RESUMO: Este artigo tem o intuito de analisar as correntes que permeiam a base de cálculo do adicional de insalubridade e os reflexos destas correntes sobre o contrato de trabalho individual do trabalhador. Através de um estudo jurídico teórico foi possível compreender a importância de um parâmetro de cálculo que tenha o condão de recompor de forma efetiva as perdas da saúde ocasionadas pela exposição a um ambiente insalubre pelo empregado.
Palavras-chave: adicional de insalubridade, base de cálculo, contrato de trabalho, saúde do trabalhador.
INTRODUÇÃO:
O adicional de insalubridade é um complemento salarial criado para recompor a saúde do trabalhador em decorrência da realização do seu trabalho em condições que lhe diminua a saúde. O complemento em comento encontra-se positivado na CLT nos artigos 189 a 197 e tem natureza remuneratória, sendo pago pelo empregador diretamente ao empregado.
O art. 192 da CLT estabelece que o trabalhador que realize a sua atividade em condições insalubres fará jus a um acréscimo no valor de 40, 20 ou 10 por cento do salário mínimo da região quando submetidos a um agente nocivo em grau máximo, médio ou mínimo respectivamente. Embora o artigo seja claro e inequívoco, ele entrou no ordenamento jurídico no ano de 1977 e já não atende mais aos valores e regramentos contemporâneos, gerando um descompasso, sobretudo, com a Carta Magna de 88, máxime na disposição referente a indexação ao salário mínimo como base de cálculo deste adicional.
Não obstante a evidente dissonância em tela, o STF, no ano de 2008, a ratificou quando da criação da súmula vinculante nº 4, que estabelece que excetuados os casos previstos na Constituição Federal, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de calculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por decisão judicial.
Diante da nova realidade criada com a súmula vinculante mencionada, o Tribunal Superior do Trabalho definiu um novo parâmetro interpretativo, de acordo com o prisma constitucional estabelecido pelo STF, estabelecendo através da súmula 228, que após a publicação da súmula vinculante nº 4 do Pretório Excelso, o adicional será calculado sobre o salário básico, salvo quando houver critério mais vantajoso estabelecido em instrumento coletivo.
Em que pese a sensata solução definida pelo TST; ainda no ano de 2008, numa decisão em caráter liminar, o Min. Gilmar Mendes suspendeu a eficácia da sumula 228 da corte superior do trabalho, sob a justificativa de que o TST embora tenha respeitado a sumula vinculante nº 4, fixou uma base de cálculo sem base normativa.
Desta forma, estabelecido o vácuo normativo supra, buscaremos ao longo desta tese demonstrar os reflexos que a alteração da base de cálculo para um patamar incompatível com a perda da saúde ocasionada pela exposição ao agente nocivo possa causar ao trabalhador.
A importância deste estudo reside justamente na necessidade de apresentação das correntes criadas até então para, após a analise das referidas correntes, se possua elementos para uma construção normativa sólida que atenda aos anseios de ambas as classes envolvidas na relação de trabalho.
DESENVOLVIMENTO
Antes de adentrarmos no epicentro do tema abordado neste artigo convém trazermos o seu conceito e a sua fundamentação normativa.
1. Conceito:
O termo insalubridade refere-se ao oposto de saúde, ou seja, tudo aquilo que de alguma forma deprecia a saúde do indivíduo é considerado insalubre.
Já o termo adicional, conforme ensina Ricardo Resende (2014), nos remete a idéia de acréscimo ao salário pactuado contratualmente, oriundo de circunstâncias que tornam a prestação do labor mais gravosa, legitimando assim o pagamento do adicional.
O adicional de insalubridade, portanto, trata-se de complemento salarial agregado a remuneração do trabalhador, criado com o intuito de recompor a perda da saúde do empregado em virtude da exposição acima dos limites tolerados a agentes prejudiciais a saúde do trabalhador.
A justificativa para o pagamento desse complemento salarial é que o obreiro poderá de alguma forma, com o aumento da sua remuneração advinda deste adicional, melhorar a sua qualidade de vida, equilibrando o desequilíbrio ocasionado com a perda da saúde em virtude da prestação da mão-de-obra em condições acima dos limites de insalubridade permitidos pela lei e pelos órgãos fiscalizadores.
