sob o prisma constitucional, esta que atribui aos cidadãos sua participação de forma direta, sem intermediários, promovendo sua atuação nas políticas do Estado, por fim, mostraremos como a tecnologia impulsionaria a participação da sociedade na iniciativa popular brasileira.
Desta forma, com as inúmeras inovações tecnológicas nos últimos anos, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados apresentaram o Projeto de Lei do Senado n° 84/11 e o Projeto de Regulamentação nº 68/11, respectivamente. Esses projetos visam a utilização da internet, como um meio de participação da população em projetos de leis. Entretanto, nota-se um certo desinteresse dos cidadãos, pois tais projetos não são conhecidos da forma que deveriam, tendo em vista o impacto direto na forma de participação da população ao apresentarem projeto de lei e, a partir de então, iniciar o processo legislativo.
No Brasil, existem somente quatro projetos da iniciativa popular que foram convertidos em leis e nota-se a dificuldade, por exemplo, na conferência das assinaturas desses cidadãos, em que muitos projetos acabam sendo usurpados por Deputados para poder efetivá-los. Dos quatro projetos oriundos da iniciativa popular, percebe-se que eles tem em comum o forte apelo popular, sendo dois de combate à corrupção e um de punição por crimes hediondos.
Salienta-se que por mais que estes projetos comumente são citados como consequência da iniciativa popular, na realidade somente um foi de fato promulgado mediante tal princípio, pois dependendo do número de assinaturas em favor de ima lei, nota-se que o Estado tem uma certa dificuldade quanto ao recolhimento destas, sendo assim, o que ocorre é algum deputado utilizar o projeto de lei que inicialmente foi proposto por iniciativa popular e utiliza-lo como seu.
Considerando que a democracia é uns dos pilares mais importantes em uma república, no qual se tem como uma de suas definições a forma de organização política em que o povo controla diretamente a gestão da sociedade, por meio de referendos, plebiscitos e outros instrumentos legais, nota-se que apenas 4 (quatro) projetos de iniciativa popular foram convertidos em lei, assim, tal definição está longe da realidade atual, seja por conta da falta de interesse populacional em participar de fato ou da dificuldade para ter suas ideias ouvidas pelos representantes do povo.
O artigo, portanto, consiste na necessidade, observada pelos autores, de se pensar estratégias para a Iniciativa Popular de lei, de modo a facilitar sua proposição e aproximar o povo do processo deliberativo. É necessária uma reflexão acerca da participação da população na propositura de projetos de lei. Adiante, a principal forma de viabilizar a iniciativa popular seria por meio do uso da tecnologia, tendo em vista a forma arcaica de coleta de assinaturas para efetivação da mesma. Percebe-se que falta equanimidade em território nacional para que a participação da iniciativa popular no processo democrático de criação de leis possa tornar-se efetiva.
2 SOBERANIA POPULAR E SUA ATUAÇÃO: CONSTRUÇÃO DE UMA SOCIEDADE PARTICIPATIVA
A primeira ideia de soberania popular surgiu com a Constituição Federal de 1934, onde em seu artigo 2º é elucidado que “todos os poderes emanam do povo e em nome dele são exercidos”. A partir daí, todas as constituições posteriores deixavam claro que tudo era em pró do povo, todavia, somente com a Constituição de 1988 que a soberania popular foi citada, se tornando um princípio fundamental de fato e não vago como as constituições anteriores.
Ainda sobre a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 1º, parágrafo único (BRASIL, 1988), deixa claro que todo o poder emana do povo, este que deve exercido por meio de representantes eleitos ou diretamente. Desta forma, a soberania popular se dará por meio por meio de representantes eleitos por votos ou exercida pelo povo de forma direta ou semidireta, através do plebiscito, referendo ou iniciativa popular.
De acordo com Silva (2014, p. 79):
O constitucionalismo firmou a tese de que por "constituição" se entende a constituição escrita, porque só esta pode assumir seu objetivo básico, qual seja, estabelecer limitações ao poder, não como fim em si, mas como garantia dos direitos fundamentais da pessoa humana. Para tanto, a constituição teria que ser a expressão da soberania popular.
