RESUMO: O presente artigo tem por objetivo abordar os denominados Contratos Eletrônicos, assim entendidos como os contratos celebrados no ambiente eletrônico. Os referidos Contratos são protagonistas na sociedade contemporânea caracterizada pela transformação digital. Nos últimos anos, em razão da pandemia do COVID 19 que assolou o mundo, os Contratos Eletrônicos foram ainda mais impulsionados, tendo em vista a impossibilidade de interação presencial entre as partes contratantes, especialmente para as assinaturas dos instrumentos. Neste contexto, o presente artigo, além de abordar o relevante papel desempenhado por tais contratos, também busca trazer uma reflexão dogmática, explorando a natureza jurídica dos referidos contratos, bem como a forma de exteriorização da declaração negocial no ambiente eletrônico em que são estabelecidos. Há várias modalidades de contratos eletrônicos. Contudo, o presente artigo tem por enfoque os instrumentos denominados “Termos e Condições” em negócios jurídicos paritários, documentados e expedidos por sistemas eletrônicos, os quais são muito utilizados no ambiente empresarial para formalizar as mais diversas operações econômicas. Nesta perspectiva, aborda-se uma situação hipotética para ilustrar a complexidade dessas transações eletrônicas, especialmente no que tange ao aperfeiçoamento do negócio jurídico. Pretende-se com este trabalho contribuir para o fomento à utilização dos Contratos Eletrônicos que, indubitavelmente, exercem papel fundamental na sociedade da transformação digital.
Palavras-chave: contrato eletrônico; forma; documento eletrônico; declaração negocial.
Abstract: This paper has the goal to explore the electronic contracts, thus understood as the contracts established in the electronic environment. The abovementioned Contracts are protagonists in the contemporary society characterized by the digital transformation. In the last few years, due to the COVID pandemic that struck the world, the electronic contracts were even more used, since the impossibility of physical interaction between the parties, especially for the contract’s execution. In this context, this paper, in addition to approaching the relevant role played by such contracts, also seeks to bring a dogmatic reflection, exploring the legal framework of the mentioned contracts and how the consent is verified in the electronic environment in which they are established. There are various types of electronic contracts. However, the present paper focus on the instruments denominated “Terms and Conditions” in legal agreements, documented and issued by electronic systems, which are very used in the business environment to formalize different business and economic transactions. In this sense, the paper explores a hypothetical case to demonstrate the complexity of those electronic transactions, specially in regard to the completion of the agreement. This works intends to contribute with the enhancement of the Electronic Contracts which, undoubtedly, play a fundamental role in the digital society.
Keywords: electronic contract; form; electronic document; consent.
Sumário: Introdução – 1 Contratos Eletrônicos. – 2 Declaração Negocial e Formação dos Contratos Eletrônicos. – 3 Conclusões. – Referências
1.INTRODUÇÃO
O advento da Internet modificou profundamente os meios de comunicação a nível global, trazendo consigo novos hábitos, práticas empresariais e formas de instrumentalização de relações jurídicas.
A sociedade contemporânea é marcada pela transformação digital, abrangendo o uso de tecnologias e instrumentos como: automação; inteligência artificial; robótica; e computação. A cada dia vivenciamos o lançamento de novas ferramentas digitais, capazes de oferecer soluções práticas pensadas para eliminar ineficiências e gerar valor para a sociedade, mercado e indústria.
Evidentemente, essa transformação também tem reflexos no Direito, que não é alheio em relação à esta transformação que cada vez mais surge como uma variável indispensável na equação da sociedade digital (PINHEIRO; WEBER; OLIVEIRA NETO, 2019, p. 12).
É dentro deste contexto, que trazemos à tona o tema relativo aos denominados Contratos Eletrônicos, assim entendidos como contratos em relação aos quais as partes convenentes exteriorizam a vontade de contratar por meio de declarações veiculadas de forma eletrônica (Contratos Eletrônicos).
Evidentemente, os Contratos Eletrônicos assumem papel fundamental para a viabilização do comércio jurídico de bens e serviços dentro da atual moldura sociológica que vivemos, substancialmente estruturada na transformação digital.
Na prática jurídico-empresarial, observamos lentamente os avanços das tecnologias e hoje nos deparamos com uma realidade que se impõe: as soluções tecnológicas são imprescindíveis para a viabilização de negócios, com redução de custos de transação e eliminação de expedientes burocráticos.
Ao longo dos anos de 2020 e 2021 vivenciamos a importância dos Contratos Eletrônicos em razão dos efeitos deletérios da pandemia da COVID-19, que impossibilitou a interlocução presencial entre os atores do contrato e o tradicional hábito dos rituais de assinaturas manuscritas. A sociedade teve que recorrer à solução por meio dos métodos eletrônicos de contratação para a constituição, modificação e extinção de relações jurídicas contratuais.
Os Contratos Eletrônicos são utilizados para materializar diversos tipos de operações, desde contratos que são objeto de intensas negociações entre as partes contratantes, como àquelas que, por serem realizadas de forma recorrente, contínua e padronizada, são materializadas por meio instrumentos-modelo usualmente denominados como “Termos e Condições” (em inglês “terms and conditions”).
Apesar de mais conhecido popularmente nas relações de consumo, que não são objeto de análise do presente artigo, o instrumento dos Termos e Condições é largamente utilizado nos negócios, para operações de elevada recorrência e/ou impossibilidade operacional de negociação individual com cada contraparte contratual com quem o agente econômico vier a interagir para estabelecimento de relações jurídico-comerciais.
Dentro desta perspectiva, é usual que tal instrumento, geralmente concebido em formato não editável, tenha o seu envio automatizado pelos sistemas operacionais das empresas, acompanhando documentos eletrônicos de ordens de compra e/ou venda, conforme o caso, os quais são enviados por uma parte à outra (REBOUÇAS, 2018)[1]. O envio manual por correio eletrônico do documento por um preposto de uma empresa ao preposto da contraparte também é prática frequente em algumas indústrias.
