GUSTAVO ANTONIO NELSON BALDAN
(orientador)
RESUMO: O presente estudo tem como finalidade analisar a respeito dos maus tratos animais e suas possíveis punições, demonstrando a importância do conhecimento sobre o assunto para demonstrar que todos os seres vivos são dignos de amor, respeito e cuidados para, então, reduzir essa prática de abandono animal existente. Para isto, foi contextualizado a evolução histórica dos direitos ambientais e dos animais para, posteriormente, demonstrar o tratamento dos animais no ordenamento jurídico brasileiro e as punições que a prática possui. Para a realização do presente artigo científico foi realizado uma pesquisa dedutiva, com metodologia através da pesquisa bibliográfica, com base em livros, artigos científicos e demais documentos pertinentes ao tema proposto. Pode-se concluir é fundamental orientar os indivíduos através de informações sobre a legislação, bem como demonstrar que os animais são seres sencientes e sujeitos de direito, para que a prática do abandono animal seja reduzida e, até mesmo, extinta.
PALAVRAS-CHAVE: Maus Tratos. Direito Ambiental. Proteção aos Animais.
ABSTRACT: The present study aims to analyze about animal abuse and its possible punishments, demonstrating the importance of knowledge on the subject to demonstrate that all living beings are worthy of love, respect and care, in order to reduce this practice of abandonment. existing animal. For this, the historical evolution of environmental and animal rights was contextualized to, later, demonstrate the treatment of animals in the Brazilian legal system and the punishments that the practice has. For the accomplishment of this scientific article, a deductive research was carried out, with methodology through bibliographic research, based on books, scientific articles and other documents relevant to the proposed theme. It can be concluded that it is essential to guide individuals through information about the legislation, as well as to demonstrate that animals are sentient beings and subjects of law, so that the practice of animal abandonment is reduced and even extinct.
KEYWORDS: Mistreatment. Environmental Law. Animal Protection.
As relações interespécies é um fenômeno presente em todas as civilizações ao longo dos tempos, eis que sempre existiu a troca de atividades servis entre os seres humanos e os animais, no âmbito produtivo ou familiar. Diante desse contexto, com o crescimento de situações envolvendo humanos e animais, o direito se debruçou sobre o tema para regulamentar tais relações e evitar que os maus tratos estejam presentes em nossa sociedade.
Ao analisar o conteúdo histórico a respeito da proteção animal, verifica-se uma grande diversidade de fatos que não são coerentes com o que há na legislação ambiental contemporânea. Anteriormente de elaborarem normas ambientais, os indivíduos utilizavam o meio ambiente de todos os modos, sem preocupar-se com a preservação e com a concepção de que os seres humanos estavam acima de quaisquer outros seres que compunham a natureza, portanto, nada era assegurado.
Deste modo, as legislações ambientais originaram através de novos conceitos a respeito do meio ambiente e a partir da compreensão de que os recursos advindos da natureza são bens fundamentais à humanidade e a sua devida sobrevivência. A vista disso, a Constituição Federal de 1988 incluiu a flora e a fauna como direitos fundamentais, devendo o Estado se responsabilizar por sua proteção.
A importância de estudar referido tema encontra-se na discussão em relação aos direitos fundamentais, que são pilares da Constituição Federal de 1988, tais como a proteção dos animais, direito ao meio ambiente, dentre outros. É um tema imprescindível, tendo em vista que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado está disciplinado no art. 225 da CF/88 e deve ser assegurado pelo Poder Público e pela sociedade em geral.
A partir deste momento o legislador estabeleceu com delitos, passíveis de punição, qualquer tipo de tratamento danoso ao meio ambiente e seus elementos, tais como os animais. Deste modo, o presente estudo objetivou discorrer a respeito dos maus tratos animais e suas sanções, demonstrando a importância que o conhecimento sobre o assunto traz para a compressão que todos os seres vivos são dignos de amor, respeito e cuidados. Tal conhecimento proporciona uma relação de proteção que contribuiu para a redução da prática de abandono e maus tratos com os animais existentes.
O método de pesquisa, como processo de reunião de informações para encontrar uma resposta, por meio da dedução, através da formulação de uma hipótese, que permitiu a familiarização com o tema que, por ter relevância para a sociedade, mereceu ser objeto de estudo, percepção e descobrimento de ideias. Assim, foram utilizadas doutrinas nacionais e autores clássicos, para que através da pesquisa bibliográfica, fosse possível realizar estudo empírico exploratório, sem, contudo, esgotar o assunto.
