1 - CONCEITO E ESPÉCIES
Por processo coletivo entende-se aquele que envolve uma relação jurídica litigiosa coletiva, isto é, o sujeito ativo ou passivo encontra-se em um grupo ou se encontra em direito, dever ou estado de sujeição.
Microssistema processual coletivo, por sua vez, enfatiza o policentrismo do direito contemporâneo, sendo formado pela Constituição Federal de 1988, Código de Processo Civil de 2015 e leis especiais.
Conforme o Superior Tribunal de Justiça, tal microssistema envolveria, ainda, a Lei de Improbidade Administrativa, a Lei de Ação Civil Pública, a Lei de Ação Popular, a lei que regulamenta o mandado de segurança coletivo, o Código de Defesa do Consumidor, o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Estatuto do Idoso, compondo o que convencionou chamar de microssistema de interesses transindividuais que interpenetram-se e subsidiam-se.
Conforme Fredie Didier, o “micromodelo processual do Estado” é composto por leis e interpretações sobre o direito coletivo que favorecem o Estado em detrimento do cidadão, dificultando a tutela coletiva, razão pela qual seriam inconstitucionais.
Acolhendo, em parte, o entendimento do doutrinador, o Supremo Tribunal Federal recentemente proferiu decisão no sentido de declarar a inconstitucionalidade do artigo 16 da Lei de Ação Civil Pública (RE 1101937):
“I - É inconstitucional a redação do art. 16 da Lei 7.347/1985, alterada pela Lei 9.494/1997, sendo repristinada sua redação original.
II - Em se tratando de ação civil pública de efeitos nacionais ou regionais, a competência deve observar o art. 93, II, da Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor).
III - Ajuizadas múltiplas ações civis públicas de âmbito nacional ou regional e fixada a competência nos termos do item II, firma-se a prevenção do juízo que primeiro conheceu de uma delas, para o julgamento de todas as demandas conexas.”
A fim de uma melhor compreensão do tema, tem-se que os direitos e/ou interesses coletivos tuteláveis podem ser assim divididos:
ESSENCIALMENTE COLETIVOS |
ACIDENTALMENTE COLETIVOS |
|
COLETIVOS (stricto sensu) |
DIFUSOS |
INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS |
Transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular GRUPO, CATEGORIA OU CLASSE de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma RELAÇÃO JURÍDICA BASE |
Transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e LIGADAS POR CIRCUNSTÂNCIAS DE FATO (não há relação jurídica) |
Decorrentes de ORIGEM COMUM. Divisíveis, titulares determinados ou determináveis. STF: direitos subjetivos, todavia, transcendem interesses puramente particulares |
Há quem entenda, ainda que direito não se confunde com interesse. Isso porque, enquanto o primeiro seria algo subjetivo, inerente ao indivíduo, o segundo seria aquele legítimo, geral.
Em um mesmo processo, é possível que se tutelem 3 (três) direitos coletivos, não estando ligados por relação de exclusão, mas de complementariedade.
2 - FASES DO PROCESSO COLETIVO
O Ministro Teori Zavascki possui interessante teoria para as fases da tutela coletiva dos direitos individuais homogêneos.
Segundo o eminente jurista, a primeira fase seria composta pela ação coletiva propriamente dita, isto é, pelo núcleo de homogeneidade, enquanto em um segundo momento, caracterizado pelo cumprimento de sentença, já passaria a ter certa margem de heterogeneidade.
Fredie Didier ainda acrescenta uma terceira, denominada de “Fluid Recovery”, caracterizada pela possibilidade de liquidação e execução subsidiárias pelos legitimados do artigo 82 do CDC após 1 (um) ano sem habilitação de interessados.
3 - PRINCIPIOLOGIA
Como princípios do processo coletivo, é possível citar, o devido processo legal ou social, dentro do qual se encontram as adequadas representação, competência, certificação, informação, publicidade e coisa julgada diferenciada, adiante melhor explanada.