Sem embargo da importância e essencialidade dos Contratos Eletrônicos no comércio jurídico, notadamente em tempos de pandemia, indaga-se: como os Contratos Eletrônicos juridicamente se formam e se tornam vinculantes entre as partes?
O objetivo do presente artigo é trazer reflexões sobre as referidas indagações com base nos institutos já previstos na legislação civil, trazendo como enfoque a declaração negocial validamente emitida pelas partes contratantes em relação a determinadas modalidades de Contratos Eletrônicos comuns na prática empresarial.
2.CONTRATOS ELETRÔNICOS
Os Contratos Eletrônicos são contratos como todos os demais. Sim, a mensagem é redundante, porém dogmaticamente relevante. Não estamos tratando, pois, de uma nova espécie de negócio jurídico. Tratam-se apenas de contratos que adotam uma forma específica para a veiculação da declaração negocial, isto é, a forma eletrônica. É por esta razão que Paulo Sá Elias afirma, que “[...] todos os princípios existentes no Direito contratual são aplicáveis às avenças celebradas por via eletrônica” (ELIAS, 2008, p. 154; SCHREIBER, 2014)[2].
Como é cediço, o contrato consiste em espécie de negócio jurídico, cujo pressuposto reside no consentimento entre as partes, materializado na declaração negocial (AZEVEDO, 1986). Este é o princípio estrutural do contrato – o consensualismo – que indica que os contratos, como regra geral, aperfeiçoam-se pelo mero consenso entre as partes, por meio da manifestação de consentimento recíproco de partes em relação à avença.
Por meio do contrato, os integrantes da relação jurídica, no exercício de sua autonomia privada (PRATA, 1982), regulam os direitos e obrigações que vincularão as partes, observados os parâmetros legais definidos em nosso ordenamento jurídico (BRASIL, 2002)[3].
No ambiente empresarial em que se fazem presentes agentes econômicos paritários, o contrato representa importante instrumento para as partes no sentido de disciplinar detalhadamente as regras, que deverão ser observadas no decorrer da relação contratual. Este exercício negocial entre os interlocutores contratuais leva em consideração diversos fatores, notadamente as características da operação econômica objeto da regulação contratual e os riscos emergentes da convenção.
O produto desta atividade negocial – o contrato – projeta efeitos jurídicos, econômicos e sociais para as partes e para terceiros, compreendendo a legítima expectativa recíproca e voluntária de cumprimento da avença pelas partes contratantes e o reconhecimento jurídico-institucional do contrato, como instrumento que deve ser assegurado e preservado pelas instituições, em especial o Poder Judiciário.
Dentro deste contexto, é absolutamente legítimo que as partes, no exercício da autonomia privada, possam estabelecer consensualmente previsões contratuais, de forma a prever direitos e obrigações que buscam distribuir e alocar as responsabilidades e riscos potencialmente advindos da relação jurídica no escopo individual de cada umas das partes.
A este respeito vale mencionar as disposições do art. 113, V, § 2º, art. 421 e seu parágrafo único e o art. 421-A, que reforçam o conteúdo valorativo da autonomia privada, in verbis:
Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.
[...]
V - corresponder a qual seria a razoável negociação das partes sobre a questão discutida, inferida das demais disposições do negócio e da racionalidade econômica das partes, consideradas as informações disponíveis no momento de sua celebração.
§ 2º As partes poderão livremente pactuar regras de interpretação, de preenchimento de lacunas e de integração dos negócios jurídicos diversas daquelas previstas em lei.
Art. 421. A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato.
Parágrafo único. Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual.
Art. 421-A. Os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa presunção, ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais, garantido também que:
I - as partes negociantes poderão estabelecer parâmetros objetivos para a interpretação das cláusulas negociais e de seus pressupostos de revisão ou de resolução
II - a alocação de riscos definida pelas partes deve ser respeitada e observada; e
III - a revisão contratual somente ocorrerá de maneira excepcional e limitada.
Como decorrência da autonomia privada, é conferido às partes a prerrogativa de eleger livremente a forma por meio da qual o contrato será instrumentalizado, salvo os casos previstos expressamente em lei. De acordo com Nathalia Masson, a forma “[...] segundo uma definição geral, é a modalidade através da qual a vontade do particular se manifesta no exterior” (MASSON, 2006, p. 169-170).
Este conceito é traduzido pelo princípio da liberdade das formas, expressamente adotado pelo art. 107 do Código Civil de 2002, segundo o qual “[...] a validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir” (BRASIL, 2002).
Com efeito, o sistema privilegiou a liberdade das formas com o objetivo de assegurar a autonomia privada das partes contratantes, que, dessa maneira, estão livres para fazer uso de qualquer forma para a exteriorização da declaração negocial e, consequentemente, para a celebração de negócios jurídicos (BRASIL, 2002)[4].
Os Contratos Eletrônicos, portanto, representam instrumentos resultantes da autonomia privada conferida aos agentes econômicos, que, no exercício da liberdade contratual, optam por celebrar o negócio jurídico por meio da forma eletrônica, podendo se manifestar, por exemplo, por meio de troca de correspondências eletrônicas e/ou chats interativos com conteúdo de proposta e aceitação (REBOUÇAS, 2018)[5], contrato gerado e assinado eletronicamente entre as partes por meio de sistema ou software por elas livremente escolhido e até mesmo por meio de Termos e Condições entabulados eletronicamente entre as partes, de forma sistemicamente automatizada ou não, desde que depreendida a declaração negocial de contratar, expressa ou tacitamente, segundo os ditames da lei civil.