2. DIREITOS FUNDAMENTAIS AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO E À PROTEÇÃO AOS ANIMAIS
O termo Direitos Fundamentais teve sua origem durante um movimento político que deu início a Declaração Universal dos Homens e do Cidadão, em 1789, na França (PÉREZ LUÑO, 2004). Atualmente é decorrente de diversas fontes históricas, políticas e culturais e um dos principais elementos que influenciaram para a sua formação foram a limitação do poder do Estado e a consagração dos princípios da igualdade e da legalidade (MORAES, 2011).
Nos séculos XVIII e XIX havia apenas uma concepção das liberdades individuais, que era a liberal. Ainda que sofresse diversas críticas dos socialistas, católicos e legitimistas, o liberalismo prevalecia em todas as Constituições e declarações, atribuindo diversas interpretações da liberdade individual (MIRANDA, 2014).
A partir do século XX e XXI ocorreu a universalização dos Direitos Humanos e poder soberano vinculante da Constituição Federal, conforme explica Miranda (2014).
De acordo com os ensinamentos de Sarlet (2012), os Direitos Humanos defendem a existência dos direitos inatos aos indivíduos e, apesar de possuir diferenças com os Direitos Fundamentais, são coincidentes.
Neste período nasce o Estado Liberal, reproduzido pela limitação do poder estatal através da legislação e da separação de poderes, influenciado por diversos pensadores da Revolução Francesa e Norte-Americana (FACHIN, 2013).
Caracterizou-se através dos direitos fundamentais, especialmente a liberdade e propriedade que eram previstos de maneira formal e facultados apenas para uma parcela da população, a atuação do Poder Público de acordo com a legislação, Estado submetido à norma, função do Poder Público restrito à garantia da ordem e segurança pública, intervenção mínima do Estado, dentre outros (FACHIN; VINCE, 2017).
Nas palavras de Silva (2005, p. 149):
O reconhecimento dos direitos fundamentais do homem, em enunciados explícitos das declarações de direitos, é coisa recente, e está longe de se esgotarem suas possibilidades, já que cada passo na etapa da evolução da Humanidade importa na conquista de novos direitos. Mais do que conquista, o reconhecimento desses direitos caracteriza-se como reconquista de algo que, em termos primitivos, se perdeu, quando a sociedade se dividira entre proprietários e não proprietários.
Houve uma diminuição da atuação do Estado diante das relações sociais, que acabou trazendo consequências negativas, pois gerou uma liberdade indiscriminada, que ressaltou às desigualdades sociais, conforme sustenta Bonavides (2011, p. 59): “[...] a desumana espoliação do trabalho, o doloroso emprego de métodos brutais de exploração econômica, a quem nem a servidão medieval se poderia, com justiça, equiparar”.
Os direitos fundamentais são definidos por um conjunto de normas, prerrogativas, princípios, deveres e institutos intrínsecos à soberania popular, os quais asseguram uma convivência digna, igualitária, pacífica e livre, independentemente da raça, cor, origem, religião, condições econômicas, etc. Sem tais direitos, o indivíduo não vive, não convive nem mesmo sobrevive (BULOS, 2014).
É importante esclarecer que os direitos fundamentais possuem diversas funções no ordenamento jurídico e na sociedade, através da atuação frente ao Estado, sendo eles: direitos de defesa, de prestação e de participação. O primeiro é um dever de abstenção que não autoriza a intervenção do Estado no espaço de autodeterminação do indivíduo, restringindo o poder de autoridade (FACHIN; VINCE, 2017).
Já os direitos de prestação caracterizam-se pelo estabelecimento de uma abstenção, omissão, visando assegurar à sociedade um comportamento proativo do Estado, que deve agir visando libertar os cidadãos das necessidades. Por último, os direitos de participação referem-se a direitos ativos que possibilitam a intervenção do indivíduo na seara política, sendo um fundamento da democracia (FACHIN; VINCE, 2017).
Desta forma, os direitos fundamentais apresentam-se como um conjunto de valores objetivos que direcionam a conduta positiva do Poder Público, além das garantias negativas dos interesses dos indivíduos, no âmbito da ordem constitucional e estão disciplinados nos artigos 215 e 217.