Além disso, como regra, a demanda coletiva é indisponível, dado que interessa a toda uma coletividade, e não a um único indivíduo. Como exceção, tem-se o princípio da disponibilidade motivada da ação coletiva, isto é, havendo fundamento, o Ministério Público pode não ajuizar ou continuar a demanda coletiva.
No entanto, uma vez ajuizada e proferida sentença, a demanda executiva é sempre obrigatória, devendo o dano ser integralmente reparado (princípio da reparação integral do dano).
Prosseguindo na parte principiológica, ainda é possível citar a integração do microssistema processual coletivo, pelo qual este dialoga com outras fontes. Ex.: a aplicação do Código de Processo Civil é supletiva e subsidiária.
Diversamente do procedimento comum, o processo coletivo, de maneira geral, é regido pela não taxatividade e atipicidade. Isso porque há direitos coletivos atípicos e todos os procedimentos podem servir à tutela coletiva, inclusive os de jurisdição voluntária.
Outro ponto divergente é a predominância de aspectos inquisitoriais, possibilitando que juiz aja de forma mais participativa, decisiva e dirigente, tendo em vista os interesses envolvidos.
Neste ponto, cumpre ressaltar o que se convencionou denominar, em âmbito doutrinário, de “calibração diferenciada”, é dizer, quanto maior a vulnerabilidade, maior a complexidade do processo, logo, mais participativo o juiz deve ser.
Por fim, o princípio da primazia das decisões coletivas sobre as individuais. Como exemplo, os repetitivos, que suspendem as ações individuais no aguardo do julgamento da ação coletiva. Ressalta-se, no entanto, que tal princípio não é absoluto, devendo haver um prazo para tanto, de modo que não afronte a duração razoável do processo, princípio igualmente relevante e que deve ser ponderado no caso concreto.
4 - COMPETÊNCIA
Consoante dispõe o artigo 93 do Código de Defesa do Consumidor:
Art. 93. Ressalvada a competência da Justiça Federal, é competente para a causa a justiça local:
I - no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, quando de âmbito local;
II - no foro da Capital do Estado ou no do Distrito Federal, para os danos de âmbito nacional ou regional, aplicando-se as regras do Código de Processo Civil aos casos de competência concorrente.
Assim, ressalvada a competência da Justiça Federal, é competente para a causa a justiça do local onde ocorreu ou deva ocorrer o dano de âmbito local, e a capital do Estado ou o Distrito Federal para danos de âmbito nacional ou regional, aplicando-se as regras do CPC aos casos de competência concorrente.
Nesse contexto, surgiu o denominado “fórum shopping”, que nada mais é do que a escolha do juízo de competência concorrente para apreciar a lide de acordo com os seus interesses.
Conforme o princípio da competência adequada, o juiz pode controlar a competência valendo-se da teoria do “forum non conveniens”, que nasceu como freio ao fórum shopping, a fim de evitar abusos. Desse modo, o juiz pode declinar a competência para um juízo que considere mais adequado, desde que o faça de forma fundamentada.
A competência na Lei de Ação Civil Pública é funcional territorial (absoluta) do foro do local do dano.
A propositura previne a jurisdição. No entanto, em atenção ao princípio da competência adequada, o STJ já entendeu como possível a relativização dessa regra (visão macroscópica dos danos ocasionados).
Em regra, competência para julgar a Ação Popular é do juízo de 1º grau, ainda que ajuizada contra atos e/ou omissões do Presidente, não havendo que se falar em foro por prerrogativa de função.
Excepcionalmente, o STF ficará encarregado do julgamento quando a ação interessar à totalidade de juízes ou a causa envolver conflito federativo envolvendo União e Estados ou DF.
Ainda no que tange à ação popular, cumpre tecer maiores considerações, tendo em vista as recentes decisões proferidas.
A ação popular é prevista no art. 5º, LXXIII, da CF/88:
Art. 5º (...)
LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;
No âmbito infraconstitucional, esta ação é regulamentada pela Lei nº 4.717/65, recepcionada pela CF/88.