Nesta perspectiva, os Contratos Eletrônicos, por serem juridicamente contratos, também são considerados existentes, válidos e eficazes quando verificada a emissão de declaração negocial livremente exteriorizada, depreendida dos meios eletrônicos. Esta conclusão também encontra respaldo no princípio da equivalência funcional entre os suportes físicos e eletrônicos dos contratos, conforme explicação de Fábio Ulhoa Coelho:
Pelo princípio da equivalência funcional, afirma-se que o suporte eletrônico cumpre as mesmas funções que o papel. Aceita essa premissa, não há razões para se considerar inválido ou ineficaz o contrato só pela circunstância de ter sido registrado em meio magnético. Do princípio da equivalência funcional decorre a regra de que nenhum ato jurídico pode ser considerado inválido pela só circunstância de ter sido celebrado por transmissão eletrônica de dados. O suporte virtual, em outros termos, não pode servir à invalidação do contrato, porque não aumenta as incertezas apresentada por determinado negócio jurídico (COELHO, 2011, p. 56).
No caso dos Contratos Eletrônicos, portanto, as declarações negociais são manifestadas pela via eletrônica, sendo esta entendida como o ambiente cibernético de troca de dados por meio do qual as manifestações de vontade navegam ao encontro de uma com a outra, perfazendo o Contrato Eletrônico[6].
Neste mesmo sentido, explica Erica Brandini Barbagalo, in verbis:
[...] a distinção entre contrato eletrônico e contrato tradicional está no meio utilizado para a manifestação das vontades e na instrumentalidade do contrato – o que assegura aos contratos eletrônicos características peculiares – definimos como contratos eletrônicos os acordos entre duas ou mais pessoas para, entre si, constituírem, modificarem ou extinguirem um vínculo jurídico, de natureza patrimonial, expressando suas respectivas declarações de vontade por computadores interligados entre si (BARBAGALO, 2001, p. 08).
No que tange à prova do Contrato Eletrônico, fazemos alusão ao art. 225 do Código Civil de 2002, in verbis:
Art. 225. As reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros fonográficos e, em geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou de coisas fazem prova plena destes, se a parte, contra quem forem exibidos, não lhes impugnar a exatidão (BRASIL, 2002).
O referido dispositivo é claro, portanto, ao estatuir que a reprodução eletrônica de fatos e coisas fazem prova plena destes, ressalvado a prerrogativa de impugnação da parte contra quem a reprodução eletrônica foi oposta.
O Enunciado 297 da IV Jornada de Direito Civil do Conselho de Justiça Federal também referendou o valor probante dos documentos eletrônicos ao estatuir que: “[...] o documento eletrônico tem valor probante, desde que seja apto a conservar a integridade de seu conteúdo e idôneo a apontar sua autoria, independentemente da tecnologia empregada”.
O Código de Processo Civil (CPC/15) regulou a matéria dispondo, nos termos do art. 441, que: “[...] serão admitidos documentos eletrônicos produzidos e conservados com a observância da legislação específica”. Do mesmo modo, o art. 369 do diploma processual dispõe que: “As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz”. Não podemos deixar de mencionar, ainda, o princípio do livre convencimento motivado do magistrado, previsto no art. 371 do CPC/15, segundo o qual este pode apreciar livremente as provas, de modo a formar seu entendimento (BRASIL, 2015)[7].
A 3ª Turma do STJ, nos autos do Recurso Especial 1495920/DF, de relatoria do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, não somente reconheceu a validade do documento eletrônico, como também a sua força executiva. Abaixo transcrevemos trechos da ementa do mencionado julgado, os quais mostram-se fundamentais para o presente artigo:
3. Possibilidade, no entanto, de excepcional reconhecimento da executividade de determinados títulos (contratos eletrônicos) quando atendidos especiais requisitos, em face da nova realidade comercial com o intenso intercâmbio de bens e serviços em sede virtual.
4. Nem o Código Civil, nem o Código de Processo Civil, inclusive o de 2015, mostraram-se permeáveis à realidade negocial vigente e, especialmente, à revolução tecnológica que tem sido vivida no que toca aos modernos meios de celebração de negócios, que deixaram de se servir unicamente do papel, passando a se consubstanciar em meio eletrônico.
5. A assinatura digital de contrato eletrônico tem a vocação de certificar, através de terceiro desinteressado (autoridade certificadora), que determinado usuário de certa assinatura a utilizara e, assim, está efetivamente a firmar o documento eletrônico e a garantir serem os mesmos os dados do documento assinado que estão a ser sigilosamente enviados.
6. Em face destes novos instrumentos de verificação de autenticidade e presencialidade do contratante, possível o reconhecimento da executividade dos contratos eletrônicos. (STJ, Terceira Turma, REsp 1495920, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. em 15/05/2018, publicado no DJe 07/06/2018 (RT vol. 994 p. 822)).
Há outros julgados de tribunais estaduais no mesmo sentido[8].
Neste contexto, é ponto pacífico no direito brasileiro que os Contratos Eletrônicos consistem em negócios jurídicos plenamente válidos e eficazes, sendo admitida a sua prova por documentos eletrônicos que os consubstanciam.
Contudo, o tema se reveste de maior complexidade quando nos debruçamos sobre os aspectos relacionados à exteriorização da declaração negocial pelas partes contratantes e seu alcance e eficácia nos Contratos Eletrônicos, como passaremos a expor.
2.DECLARAÇÃO NEGOCIAL E FORMAÇÃO DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS
Como negócio jurídico que são, os Contratos Eletrônicos exigem a presença de ao menos uma declaração negocial. Isso porque, “[...] não há negócio jurídico que não tenha em seu suporte fático pelo menos uma declaração de vontade” (AZEVEDO, 1986, p. 16).