Dentro do rol de direitos fundamentais se encontra o direito ao meio ambiente, que é considerado um direito de terceira dimensão, relacionado ao princípio da fraternidade ou solidariedade, que possui a finalidade de buscar a qualidade de vida para toda a coletividade, uma vez que o meio ambiente é primordial para a vida humana. Deste modo, evidente seu caráter difuso e que sua titularidade é indeterminável, ou seja, não está vinculado a uma determinada pessoa ou um grupo, mas sim a toda a sociedade (PESSANHA, 2015).
Com base na definição de Silva (2013, p. 20), o meio ambiente pode ser considerado como “um conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas”. De forma complementar, a jurisprudência oferece um conceito considerando as noções de meio ambiente natural, artificial, cultural e laboral (BRASIL, 2005).
Por fim, o art. 3º, inciso I21, da Lei n° 6.938/1981, dispõe que: “o meio ambiente é o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas” (BRASIL, 1981).
A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, ocorrida em 1972 na cidade de Estocolmo, Suíça, foi um verdadeiro marco para o aludido direito, tendo em vista que concretizou a preocupação com o meio ambiente, inspirando as Constituições de inúmeros países a assegurar em seus textos o tema (PESSANHA, 2015). O Princípio 1, que está previsto nos dispositivos da menciona conferência declara que o meio ambiente de qualidade é um direito fundamental imprescindível para o bem-estar da sociedade e das suas futuras gerações (ONU, 1972).
A CF/88 foi uma das pioneiras a abordar a respeito do meio ambiente de forma específica, garantindo em seus dispositivos a proteção, nos termos do art. 225 e seus parágrafos (BRASIL, 1988). A Constituição Federal busca, ao citar a palavra equilíbrio, a harmonia entre a natureza e o ser humano. Reconhece que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado se trata de um direito de todos e inclui as pessoas que possam a vir a existir também, evidenciando a precaução com as futuras gerações. Logo, é um bem de uso comum da sociedade, devendo o Poder Público e toda a coletividade protegê-lo e preservá-lo (CIRNE, 2018).
Consoante afirma Cirne (2018), através de entendimentos jurisprudenciais, o direito ao meio ambiente é um direito fundamental de terceira dimensão, podendo ser considerado uma cláusula pétrea, pois faz parte do núcleo material da dignidade da pessoa humana, que é formado de um mínimo existencial, baseado em utilidades básicas para a subsistência digna do ser humano.
A dignidade da pessoa humana é, nas palavras de Moraes (2011, p. 48) “um valor espiritual e moral inerente a pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar”.
Alusivo princípio representa um núcleo básico e informador, que permeia todo o ordenamento jurídico, devendo ser parâmetro de valoração pelo qual orienta a interpretação do sistema constitucional, visando atender às exigências de justiça e valores éticos, conferindo suporte axiológico a todo ordenamento jurídico brasileiro (PIOVESAN, 2008).
A Constituição Federal de 1988 consagrou a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado Democrático de Direito, colocando-o em posição de premissa fundamental, prevista no art. 1°, inciso III Constituição Federal, atribuindo à dignidade humana como sendo preceito fundamental e essencial de todo ordenamento jurídico brasileiro, pelo qual sua inobservância acarreta na inconstitucionalidade da lei (GOMES, 2011)
A dignidade da pessoa humana dá sustentação a diversos direitos fundamentais, pelos quais são regidos por uma hierarquia constitucional. Diante a conscientização da dignidade da pessoa humana, surgem novos direitos inerentes a tal premissa, todos com o mesmo condão: garantir uma vida digna a todos.
Considera-se, portanto, que a dignidade da pessoa humana é mais que um direito fundamental, é a razão de existência do Estado. A dignidade estabelece limites de atuação do estado, ao intuito de estabelecer condições materiais, físicas e morais a todos, bem como oferecer um mínimo existencial necessário a quem necessite.
Os direitos humanos fundamentais surgiram como resultado da fusão de várias fontes ideológicas, advindo dos costumes e tradições das civilizações, tornando-se fonte moral da razão humana provenientes de pensamentos filosóficos jurídicos. De acordo com Moraes (2011, p. 02), a necessidade de contemplar os direitos fundamentais veio “da necessidade de limitação e controle dos abusos de poder, do próprio Estado e de suas autoridades constituídas, a consagração dos princípios básicos da igualdade e da legalidade como regentes do Estado moderno e contemporâneo”.