O art. 5º da Lei nº 4.717/65 trata sobre a competência da ação popular, mas não traz nenhuma regra sobre a competência territorial.
O art. 22 da Lei, por sua vez, afirma que devem ser aplicadas, subsidiariamente, as regras do CPC, naquilo que não contrariar os dispositivos da lei nem a natureza específica da ação.
O art. 51, parágrafo único, do CPC autoriza que o autor da ação popular ajuíze a ação tanto no foro de seu domicílio como também no local onde ocorreu o fato.
Logo, regra geral, a ação popular pode ser ajuizada no foro do domicílio do autor, ou no local em que ocorrido o dano, à escolha do proponente. Isso porque, a ação popular representa um direito político fundamental, devendo-se facilitar, portanto, o seu exercício.
Ocorre que o STJ já admitiu uma exceção:
Em face da magnitude econômica, social e ambiental do caso concreto (responsabilidade civil e ambiental envolvendo o rompimento da barragem de Brumadinho), é possível a fixação do juízo do local do fato para o julgamento de ação popular que concorre com diversas outras ações individuais, populares e civis públicas decorrentes do mesmo dano ambiental. STJ. 1ª Seção. CC 164.362-MG, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 12/06/2019 (Info 662).
Os fundamentos utilizados pelo STJ, consistiram, basicamente:
1) A definição do foro competente para a apreciação da ação popular em temas como o de direito ambiental exige a aplicação, por analogia, da regra pertinente contida no art. 2º da Lei da Ação Civil Pública:
Art. 2º As ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa.
Parágrafo único. A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto.
2) Princípios do Direito Ambiental: assegurar a apuração dos fatos pelo órgão judicante que detém maior proximidade com o local do dano e, portanto, revela melhor capacidade de colher as provas de maneira célere e de examiná-las no contexto de sua produção.
3) A sobreposição do foro do domicílio do autor ao foro onde ocorreu o dano ambiental acarretará prejuízo ao próprio interesse material coletivo tutelado por intermédio desta ação, em benefício do interesse processual individual do cidadão, em manifesta afronta à finalidade mesma da demanda por ele ajuizada.
4) Ausência de prejuízo para o autor da ação popular: devido ao processamento eletrônico, as dificuldades decorrentes da redistribuição para local distante do domicílio do autor são significativamente minimizadas, se não totalmente afastadas, em decorrência da possibilidade de acesso integral aos autos por meio do sistema de movimentação processual.
Contudo, em 2022, o STJ, no julgamento do AREsp 1966684-ES, decidiu o seguinte:
Em ação que tem por objeto apenas a reparação de danos morais e materiais suportados por pescadores em razão do rompimento da barragem de Fundão em Mariana/MG, não se discutindo a responsabilização do Estado, não prevalece a competência da 12ª Vara Federal de Belo Horizonte, permitindo-se o ajuizamento no foro de residência do autor ou no local do dano. STJ. 4ª Turma.AgInt no AREsp 1966684-ES, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 17/10/2022 (Info 758).
Assim, apesar de similares, há que se fazer uma distinção:
1) Nas demandas em que discutida a responsabilização civil e ambiental do Estado por danos de grande magnitude, de que é exemplo o rompimento de barragens, é possível que se imponha o foro do local do dano aos autores de ação popular;
2) No entanto, em caso de ações individuais ajuizadas, visando tão somente ao ressarcimento de danos morais e materiais (natureza eminentemente privada), é plenamente possível que o autor opte pelo foro de seu domicílio, instrumento que se mostra consentâneo com a garantia de acesso à justiça constitucionalmente assegurada.
Conexão é fato jurídico que determina a modificação de competência, não se confundindo com prevenção, critério utilizado para saber em qual dos juízos as causas devem ser reunidas.
A propositura previne para as causas que tenham mesma causa de pedir ou mesmo objeto (pedido). Todavia, não serão reunidos se um já houver sido julgado.
Mitigação: no processo coletivo, se o conflito decorre de competência absoluta, não há restrição a seu conhecimento após prolatada a sentença, desde que não tenha havido trânsito em julgado (STJ).