As referidas declarações devem ser destinadas à produção de efeitos jurídicos concretos. Neste sentido, os efeitos jurídicos não devem ser constatados a partir da vontade íntima do sujeito emissor da declaração, tampouco da declaração isoladamente, mas sim em razão do cotejo da referida declaração no contexto social em que fora lançada, de modo que seja “[...] socialmente vista como destinada a produzir efeitos jurídicos” (AZEVEDO, 1986, p. 21).
Com efeito, diversamente do que pensam os autores adeptos da teoria da vontade ou voluntarista, em que o negócio jurídico é visto como um ato de vontade interna do sujeito (MONTEIRO, 1966, p. 183)[9], assim como em contraposição aos autores adeptos da teoria da declaração ou objetivista (AZEVEDO, 2013, p. 10)[10], que sustentam que a declaração deve prevalecer sobre a vontade interna, o enfoque deve se dar na declaração “[...] vista socialmente como destinada à produção de efeitos jurídicos” (AZEVEDO, 2013, p. 16).
Logo, a declaração que deve se fazer presente no negócio jurídico é qualificada, assumindo, pois, a natureza de declaração negocial (MARTINS-COSTA, 2015)[11]. Sobre esse ponto, explica Antônio Junqueira de Azevedo:
Percebe-se, assim, que a declaração de vontade, suporte fático do negócio jurídico, não é qualquer declaração de vontade; há de ser uma hipótese específica, Poder-se-ia dizer, num primeiro momento, com a teoria voluntarista do século passado, que o que a distingue é o fato de o sujeito visar diretamente obter efeitos jurídicos. Acontece, porém, que, para obter ‘efeitos jurídicos’, deve o sujeito atuar dentro de moldes socialmente reconhecíveis como aptos a produzir efeitos jurídicos. É a sociedade que lhe fornece esses moldes, e não, a sua vontade. Segue-se daí que essa declaração de vontade – declaração negocial – passa a se distinguir das demais, não pela vontade do sujeito, e sim, pelo modelo social de atitude em que está vertida (AZEVEDO, 1986, p. 20).
A declaração negocial, quanto à forma, pode ser expressa, tácita ou presumida. Segundo a doutrina tradicional, será expressa quando as partes contratantes se utilizem de qualquer veículo para exteriorizá-la no mundo civil, por palavras, escritas ou orais, e até mesmo por mímica (VENOSA, 2003, p. 512), desde que o sujeito se exprima por um gesto tradutor de seu querer. Por outro lado, será tácita a declaração negocial quando surgem do comportamento, atos e fatos dos contratantes VENOSA, 2003, p. 512). Poderá, ainda, ser presumida a declaração de vontade quando, em não sendo expressa, a lei deduz do comportamento do sujeito (AZEVEDO, 1986)[12], como ocorre nos casos de presunção de pagamento arts. 322[13], 323, e 324 do Código Civil ou com a presunção de remissão, conforme art. 387 do Código Civil (NANNI, 2014, p. 40).
Conclui-se, portanto, que o consentimento do sujeito, em superação às antigas teorias da vontade e da declaração, é aferido a partir da declaração negocial, que, por sua vez, consiste na declaração que, no contexto negocial e social em que foi emitida, gera a crença social de que está plenamente apta a produzir determinados efeitos jurídicos. O conceito da declaração negocial tem por pressuposto um elemento objetivo, que é a sua recepção, no ambiente social em que foi veiculada, como instrumento hábil a transmitir um significado negocial.
Trazendo os conceitos acima para a prática empresarial dos Contratos Eletrônicos, temos que estes também serão depreendidos das declarações negociais veiculadas pela modalidade eletrônica, sendo certo que inexiste no Direito brasileiro qualquer proibição para esta forma de veiculação da declaração negocial. Neste mesmo sentido, Ana Paula Gambogi Carvalho assim se pronuncia:
O Direito brasileiro não possui qualquer preceito que proíba a declaração da vontade transmitida por meios digitais. Não havendo, portanto, norma proibitiva, as vontades das partes podem ser produzidas e/ou transmitidas eletronicamente. A questão da declaração da vontade automatizada encontra no Direito brasileiro a mesma resposta oferecida pelo Direito alemão: mesmo a declaração de vontade produzida por um computador tem a sua origem em um comando humano, sendo, portanto, perfeitamente válida (CARVALHO, 2001, p. 63).
A título de exemplo, quando as partes optam por negociar, gerar e assinar eletronicamente um contrato através de um software escolhido por elas é ponto pacífico que temos um Contrato Eletrônico vinculante e revestido de exigibilidade. A mesma conclusão será para os Contratos Eletrônicos paritários consentidos livremente por meio de um click em que o usuário-cliente concorda com os Termos e Condições veiculados em sistema eletrônico ou pelo website do fornecedor para a consumação de uma determinada operação.
A respeito dos documentos celebrados por meio de lançamento de assinaturas eletrônicas (LOTUFO, 2004)[14], a Medida Provisória n.º 2.200-2 de 24 de agosto de 2001, que instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil), Medida Provisória (MP) n.º 2.200, regulamentou o tema, estabelecendo em seu art. 10, § 1º, o processo específico de certificação digital pública da ICP-Brasil, como também a possibilidade de metodologia de certificação privada, nos termos do § 2º, que é claro ao dispor que:
[...] o disposto nesta Medida Provisória não obsta a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento.
Somado a isso, o Código Civil de 2002 estabelece em seu art. 219, caput, que “[...] as declarações constantes de documentos assinados presumem-se verdadeiras em relação aos signatários”. Dessa forma, em razão do revestimento legal conferido às assinaturas eletrônicas no âmbito do ICP-Brasil à luz da MP n.º 2.200, é possível afirmar que a lei conferiu presunção relativa no que tange à autenticidade do documento assinado eletronicamente. Isso significa que faz prova em favor de quem alega, cabendo a quem arguir a sua falsidade o ônus de provar a irregularidade apta a macular o negócio jurídico pactuado.
