BRUNO NOGUEIRA REBOUÇAS[1]
(Coautor)
RESUMO: Como o própria nome do estudo suscita, o presente artigo compreende o princípio da legalidade tributária, a reserva de lei complementar e a não incidência do ICMS em caso de serviços de transmissão e distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica, o que passou a ser convalidado ainda mais a partir da edição da Lei Complementar nº 194, de 2022, que veio tratar a referida situação como caso de não incidência do imposto estadual, de forma a não compor a base de cálculo do Imposto sobre Operações de Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) incidente sobre a energia elétrica.
Palavras-chave: Energia elétrica, ICMS, não incidência, base de cálculo, TUST, TUST, encargos de distribuição.
1. Introdução
No presente estudo será tratado não só da questão atrelada à legalidade tributária e a necessidade de sua conformação com as regras de competência rigidamente dispostas na Constituição e atribuídas aos entes federados, como ocorre particularmente me relação ao Imposto sobre Operações de Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), como a questão atrelada ao que usualmente se passou a denominar como reserva de lei complementar para tratar de normas gerais em matéria de impostos, como definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes (art. 146, Inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal), particularmente, neste último caso, quando se tratar da edição da Lei Complementar nº 194/2022, que tratou de aspetos atrelados à base de cálculo do ICMS incidente sobre energia elétrica.
A questão da reserva de certas matérias à lei complementar tributária, como decorreu da nova redação atribuída ao art. 3º da Lei Complementar nº 87/1996 pela Lei Complementar nº 194/2022, não deixa de ser uma reconhecida como uma forma de incrementar e valorizar o princípio da legalidade tributária. Nesse sentido, como bem pontuado por Hugo de Brito Machado, “também fortalecem o princípio da legalidade tributária o fato de haver sido proibida a delegação de competência reservada à lei complementar”[2], o que foi feito a partir da edição da Emenda Constitucional nº 32/2001.
Nesse sentido, a lei complementar teria o condão de incrementar a legalidade tributária a partir de uma vedação de que o Poder Executivo pudesse atuar por meio de edição de medidas provisórias em relação a matérias constitucionalmente reservadas `lei complementar, dando maior relevo à atuação do Poder Legislativo nesse aspecto. Como será visto em tópico específico do presente estudo, a lei complementar exerce importante função em matéria tributária, especificamente quando se fala de temas a ela reservados pelo constituinte.
2. A ideia de matéria “reservada” à lei complementar e a valorização do princípio da legalidade tributária em matéria de ICMS
A nossa Constituição de 1988 é considerada rígida, e particularmente nosso sistema constitucional tributário é caracterizado por esse evidente teor de rigidez, que, como bem salienta Carlos Augusto Daniel Neto, assim o é com o intuito de imprimir “um tom consentâneo ao compromisso de proteção e garantia que essa estrutura implica, impondo a adoção de um proxy formalista decorrente de uma orientação eminentemente voltada à segurança jurídica do contribuinte”[3], ao passo que a rigidez de um sistema jurídico constitucional se torna, como bem salientado por Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, “como elemento necessário à estabilidade das instituições”[4], de modo que o “poder legislativo recebe competência dentro da regra constitucional, regra não susceptível de modificação pelo rito ordinário das leis”[5], o que só reforça a ideia de uma busca por um ideal de segurança jurídica e proteção da confiança por meio dessa rigidez.
Essa rigidez do sistema tributário brasileiro garante, ao mesmo tempo, uma rígida repartição de competências impositivas entre os entes tributantes (União, Estados, Municípios e Distrito Federal), de sorte a garantir – ao mesmo sob a perspectiva do exercício de tais competências – que um pedaço justo de arrecadação tributária seja garantido a cada ente federativo, ao mesmo tempo que que se incrementa sua autonomia financeira dentro da Federação.
Não que essa seja a única forma de garantia de autonomia financeira aos entes federados, de modo que Luís Eduardo Schoueri chega a afirmar que “a discriminação de competências tributárias não é requisito de um sistema federal”[6]; mas, sem dúvidas, notadamente frente a nosso histórico federativo, torna-se a atribuição e distribuição de competências impositivas um modelo que se tornou e se convalidou, com o passar dos anos, em nossa experiência histórico-cultural constitucional como Federação. Como bem pontou Antonio Roberto Sampaio Dória, ao retroagir em sua análise a uma perspectiva histórica do federalismo brasileiro e da repartição de rendas entre os entes federados, pode-se inferir o seguinte acerca da temática:
No regime federativo, entretanto, onde coexistem paralelamente sobre um mesmo território duas ou mais ordens de poderes autônomos, cada qual competente, portanto, para gravar integralmente fatos, atos ou negócios ocorridos dentro de sua esfera territorial comum, a discriminação de rendas atribuída privativamente à União, Estados e Municípios é imperiosa exigência para o equilíbrio do sistema e desenvolvimento de sua economia.[7]
O mesmo autor, em outra obra, ressalta:
Desfaz-se, assim, a opinião comumente sustentada de ser a discriminação de rendas característica essencial do federalismo. De fato, e historicamente, não o é. A atribuição de competência tributária, sim, é requisito axiomático da federação, para assegurar independência política. Mas a circunstância de ser tal atribuição de competência decomposta numa discriminação de rendas compreensiva, objetivando, ao imprimir feitio privativo à respectiva competência fiscal, propósitos de natureza econômica, é fator, senão acidental, pelo menos secundário na definição da estrutura do regime federativo.[8]
Nesse mesmo sentido, interessante a reprodução das lições de Humberto Ávila:
O âmbito material das regras de competência é também especificado pelas leis complementares. Nesta hipótese, as leis complementares podem exercer duas funções: em primeiro lugar, limitar o âmbito material das regras de competência quando a Constituição o exige; em segundo lugar, determinar o âmbito material das regras de competência de modo a evitar conflitos de competência.[9]
Mesmo com fundamento em uma rígida discriminação de competências tributárias operada a partir do texto constitucional, com função de garantir não só segurança jurídica, mas, igualmente e em última instância, a preservação da independência política e do pacto federativo, sem que um ente possa invadir a competência particularmente e privativamente atribuída a outro ente federado, há situações de natural penumbra da atribuição de tais competências, gerando o que se convencionou chamar de conflito de competências em matéria tributária, gerando a necessidade de a lei complementar vir a regular de forma mais clara, para que não haja dúvidas quanto ao alcance de tais competências, regulando, inclusive, as limitações constitucionais ao seu exercício (art. 146, inciso II, da Constituição Federal), a trazendo normas gerais em matéria de impostos (art. 146, inciso III, da Constituição Federal), a fim de se dar um tratamento uniforme acerca do tema, algo que ganha maior relevância em um tributo como o ICMS.
Nesse sentido, a lei complementar teria um caráter de lei nacional, como já bem sedimentado na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal em decisão de relatoria do então Min. Octávio Gallotti, em que se transcreve trecho do voto do também então Min. Celso de Mello:
A lei complementar a que se refere o preceito inscrito no art. 146 da Carta Política tem caráter de lei nacional, projetando-se e impondo-se, na esfera jurídico-normativa, e no que concerne aos estritos limites materiais de sua incidência, à compulsória observância das pessoas estatais investidas, pelo ordenamento constitucional, de competência impositiva. Nessa condição formal, a lei complementar, que veicula regras disciplinadoras do conflito de competências tributárias e que dispõe sobre normas gerais de direito tributário, evidencia-se como espécie tributária que, embora necessariamente obediente às diretrizes traçadas pela Carta da República, constitui manifestação superior do próprio Estado Federal.[10] (grifos próprios)
Embora não possa confrontar a rígida discriminação de competências tributárias firmada precedentemente pelo legislador constituinte, sob pena se subversão hierárquica, a lei complementar, tendo assim caráter de lei nacional, pode esclarecer e ajudar a determinar situações que ainda se encontram em zonas de penumbra, ou casos não tão uniformemente esclarecidos entre os Estados (entes federados), dentro da abrangência do exercício de sua competência impositiva.