2. Fundamentação normativa e procedimento:
A legislação que ampara o adicional de insalubridade está prevista em nosso ordenamento jurídico na constituição federal e, sobretudo, na CLT.
A Constituição Federal no seu art. 7º consagra os direitos dos trabalhadores alçados a categoria de fundamentais. Dentre os vários direitos encontra-se o direito a percepção do adicional de insalubridade:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...)
XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei;
A elevação deste adicional a categoria de norma constitucional reflete a importância que o legislador deu a este direito, sobretudo porque a condição para o seu recebimento está atrelada a submissão do trabalhador a uma condição que lhe diminua a saúde.
Não obstante aquela norma, o art. 225 da CF consagra como direito de todos um meio ambiente ecologicamente equilibrado, englobando-se ai o direito a um meio ambiente de trabalho saudável.
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
Assim, numa situação ideal, observando-se a regra do art. 225 do diploma constitucional, temos que nenhum trabalhador deveria ser submetido a uma condição de trabalho não saudável e, por consectário lógico, não tivesse direito a perceber o referido adicional.
Em âmbito infraconstitucional, o diploma celetista regula o adicional de insalubridade nos artigos 189 a 197. Atente-se que, para ser deferido, o complemento oriundo da insalubridade deve se submeter a um procedimento próprio.
Cabe, de início, ao Ministério do Trabalho e Emprego, mediante portaria, incluir em seus quadros a atividade como insalubre, regulando-a quanto aos limites de exposição, o tempo e as formas de proteção a substância nociva.
Estando a atividade caracterizada nos quadros do MTE, é necessário seja realizada perícia por médico ou engenheiro do Trabalho para se verificar, in loco, a agressividade do ambiente de trabalho à saúde do trabalhador (CLT art. 195).
Assim, conforme assinala Renato Saraiva (2012, p. 104), para se configurar a existência do direito ao adicional de insalubridade, não basta a perícia constatar que o ambiente de trabalho é agressivo a saúde do empregado, sendo indispensável o enquadramento da atividade ou operação entre as insalubres pelo Ministério do Trabalho.
Por isso, a doutrina considera o deferimento do complemento salarial em comento um ato complexo, haja vista ser necessário, para a sua viabilidade, a participação de ao menos dois órgãos distintos.
Embora haja a previsão da complementação salarial ao trabalhador que exerça as suas funções em ambiente nocivo a sua saúde, deve-se frisar que é dever do empregador tomar todas as cautelas para fazer cessar o agente nocivo, ou minorá-lo ao máximo, adotando medidas que conservem o ambiente de trabalho dentro dos limites de tolerância, fornecendo e fiscalizando o uso de equipamentos de proteção individual pelo empregado, nos termos do Art. 191 da CLT.
Uma vez fornecido pelo empregador, o não uso dos EPI's pelo empregado pode, inclusive, acarretar em dispensa por justa causa, nos termos do art. 482, h da CLT. (TRT 3ª Região, JusBrasil). No mesmo sentido, assevera a professora Vólia Bonfim (2014, p. 1650), se o empregado se recusar a utilizar o EPI, o empregador pode ainda demiti-lo por justa causa, na forma do art. 158, parágrafo único, b, da CLT.
Se, no entanto, o empregador através do fornecimento de EPI's ou por meio de algum melhoramento no ambiente de trabalho fazer cessar a insalubridade, perde o trabalhador o direito a percepção do adicional.
Em continuidade, preconiza o art. 192 da CLT que o trabalhador que realize a sua atividade em condições insalubres fará jus a um acréscimo no valor de 40, 20 ou 10 por cento do salário mínimo da região quando submetidos a um agente nocivo em grau máximo, médio ou mínimo respectivamente.