Logo, admite-se (BRASIL, 2006)[15] no direito brasileiro a celebração de contratos por meio de assinaturas eletrônicas pelos métodos de certificação digital pública e privada, sendo que, neste último caso, é recomendável que as partes reconheçam expressamente tal procedimento para mitigar eventual questionamento relacionado ao documento eletrônico.
No que tange à formação dos contratos em geral, segundo a regra geral do Código Civil de 2002, esta se dá quando se verifica a convergência entre declarações que materializem proposta e aceitação. Assim, consoante art. 427 do Código Civil de 2002: “[...] a proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso”.
Especificamente nas relações jurídicas entre ausentes, regula a lei, nos termos do art. 428, II, que a proposta deixa de ser obrigatória, quando enviada sem prazo fixado para resposta, se “[...] tiver decorrido tempo suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do proponente [...]”; ou, se fixado prazo para resposta, segundo o art. 428, III, “[...] não tiver sido expedida a resposta dentro do prazo dado”. Caso a aceitação tenha sido realizada fora do prazo, ou tenham sido requeridas adições, restrições ou modificações, esta será considerada nova proposta a ser avaliada pelo proponente original, agora oblato. Este é o teor do art. 431 da Lei Civil (BRASIL, 2002)[16].
Emblemático, vale dizer, o teor do art. 432 (BRASIL, 2002)[17], que prevê o aperfeiçoamento do contrato nos negócios em que não seja costume a aceitação expressa, caso a recusa à proposta não tenha chegado a tempo.
Pois bem. Feito este apanhado jurídico-dogmático acerca da formação dos contratos em geral, pensemos na situação em que um fornecedor envia uma proposta de venda de um determinado bem por correio eletrônico, acompanhada de um instrumento eletrônico com Termos e Condições, ao seu potencial cliente que, por sua vez, aceita expressamente a proposta e os Termos e Condições, fato este que o proponente tomou inequívoco conhecimento. Neste caso temos a formação de um Contrato Eletrônico perfeito e acabado, materializado em correios eletrônicos, com incidência direta dos arts. 107[18], 427 e 434, caput, do Código Civil de 2002.
Do mesmo modo, quando um determinado cliente ingressa no website de seu fornecedor, mediante login e senha a ele disponibilizado, aceita os Termos e Condições como condição prévia à realização de uma compra e ao final pratica os atos de consumação da operação, também temos o aperfeiçoamento de um Contrato Eletrônico entre as partes.
Os exemplos acima ilustram típicos casos de negócios jurídicos estabelecidos mediante a veiculação de declarações negociais expressas, ou seja, os agentes econômicos envolvidos na operação aceitaram inequivocamente os termos dos documentos eletrônicos que consubstanciaram o Contrato Eletrônico.
O tema adquire novos contornos, quando passamos a explorar hipóteses de Contrato Eletrônico entabulado por meio de declarações negociais tácitas, isto é, depreendidas dos atos e comportamentos das partes convenentes. Tomemos o mesmo exemplo em que um fornecedor envia um correio eletrônico com conteúdo de proposta de venda de determinado bem a seu potencial cliente, fazendo referência expressa e anexando um instrumento eletrônico com Termos e Condições ao e-mail, sendo que, neste caso, o cliente não responde à oferta consubstanciada no correio eletrônico, mas prossegue operacionalmente com o negócio, realizando o pagamento e consumindo o produto que fora fornecido. Podemos afirmar categoricamente que um Contrato Eletrônico se formou? Em que extensão? Tais questões não são triviais[19].
Temos a percepção que a situação retratada no referido exemplo retrata uma relação jurídica de compra e venda, com incidência das regras inderrogáveis que incidem no regime jurídico deste contrato típico. Isto porque, verifica-se a presença dos elementos essenciais categoriais deste negócio jurídico (AZEVEDO, 2013)[20], a saber, preço, coisa e consentimento, este materializado com a execução efetiva dos atos correspondentes à realização do negócio jurídico pelas partes, notadamente a fabricação e entrega da coisa, mediante contraprestação pecuniária (pagamento do preço). Neste sentido, pois, teria o comprador, parte de um contrato comutativo sobre uma coisa, os direitos e garantias correspondentes, a exemplo da garantia dos vícios redibitórios, nos termos do art. 441[21] do Código Civil de 2002 (BRASIL, 2002).
Porém, com relação aos Termos e Condições, a vinculação ao instrumento depende de algumas premissas, especialmente a compreensão da existência de declaração negocial, expressa ou tácita, também endereçada à aceitação dos referidos Termos e Condições; e das circunstâncias negociais, ou seja, a configuração de um ambiente social do qual seja possível depreender a declaração destinada à produção de efeitos jurídicos também em relação aos Termos e Condições.
No exemplo hipotético acima apresentado, seria plausível esperar que o comprador, caso tenha interesse jurídico em desvencilhar-se do vínculo em relação ao instrumento de Termos e Condições, alegue que jamais consentira com o referido documento eletrônico, já que não teria veiculado qualquer declaração negocial especificamente destinada à aceitação do referido instrumento.
Contudo, embora silente em relação à concordância aos termos do instrumento, se a prática de Termos e Condições for algo inerente ao mercado do produto comercializado (BRASIL, 2002)[22], sendo de amplo conhecimento de seus participantes que recorrentemente adotam este modelo transacional, não sendo o costume estabelecido no ambiente negocial a obtenção de uma concordância expressa, seria possível sustentar a formação, e consequente vinculação, pelo comprador, a todas as disposições constantes do instrumento de Termos e Condições que serviram de base para a referida operação de compra e venda, já que emitira uma declaração negocial tácita destinada à produção de efeitos jurídicos, consubstanciada na prática de atos de consumação da compra e venda, em toda sua extensão e características, dado o ambiente em que a operação foi estabelecida. A ausência de objeção do comprador ao instrumento a ele direcionado também representaria fator importante para estender-lhe a vinculação aos termos previstos nos Termos e Condições.