Como será visto, foi exatamente essa função da lei complementar, como uma norma geral, com caráter de lei nacional, para fins de uniformizar a base de cálculo do ICMS incidente sobre energia elétrica, que foi valorizada quando da edição da Lei Complementar nº 194/2022, alterando o art. 3º da Lei Complementar nº 87/1996 (Lei Kandir). Como já mencionado, a questão da reserva de certas matérias à lei complementar tributária, como decorreu da nova redação atribuída ao art. 3º da Lei Complementar nº 87/1996 pela Lei Complementar nº 194/2022, não deixa de ser uma reconhecida como uma forma de incrementar e valorizar o princípio da legalidade tributária, o que se prova, a título de exemplo, com base na vedação trazida pela Emenda Constitucional nº 32/2001 ao tratamento de matérias a ela reservadas e, por conta disso, vedadas de tratamento por meio de medidas provisórias.
Antes de tratar da Lei Complementar nº 194/2022, que deixou claro que as tarifas de distribuição e transmissão de energia não deveriam compor a base de cálculo do imposto estadual, será explorado o âmbito constitucional de incidência do ICMS-energia e a conformação com a legislação dos Estados a tal comando constitucional, o que a Lei Complementar nº 194/2022 só procurou, a posteriori, esclarecer em sua função de norma geral (art. 146, inciso III, da Constituição Federal) e como regulamentadora das limitações ao poder de tributar (art. 146, inciso II, da Constituição Federal) dos Estados, como se passa a demonstrar.
3. Âmbito constitucional de incidência do ICMS
O dispositivo constante do art. 155, inciso II, da Constituição Federal dispõe que compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.
Para efeitos didáticos, analisar-se-á cada um dos signos linguísticos mencionados, compreendidos no conceito de (i) operação, (ii) circulação e (iii) mercadoria, que compõe a regra de competência do imposto incidente sobre operações relativas à circulação de mercadorias, para depois tratar do âmbito material e quantitativo do ICMS-Energia, de forma a dimensionar o problema relativo à indevida inclusão de valores correspondentes à Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão de Energia Elétrica (TUST) e à Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) na base de cálculo do imposto estadual.
Propositalmente, inverteu-se a apresentação dos conceitos jurídicos de operações, circulação e mercadoria, de forma a evidenciar que tais signos linguísticos (operação, circulação e mercadoria) são logicamente indissociáveis dentro do contexto constitucional. Isso tudo, porque nos será de grande valia para a análise das operações que envolvem a circulação de energia elétrica.
3.1 Mercadoria
Primeiramente, vale perquirir acerca do significado do caráter mercantil que se exige a fim de que haja a incidência do ICMS, já que não parece perfeitamente claro, ao menos em alguns casos mais sensíveis, quais seriam os limites interpretativos para se considerar um bem como mercadoria sujeita à tributação.
Para isso, há de se que resgatar em que sentido a Constituição Federal albergou o conceito de mercadoria, particularmente para fins de incidência do imposto.
Num primeiro momento, pode-se inferir que o signo mercadoria, em mais larga acepção, alcança a ideia de um bem que terá por fim último o consumo, como bem pontua Alcides Jorge Costa[11], sendo, em síntese, o principal objeto remoto de negócio de quem a comercializa. É bem, pois dotado de valor; e com o fim de consumo, senão não faria sentido ser objeto da atividade econômica mercantil.
Por último, tem ele de ser objeto do negócio desenvolvido por seu titular, ou seja, de forma habitual (art. 4º da Lei Complementar nº 87/96), sob pena de não se diferenciar de outras categorias quaisquer de bens; pois é isso que o diferencia, ou seja, o exercício habitual de sua comercialização por seu titular, já que só determinada categoria de sujeitos terá a potencialidade de lhe dar a destinação que determina a natureza jurídica típica da atividade comercial, qualificando-o, ao fim e ao cabo, como mercadoria. Em outras palavras, se não houver habitualidade, podemos estar falando de um bem qualquer, mas que não necessariamente se qualifica como mercadoria.
Ainda assim, para efeitos da adoção de um conceito de mercadoria, como bem destinado ao comércio, pelo constituinte, há mais alguns aspectos que devem ser levados em consideração, estreitando-se ainda mais a moldura interpretativa que serve de receptáculo aos significados juridicamente atribuíveis ao vocábulo mercadoria.
Conforme lições extraídas a partir de Pontes de Miranda, “Mercadoria é o nome que se dá ao objeto da atividade comercial(...).”[12] Quer isso dizer que não se pode falar de mercadoria sem ser referir a uma atividade comercial que se desenvolva logo por detrás, o que está implícito na exigência de habitualidade de seu exercício. Como bem sintetizou Geraldo Ataliba,
Não é qualquer coisa que circula que se compreende no conceito constitucional do ICM, mas só mercadorias. Mercadoria, em termos técnico-jurídicos, universal e tradicionalmente, é objeto de uma atividade que juridicamente se qualifica como mercancia. Esta por sua vez é regulada por um ramo, se não cientificamente, pelo menos didaticamente discernível e definível como Direito Comercial.[13]
Por esse fato, o promotor de sua circulação jurídica de um bem deve ser alguém que se qualifica para tanto por desenvolver atividade econômica organizada e habitual de circulação de bens com o fim de lucro (este último aspectos referente ao intuito comercial de que trata o art. 4º da Lei Kandir, que será tratado mais a frente), tal qual se qualifica o comerciante/empresário para o Direito Empresarial.
Sustenta-se aqui, entretanto, que, pelo fato de o texto constitucional de 1988 ter entrado em vigor e produzido seus efeitos antes do novo Código Civil, ele albergou o conceito de mercadoria com base na ideia negócio jurídico (compra e venda) mercantil delineado ainda com base no Código Comercial de 1850, legislação então vigente à época, com as depurações e reparos que a doutrina e a jurisprudência já lhe vinham produzindo, modificando a essência do instituto, já que se tratava de legislação já antiga e relativamente “obsoleta” em diversos aspectos, o que fica notório frente às novas realidades que se apresentavam já anteriormente ao Código Civil de 2022, que revogou vários de seus dispositivos.
À época ainda do IVC (Imposto de Vendas e Consignações), Rubens Gomes de Sousa já afirmava, com toda razão, que “A venda pode ser mercantil ou civil. Venda mercantil é aquela em que pelo menos uma das partes seja comerciante (...).”[14]. Isso, como já reiterado, limita bastante aquele bem que pode ser intitulado como objeto do comércio ou não, considerando sua qualificação como mercadoria em razão do intuito de venda ou revenda por parte de seu titular. Extremamente lúcido e atual é o questionamento levantado por Alcides Jorge Costa (1978, p.101), ainda ao tempo do ICM, ao se pronunciar no seguinte sentido:
Ora, considerar o elemento subjetivo do recebedor da cousa e considerá-la mercadoria segundo a destinação que ele tencionasse dar-lhe equivaleria a considerar não sujeitas à tributação todas as vendas de varejo que, em princípio, são feitas a consumidores.
O aspecto subjetivo parece ter prevalecido na legislação fiscal, assim como no entendimento dos tribunais, como aquele que exigisse à compra e venda mercantil apenas a presença de um dos polos, notadamente escolhido como regra geral pela LC nº 87 (norma geral que trata do ICMS a nível nacional) como o sujeito que dará saída da mercadoria de seu estabelecimento.
Isso restringe ainda mais o proceder do intérprete, estando vinculado às finalidades que ora identificamos como (i) mediata e (ii) imediata perseguidas quando da comercialização de um bem, que devem seus a ele imputadas na qualificação de seu caráter mercantil, quais sejam (i) a venda ou revenda do bem (imediata), de modo habitual, (ii) o intuito comercial, transposto na busca pela obtenção de lucro (mediata).