Assim, os direitos fundamentais são anteriores à ideia de constitucionalismo, diante da necessidade de se afirmar um rol mínimo de direitos básicos que viesse a garantir o bem-estar de todos e a soberania da vontade popular. O Direito Constitucional é um ramo do Direito Público, pelo qual estabelece o modo de organização e funcionamento do Estado. Através dele, é possível conferir os elementos que propiciam a soberania estatal, conferindo-lhe estrutura, organização de suas instituições, o modo de aquisição e limitação do poder, bem como a previsão de garantias aos direitos fundamentais, ora em estudo (MIRANDA, 2014).
Os direitos fundamentais, portanto, encontram-se como preceitos absolutamente necessários ao direito constitucional e toda e qualquer regime democrático, de modo a enaltecer a importância da dignidade da pessoa humana, o pleno desenvolvimento da personalidade e a garantia às limitações do poder Estatal.
No ordenamento jurídico brasileiro o direito dos animais encontra-se disciplinado na Constituição Federal, em seu art. 225, § 1º, inciso VII, em consonância com a Declaração da Conferência das Nações Unidas de Estocolmo, de 1972, que determina que “protegerá a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade”. (BRASIL, 2017).
Percebe-se que o texto constitucional reconhece que os animais podem sofrer com atividades consideradas cruéis, as quais passaram a incomodar a sociedade de forma que as tornou reprováveis e, consequentemente, proibidas. Por conta disso, foi definido uma nova dimensão do direito à vida e a dignidade humana de forma extensiva aos animais, uma vez que o aludido artigo está contido no direito fundamental de terceira dimensão, que tem como finalidade assegurar os seres humanos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado (OLIVEIRA, 2017).
Além da Constituição Federal de 1988 assegurar a proteção animal, há a Lei nº 9.605 de 1998 que versa sobre os crimes ambientais e suas sanções, determinando a criminalização de atividades de abuso e maus tratos em face de qualquer espécie animal (BRASIL, 1998). Portanto, evidente que o ordenamento jurídico brasileiro visa assegurar a proteção dos animais contra atos de crueldade, de forma que quando ocorrer tal tipo de prática, as mesmas sejam punidas.
Ademais, pode-se perceber que a proibição de práticas que submetam os animais à crueldade está inserida no núcleo essencial dos direitos fundamentais, sendo o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Deste modo, analisa-se o desenvolvimento a respeito do direito dos animais, uma vez que tanto a ética como a lei estão evoluindo no sentido de assegurar os animais e, por conta disso, práticas que possuam teor de crueldade devem ser vedadas pelo Poder Público.
3. ABANDONO E MAUS TRATOS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Na contemporaneidade, diversas notícias a respeito de animais que foram vítimas de maus tratos ou abandono estão sendo veiculada nos meios de comunicação.
Os animais de estimação são as principais vítimas de tal prática, eis que são dependentes de seus tutores devido aos cuidados e a alimentação necessária, por razões inúmeras, tais como a velhice, alteração de residência, viagem, acometimento de doenças, nascimento de filhotes, dentre outros (SALLES, 2014).
Importante mencionar que o abandono é compreendido como um delito grave, eis que é caracterizado como maus-tratos, ou seja, um ato de violência. Ademais, o maus-tratos pode ser consumado com a prática de agressões físicas, tais como espancamento, envenenamento, mutilação, manter o animal preso a cordas ou correntes, manter em locais pequenos, sem higiene, ventilação, exposto ao sol ou chuva, não alimentar corretamente, não prestar auxílio ao animal ferido, submeter o mesmo a tarefas exaustivas, dentre outros (SALLES, 2014).
A vista disso, Natalino (2016, p. 01) pondera que “além de cruel e desumano, abandonar animais em logradouros públicos é crime e quem cometê-lo deve ser punido com prisão, multa e perda da guarda do animal, de acordo as leis vigentes”.
No ordenamento jurídico brasileiro a prática está elencada no art. 164, do Código Penal, que define o delito de introdução ou abandono de animais em propriedade alheia (BRASIL, 1940). Apesar de tal tipo penal, este não se enquadra em diversas situações de abandono, eis que a tipificação é designada a responsabilização de abandonos que há prejuízos ao dono do local onde o animal fora abandonado, e não ao tutor em si.