Reconhecida a continência, devem ser reunidas na Justiça Federal a Ação Civil Pública proposta nesta e na Justiça Estadual (súmula nº 489 do STJ).
5 - LITISPENDÊNCIA
Litispendência possui dois significados: pendência de causa ou pressuposto processual negativo.
Ocorre que a legitimidade ativa ad causam nas ações coletivas é extraordinária, concorrente e disjuntiva, de modo que raras são as situações de litispendência por identidade de elementos (partes, pedido e causa de pedir).
Assim, quando ocorrer litispendência (processos com o mesmo conteúdo = identidade de situação jurídica, ainda que partes e/ou pedidos sejam diversos) com partes diversas, a solução é a reunião para processamento simultâneo ou, caso não seja possível, a suspensão de um ou de alguns.
Denota-se, pois, que a identidade de ritos é irrelevante. No entanto, não é possível haver litispendência entre ação coletiva de direito difuso e de direitos individuais homogêneos, pois há relação de preliminaridade, dado que a procedência da que julga direito difuso torna desnecessária a individual (extensão in utibilus da coisa julgada coletiva para o plano individual).
Além disso, ações coletivas não induzem litispendência para ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes não beneficiarão os autores das ações individuais se não requerida sua suspensão em até 30 (trinta) dias.
Necessário que seja informado acerca do processo coletivo, a fim de que exerça o seu “right do opt out”, isto é, direito de optar por ser excluído.
O CDC prevê legitimidade concorrente do Ministério Público, União, Estados, DF, Municípios, órgãos da administração direta e indireta, ainda que sem personalidade jurídica e associações legalmente constituídas há, pelo menos, 1 (um) ano, dispensada autorização.
Aqui cumpre fazer uma relevante diferenciação, bastante explorada pelas bancas examinadoras de concursos públicos nos últimos tempos:
LEGITIMAÇÃO ORDINÁRIA |
LEGITIMAÇÃO EXTRAORDINÁRIA |
Defende em nome próprio interesse próprio |
Defende em nome próprio interesse alheio |
É parte processual e material |
É parte processual, mas não material |
Existem, basicamente, três correntes acerca da legitimidade nos processos coletivos: legitimidade ordinária; extraordinária (prevalece na doutrina e no STJ) e autônoma. Fredie Didier diz que nas comunidades indígenas há legitimação ordinária e extraordinária.
Trata-se, ainda, de legitimação plúrima (vários legitimados) e mista (entes da sociedade civil e do Estado).
Como características da legitimação coletiva é possível citar: a substituição processual autônoma (legitimado pode conduzir o processo independentemente da participação do titular do direito), exclusiva (legitimado é parte principal, cabendo ao titular do direito apenas intervir como assistente litisconsorcial nos casos de direitos individuais homogêneos), concorrente (colegitimação, pois há vários legitimados extraordinários) e disjuntiva (apesar de concorrentes, não precisam atuar conjuntamente).
Em relação ao controle jurisdicional da legitimação coletiva, existe divergência: enquanto alguns defendem tratar-se de rol legal taxativo, existindo presunção absoluta de “representantes adequados”, outros preceituam ser necessário filtro judicial para considerar a legitimação adequada ou não. Por fim, ainda existe uma terceira corrente, segundo a qual, o procedimento coletivo seria dividido em 2 fases: verifica-se se há previsão legal e analisa-se, no caso concreto, a adequação.
O Ministério Público e os entes políticos estão dispensados da demonstração de pertinência temática e representatividade adequada (exigíveis das associações e sindicatos), pois esta é presumida para aqueles, dadas as suas incumbências constitucionais.
No entanto, conforme o STF, o Ministério Público só tem legitimidade para direitos individuais de natureza disponível se houver relevância social.
Na ausência de legitimação coletiva ativa, haverá a sucessão processual, o que se mostra consentâneo com a primazia da decisão de mérito e a indisponibilidade da demanda coletiva.