Quanto a cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade, cumpre frisar que até o ano de 2019 o entendimento preponderante do TST é no sentido de que o art. 193, p. 2º não foi recepcionado pela Constituição; a uma pelo art. 7º, XXIII da constituição de 1988 ter previsto a possibilidade de recebimento dos adicionais de penosidade, insalubridade e periculosidade sem qualquer ressalva quanto a percepção cumulativa de ambos; a duas, pelo fato das convenções 148 que consagra a necessidade de atualização constante da legislação sobre as condições nocivas de trabalho e a 155 da OIT que prevê que riscos para a saúde decorrentes da exposição simultânea a diversas substâncias ou agentes devem sempre ser levados em conta quando da aferição da contraprestação pelo labor prestado possuirem status de norma supralegal legislando assim de forma mais benéfica ao trabalhador sobre o tema,(RR-1072-72.2011.5.02.0384 Rel. Min. Cláudio Brandão)
No entanto, a partir de 2020 o tema foi afetado ao sistema de recursos repetitivos, tendo o TST fixado a seguinte tese:
"INCIDENTE DE RECURSOS REPETITIVOS. ADICIONAIS DE PERICULOSIDADE E DE INSALUBRIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO, AINDA QUE AMPARADOS EM FATOS GERADORES DISTINTOS E AUTÔNOMOS. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DO ORDENAMENTO JURÍDICO. RECEPÇÃO DO ART. 193, § 2º, DA CLT, PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. Incidente de recursos repetitivos, instaurado perante a SBDI-1, para decidir-se, sob as perspectivas dos controles de constitucionalidade e de convencionalidade, acerca da possibilidade de cumulação dos adicionais de periculosidade e de insalubridade, quando amparados em fatos geradores distintos e autônomos, diante de eventual ausência de recepção da regra do art. 193, § 2º, da CLT, pela Constituição Federal. 2. Os incisos XXII e XXIII do art. 7º da Constituição Federal são regras de eficácia limitada, de natureza programática. Necessitam da "interpositio legislatoris", embora traduzam normas jurídicas tão preceptivas quanto as outras. O princípio orientador dos direitos fundamentais sociais, neles fixado, é a proteção da saúde do trabalhador. Pela topografia dos incisos - o XXII trata da redução dos riscos inerentes ao trabalho e o XXIII, do adicional pelo exercício de atividades de risco - , observa-se que a prevenção deve ser priorizada em relação à compensação, por meio de retribuição pecuniária (a monetização do risco), dos efeitos nocivos do ambiente de trabalho à saúde do trabalhador. 3. Gramaticalmente, a conjunção "ou", bem como a utilização da palavra "adicional", no inciso XXIII do art. 7º, da Carta Magna, no singular, admite supor-se alternatividade entre os adicionais. 4. O legislador, no art. 193, § 2º, da CLT, ao facultar ao empregado a opção pelo recebimento de um dos adicionais devidos, por certo, vedou o pagamento cumulado dos títulos, sem qualquer ressalva. 5. As Convenções 148 e 155 da OIT não tratam de cumulação de adicionais de insalubridade e de periculosidade. 6. Conforme ensina Malcom Shaw, "quando uma lei e um tratado têm o mesmo objeto, os tribunais buscarão interpretá-los de forma que deem efeito a ambos sem contrariar a letra de nenhum dos dois". É o que se recomenda para o caso, uma vez que os textos comparados (Constituição Federal, Convenções da OIT e CLT) não são incompatíveis (a regra da impossibilidade de cumulação adequa-se à transição para o paradigma preventivo), mesmo considerado o caráter supralegal dos tratados que versem sobre direitos humanos. É inaplicável, ainda, o princípio da norma mais favorável, na contramão do plano maior, por ausência de contraposição ou paradoxo. 7. Há Lei e jurisprudência consolidada sobre a matéria. Nada, na conjuntura social, foi alterado, para a ampliação da remuneração dos trabalhadores no caso sob exame. O art. 193, § 2º, da CLT, não se choca com o regramento constitucional ou convencional. 8. Pelo exposto, fixa-se a tese jurídica: o art. 193, § 2º, da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal e veda a cumulação dos adicionais de insalubridade e de periculosidade, ainda que decorrentes de fatos geradores distintos e autônomos. Tese fixada" (IRR-E-ED-RR-239-55.2011.5.02.0319, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Redator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 15/05/2020).
Vale dizer que embora a tese fixada pelo TST seja no sentido da impossibilidade de cumulação dos adicionais e de insalubridade e periculosidade, o referido processo ainda não transitou em julgado, encontrando-se neste momento em fase de recurso extraordinário perante o STF.
Assim, por hora, a jurisprudencia atual é no sentido de não ser mais possível, o recebimento simultâneo de ambos os adicionais mesmo se tratando de fatos geradores distintos.