Conforme o autor, “o funcionamento do Estado estará submetido à vontade popular” (2014, p. 106). Desta forma, o povo tem o dever de fiscalizar e cobrar do Estado, bem como intervir diretamente caso seja necessário, possuindo total legitimidade para tomar decisões, seja por meio de seus representantes, de forma direta ou semi-indireta.
2.1 Formas de Soberania Popular
Adentrando nas formas de soberania popular, temos o voto. A Constituição Federal, em seu art.º 60, § 4º, inciso II, trata de suas características, este que deve ser direto, secreto, universal e periódico. O voto se trata do poder do povo para decidir aqueles que de fato possuem competência para representa-los, tendo em vista que dependendo do cargo político, o represente terá até 8 (oito) anos no mandato político, como é o caso dos senadores (BRASIL, 1988).
Para Dallari (1983, p. 39):
Para que o voto seja consciente é preciso ainda mais. É necessário que o eleitor obtenha conhecimentos sobre os principais problemas sociais que o escolhido deverá procurar resolver, ao mesmo tempo em que procura firmar opinião sobre as melhores soluções para cada problema em particular e para o aperfeiçoamento de toda a ordem social. Por tais motivos, o voto consciente exige que, além de uma visão da sociedade em seu conjunto, o eleitor se conscientize das necessidades e exigências do momento e do lugar em que a escolha está sendo feita.
Estando previstos nos incisos I e II do art.º 14 da Constituição Federal (BRASIL, 1988), o plebiscito e referendo se tratam decisão popular ou de consulta direta ao povo em questões de natureza constitucional, legislativa ou administrativa. Ademais, apesar de serem semelhantes o plebiscito se difere do referendo no fato de que visa a decidir previamente uma questão política ou institucional, antes de sua formulação legislativa, enquanto o referendo trata da aprovação de textos de projeto de lei ou de emenda constitucional que já foram aprovados (SILVA, 2013, p. 144).
3 INICIATIVA POPULAR SOB O PRISMA CONSTITUCIONAL
A Constituição Federal de 1988 forma a lei básica e fundamental de uma democracia ou república, e que a legitimidade de um governo está enraizada nesta constituição. Atualmente a Iniciativa Popular tem aqueles que incorporam o núcleo eleitoral e são assim colocados no conceito de povo, transformando-se em cidadãos ativos no poder político. Ademais, a iniciativa popular é a autorização cedida ao povo com o intuito de propor um projeto de lei à Câmara dos Deputados. Mas, o cidadão sozinho não tem força na iniciativa de propositura, devendo coletivamente adquirir tal poder (VICENTE; ALEXANDRINO, 2005).
A iniciativa popular atribui aos cidadãos sua participação de forma direta, sem intermediários, promovendo sua atuação nas políticas do Estado. Desse modo, busca introduzir a participação política coletiva de cidadãos para apresentar projetos de atos legislativos, reformas das leis federais, estaduais e municipais. Portanto, deve ser considerada como um dos objetos de democracia semidireta mais apta a atender aos desejos de melhorias na política Estatal, logo por meio dela consegue-se um caminho formidável para orientar o governo, configurando-se em uma participação popular mais possível de acontecer.
Não está incluído no exercício da iniciativa popular aquele que não for eleitor, conforme prevê a Constituição Federal de 1988 em seu artigo 61, § 2º; quando preceitua:
A iniciativa popular pode ser exercida pela apresentação à Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles (BRASIL, 1998).
Desse modo, é notório que a legitimidade para a propositura de um projeto de lei depende do alistamento eleitoral e do pleno gozo de direitos políticos por cada eleitor. Além de exigir que cada projeto de lei seja subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído por pelo menos cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles.