Trilogia estrutural dos litígios coletivos: Conforme esta teoria, os litígios coletivos podem ser assim subdivididos:
a) Globais: grupos titulares não divergem, o interesse é comum e o bem indeterminado. Não há dificuldade de identificar o legitimado adequado;
b) Locais: coesão e homogeneidade dos grupos. Fácil identificar o legitimado adequado;
c) Difusão irradiada: divergências entre grupos; controle de legitimação deve ser mais intenso. Deve privilegiar instituições não parciais.
Intervenção de terceiro é admitida na modalidade assistência, que pressupõe interesse jurídico. Não é possível que o indivíduo intervenha, no entanto, nas causas envolvendo direitos difusos ou coletivos stricto sensu, ficando a exceção por conta dos casos repetitivos.
Ademais, na ação popular o cidadão é colegitimado à tutela coletiva, podendo intervir no feito que tenha objeto semelhante.
No que se refere aos direitos individuais homogêneos, a assistência dar-se-á do seguinte modo: publica-se edital no órgão oficial para que eventuais interessados possam intervir como litisconsortes (litisconsórcio ulterior).
O STF entende que o Estado não pode ser autor em ação popular, remédio privativo do cidadão. Há quem defenda que MP e associações podem atuar como litisconsortes do autor, sob o argumento de que a lei de ação civil pública autoriza que em caso de desistência o Ministério Público ou outro cidadão assuma a causa.
O amicus curiae é admitido, quando comprovada a relevância da matéria, a especificidade do tema ou a repercussão social da controvérsia, geralmente presentes nas demandas coletivas.
Intervenção móvel, pendular ou despolarização da demanda refere-se à possibilidade de a Fazenda Pública passar a atuar ao lado do autor na demanda coletiva, caracterizando-se como verdadeira flexibilização da estabilidade subjetiva do processo.
É possível, inclusive, que o mesmo ente ocupe ambos os polos, se houver interesse em parte do pedido do autor e parte do réu (STJ).
A legitimidade para executar e liquidar a sentença coletiva, a princípio, é dos próprios titulares do direito ou dos sucessores. Apenas em caso de inércia, serão os órgãos do art. 82 legitimados para tanto (fluid recovery).
No que tange à legitimidade das associações, necessária a seguinte distinção (tabela retirada do site Dizer o Direito, do professor Márcio André Lopes Cavalcante):
As associações precisam de autorização específica dos associados para ajuizar ação coletiva? Quando uma associação ajuíza ação coletiva, ela atua como representante processual ou como substituta processual? |
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1) Ação coletiva de rito ordinário proposta pela associação na defesa dos interesses de seus associados: SIM |
2) Ação civil pública (ação coletiva proposta na defesa de direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos): NÃO |
A associação, quando ajuíza ação na defesa dos interesses de seus associados, atua como REPRESENTANTE PROCESSUAL e, por isso, é obrigatória a autorização individual ou assemblear dos associados. |
A associação, quando ajuíza ação na defesa de direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos, atua como SUBSTITUTA PROCESSUAL e não precisa dessa autorização. |
Aplica-se o entendimento firmado pelo STF no RE 573232/SC (veja abaixo). |
O entendimento firmado no RE 573232/SC não foi pensado para esses casos. |
O disposto no artigo 5º, inciso XXI, da Carta da República encerra representação específica, não alcançando previsão genérica do estatuto da associação a revelar a defesa dos interesses dos associados. As balizas subjetivas do título judicial, formalizado em ação proposta por associação, é definida pela representação no processo de conhecimento, presente a autorização expressa dos associados e a lista destes juntada à inicial. STF. Plenário. RE 573232/SC, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, julgado em 14/5/2014 (repercussão geral) (Info 746). |
(...) 1. Ação civil pública, ajuizada pelo Movimento das Donas de Casa e Consumidores de Minas Gerais, na qual sustenta a nulidade de cláusulas de contratos de arrendamento mercantil. (...) 3. Por se tratar do regime de substituição processual, a autorização para a defesa do interesse coletivo em sentido amplo é estabelecida na definição dos objetivos institucionais, no próprio ato de criação da associação, sendo desnecessária nova autorização ou deliberação assemblear. (...) 9. As teses de repercussão geral resultadas do julgamento do RE 612.043/PR e do RE 573.232/SC tem seu alcance expressamente restringido às ações coletivas de rito ordinário, as quais tratam de interesses meramente individuais, sem índole coletiva, pois, nessas situações, o autor se limita a representar os titulares do direito controvertido, atuando na defesa de interesses alheios e em nome alheio. (...) STJ. 3ª Turma. AgInt no REsp 1799930/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 26/08/2019. |
Tratando-se de interesse ou direito difuso, promovida a ação coletiva por um dos legitimados, a coisa julgada terá eficácia de coisa julgada erga omnes, salvo se o pedido de improcedência for por insuficiência de provas (coisa julgada secundum eventum probationis), hipótese em que qualquer legitimado poderá ingressar com nova ação, com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.