Desse modo, em relação à finalidade mediata da mercadoria objeto de uma operação de circulação mercantil, Hugo de Brito Machado, após deixar claro que o que define especificamente as mercadorias são sua destinação, esclarece que
O que caracteriza uma coisa como mercadoria é a destinação. Mercadorias são coisas móveis destinadas ao comércio. São coisas adquiridas pelos empresários para revenda, no estado em que as adquiriram, ou transformadas, e ainda produzidas para venda. Não são mercadorias as coisas que o empresário adquire para uso ou consumo próprio.[15]
Em outras palavras, quer-se dizer que a destinação dada a determinado bem seria a viga mestra para poder-se apurar o conceito constitucional de mercadoria, como já afirmado anteriormente. Nesse sentido, pertinente é a advertência feita por Paulo de Barros Carvalho, no seguinte sentido:
A natureza mercantil do produto não está, absolutamente, entre os requisitos que lhes são intrínsecos, mas na destinação que se lhes dê. É mercadoria a caneta exposta à venda entre outras adquiridas para esse fim. Não o será aquela que mantenho em meu bolso e se destina a meu uso pessoal. Não se operou a menor modificação da índole do objeto referido.[16]
Quanto àquilo que ora classificamos como finalidade imediata, isto é, atrelada à ideia de venda ou revenda do bem em si, tem-se que “a venda é commercial quando quem vende comprou precedentemente com o intuito de revender” (sic)[17]. E isso, por si só, não basta. “A intenção de revender deve ser o motivo principal da aquisição” (Idem, p.25). Sabe-se que para a moderna teoria da empresa, o conceito de Direito Comercial se define pela organização dos fatores de produção[18], o que fundamenta, por conseguinte, a atividade comercial e o respectivo regime jurídico[19] que lhe é aplicável.
Em resumo, o qualificativo, portanto, de um bem como mercadoria, como depende de sua destinação específica, se dá logicamente sempre a posteriori, quando já se reconhece a destinação específica que lhe é dada, ou seja, mesmo que o motivo inicial da aquisição não aparentasse ser a revenda, ele se externalizou em momento posterior dentro de uma atividade habitual e organizada do sujeito, garantindo o caráter mercantil ao bem, sujeitando-se à incidência do imposto, portanto.
Isso serve meramente para aceitar a situação em que o fato gerador pode já sinalizar a priori, ou seja, temporalmente quando da contratação da venda do bem para um terceiro que já a compra com intenção de revendê-la, e que pode perfeitamente ser utilizado para consumo próprio ou imobilização, desqualificando-o como mercadoria adquirida para revenda. Em outros casos, também excepcionais que se dão a posteriori, nos quais, embora o sujeito adquira o bem para um determinado fim de consumo/imobilização, diverso do de revenda, utiliza-o, por fim, para fins mercantis, portanto especulativos, revertendo-o como objeto de seu negócio (habitual e organizado), passando também a compor sua finalidade mediata, qual seja o fito de lucro.
Advirta-se, entretanto, que a sinalização ora apontada, ao menos no sentido aqui atribuído, temporalmente não se confunde com o momento escolhido pelo legislador para a exteriorização do fato gerador, ou seja, faz-se inconfundível com o aspecto temporal da hipótese de incidência, que se define – como regra – a partir da saída da mercadoria do estabelecimento qualificado como comercial.
Vale agora analisar, com mais vagar, o que denominamos de finalidade mediata, que assim como a imediata, decorre da destinação que será dada ao bem que, justamente por conta disso, receberá a denominação de mercadoria para fins de fazer-se valer a pretensão arrecadatória dos Estados e Distrito Federal.
Para depurar quem seria, à luz do Direito Privado, o único sujeito elegível a ser titular de negócio jurídico que tivesse por objeto de transação comercial uma mercadoria (qualificando-a como tal), faz-se necessário definir juridicamente o que seria comerciante ou empresário, coisa que o Código Civil já o fez[20], assim como a legislação e a doutrina já o delimitaram conceitualmente, antes mesmo da Constituição de 1988.
Há de lembrar-se que a ideia de atividade econômica denota implicitamente o fito de lucro como finalidade última a ser alcançada por aquele que se propõe a executar determinada atividade mercantil, decorrente de sua “empresariedade”. Exatamente por isso, Geraldo Ataliba[21] sabiamente sustentou que o fato gerador do antigo ICM deve pressupor um fim mercantil, positivado sob a perspectiva de um intuito mercantil, conforme mencionado na legislação (art. 4ª da LC nº 87/96), que se faz, portanto, especulativo, ou seja, visando ao lucro que estaria intrinsecamente vinculado e indissociável à essência da atividade mercantil, o que limita, por exemplo, a tributação do ato cooperativo, como bem assinalado por Geraldo Ataliba[22], justamente por não visar essencialmente ao lucro, ou da eventual venda de ativos imobilizados, que não são objeto de sua atividade empresarial.
Em qualquer caso, analisa-se a atividade desenvolvida pelo vendedor para qualificá-la ou não como atividade mercantil, de sorte que, só a partir daí, dá-se ao bem objeto do negócio o qualificativo de mercadoria para efeitos de adoção de um conceito juridicamente adequado, que assim fora recepcionado pela Constituição Federal para fins de se autorizar a incidência do imposto.
Adverte-se, por último, que objetivo ou fito de lucro (caráter especulativo), que denominamos como finalidade imediata, é totalmente diferente de se condicionar a incidência do imposto ao lucro, efetivamente considerado, sob pena de estar-se tributando o lucro ou a renda, e não a operação de circulação mercantil, o que acarretaria indevida bitributação. Aquele caso, diferentemente deste, é mera finalidade a ser alcançada para fins de qualificação jurídica da atividade mercantil, como especulativa em sua essência; este, por outro lado, é signo presuntivo de renda, delimitado por legislação própria quanto à sua hipótese de incidência normativa.
Em suma, o que se exige como finalidade imediata é o fito de lucro, não a necessidade do lucro efetivo, aquele primeiro inafastavelmente vinculado à atividade mercantil.
Em vista disso, 3 (três) requisitos principais, mas não necessariamente suficientes, se colocam em evidência para a qualificação de um bem negociado como mercadoria para fins de incidência do ICMS, por decorrer, de fato, de um negócio jurídico mercantil:
Entendemos, por fim, que a (i) habitualidade no exercício do labor comercial, prescrita no art. 4º da LC 87/96 e a própria ideia de (ii) intuito comercial, esta última a que atribuímos o caráter intrinsecamente especulativo atribuível à atividade mercantil, que são mencionadas no mesmo dispositivo normativo da lei Kandir, ambas compreendidas como requisitos necessários para se definir quem pratica o fato gerador do ICMS, podem ser extraídas a partir de uma definição formulada, em nossa visão, a partir do próprio conceito constitucional de mercadoria, particularmente para fins de se autorizar a incidência do imposto.
Isso quer dizer que, independente de qualquer definição constitucional, não há como se conceber um conceito de mercadoria, para fins do ICMS, que não compreenda tais características, fazendo parte das limitações impostas ao poder de tributar a partir do delineamento da regra de competência desse imposto estadual. Em outras palavras, independentemente do que dispõe a Lei Kandir, a habitualidade e o caráter especulativo se extraem da própria essência do significado da atividade mercantil.
3.2 Operação
O conceito de operação está intrinsecamente ligado a ideia título ou fundamento jurídico, no caso, da circulação mercantil, relacionado a um ato ou negócio jurídico, portanto produtor de efeitos jurídicos, ou seja, inseridos e categorizados dentro de uma classificação mais ampla do fato jurídico latu sensu, porque pertinente ao direito, mas qualificado por uma manifestação de vontade, de forma que não há operação que não seja motivada pela vontade de alguém.