Como o texto constitucional somente traçou as linhas gerais para a atividade da iniciativa popular, deixando ao legislador infraconstitucional ao exercício de dispor a respeito do assunto, a Lei Ordinária de 18 de novembro de 1998 de nº 9.709, veio dispor a regulamentação da iniciativa popular. O primeiro artigo dessa lei elucida o instituto da iniciativa popular e como ela deve ser conduzida. Em seu parágrafo 1º, limita-se o uso da iniciativa popular somente a um assunto. No parágrafo 2º, a referida lei não aceita a rejeição do projeto de iniciativa popular que possua vícios de forma, inclusive aqueles que não sigam a técnica legislativa ou de redação.
No segundo artigo referente à iniciativa popular, o legislador determina que a Câmara dos Deputados certifique se as exigências previstas no parágrafo anterior foram cumpridas e já preenchidas única vez àquelas, dê continuidade à iniciativa popular, atento às normas que estão no regimento interno da Câmara dos Deputados. É notório que o legislador ordinário não se estendeu muito ao fazer esse instituto tão valioso, e a forma como foi disciplinado, denota a falta de interesse por parte do legislador derivado em tornar realidade a participação democrática.
Portanto, os indivíduos que têm como objetivo a satisfação de seus interesses de modo mais simples por meio do voto, percebem o que Canotilho (2003, p. 1449-1450) encontra como “Paradoxo da democracia”, o qual especifica que, apesar da carta constitucional oferecer direitos, o processo político que busca garantir isso nem sempre se efetiva perseguindo o que é justo, deixando claro que a iniciativa popular é um forte instrumento de democracia.
3.2 A Dificuldade de Efetivação e os Poucos Projetos Aprovados no Brasil
Conforme elucidado anteriormente, a iniciativa popular se trata de um dos incisos da soberania popular, que pode ser definida como a participação direta do povo em projetos de criação de leis, desta forma, o povo tem o poder para tal contanto que cumpra uma série dos requisitos já mencionados. O problema está justamente em tais requisitos, tendo em vista a dificuldade de cumprimento dos mesmos e a prova disso é justamente o número limitado de projetos de leis efetivados por meio da iniciativa popular, sendo um total de 04 projetos, sendo que alguns não são de fato de iniciativa popular.
No Brasil, somente 04 (quatro) projetos de iniciativa popular foram convertidos em leis, entretanto, esses projetos não são de fato de iniciativa popular, pois como demonstrado anteriormente, é necessário 1% do eleitorado nacional; distribuído pelo menos por cinco Estados; com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles. Desta forma, o maior problema está justamente na coleta de assinatura, afinal, como será feita a análise de pelo menos 1 milhão de assinaturas e saber se são autênticas? Bem, como se deve imaginar é bastante difícil, sendo assim, apesar dos casos que serão listados abaixo possivelmente terem atingido o número necessário de assinaturas, em alguns destes os deputados tiveram que adotar esses projetos como se fossem seus, que de fato se torna um problema, pois podem alterá-los a bel prazer, não sendo um projeto mediante iniciativa popular de fato (BAZILIO, 2017). Conforme o entendimento de Cavalcante Filho (2017, p. 36), “caso se queira – é preciso repetir – limitar o poder de emendas parlamentares nos projetos de lei de iniciativa popular”.
O primeiro projeto mediante iniciativa popular foi a Lei 8.930/ 1994 (BRASIL, 1994), ou como ficou conhecido, “o caso Daniella Perez”, este que ganhou extrema notoriedade no Brasil na época, pois Daniella Perez era uma atriz, filha da consagrada autora de telenovelas Glória Perez. Ocorre que a vítima foi assassinada mediante o crime de homicídio qualificado, este que na época não possuía previsão legal, pois não estava previsto no rol dos Crimes Hediondos (Lei nº 8.072, de 1990). O homicídio qualificado, conforme previsão legal posterior ao caso, se encontra previsto no art. 121, em seu parágrafo segundo, tendo a sua última alteração em 2019, conforme o decreto Lei Nº 13.964, de 24 de Dezembro de 2019 (BRASIL, 2019). Por fim, esse caso conseguiu cerca de 1,3 milhões de assinaturas, apresentando o crime de homicídio qualificado no rol dos crimes hediondos sendo que em 1994 o projeto foi sancionado (BLUME, 2015).