Diante de tal lacuna, a Lei nº 9.605 de 1998 encarregou-se de destinar a responsabilização ao indivíduo que cometer maus tratos, nos termos do art. 32, sob pena de detenção de três meses a um ano e multa (BRASIL, 1998).
O aludido dispositivo trata-se de tipificar um crime comum, doloso, material, de dano, unissubjetivo, não transeunte, plurissubsistente e de ação múltipla, com a finalidade de tutelar a incolumidade dos animais (AMADO, 2014).
Ressalta-se, ainda, que o ilícito usualmente é instantâneo, porém, se a conduta se estender no tempo, será permanente. Em regra, é comissivo, no entanto, poderá se consumar através da omissão imprópria, como em casos em que o tutor de um animal o deixa sem alimentação objetivando maltratá-lo, uma vez que o tutor possui a condição penal de garantidor (AMADO, 2014).
Deste modo, analisa-se que o sujeito que pratica o abandono e/ou maus tratos deverá responder pelos seus atos com base na Lei de Crimes Ambientais.
Ressalta-se que no ano de 2020 foi aprovado pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República a ei nº 14.064/20, que inseriu o art. 32, § 1-A na Lei nº 9.605/98, majorando a pena para reclusão de dois a cinco anos, multa e proibição de guarda, em casos que os animais vitimados forem domésticos (BRASIL, 2020).
O início do ano de 2020 foi marcado por um surto de um misterioso vírus que causa, em sua maioria das vezes, pneumonia, originado por uma variação do coronavírus. O primeiro caso ocorreu em dezembro de 2019 na cidade de Wuhan, na China e desde então o número de pessoas contaminadas só foi progredindo, caracterizando a infecção como um surto. Por estas razões, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou a situação como uma emergência em saúde pública de interesse internacional, em janeiro de 2020 (WHO, 2020).
O coronavírus trata-se de um vírus encontrado pela primeira vez em 1937 e, posteriormente, no ano de 1965 foi denominado como coronavírus, tendo em vista que possui um perfil na microscopia semelhante a uma coroa. Nos anos de 2002 e 2003 a OMS notificou um total de 774 falecimentos decorrentes do referido vírus e, em 2012, foram confirmadas 858 mortes também decorrentes do COVID-19. Na sequência, já no ano de 2019 e 2020 houve uma mutação no RNA do vírus, que acabou se expandindo até mesmo de forma assintomática em alguns indivíduos, através de uma infecção emergente, trazendo sintomas mais leves, no entanto, com uma taxa de transmissão muito elevada, o que gerou impactos preocupantes para os sistemas de saúde do mundo todo (CHANG, YAN, WANG, 2019).
Ao longo da história, a humanidade já viveu experiências decorrentes de outras pandemias, tais como a varíola, o sarampo, a gripe espanhola, gripe asiática, gripe aviária, dentre outras (ANDRADE et al., 2009). Atualmente, o mundo vive a pandemia do Covid-19, que trazem cada dia mais números alarmantes, com dimensões globais.
Com o impacto da pandemia do novo Corona vírus nas atividades do país e no mundo, o Governo Brasileiro adotou medidas para tentar diminuir e amenizar a crise. Diversos estados e cidades decidiram por adotarem o isolamento social para os casos suspeitos e o distanciamento social em escala geral, determinando quarentena e liberando o funcionamento apenas de serviços essenciais, com o objetivo de reduzir o fluxo de pessoas e evitar aglomerações para diminuir a propagação do vírus, gerando diversas mudanças em inúmeras áreas, especialmente no direito.
Tal pandemia afetou diretamente os números de animais abandonados ou resgatados após maus-tratos, com o número de aproximadamente 185 mil animais, os quais 96% são cães e 4% tratam-se de gatos. A pesquisa foi realizada através de um levantamento elaborado pelo Instituto Pet Brasil (IBP), juntamente a 400 ONGs de todo o país, demonstrando que a vulnerabilidade mais do que duplicou no Brasil entre 2018 e 2020 (PUENTE, 2022).