Importante se faz essa noção para que não se caia no grave erro de configurar situações de saídas decorrentes de furto, roubo, extravio etc, como ensejadoras do fato gerador do tributo, não só porque não haveria circulação da mercadoria, mas, também, pela falta de uma operação juridicamente qualificada que lhe desse fundamento para a incidência do imposto. No caso do ICMS, ora tratado, acresce-se a potencialidade de tal operação gerar a transmissão de sua posse ou propriedade, o que tem impacto, inclusive, para fins de qualificação das operações de circulação de energia sujeitas ao imposto.
3.3 Circulação
Afora a ideia de circulação física, vista geralmente como insuficiente à configuração do fato gerador do imposto, há, pelo menos, duas grandes correntes doutrinárias que tratam, de há muito, da configuração do fato gerador do ICMS, a partir da ideia de circulação, quais sejam (i) aquela que pressupõe a circulação econômica mercantil, sem a necessidade da transmissão jurídica da propriedade tal qual traçada pelo Direito Privado, necessitando-se, tão somente, de seu caráter especulativo, seguindo uma marcha na cadeia econômica até se chegar às mãos do consumidor final e (ii) aqueloutra que pressupõe que exista a efetiva transferência de propriedade mercantil, conforme seu conteúdo privatístico, como mencionado.
Em suma, não é porque se nomeia uma circulação como “econômica”, que não se atribui à referida circulação o caráter jurídico necessário, inclusive, porque, nesse caso, também se configura um fato juridicamente relevante para o Direito Tributário, no sentido de se considerar determinada situação ou pressuposto de fato como susceptível da incidência normativa e, consequentemente, participante de formação da obrigação tributária.
A primeira corrente doutrinária, referente ao que usualmente se denomina de circulação econômica, parece ter prevalecido quando da redação da Lei Complementar nº 87/96 (LC nº 87/96 ou Lei Kandir), assim como na época da edição do decreto-Lei 406/68, ao dispor claramente sobre a possibilidade de tributação nas operações de transferências entre estabelecimentos pertencentes à mesma pessoa jurídica, em sintonia com a denominada autonomia dos estabelecimentos de uma mesma pessoa jurídica em matéria de ICMS.
Embora seja diminuta a doutrina que ainda defende a ideia de circulação econômica, ou seja, não necessariamente atrelada à transferência da propriedade do bem em linha com o Direito Privado, essa corrente doutrinária sempre contou com tributaristas de peso, notáveis conhecedores da sistemática de tributação do imposto, como é o caso de Hugo de Brito Machado, que assim se pronuncia acerca da questão:
Circulação quer dizer, aqui, a movimentação econômica. A marcha que as coisas realizam desde a fonte de produção até o consumo. Essa movimentação econômica geralmente acontece mediante a mudança da propriedade das coisas, em face do princípio da divisão do trabalho, ou da especialização. Quem produz, industrializa, fabrica, geralmente não se dedica à distribuição, ao comércio, das coisas. O produtor da coisa geralmente não cuida de sua distribuição, não pratica os atos necessários a que a coisa chegue até o consumidor. Por isto diz-se que a circulação decorre da mudança de propriedade. Essa ideia de mudança de propriedade, porém, não é adequada para expressar a ocorrência do fato gerador do ICMS, pois é possível que uma coisa seja produzida por uma empresa, seja por ela própria distribuída em todo o território nacional, e também por ela a final vendida ao consumidor, utilizando-se essa empresa de vários estabelecimentos seus.
A mudança de propriedade é bastante para configurar a circulação, mas não é indispensável.[23]
Faz-se mister lembrar que Antônio Roberto Sampaio Dória também se filiou a essa corrente, como se compreende a partir da seguinte explicação:
(...) na criação do ICM, teve-se em mira – e isso ficou bastante claro nos trabalhos de reforma da época – criar um imposto com uma realidade econômica definida, isto é, a circulação de mercadorias, entendida como uma daquelas etapas do processo produtivo, sem qualquer vinculação com o negócio jurídico de que se pudesse estar revestida.[24] (grifos próprios)
Ainda em relação à sustentação da ideia de circulação econômica, Hamilton Dias de Sousa ilustrou bem essa questão ao tratar do conceito de circulação para efeitos de cobrança do ICM.
Note-se, contudo, que para haver tributação há de existir uma operação que implique no curso da mercadoria em direção ao consumidor final, ou ainda uma etapa no processo de circulação de mercadorias. Desta sorte, não há circulação quando o bem sair para retornar, como no comodato.[25]
Advirta-se, em sentido contrário a conclusões apressadas de quem venha a enfrentar o tema, que, tanto para a segunda corrente (circulação jurídica) como para a primeira (circulação econômica), a doutrina que as defende ou defendeu as qualifica, ao fim e ao cabo, como circulação de mercadorias juridicamente qualificadas, de modo que, em final de contas, ambas seriam jurídicas, não podendo a nomenclatura utilizada conduzir a um erro inadequado acerca da interpretação extraída de ambas as abordagens mencionadas.
Por outro viés, a teoria que se sedimentou na doutrina majoritária com o passar do tempo e de maior aceitação hoje nos tribunais, inclusive do próprio Supremo Tribunal Federal, como se demonstra a partir do que se decidiu na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 49, embora divirja da própria legislação do ICMS (como visto), é aquela que restringe a ocorrência do fato gerador do ICMS aos casos em que há, necessariamente, transferência jurídica da propriedade[26] nos termos definidos pelo Direito Privado.
Como fortes representante dessa corrente, Paulo de Barros Carvalho reproduz as palavras de Geraldo Ataliba (1975, p. 115 apud CARVALHO, 1978, p. 339) nos seguintes termos:
(...) em termos jurídicos, circular é mudar de titular; circular é mudar de pertinência jurídica. Circulação jurídica é mutação de titular. Não há identidade entre situação física e econômica (inapreciável juridicamente) e circulação jurídica. Tanto é assim que, juridicamente, os imóveis circulam e, no entanto, fisicamente não podem fazê-lo.[27]
O importante para fins do presente estudo é reconhecer que o mencionado entendimento também se aplica no caso da circulação de energia elétrica que enseja a cobrança do ICMS, de modo que, por exemplo, o denominado autoconsumo[28] de energia deve ser afastado da hipótese de incidência do imposto em apreço.
4. ICMS-Energia e a discussão acerca da não inclusão da TUSD e da TUST de sua base de cálculo
Como bem leciona o professor José Eduardo Soares de Melo (2020, p.209), antes de adentrar na análise das possibilidades de incidência do ICMS-Energia, o mercado de energia, além de compreender uma cadeia de transmissão e distribuição, faz com que a tarifação da energia elétrica, fixada em função de diversos elementos econômico-financeiros, condições técnicas atreladas ao sistema de fornecimento, normatizados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), considera consumidores qualificados nos seguintes casos (MELO, 2020, p. 209):
a) Os consumidores livres (classificados segundo determinadas cargas próprias e tensão) que têm a opção de compra de quaisquer fornecedores, e decorrência do que o preço é estipulado segundo o mercado; e
b) Os consumidores cativos (opção exclusiva de fornecimento por meio de concessionárias de atendimento de sua localização), fixando o preço correspondente ao do serviço pelo custo ou com base nos custos médios verificados, cabendo à Aneel estabelecer as margens de lucro permitidas.