Seguindo a ordem cronológica, temos a Lei nº 9.840/1999 (BRASIL, 1999), esta que trata sobre o combate à compra de votos. É de conhecimento de todos que a compra de votos sempre esteve presente no Brasil e infelizmente acaba sendo algo comum em época eleitoral, principalmente em interiores. Tendo registro no Brasil desde a época do coronelismo através do “voto de cabresto”, a compra de votos sempre foi um problema, tendo em vista que ao vender o voto, consequentemente acaba vendendo seus direitos.
Conforme Dallari (1983, p. 40):
É indispensável, afinal, que o eleitor não se esqueça de que o voto é a expressão de sua consciência e de que por isso ele não deve ser negociado, vendido ou trocado, não deve ser dado só para agradar alguém ou para pagar favores recebidos. A participação eleitoral através do voto poderá ser valiosa se o eleitor agir com liberdade, consciência e espírito público.
Antes da promulgação da Lei nº 9.840/1999 (BRASIL, 1999), não se tinha uma punição de fato para a compra de votos, sendo de extrema importância para a democracia brasileira. Tendo alcançado cerca de 1,06 milhões de assinaturas, esta foi apresentada à Câmara dos Deputados e rapidamente promulgada. Ademais, através desta lei, aquele que fosse condenado poderia perder seu mandato, bem como pagar multa (BLUME, 2015).
Adiante, a Lei nº 11.124/2005 referente ao Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social; esta teve uma tramitação longa, tendo 13 anos de tramitação ao todo, pois começou em 1992 e só teve êxito em 2005. Tinha o intuito de criar um sistema em que a população mais carente tivesse direito à construção, reforma ou compra de uma moradia, sendo um direito fundamental de todos, teve cerca de 1,1 milhões de assinaturas (LATINNO, 2017).
Por último, encerrando as leis de iniciativa popular vigentes no Brasil, temos a Lei Complementar nº 135/2010: a Lei da Ficha Limpa. Esta lei, assim como a lei da compra de votos citada anteriormente, veio para impulsionar o combate à corrupção no Brasil, pois após a promulgação desta, os candidatos a cargos políticos deveriam cumprir uma série de requisitos para serem elegíveis, sendo criada para moralizar o exercício da atividade política, a sociedade civil organizou-se para propor ao Congresso Nacional um projeto de lei (complementar) impondo a inelegibilidade das pessoas que fossem condenadas. Apesar das inúmeras assinaturas para a promulgação da lei, esta foi apresentada por um deputado por não ter sido possível computar a quantidade de assinaturas (CAVALVANTI FILHO, 2016).
Diante o exposto, nota-se que se tem um pequeno número de leis promulgadas de iniciativa popular, dentre os fatores que contribuem para tal, o maior empecilho não se dá por conta da quantidade de assinaturas em si, mas sim pela forma de coletas destas, tendo em vista todo o avanço tecnológico contemporâneo. Adiante será demonstrando a cerca de alternativas para que se tenha mais rapidez, bem como facilidade para a propositura da iniciativa popular no Brasil (BAZILIO, 2017).
4 INSERÇÃO DA TECNOLOGIA A FIM DE IMPULSIONAR A INICIATIVA POPULAR
O número expressivo de assinaturas e sua distribuição pelos Estados são fatores que, de alguma forma, torna complexa a atividade da Iniciativa Popular quando essa segue os requisitos do artigo 61, § 2º da Constituição Federal de 1988. Além disso, processo legislativo de iniciativa popular segue as seguintes fases: a iniciativa legislativa; a discussão; a votação; a sanção e o veto; e a promulgação e publicação (ITSRIO, 2017, p. 13). Acontece que, a participação democrática, de maneira instantânea, promovida com o advento das mídias sociais, não acontecia de fato, contudo, na contemporaneidade se faz presente, ou seja, hoje a tecnologia permite que os indivíduos possam participar do processo democrático de modo amplo, eficaz e mais rápido.