A este respeito, vale dizer que o Código Civil de 2002 indica a possibilidade de o silêncio caracterizar anuência “[...] quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa [...]”, nos exatos termos do art. 111 do referido diploma legislativo. No mesmo sentido, o art. 432., dispõe que: “[...] se o negócio for daqueles em que não seja costume a aceitação expressa, ou o proponente a tiver dispensado, reputar-se-á concluído o contrato, não chegando a tempo a recusa”.
Neste sentido, Rodrigo Fernandes Rebouças indica a possibilidade de silêncio “[...] como comportamento contundente e representativo da declaração de vontade na contratação eletrônica, especialmente nas situações de contratos intersistêmicos e interpessoais” (REBOUÇAS, 2018, p. 140).
Evidentemente, o alcance das declarações negociais de vinculação aos Termos e Condições, especialmente àquelas definidas como tácitas, estão adstritas aos ditames legais. Sendo instrumentos tipicamente de adesão, serão inválidas as cláusulas que impliquem renúncia de direitos do aderente-aceitante resultantes da natureza da operação, consoante art. 424 do Código Civil de 2002 (BRASIL, 2002)[23]. Do mesmo modo, em caso de ambiguidade ou contradição dos Termos e Condições, “[...] dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente [...]”, nos termos do art. 423 do mesmo diploma legal (BRASIL, 2002)[24]. Por fim, disposições insertas nos Termos e Condições que, pela sua natureza, exijam a declaração expressa, também poderão ter a sua validade e eficácia questionadas pela parte interessada, nos termos dos supramencionados arts. 111[25] e 432 do Código Civil de 2002.
3.CONCLUSÃO
Em suma, os Contratos Eletrônicos assumiram grande relevância no contexto da sociedade atual, caracterizado pela transformação digital. São instrumentos jurídicos largamente utilizados na prática empresarial, possuindo importância estrutural na viabilização de negócios jurídicos no ambiente digital.
Com o infeliz advento da pandemia da COVID-19, a prática dos Contratos Eletrônicos foi substancialmente impulsionada, tendo em vista a impossibilidade de interação presencial entre as partes contratantes.
Os Contratos Eletrônicos se revestem da natureza jurídica de contratos em geral e se materializam quando depreendidas declarações negociais para a formação do vínculo jurídico. As declarações são exteriorizadas pela forma eletrônica, como manifestação do princípio da liberdade das formas. As declarações, por sua vez, podem ser expressas ou tácitas, mas sempre depreendidas por documentos veiculados em ambiente eletrônico.
Enquanto meio de prova, é pacífica admissibilidade dos documentos eletrônicos para a prova da existência do contrato, nos termos do Código Civil de 2002 e do Código de Processo Civil de 2015. A respeito da assinatura eletrônica, esta pode ser utilizada e lançada por meio de certificação pública ou privada, observadas as condições previstas na MP n.º 2.200, que disciplina o regime jurídico dos documentos eletrônicos, visando a sua integridade e autenticidade.
Os Contratos Eletrônicos podem se formar por diversas maneiras, a exemplo: de troca de correios eletrônicos; utilização de software; estabelecimento de Termos e Condições; dentre outros, sempre por meio da forma eletrônica, sendo que as declarações negociais podem ser veiculadas nas formas: expressa; ou tácita, contanto que observados os institutos e princípios gerais do direito civil relativos à formação dos contratos em geral. O alcance das declarações dependerá de uma série de fatores, notadamente as circunstâncias negociais, como abordado no presente artigo.
AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Negócio jurídico e declaração negocial: noções gerais e formação da declaração negocial. São Paulo: [S.I.], 1986.
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[1] Rodrigo Fernandes Rebouças intitula tais operações como “Contratações Intersistêmicas”, explica o autor: “[...] tal forma de contratação ocorre nas hipóteses em que são realizadas operações de compra e venda, por exemplo, de forma automatizada entre um distribuidor e o produtor. Ou seja, são hipóteses em que houve uma prévia programação pelos representantes legais de cada uma das sociedades empresárias ou do próprio consumidor, no sentido de que ao realizar a venda de um produto para outra parte, ou para o consumidor, o sistema irá automaticamente realizar a baixa de tal produto no estoque e, havendo necessidade, emitirá uma ordem automática de compra junto ao produtor para a reposição dos níveis do estoque” (REBOUÇAS, 2018, p. 52).
[2] Em artigo específico sobre contratos eletrônicos, Anderson Schreiber, embora reconheça que os referidos contratos não “sejam um mundo à parte”, destaca algumas particularidades deste tipo de contratação, in verbis: “Os chamados contratos eletrônicos não representam um mundo à parte, estranho ao direito dos contratos ou governado por regras próprias. Não se trata de uma dimensão paralela que somente aparenta similaridade com a realidade tradicional, como uma espécie de Matrix, lembrada na epígrafe a este artigo. A contratação eletrônica traz inúmeras questões novas, mas se insere no tratamento sistemático dos contratos no direito brasileiro. Seus pontos de dissonância com a teoria geral tradicional representam frequentemente oportunidades para rever dogmas rígidos que já não se justificam mais, nem mesmo fora do ambiente eletrônico (como se viu na discussão pertinente à prova do contrato). Noutros casos, trata-se de instituir novos mecanismos jurídicos de proteção contra novos riscos que surgem especialmente – mas nem sempre de modo exclusivo – no ambiente eletrônico” (SCHREIBER, 2014).
[3] Destaque para o parágrafo único do art. 2035 do Código Civil de 2002. “Parágrafo único. Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a função social da propriedade e dos contratos”. Em sentido equivalente, o art. 17 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro dispõe que: “As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes”. (BRASIL, 2002).