O sistema em referência está estruturado com base nas leis nº 9.074/95 e 10.848/14, que preveem, em suma, um mercado para a compra de energia elétrica com dois ambientes de contratação: o Ambiente de Contratação Regulada (ACR), ou mercado cativo, e o Ambiente de Contratação Livre (ACL) ou mercado livre. De regra, um está atrelado ao que se qualificou como consumidores cativos, e o outro ao que nos referimos como consumidores livres. A esse respeito, assim dispõe o artigo 1º da lei 10.848/2004:
A comercialização de energia elétrica entre concessionários, permissionários e autorizados de serviços e instalações de energia elétrica, bem como destes com seus consumidores, no Sistema Interligado Nacional - SIN, dar-se-á mediante contratação regulada ou livre, nos termos desta Lei e do seu regulamento, o qual, observadas as diretrizes estabelecidas nos parágrafos deste artigo, deverá dispor sobre:
(...)
§ 1o A comercialização de que trata este artigo será realizada nos ambientes de contratação regulada e de contratação livre.
§ 2o Submeter-se-ão à contratação regulada a compra de energia elétrica por concessionárias, permissionárias e autorizadas do serviço público de distribuição de energia elétrica, nos termos do art. 2o desta Lei, e o fornecimento de energia elétrica para o mercado regulado.
§ 3o A contratação livre dar-se-á nos termos do art. 10 da Lei no 9.648, de 27 de maio de 1998, mediante operações de compra e venda de energia elétrica envolvendo os agentes concessionários e autorizados de geração, comercializadores e importadores de energia elétrica e os consumidores que atendam às condições previstas nos arts. 15 e 16 da Lei no 9.074, de 7 de julho de 1995, com a redação dada por esta Lei.
Assim, o denominado ACR atende a grande maioria da população em geral e nele as concessionárias de distribuição atendem toda a demanda dos consumidores residentes na região para qual obtiveram a concessão, ou seja, aos denominados consumidores cativos. Em relação ao ACR, os consumidores situados na área de concessão da distribuidora local estão obrigados a comprar energia elétrica dessa distribuidora, pagando, para tanto, as tarifas definidas pela ANEEL.
Em regra, os consumidores inseridos no ACR celebram contratos de adesão com as distribuidoras, por meio dos quais paga-se pelo fornecimento da energia e pela utilização da estrutura disponibilizada por estas. Assim, as distribuidoras, além de repassarem o valor pelo consumo de energia para os consumidores finais (parte da tarifa de energia, ou TE), também são remuneradas pela disponibilização da infraestrutura necessária para a efetivação da distribuição de energia (compreendidos os postes, torres de distribuição de energia elétrica, fios elétricos, transformadores e subestações de distribuição). Essa remuneração se dá pela TUSD. Para tanto, no contexto do ACR, a remuneração das distribuidoras se dá via TE, que compreende o consumo de energia propriamente dito, além de outras parcelas adicionais, e TUSD, esta última remunerando as distribuidoras pela disponibilização da sua infraestrutura.
Por outro viés, o ACL atende consumidores de maior porte, assim compreendidos aqueles que consomem uma grande quantidade de energia elétrica[29]. No ACL estão as grandes indústrias, shoppings, supermercados, universidades e etc., de sorte que cabe mencionar que a migração do ACR para o ACL por parte do consumidor é opcional, isto é, o consumidor, desde que atingido o requisito mínimo de consumo, pode optar por comprar energia no ACL, sem que se impeça que continua, á sua livre escolha, comprando energia no ACR, sendo atendido diretamente pela distribuidora local. Assim, no ambiente livre, os consumidores firmam contratos específicos, bilaterais, para fins de aquisição de energia elétrica diretamente de geradoras/comercializadores de energia elétrica, contratos estes denominados CCEAL.
No que diz respeito ao CCEAL, ao contrário do que ocorre no contexto do ACR, as geradoras/comercializadoras são remuneradas pela venda da energia elétrica de acordo com os preços livremente negociados com o consumidor. Na compra de energia no ACL, o consumidor não paga a tarifa da distribuidora definida pela ANEEL (TE), como ocorre no ACR, mas sim o valor negociado diretamente com o seu fornecedor de energia elétrica. Entretanto, em que pese a aquisição de energia se dar de forma livremente negociada entre as partes, a infraestrutura necessária para o efetivo recebimento dessa energia pelo consumidor ainda é disponibilizada pela distribuidora na qual ele está fisicamente conectado, devendo a distribuidora ser remunerada por essa disponibilização. Desse modo, para possam usufruir da infraestrutura da distribuidora, esses consumidores do ACL celebram o Contrato de Uso do Sistema de Distribuição (CUSD), por meio do qual será estabelecida a remuneração pelo uso da infraestrutura da distribuidora (TUSD).
Importante saber é que, independentemente do ambiente de contratação a que se refere, seja o ACR, seja o ACL, a TUSD e a TUST não devem compor a base de cálculo do ICMS-Energia, por escapar à materialidade desse imposto, como será melhor demonstrado.
A LC nº 87/96 (Lei Kandir), em linha como prevê o sistema constitucional tributário brasileiro, particularmente a partir das disposições contidas tanto no art. 146 como do art. 155 da Constituição, tratou de melhor delinear os aspectos gerais do tributo em questão e, nos termos do seu artigo 2º, citou suas possíveis hipóteses de incidência, conforme se extrai de seu art. 2º:
Art. 2° O imposto incide sobre:
I - operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares;
II - prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, por qualquer via, de pessoas, bens, mercadorias ou valores;
III - prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza;
IV - fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios;
V - fornecimento de mercadorias com prestação de serviços sujeitos ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, quando a lei complementar aplicável expressamente o sujeitar à incidência do imposto estadual.
Nesse contexto, o tributo em questão poderá incidir sobre a comercialização de energia elétrica, identificando-se com a hipótese listada no art. 2º, inciso I, da Lei Kandir, por entender-se que a energia é espécie sujeito à atividade mercantil, e, nesse particular caso, seria qualificada como mercadoria. Assim, e em consonância com voto produzido pelo Exmo. Min. Sepúlveda Pertence no âmbito do Recurso Extraordinário (RE) nº 176.626-3/SP, “(...) mercadoria é bem corpóreo objeto de atos de comércio ou destinado a sê-lo”.
Notadamente em relação ao tratamento da energia elétrica como mercadoria, o STF firmou o seu entendimento na linha de que a energia elétrica “é objeto de comércio; é mercadoria, bem apropriável pelo homem, bem no mercado, inclusive para fins tributários”[30], de sorte que a materialidade do ICMS-Energia, por conseguinte, estaria circunscrita à operação circulação de energia elétrica, configurando, assim, uma genuína atividade mercantil sujeita à incidência do ICMS, satisfazendo-se a pretensão arrecadatória dos Estados e Distrito Federal nesse aspecto.
Ainda dentro desse contexto, faz-se mister definir e perquirir acerca do que vem a ser definido como operação de circulação dessa mercadoria e se questionar acerca da possibilidade de a TUSD e da TUST, assim como outros componentes assessórios da Tarifa de Energia (TE), que não remuneram propriamente a energia adquirida por quem a consome, poderem compor a denominada operação de circulação de mercadoria, no caso de energia, de modo a eventualmente justificar a incidência do ICMS em tais casos.
Acima de tudo, a questão possui pano de fundo eminentemente constitucional, na medida em que a regra de competência do ICMS, atrelada a todos aqueles signos linguísticos explorados em tópico antecedente a este, como o de mercadoria, de circulação e de operação, devem conduzir a interpretação da legislação infraconstitucional que trata do tema, tanto em âmbito de lei complementar como lei ordinária, especialmente no que diz respeito à determinação da base impositiva que pode ser eleita pelo legislador ordinário e cada ente federado, o que não é diferente para o ICMS-Energia.
Como se pode demonstrar a partir da análise pormenorizada dos autos do Recurso Extraordinário nº 540.829, submetido ao rito da Repercussão Geral, ficou definido que incide o ICMS “somente se de fato houver circulação de mercadoria, caracterizada pela transferência do domínio (compra e venda)”, vinculando-se, portanto, à teoria da circulação jurídica, conforme já tratado em tópico precedente. O âmbito constitucional do ICMS se definiu na jurisprudência dos Tribunais Superiores no sentido de que a circulação em questão deve ser jurídica, não meramente um deslocamento físico ou uma marcha de produção ao consumo, ou seja, o fato gerador do imposto pressupõe a transferência de domínio do bem transacionado.