Deste modo, verifica-se um avanço legislativo no tocante aos maus tratos em relação aos cães e gatos, visto que os números demonstram que essas espécies são as maiores vítimas dos seres humanos, especialmente por serem animais domésticos, porém ainda é fundamental a efetivação de forma devida no aumento de pena, bem como melhoria do trabalho eficaz do judiciário.
Na atualidade, a grande parte dos ilícitos de animais, dependendo do trâmite judiciário ou policial, os sujeitos são liberados após o pagamento da fiança ou a pena é substituída por penas restritivas de direitos, as quais podem ser convertidas em prestação de serviços à comunidade, ou pagamento de multa (BRASIL, 1998).
Visando tornar mais efetivo a penalização da prática do delito de maus-tratos animais e conscientizar as pessoas a respeito do assunto, percebe-se que substituição da pena poderia ser revertida em prol da causa animal.
Tal fato é de suma importância pois as prestações pecuniárias são destinadas ao sistema penitenciário ou demais organizações que apanham os apenados (SILVA, 2022).
Do mesmo modo, a prestação de serviços à comunidade poderia ser pensada de forma que o criminoso cumpra sua pena de forma pedagógica, ou seja, realize atividades ligadas ao tipo do delito que cometeu, visando trazer reflexões e aprendizados que evitem a reincidência (SILVA, 2022).
Logo, o sistema penitenciário deve refletir a respeito de como potencializar a conscientização sobre os maus tratos animais, executando as funções do Estado de proteção.
Desta forma, uma maneira de demonstrar que todos os seres vivos são dignos de amor, respeito e cuidado, não é apenas aplicando e majorando as penas, mas tornando elas pedagógicas, de forma que as multas sejam repassadas para organizações que auxiliam nas causas animais, para ajudar as ONG’s e projetos no combate aos maus tratos aos animais. Tal destinação é importante, eis que o Estado não possui estrutura, nem políticas públicas suficientes para o recebimento, tratamento e futuras doações dos animais vítimas.
Do mesmo modo, a Prestação de Serviço à Comunidade realizadas pelos cumpridores de penas irão contribuir com os voluntários que cuidam desses animais, além de tal ação ser capaz de ressocializar, sensibilizar e conscientizar os apenados.
O presente estudo analisou um dos direitos fundamentais que estão elencados na Constituição Federal, quais sejam: o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, que tem como finalidade assegurar à fauna, decorrente da proibição aos maus tratos contra os animais.
O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito fundamental de terceira dimensão que tem como objetivo assegurar a qualidade de vida da presente e futura geração. Por conta disso, faz parte do núcleo material da dignidade da pessoa humana, que é composta de um mínimo existencial, em uma interpretação extensiva do art. 60, § 4°, inciso IV da Constituição Federal, portanto, é considerado uma cláusula pétrea.
Outro fator demonstrado foi que para garantir a efetividade do referido direito, o Estado deve assegurar a fauna e a flora, proibindo práticas que submetam os animais à crueldade, nos termos do art. 225, § 1º, inciso VII do mesmo diploma legal.
O direito animal é um assunto complexo, que necessita de debates e reflexões importantes, para que o meio ambiente seja devidamente respeitado e assegurado pelos seres humanos.
Foi verificado que os maus-tratos é um assunto atual e muito recorrente nos noticiários brasileiro, especialmente após a pandemia do Corona vírus, que mais do que duplicou o número de animais em situações de maus-tratos.
Apesar de haver legislação específica sobre o tema, bem como uma reforma que majorou a punição para as pessoas que praticam tal ilícito, a norma não é suficiente para evitar tais práticas e, principalmente para conscientizar as pessoas a não realizarem esses atos cruéis.
Deste modo, pode-se concluir com a presente pesquisa que uma maneira mais eficaz seria tornar as punições mais pedagógicas, de forma que as multas sejam repassadas para organizações que auxiliam nas causas animais, bem como a Prestação de Serviço à Comunidade serem realizadas pelos cumpridores de penas em favor de tais locais, visando contribuir com os voluntários que cuidam desses animais.
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Graduanda do Curso de Direito pela Universidade Brasil
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MARQUES, Tawany de Paula. Abandono e maus tratos aos animais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 dez 2022, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60708/abandono-e-maus-tratos-aos-animais. Acesso em: 21 nov 2024.
Por: gabriel de moraes sousa
Por: Thaina Santos de Jesus
Por: Magalice Cruz de Oliveira
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