[4] Em caráter excepcional, contudo, em razão dos interesses tutelados ou por simples política legislativa, a lei impõe que o ato deve observar uma determinada forma especial para ser válido. É o caso, por exemplo, dos negócios jurídicos envolvendo direitos reais, nos termos do art. 108 do Código Civil, com valores superiores a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País. A observância ao requisito da forma está prevista no art. 104, inciso III, e no art. 166, incisos IV e V, todos do Código Civil de 2002, e o seu não cumprimento poderá ensejar a invalidade ou a ineficácia, a depender da sanção cominada pela lei (BRASIL, 2002).
[5] O autor Rodrigo Fernandes Rebouças classifica tais operações como “Contratações Interpessoais”, as quais “[...] são essencialmente caracterizadas pela necessidade de ação humana de forma direta, envolvendo os momentos da oferta ou da proposta e o momento do aceite ou da nova proposta (contraproposta), ambas as ações demandam a ação humana e a respectiva declaração de vontade. [...] As contratações interpessoais são usualmente realizadas por troca de correspondência eletrônica (contrato “entre ausentes”), por meio de chats ou sistemas de mensageria instantânea (contrato “entre presentes”) e atualmente podemos também pensar nas situações envolvendo redes sociais e micro blogs (v.g. Twitter) que dependendo da forma com que é utilizado poderá ser configurada como contrato “entre presentes” ou “entre ausentes” (REBOUÇAS, 2018, p. 41).
[6] Estão excluídos deste conceito, portanto, os contratos celebrados pela forma física e assinados de forma manuscrita eu que forem escaneados ou “digitalizados”. Estes instrumentos não são eletrônicos em essência, mas as suas vias digitalizadas podem ser usadas para algum expediente eletrônico.
[7] Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento (BRASIL, 2015).
[8] Apelação nº 1.002406.1322160/002, julgada pela 16ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Julgamento realizado em 19/12/2007. MINAS GERAIS (Estado). Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Apelação Cível AC 1.002406.1322160/002 Belo Horizonte. (16ª Câmara Cível). Relator: Nicolau Masselli. Data de julgamento: 19 dez. 2007. Ação cobrança. Prestação de serviços educacionais. Contrato eletrônico. Relação jurídica demonstrada. O contrato de prestação de serviços educacionais é informal e não exige forma prescrita em lei, de maneira que o instrumento contratual firmado por meio eletrônico é apta a demonstrar a relação jurídica entra as partes. Diário de Justiça, 15 fev. 2008. TJSP, Apelação Cível 1003345-75.2020.8.26.0318; Relator (a): Alberto Gosson; Órgão Julgador: 22ª Câmara de Direito Privado; Foro de Leme - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 08/04/2021. SÃO PAULO (Estado). Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação Cível AC 1003345-75.2020.8.26.0318. (22ª Câmara de Direito Privado). Relator: Alberto Gosson. Data do julgamento: 08 abr. 2021. Ação monitória. Contrato bancário. Para o ajuizamento do pedido monitório faz-se necessária a apresentação de documento previamente apurado, líquido, exigível, sem força executiva, Inocorrência de cerceamento de defesa. Prova pericial que é desnecessária à solução do mérito, cujo teor abrange questão exclusivamente de direito. Diante da presença do instrumento contratual e do demonstrativo de cálculo, que indica com clareza o valor e a evolução da dívida, com a liquidez necessária para embasar a ação monetária, deve ser mantida a R. sentença que rejeitou os embargos e acolheu o pedido monitório. Celebração do empréstimo mediante terminal de autoatendimento que não pode ser utilizada, por si só, como elemento para obstar a exigibilidade do crédito tomado pelo correntista, que se beneficiou da quantia recebida por meio de transação realizada com chip dotado de senha intransferível. Tomadora que, no momento da contratação, obteve todas as informações referentes a juros remuneratórios, com exposição detalhada do número de parcelas e de seus termos inicial e final, o que evidencia, à luz da boa-fé objetiva, o seu consentimento informado em tornar-se mutuário. Os contratos eletrônicos expressam modalidades previstas em leis (contratos nominados ou contratos típicos) ou modalidades permitidas pelo princípio da liberdade contratual, os denominados contratos inominados ou atípicos, sendo certo que os contratos eletrônicos não constituem uma modalidade contratual per se. Os contratos podem ser veiculados por meio eletrônico desde que entabulados dentro das balizas modeladas pelo respeito as normas cogentes, aos princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato e do equilíbrio econômico, e tal forma de expressão e comunicação lhes assegura os atributos de existência, validade e eficácia no âmbito do ordenamento jurídico com respeito aos requisitos básicos de: livre manifestação da vontade, presença de dois ou mais sujeitos de direito, capacidade civil e legitimação para o ato que está sendo praticado. Prescrição quinquenal (art. 206, § 5º, I, CC). Inexistência. Empréstimo que foi tomado e, 23/11/2018, com a demanda ajuizada em 01/10/2020. Capitalização de juros em periodicidade inferior à anual. Tabela Price. Possibilidade. Contratos bancários firmados na vigência da Medida Provisória n.º 1.963.17/2000, reeditada sob o n.º 2.170-36/2001, desde que expressamente pactuada. Jurisprudência do colendo do STJ. Entendimento do excelso STF. Suficiência da previsão de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal para autorizar a cobrança da taxa efetiva anual contratada (Súmula n.º 541 do STJ). Recurso desprovido. Diário de Justiça, 08 abr. 2021.
[9] Boa parte da tradicional doutrina de direito civil nacional, ao definir o negócio jurídico, faz menção à vontade. É o caso, por exemplo, de autores como Washington de Barros Monteiro (MONTEIRO, 1966, p. 183).