Na situação que compreende o ICMS incidente sobre a circulação de energia elétrica, o elemento referente á transferência de domínio ou propriedade do bem (energia) deve ser observado com a maior cautela, haja vista as particularidades que lhes são próprias, de modo que, diferentemente do que ocorre com outros bens, que são corpóreos e, por conta disso, tangíveis, a transferência da propriedade ao consumidor da energia ocorre com o efetivo consumo pelos aparelhos aptos para tanto (v.g., lâmpadas, maquinário, aparelhos elétricos etc.), à medida que são efetivamente utilizados, sendo esse, inclusive, o parâmetro de definição da quantidade consumida, medida em unidade watts.
Desse modo, o que efetivamente determina a circulação jurídica no caso da circulação da energia elétrica, como mercadoria juridicamente qualificada, em sentido notoriamente particular em relação a outro bem objeto de comércio, se dá a partir da constatação de seu consumo, o que requer um certo cuidado na análise a ser realizada no caso concreto.
A respeito disso, vale ressaltar que é impossível adequar a TUST e a TUST, assim como parte da TE, enquanto componentes dessa hipótese de incidência do ICMS, assim caracterizada pela jurisprudência a partir da transferência de domínio e pelo consumo, tendo em vista esses valores não remuneram a transferência de propriedade da energia disponibilizada ao consumidor, mas tão somente representam o veículo por meio do qual isso seja realizado, além do que não é possível considerar que a energia elétrica seja gerada sem ser consumida, de sorte que todo esse processo ocorre instantaneamente, de modo que não há como se falar em uma circulação jurídica, com a transferência de propriedade ou domínio do bem (energia), logicamente antes de ser ela consumida por seu destinatário.
Tanto a TUST como a TUSD remuneram estruturas prévias de transmissão e distribuição de energia, as quais possibilitam a circulação meramente física de energia; mas, nem por conta disso, têm a potencialidade de configurar o aspecto material de incidência do tributo, como depois ficou consignado pela LC nº 194/22, representando, em verdade, apenas um meio que possibilita que a circulação jurídica venha a ocorrer na etapa final do consumo, de sorte que a mesma situação ocorre em relação aos demais componentes da TE, referentes ao transporte, a encargos e a perdas, e que, por via de consequência, não remuneram a energia propriamente dita, mas sim possuem outras destinações. Nesse contexto, importante mencionar que tais serviços representam estruturas, instrumentos à circulação da energia elétrica, e não etapas da operação de circulação de mercadoria, de modo que o ato de mercancia, com transferência de titularidade e com objetivo ou fito de obter lucro, isto é, especulativo (que denominamos de finalidade mediata, intrínseca ao conceito qualificado de mercadoria), e, portanto, onerosamente qualificada em relação a quem a vende e a quem a adquire.
Noutra perspectiva, a razão de a aquisição de energia no mercado cativo ser feita por intermédio da distribuidora concessionária, por motivos regulatórios, não desconfigura a essência daquilo que cada uma dessas tarifas (TUSD e TUST) remuneram em uma estrutura, e, em outra (e apenas em parte), a compra (e consumo) da energia propriamente.
Não se deve confundir, equivocamente, aquilo que se qualifica como atividade-meio daquilo que se refere à atividade-fim desempenhada no caso da comercialização de energia. Especialmente elucidativa é a doutrina de Roque Antonio Carrazza, propugnando que as atividades desenvolvidas pelas concessionárias de distribuição de energia elétrica são atividades-meio que, apesar disso, devem ser separadas da atividade-fim, no caso, o fornecimento de energia, aduzindo que por “simplesmente viabilizar a prestação de serviço de fornecimento de energia elétrica, a mera operação das precitadas redes e equipamentos das distribuidoras não pode ser tributada por meio de ICMS”[31], de sorte que a estrutura disponibilizada pelas distribuidoras seria, para o consumidor, uma prestação de serviço, afastando com maior razão a incidência do ICMS, cujo fato gerador é a circulação de mercadoria (Idem, 2015, p. 334).
Nesse sentido, não se confunde o TUSD e a TUST com um mero custo atrelado à operação de circulação da mercadoria, o que, em harmonia com essa posição, ficou consolidado em jurisprudência que se formou favorável aos contribuintes, como consta dos autos de Agravo Regimental em Agravo ao REsp. nº 845.353/SC, de relatoria do Min. Humberto Martins, no sentido de que “(...) O STJ possui entendimento no sentido de que a Taxa de Uso do Sistema de Transmissão de Energia Elétrica – TUST e a Taxa de Uso do Sistema de Distribuição de Energia Elétrica – TUSD não fazem parte da base de cálculo do ICMS”, a exemplo de outros precedentes do Egrégio Tribunal que firmaram entendimento no mesmo sentido.
Importante mencionar, ainda, que a Resolução Normativa nº 414/10 da ANEEL reafirma o entendimento, aparentemente coerente, no sentido de que a circulação jurídica da energia elétrica ocorre com e para o consumo, conforme segue: “O ponto de entrega é a conexão do sistema elétrico da distribuidora com a unidade consumidora e situa-se no limite da via pública com a propriedade onde esteja localizada a unidade consumidora, exceto quando: (...)”.
Tecnicamente, como se depreende de uma análise dos aspectos regulatórios relacionados ao tema, pode-se inferir que o momento de entrega da energia ao consumidor ocorre com a conexão entre sistemas elétricos disponibilizados pela estrutura aqui detalhada, necessariamente no momento em que o consumo de energia elétrica é individualizado por meio de apontamento do medidor no caso do mercado cativo, e, no caso do mercado livre, isso ocorre com a quantidade de watts definida em contrato especificamente firmado com o consumidor, de maneira que se pode inferir que não há momento de armazenamento ou, até mesmo, estocagem da energia, de modo a se poder falar em genuínas etapas da cadeia mercantil em que ocorre venda e revenda da energia, mas mera passagem física, de modo que vale mencionar o teor a Súmula 166/STJ, ao definir que “Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte”. Isso reforça o argumento ora sustentado.
Pode-se inferir, com base nisso, que o fato gerador do ICMS é a operação de circulação jurídica de energia elétrica, o que ocorre somente com a geração-consumo instantânea, devendo, portanto, o ICMS incidir apenas sobre a parcela da TE que remunera especificamente o consumo dessa energia, e nada mais que isso, por não ter relação direta, mas meramente adjacente, com a materialidade do tributo em apreço.
Desse modo, tanto a TUST como a TUSD, assim como os demais componentes da TE vinculados ao transporte, aos encargos e às perdas, por outro lado, têm o potencial de remunerar tão somente outros elementos desvinculados da efetiva aquisição/consumo de energia elétrica, de modo que não constituem fato gerador do imposto, haja vista que isso fica notoriamente sedimentado ao se analisar que não há qualquer finalidade especulativa, com fito de lucro, muito menos uma circulação que se qualifique como jurídica direta ou indiretamente vinculada a tais montantes, de forma que não estão atreladas à aquisição da energia em tais casos. Em outras palavras, os montantes representativos à TUSD e à TUST estariam notoriamente fora do âmbito de incidência do imposto.
Nesse contexto, a matéria é considerara ainda controvertida no STJ, de modo que a questão deverá, assim, ser definida, em breve, pela Primeira Seção, em julgamento submetido ao rito dos recursos repetitivos, momento em que deverão ser julgados três recursos que versão sobre o tema, quais sejam o REsp. nº 1.692.023, o REsp. nº 1.699.851 e o EREsp. nº 1.163.020, o que deve por fim à remanescente controvérsia.