A enorme vontade social em que muitas ideias são criadas do envolvimento no meio eletrônico, é algo notável, e não é espantoso que muitas delas ocorram com o intuito de criar novas leis ou modificar as já existentes, logo, tendo em vista o atual momento em que vive-se, de grande imersão das pessoas no ciberespaço, é importante falar da necessidade e da adaptação dessas relações nesse ambiente virtual, visto que, além de ser um facilitador nas trocas e armazenamento de informações, o único empecilho para a participação popular na criação ou modificação das leis será a falta de acesso à tecnologia.
4.1 Desenvolvimento da Tecnologia Contemporânea na Sociedade
Com fulcro nos estudos do filósofo e sociólogo Pierre Lévy o desenvolvimento das novas tecnologias de interação entre indivíduos implicou em grandes transformações na estrutura identitária social, assim como no modo que eles pensam e se relacionam entre si. Tais transformações ocorreram principalmente pelo nascimento e desdobramento de novas tecnologias, e, principalmente no tocante às tecnologias da informação e comunicação (TICS), essas que se adequaram às particularidades de seus usuários e comunidades em que estão inseridos.
Partindo desse novo modelo de interação, é dado compreender que a rede de trocas em ambiente tecnológico se torna um lugar de privilégios para a humanidade se expressar em diferentes âmbitos. Assim Lemos e Lévy (2010, p. 52):
A interconexão mundial dos computadores, que integra todas as mídias precedentes em um meio de comunicação interativo original, fazem nascer um novo espaço público. Esse novo espaço público redefine radicalmente as condições de governança e vai, provavelmente, engendrar novas formas políticas, ainda dificilmente previsíveis.
Dessa forma, é importante analisar o uso da internet como ferramenta tecnológica para fomentar essa participação popular na criação de leis, e também verificar, tanto os aspectos positivos, quanto negativos do uso das tecnologias da informação que podem tornar possível ou não essa interação pelo meio eletrônico, no campo político, a fim de promover a cibercidadania.
As potencialidades da internet com intuito de estimular a participação cidadã no processo democrático é significativo. A capacidade de assinar petições on-line com uma assinatura digital é um passo importante para aproveitar esse potencial.
Uma assinatura digital é uma forma segura de verificar a identidade da pessoa que assina um documento. No caso de uma petição, ela assegura que a pessoa que assina é quem diz ser, e que a assinatura não pode ser forjada.
O uso de assinaturas digitais para petições ainda está em seus estágios iniciais, mas há potencial para que ela se torne uma maneira padrão para as pessoas mostrarem apoio a uma causa.
Há algumas vantagens em utilizar a assinatura digital para petições. Primeiro, é uma maneira fácil para as pessoas mostrarem seu apoio a uma causa sem ter que assinar fisicamente uma petição. Segundo, é uma maneira mais segura de coletar assinaturas, pois é mais difícil forjar uma assinatura digital, desde com uso do cadastro de pessoa física (CPF), do que uma assinatura física. Finalmente, é uma maneira conveniente de coletar assinaturas de pessoas que estão localizadas em diferentes partes de um território.
Entretanto, o tratar de projetos de lei de iniciativa popular, é comum a menção a “assinaturas” para que haja a deflagração do processo legislativo. De fato, leis e regulamentações locais utilizam o termo no estabelecimento das condições para o exercício da iniciativa popular. Porém, fato é que nem a Constituição Federal, tampouco a norma infraconstitucional que regula o instrumento usa o termo assinatura. O que se faz necessário, na verdade, é a subscrição (ITSRIO, 2020).
4.2 O Projeto de Lei nº 84/2011 (Senado Federal) e o Projeto de Regulamentação nº 68/2011 (Câmara dos Deputados).
Ambos os projetos tratam da possibilidade do uso da tecnologia a fim de impulsionar a iniciativa popular no Brasil, o projeto de Lei nº 84/2011, de autoria do Senador Eduardo Suplicy (PT/SP), buscava “admitir e disciplinar a subscrição eletrônica de projeto de lei de iniciativa popular”, se tornando um projeto de lei bastante interessante e de extrema importância para a democracia nacional, pois através deste se tornaria possível a coleta de assinaturas tanto manuais como eletrônicas, ainda, elucidava que:
(..) haverá informações, acessíveis a qualquer tempo e a qualquer pessoa, sobre o número de subscritores dos anteprojetos de iniciativa popular existentes nas Casas Legislativas; possibilita à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal manter convênio com o Tribunal Superior Eleitoral para que seja encaminhada base de dados, atualizada periodicamente, contendo o nome de todos os eleitores em situação regular perante a Justiça Eleitoral, devendo esses dados ser utilizados somente para os fins da presente lei.