[10] Antônio Junqueira de Azevedo faz a seguinte referência à teoria objetivista, in verbis: “[...] segundo Scognamiglio, as primeiras concepções do negócio jurídico que se afastaram da visão voluntarista e que, portanto, o encararam de forma mais objetiva foram as de Brinz e Thon; ambos viram, no negócio, antes um meio concedido pelo ordenamento jurídico para produção de efeitos jurídicos que propriamente um ato de vontade. Posteriormente, o ataque às concepções tradicionais agravou-se com o debate entre a teoria da vontade (willenstheorie) e a teoria da declaração (erklarungstheorie); embora tal assunto, nesta obra, seja desenvolvido mais adiante, porque diz respeito diretamente a qual papel atribuir à vontade no negócio jurídico, não podemos deixar de apontar, desde agora, que os partidários da teoria da declaração, mesmo admitindo que, nas situações normais, o negócio jurídico corresponde à vontade, ao defenderem, por uma proteção ao comércio jurídico, a predominância da declaração objetiva obre a vontade subjetiva, em caso de divergência entre ambas, abriram larga brecha para que o negócio jurídico deixasse de ser visto como um ato de vontade” (AZEVEDO, 2013, p. 10).
[11] O conceito de declaração negocial está em sintonia com a teoria da confiança, adotada pelo Código Civil de 2002, que superou a teoria da vontade e a teoria da declaração. Nesse sentido, expõe Judith Martins-Costa, que: “[...] as regras centrais estão nos arts. 112, 113 e 114 do Código Civil. Pela primeira foi acolhido, como já se viu, a Teoria da Confiança, um meio termo entre a Teoria da Vontade e a Teoria da Declaração, razão pela qual a atenção do intérprete deverá estar voltada à intenção tal qual exteriorizada, buscando-se o sentido da declaração em vista de um determinado contexto, fático e normativo. No art. 113 está o direcionamento aos elementos contextuais. Consequentemente, ao menos prima facie, o sentido da manifestação há de ser obtido não apenas pela sua literalidade, mas na correspondência a padrões de correção e lealdade (boa-fé) e ao que é usual no específico setor em que situado o negócio jurídico” (MARTINS-COSTA, 2015, p. 499-500).
[12] Como a lei deduz objetivamente do comportamento do sujeito uma declaração com significado, alguns autores entendem que a declaração negocial presumida, na verdade, está abrangida na declaração negocial tácita. (AZEVEDO,1986, p. 18-19).
[13] “Art. 322. Quando o pagamento for em quotas periódicas, a quitação da última estabelece, até prova em contrário, a presunção de estarem solvidas as anteriores”. [...] Art. 323. Sendo a quitação do capital sem reserva dos juros, estes presumem-se pagos”. [...] “Art. 324. A entrega do título ao devedor firma a presunção do pagamento”. [...] [13] “Art. 387. A restituição voluntária do objeto empenhado prova a renúncia do credor à garantia real, não a extinção da dívida” (BRASIL, 2002).
[14] Renan Lotufo explica que a palavra “[...] assinar vem do latim assignare, que significa pôr um sinal, marcar com seu nome ou sinal” (LOTUFO, 2004, p. 577).
[15] Corrobora com tal observação o fato de a assinatura eletrônica ser um expediente utilizado no âmbito do próprio Poder Judiciário, no contexto do processo eletrônico, nos termos da Lei n.º 11.419/2006, que cria o chamado "processo eletrônico" (BRASIL, 2006).
[16] Art. 431. A aceitação fora do prazo, com adições, restrições, ou modificações, importará nova proposta (BRASIL, 2002).
[17] Art. 432. Se o negócio for daqueles em que não seja costume a aceitação expressa, ou o proponente a tiver dispensado, reputar-se-á concluído o contrato, não chegando a tempo a recusa (BRASIL, 2002).
[18] Art. 107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir. [...] Art. 427. A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso. [...] Art. 434. Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida, exceto: […]. (BRASIL, 2002).
[19] Embora relevante para análise jurídica do caso concreto, não analisaremos as questões relativas à representação das partes envolvidas, aplicabilidade ou não da teoria da aparência e demais questões correlatas.
[20] Esclarecedora é a explicação de Antonio Junqueira de Azevedo acerca dos elementos categoriais, conforme trecho de sua obra que passamos a transcrever: “[...] os elementos categoriais não resultam da vontade das partes, mas, sim, da ordem jurídica, isto é, da lei e do que, em torno desta, a doutrina e jurisprudência constroem. Na esteira dos juristas romanos e com base na ideia de natura de cada tipo de negócio, a análise revela duas espécies de elementos categoriais: os que servem para definir a categoria de negócio e que, portanto, caracterizam sua essência são os elementos categoriais essenciais ou inderrogáveis; e os que, embora defluindo da natureza do negócio, podem ser afastados pela vontade da parte, ou das partes, sem que por isso, o negócio mude de tipo, são os elementos categoriais naturais ou derrogáveis” (AZEVEDO, 2013, p. 35).
[21] Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor (BRASIL, 2002).
[22] O Art. 113, § 1º, inciso II, orienta a interpretação dos negócios jurídicos quando corresponder aos usos, costumes e práticas do mercado relativas ao tipo de negócio (BRASIL, 2002).
[23] Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio (BRASIL, 2002).
[24] Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente. (BRASIL, 2002).
[25] Art. 111. O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa. [...] Art. 432. Se o negócio for daqueles em que não seja costume a aceitação expressa, ou o proponente a tiver dispensado, reputar-se-á concluído o contrato, não chegando a tempo a recusa (BRASIL, 2002).
Doutorando e Mestre em Direito Civil (PUC/SP). Pós-graduado em Direito Empresarial (FGV DIREITO RIO). Head Jurídico de M&A, Energia & Portos da Braskem S.A. Advogado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AZEVEDO, Ciro Rangel. Anotações sobre Contratos Eletrônicos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 dez 2022, 04:58. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60618/anotaes-sobre-contratos-eletrnicos. Acesso em: 23 dez 2024.
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