5. Necessário efeito interpretativo extraído da LC nº 194/22 em relação à não incidência do ICMS-Energia sobre a TUST e a TUSD
A Lei Complementar nº 194, de 2022, veio deixar claro e inquestionável, conforme sua função constitucional (art. 146, incisos II e III, da constituição Federal), a natureza jurídica do TUSD e da TUST, declarando que se trata de caso de não incidência do ICMS-Energia.
Dizer que se trata de não incidência quer dizer que o tributo nunca deveria ter incidido sobre tal montante referente aos serviços de transmissão e distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica, ou seja, tendo efeitos ex tunc, o que difere totalmente de um caso de isenção, em que a norma vale dali para frente (ex nunc). Tal interpretação decorre da expressa inclusão, por parte do legislador complementar, do artigo 3º, inciso X, da LC 87/96 (Lei Kandir) que expressamente passou a dispor:
Art. 3º O imposto não incide sobre:
(...)
X - serviços de transmissão e distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica. (grifos próprios)
Tal disposição veicula de forma clara e evidente um caso em que o tributo jamais poderia ter incidido, inclusive em relação ao passado, por se tratar de caso expresso de não incidência, como os demais casos elencados também no art. 3º da LC nº 87/96, que se tratam seja de casos de não incidência simples, por estarem completamente fora do âmbito de competência do ICMS, como de não incidência qualificada (imunidade), como, por exemplo, no caso inciso I do art. 3º, de modo que não há qualquer caso de isenção no rol extraído a partir desse dispositivo.
Isso quer dizer que, seja em caso (i) de não incidência simples (ou seja, completamente fora do âmbito de competência dos Estados para instituir ou cobrar o tributo), como é o caso da TUSD/TUST e outros encargos atrelados ao serviço de distribuição, seja em caso (ii) de não incidência constitucionalmente qualificada (v.g., art. 3º, inciso I, da Lei Kandir), o legislador ordinário sequer pode exercer o seu poder impositivo em tais casos, assim como a Fazenda estadual não pode se fazer valer de qualquer pretensão arrecadatória, o que – reforce-se – em nada se confunde com um caso de concessão de uma isenção por parte do entre tributante.
A título ilustrativo, para Amilcar de Araújo Falcão, a imunidade seria “(...) uma forma qualificada ou especial de não incidência, por supressão, na Constituição, da competência impositiva ou do poder de tributar quando se configuram certos pressupostos, situações ou circunstâncias previstas elo estatuo supremo.”[32]. Também esse sentido, José Souto Maior Borges afirmara que a imunidade é uma “hipótese de não-incidência constitucionalmente qualificada”[33]. Em sentido semelhante, Aliomar Baleeiro já ensinava que “disposição da lei maior que vedam ao legislador ordinário decretar impostos sobre certas pessoas, matérias ou fatos, enfim, situações que define. Será inconstitucional a lei que desafiar imunidades fiscais”[34]. Assim como na hipótese de não incidência simples, a não incidência qualificada impede que o legislador ordinário venha a instituir tributo sobre tais materialidades, tendo em vista que, em final de contas, as imunidades também definem, em sentido negativo, a competência tributária.
Em outras palavras, os casos de não incidência previstos no art. 3º da referida lei complementar têm intuito didático, no sentido de deixar claro aqueles casos que, seja por estarem notoriamente fora do âmbito de competência dos Estados em relação ao ICMS, seja por se tratar de vedação constitucional via imunidade (não incidência qualificada), obstam a atuação do legislador ordinário em qualquer sentido, independente da pré-existência do disposto no art. 3º.
Com isso, o legislador complementar só confirmou e sedimentou entendimento há anos sustentado pela quase unanimidade da doutrina especializada sobre o tema, de forma a entender que o ICMS-Energia jamais poderia ou deveria ter incidido sobre o montante tributário referente a tais encargos atrelados aos serviços de transmissão e distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica (v.g., TUSD/TUST).
6.Conclusão
Com base no exposto, parece não haver fundamentos para que incida o ICMS-Energia sobre a parcela referente à TUST e a TUSD, assim como outros encargos que compõem a TE, tendo em vista tratar-se de hipótese de não incidência do imposto, sob pena de malferimento à regra constitucional de competência do imposto e à reserva de lei complementar para tratar do assunto, como foi feito a partir da edição da Lei Complementar nº 194/2022, com suas alterações introduzidas no art. 3º da Lei Kandir, o que veio a reforçar o princípio da legalidade tributária, tendo em vista ser matéria que não pode ser revogada ou tratada por medida provisória (Emenda Constitucional nº 32/2001).
Isso se dá ao fato de que os elementos essenciais para a configuração do fato gerador do ICMS não estariam presentes no caso em tela, o que conduziu, inclusive, como já mencionado, o legislador complementar a esclarecer de forma uniforme a todos os Estados da Federação a questão, ao passar a prever que os “serviços de transmissão e distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica” (art. 3º, inciso X, da LC nº 87/96) compreenderiam casos de não incidência do imposto, justamente por sua falta de relação com a circulação jurídica da energia, atestada a partir da aquisição/consumo da energia.
A lei complementar exerceu nesse caso a sua particular função de norma geral (art. 146, inciso III, da Constituição Federal) e como regulamentadora das limitações ao poder de tributar (art. 146, inciso II, da Constituição Federal) dos Estados, preservando assim uma garantia à preservação do pacto Federativo, evitando-se tratamentos fiscais díspares e incongruentes entres esses entes da Federação, no que diz respeito à matéria em apreço.
Bibliografia:
ATALIBA, Geraldo. Estudos e Pareceres de Direito Tributário. Volume 2. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1980.
______. Estudos e Pareceres de Direito Tributário. V.1. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1978.
BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência das finanças. - 17ª ed. revista e atualizada por Hugo de brito Machado Segundo -. Rio de Janeiro, Forense, 2010.
BORGES, José Souto Maior. Teoria Geral da Isenção Tributária. 3. ed., São Paulo: Malheiros, 2007.
BRASIL. Lei no. 10.406, de 10 jan. 2002. (Código Civil) Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm> Acesso em: 15 ago. 2016.
CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 16ª ed., revisada, ampliada e atualizada. São Paulo: Malheiros, 2007.
______. ICMS. 17. Ed., revisada, ampliada e atualizada. São Paulo: Malheiros, 2015.
CARVALHO, Paulo de Barros. A regra matriz do ICM. Tese de livre docente em Direito Tributário na Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 1981.
______. Hipótese de incidência e base de cálculo do ICM. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva. O fato gerador do ICM. Cadernos de Pesquisas Tributárias. n. 3. São Paulo: Resenha Tributária, 1978.
DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Curso de direito empresarial 2: Direito Tributário. São Paulo: Editora Resenha Tributária, 1976.
FALCÃO, Amílcar de Araújo. Fato gerador da obrigação tributária. 2. ed. - anotações e atualizações por Geraldo Ataliba - São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1971.
MACHADO, Hugo de Brito. Normas Gerais de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2018.
______. Comentários ao Código Tributário Nacional. São Paulo: Atlas, 2003.
______. Aspectos fundamentais do ICMS. 2 ed. São Paulo: Dialética, 1999.
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários à Constituição de 1967. São Paulo: revista dos Tribunais. 1967.
______. Tratado de Direito Privado. V. 3. São Paulo: Ed. Borsoi, 1954.
SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. São Paulo: Edições Financeiras, 1954.
SOUZA, Hamilton Diaz de. O fato gerador do ICM. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva. O fato gerador do ICM. Cadernos de Pesquisas Tributárias N. 3. São Paulo: Resenha Tributária, 1978.
VIVANTE, Cesare. Instituições de Direito Comercial. Lisboa: Livraria Clássica, 1918.