Ocorre que, mesmo se tratando de uma matéria imprescindível para a democracia, no dia 26/12/2014 foi arquivado, já o Projeto de Regulamentação nº 68/2011 foi arquivado em 02/12/2015, este que tratava de matéria similar ao outro projeto supracitado. Foi apresentado pelo deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) e tinha como proposta a alteração dos arts. 91 e 254, com acréscimo do art.º 216-A do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, onde buscava instituir rito especial de tramitação para proposições de iniciativa da sociedade civil, com especial o apoio popular.
Conforme elucida o parágrafo §1º:
§ 1.º O apoiamento de cada eleitor poderá ser manifestado por via eletrônica, em formulário padronizado ou mediante certificação digital; § 2.º Uma vez formalizado, o apoiamento dos cidadãos e dos parlamentares à proposição passará a constar de listas específicas no sítio eletrônico da Câmara dos Deputados;
Nota-se que com tal projeto, a participação popular em projetos na Câmara dos Deputados seria bem mais simples, e não haveria tamanha burocracia. O arquivamento foi mediante o inciso I, do art. 164, que sobre a votação em separado por parte da preposição, ou seja, não obteve os números de votos dos deputados necessário para que houvesse continuidade na tramitação.
Tais projetos seriam de extrema importância para a democracia brasileira, pois trariam mobilidade na participação popular nos projetos de lei e consequentemente, uma maior participação no processo legislativo brasileiro.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
É nítido que ainda se tem um longo caminho para se ter a iniciativa popular de forma efetiva no Brasil, tendo em vista que por mais que dois projetos para regulamentação tenham surgido, os mesmos não foram tratados com a devida atenção que mereciam, seja por parte dos nossos representantes ou até mesmo por parte da população, pois houve um visível desinteresse de todos.
Nota-se também que o número de projetos aprovados mediante iniciativa popular é bem pequeno, sendo apenas 04 (quatro) projetos, sendo comum em pelo menos 03 (três) deles os fortes casos de comoção social e conforme elucidado anteriormente, muitos dos projetos nem foram mediante iniciativa popular de fato, pois por se tratar de muitos assinaturas nos projetos e por essas serem físicas, se torna impossível computar o número total, desta forma, sempre tais projetos são apadrinhados por algum deputado que utiliza o mesmo como se fosse seu, perdendo a essência do ato, que é justamente a participação de todos na propositura de lei.
É fato que a população brasileira não é tão vinculada com tal participação supracitada, estando à espera dos representantes para que estes criem projetos de leis e os representem. Ocorre que as vezes se faz necessário que o povo participe diretamente e não ficando apenas a mercê dos senadores e deputados federais.
Mediante todo o exposto, o avanço tecnológico irá promover o aumento do envolvimento dos cidadãos nos procedimentos de criação das normas no Estado brasileiro. Geralmente as pessoas não imaginam como funciona, ficando alienados no processo de criação das lei. É fato que a tecnologia seria uma forte aliada, pois quanto mais simples e direta as formas de democracia, mais participação terá, desta forma, cabe a todos o papel de procurar participar diretamente da nossa democracia.
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[1]Acadêmico do Curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho – UNIFSA.
[2]Professor do Curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho – UNIFSA, Doutorando em Direito no Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUC/RS.
Acadêmico do Curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho – UNIFSA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VELOSO, ITALO ARAUJO DE CASTRO. Inovação tecnológica e os desafios da iniciativa popular no processo legislativo brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 dez 2022, 04:20. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60473/inovao-tecnolgica-e-os-desafios-da-iniciativa-popular-no-processo-legislativo-brasileiro. Acesso em: 23 nov 2024.
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