6 - COISA JULGADA NAS AÇÕES COLETIVAS
No caso de direito coletivo stricto sensu, a coisa julgada será ultra partes para o grupo, categoria ou classe, salvo se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas (coisa julgada secundum eventum probationis).
Já nos casos de direitos difusos, a coisa julgada alcança toda a coletividade (erga omnes), salvo improcedência por insuficiência de provas, caso em que poderá qualquer legitimado propor nova ação, desde que com nova prova.
Por fim, em se tratando de direitos individuais homogêneos, a coisa julgada será erga omnes no caso de procedência do pedido.
Nesses casos, a vítima ou o sucessor poderão promover liquidação e/ou execução fundada na sentença de procedência, não sendo necessário o ajuizamento de ação condenatória.
Já no caso de improcedência da ação, ainda que por insuficiência de provas, também há a formação de coisa julgada material, somente podendo o indivíduo prejudicado promover sua ação individual condenatória, desde que não tenha ingressado no processo coletivo como litisconsorte ou assistente litisconsorcial.
Conforme o Superior Tribunal de Justiça:
1) Se a ação coletiva envolvendo direitos individuais homogêneos for julgada procedente: a sentença fará coisa julgada erga omnes e qualquer consumidor pode se habilitar na liquidação e promover a execução, provando o dano sofrido;
2) Se a ação coletiva envolvendo direitos individuais homogêneos for julgada improcedente (não importa o motivo):
A) os interessados individuais que não tiverem intervindo no processo coletivo como litisconsortes poderão propor ação de indenização a título individual.
B) não cabe a repropositura de nova ação coletiva mesmo que por outro legitimado coletivo (não importa se ele participou ou não da primeira ação; não pode nova ação coletiva).
No caso das ações coletivas, regra geral, a coisa julgada oferece peculiaridades secundum eventum litis (segundo o evento da lide), ou seja, dependendo do resultado do processo, a sentença poderá alcançar coisa julgada erga omnes ou ultra partes (a depender da categoria de direito coletivo em que se fundou a ação), ou não fazer coisa julgada.
Por fim, destaque-se o chamado reexame necessário invertido, sendo obrigatória a remessa oficial da sentença que julga improcedente ação popular ou ação civil pública.
Advogada. Pós-graduada em Direito Público. Pós-graduada em Direito Administrativo e Gestão Pública. Autora dos livros - "Audiência de Custódia: Alternativa à Cultura do Encarceramento Enraizada no Sistema Penitenciário Brasileiro" (2019); e - "A (Im)prescritibilidade das Ações de Ressarcimento por Dano Causado ao Erário: Interpretando o art. 37, § 5º, da CF, à luz do entendimento do Supremo Tribunal Federal" (2019). Professora no Conteúdos PGE.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARROS, Marcela Pedrosa. Direito processual coletivo: conceito, princípios e especificidades Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 jan 2023, 04:48. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60886/direito-processual-coletivo-conceito-princpios-e-especificidades. Acesso em: 21 nov 2024.
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
Por: PRISCILA GOULART GARRASTAZU XAVIER
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