RUIZ, Manuel Olivencia. Derecho mercantil y derecho de la empresa. In: SANCHEZ, Guillermo J. Jiménez (coord.). Derecho Mercanti. 9. ed. Madrid: Ariel, 2004.
[1] Advogado. Mestrando em Direito Tributário pela PUC-SP. Especialista em Direito Empresarial pela FGV-SP. MBA em Gestão Tributária pela USP.
[2] MACHADO, Hugo de Brito. Normas Gerais de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, p. 34.
[3] NETO, Carlos Augusto Daniel. Tributação e exceção: a derrotabilidade das regras tributárias. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2022, pp. 243-244.
[4] MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. A teoria das constituições rígidas. São Paulo: Publicação da prefeitura do município de São Paulo, 1948, p. 58.
[5] Idem, p. 58.
[6] SCHOUERI, Luís Eduardo. Discriminação de competências e competência residual. In.: Direito tributário: estudos em homenagem a Brandão Machado. São Paulo: Dialética, 1998, p. 83.
[7] DÓRIA, Antonio Roberto Sampaio. Princípios constitucionais e a cláusula do Due Process of Law. São Paulo, 1964, p. 116.
[8] DÓRIA, Antonio Roberto Sampaio. Discriminação de rendas tributárias. São Paulo: josé Bushatsky Editor, 1972, p. 15.
[9] ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5ªedição. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 196.
[10] STF – Pleno, RE nº 136.215-4/RJ, Rel. Min. Octávio Gallotti, julgamento: 18.02.1993, DJ de 16.04.1993.
[11] “As mercadorias ou são produzidas para serem postas em circulação, ou são recebidas para continuarem seu curso no processo de circulação, até chegarem a consumo.” (COSTA, 1978, p. 99)
[12] MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários à Constituição de 1967. São Paulo: revista dos Tribunais. 1967, p. 490.
[13] ATALIBA, Geraldo. Estudos e Pareceres de Direito Tributário. V.1. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1978, p. 46.
[14] SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. São Paulo: Edições Financeiras, 1954, p. 367.
[15] MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional. São Paulo: Atlas, 2003, p. 522.
[16] CARVALHO, Paulo de Barros. A regra matriz do ICM. Tese de livre docente em Direito Tributário na Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 1981, p. 206.
[17] VIVANTE, Cesare. Instituições de Direito Comercial. Lisboa: Livraria Clássica, 1918, p. 25.
[18] RUIZ, Manuel Olivencia. Derecho mercantil y derecho de la empresa. In: SANCHEZ, Guillermo J. Jiménez (coord.). Derecho Mercanti. 9. ed. Madrid: Ariel, 2004, p. 24.
[19] Afirma Roque Antonio Carrazza que “É o caso de rememorarmos que mercadoria, nos patamares do Direito, é o bem móvel, sujeito à mercancia. É, se preferirmos, o objeto da atividade mercantil, que obedece, por isso mesmo, ao regime jurídico comercial.” (CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 16ª ed., revisada, ampliada e atualizada. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 48).
[20] “Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.” (Código Civil 2002)
[21] ATALIBA, Geraldo. Estudos e Pareceres de Direito Tributário. Volume 2. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1980, p. 80.
[22] “Por outro lado, é unânime a doutrina em salientar que o ato cooperativo não tem cunho de alteridade, elidindo o lucro, o proveito, o sobre-preço, que precisamente caracterizam o ato mercantil.” (ATALIBA, Geraldo. Estudos e Pareceres de Direito Tributário. Volume 2. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1980, p. 63)
[23] MACHADO, Hugo de Brito. Aspectos fundamentais do ICMS. 2 ed. São Paulo: Dialética, 1999, p. 27.
[24] DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Curso de direito empresarial 2: Direito Tributário. São Paulo: Editora Resenha Tributária, 1976, p. 182.
[25] SOUZA, Hamilton Diaz de. O fato gerador do ICM. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva. O fato gerador do ICM. Cadernos de Pesquisas Tributárias N. 3. São Paulo: Resenha Tributária, 1978, p. 242.
[26] Dela resultou o enunciado da súmula 166, do STJ, que assim versa: “Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte”.
[27] Hipótese de incidência e base de cálculo do ICM. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva. O fato gerador do ICM. Cadernos de Pesquisas Tributárias. n. 3. São Paulo: Resenha Tributária, 1978, p. 339.
[28] Inclusive, conforme já bem decidiu o Tribunal de Justiça do Mato Grosso (TJMT), o autoconsumo de energia não pode ser tributado pelo ICMS, como consta da ementa a seguir reproduzida:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - MEDIDA CAUTELAR – LEI ESTADUAL Nº 7.098/98 – INCIDÊNCIA DE ICMS NO ÂMBITO DO SISTEMA DE COMPENSAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA REGULAMENTADO PELA RESOLUÇÃO ANEEL Nº 482/2012 – EXISTÊNCIA DE INTERPRETAÇÃO QUE POSSIBILITA A TRIBUTAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – AUSÊNCIA DE CIRCULAÇÃO JURÍDICA DE MERCADORIAS – REQUISITOS LEGAIS DEMONSTRADOS – REALIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO – MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA. 1. Para a concessão de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade é imprescindível a presença cumulativa dos requisitos atinentes à relevância da fundamentação em que se assenta o pedido e ao receio de dano difícil ou incerta reparação, caso a pretensão venha a ser atendida somente por ocasião do exame do mérito da demanda. 2. Em sede de cognição sumária, marcada pela precariedade, revela-se incompatível com os ditames da Constituição Estadual a interpretação dos arts. 2º, I, §1º, III e §4º e 3º, I e XII, e §8º, I e II, da Lei nº 7.098/98 que possibilite a tributação, por ICMS, do sistema de compensação de energia solar e do uso da rede de distribuição local, ante a ausência de circulação jurídica de mercadorias e, consequentemente, da ocorrência de fato gerador do referido imposto.” (TJMT – Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1018481- 79.2021.8.11.0000, Rel. Des. Maria Aparecida Ribeiro, julgamento em 10.02.2022)
[29] Podem adquirir energia no ACL os consumidores que consomem a partir de 500 kW (quilowatts) por mês, nos termos do § 5º do art. 26 da Lei nº 9.427/1995.
[30]Agravo Regimental nº 1607/MS, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 24.04.2015.
[31] CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 17. Ed., revisada, ampliada e atualizada. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 334.
[32] FALCÃO, Amílcar de Araújo. Fato gerador da obrigação tributária. 2. ed. - anotações e atualizações por Geraldo Ataliba - São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1971, p. 117.
[33] BORGES, José Souto Maior. Teoria Geral da Isenção Tributária. 3. ed., São Paulo: Malheiros, 2007, p. 103.
[34] BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência das finanças. - 17ª ed. revista e atualizada por Hugo de brito Machado Segundo -. Rio de Janeiro, Forense, 2010, p. 374.
Advogado e Consultor Tributário. Mestrando em Direito Tributário (PUC/SP). Pós-graduado em Direito Tributário (PUC/SP). Especialista em Direito Tributário (CEU-LAW). Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo (TIT/SP). Ex-Conselheiro Julgador do Conselho Municipal de Tributos (CMT/SP). Conselheiro e Vice-Presidente do Comitê ICMS/ISS da Associação Brasileira de Advocacia Tributária (ABAT). Professor em diversas instituições.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MELO, Eduardo Soares de. O princípio da legalidade tributária, a reserva de lei complementar e a não incidência do ICMS em caso de serviços de transmissão e distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 fev 2023, 04:37. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/61016/o-princpio-da-legalidade-tributria-a-reserva-de-lei-complementar-e-a-no-incidncia-do-icms-em-caso-de-servios-de-transmisso-e-distribuio-e-encargos-setoriais-vinculados-s-operaes-com-energia-eltrica. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Precisa estar logado para fazer comentários.