3. A base de calculo do adicional de insalubridade:
Preconiza o art. 192 da CLT que o trabalhador que realize a sua atividade em condições insalubres fará jus a um acréscimo no valor de 40, 20 ou 10 por cento do salário mínimo da região quando submetidos a um agente nocivo em grau máximo, médio ou mínimo respectivamente.
Destaque-se que referida norma foi introduzida no ordenamento jurídico em 1977 através da lei nº 6514, ou seja, antes da constituição de 1988.
Tínhamos, assim, que o adicional de insalubridade era aplicado na forma do art. 192 do diploma celetista, com percentual fixado sobre o valor do salário mínimo vigente, até o ano de 2008, quando o STF editou a súmula vinculante número 4 (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula Vinculante n° 4) estabelecendo que excetuados os casos previstos na Constituição, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por decisão judicial.
Uma vez fixado o entendimento interpretativo pelo Pretório Excelso, o TST criou a sua súmula 228, com o seguinte teor:
Súmula nº 228 - A partir de 9 de maio de 2008, data da publicação da Súmula Vinculante nº 4 do Supremo Tribunal Federal, o adicional de insalubridade será calculado sobre o salário básico, salvo critério mais vantajoso fixado em instrumento coletivo.
O TST então, através de entendimento sumulado, definiu um parâmetro interpretativo conforme o prisma constitucional, regulando a base de cálculo do adicional de insalubridade sem indexar ao salário mínimo vigente e de acordo com a peculiaridade de cada contrato de trabalho.
O STF, no entanto, em meados do ano de 2008, através de decisão liminar proferida pelo então presidente Min. Gilmar Mendes, suspendeu a eficácia da súmula 228 da corte superior trabalhista, entendendo que aquela súmula, embora tenha respeitado a regra prevista na súmula Vinculante n.º 4, fixou uma base de cálculo - o salário base do trabalhador - sem base normativa, motivo pelo qual se suspendeu o trecho da súmula 228 que previa como base de cálculo o salário base do empregado (Brasil, Supremo Tribunal Federal RE 565-714/SP, Rel. min. Carmém Lúcia, sessão de 30.04.2008 apud SARAIVA, Renato)
Diante do impasse instaurado acerca da base de cálculo do adicional de insalubridade entre a CLT, Jurisprudência do STF e TST, coube a doutrina a tentativa de fixar um parâmetro que atenda os interesses dos trabalhadores e empregadores compatível com o ordenamento jurídico. Surge então 4 correntes acerca do tema.
4. Correntes acerca da Base de Calculo do adicional de insalubridade:
Segundo o Professor Renato Saraiva (2013), diante do vácuo normativo criado após a declaração de inconstitucionalidade sem pronuncia de nulidade do trecho do art. 192 da CLT que alude ao salário mínimo, quatro correntes foram levantadas pela doutrina para buscar uma solução para o tema.
4.1. Primeira corrente:
A primeira corrente sustenta que após a liminar concedida no RE 565-714/SP a base de cálculo seria o valor do salário mínimo vigente na data da edição da súmula vinculante nº 4 (R$ 415,00), só podendo o valor ser reajustado após a criação de uma lei disciplinando o tema ou por meio de convenção coletiva.
A referida corrente, em nosso sentir, não merece prosperar. Ela desconsidera a volatilidade da economia brasileira e dos diversos mecanismos criados pela legislação para recuperar o poder aquisitivo da remuneração do trabalhador que, lamentavelmente, a todo ano é corroído pela inflação, como, por exemplo, a data-base.
Do ponto de vista jurídico, o referido entendimento não alcança o melhor direito, a medida que não atende ao contido no art. 7º IV da CF, mais precisamente em sua parte final, que define como direito do trabalhador um reajuste salarial periódico que preserve o poder aquisitivo das suas contraprestações.
Também devemos considerar, sob uma perspectiva mais abrangente, outros institutos como a correção monetária; afinal, 415 reais em 2008 não possuem o mesmo valor econômico que 415 reais no ano de 2023.
Inicialmente até seria viável a primeira corrente, no entanto, diante da perda do valor econômico ao longo dos anos, o propósito da criação do instituto do adicional de insalubridade, na forma desta corrente, não seria atendido. Entende-se, por isso, que esta corrente não é a melhor solução.
4.2 Segunda corrente:
A segunda corrente, por sua vez, entende que o adicional de insalubridade deve continuar tendo como base de cálculo o valor do salário mínimo vigente, até que a inconstitucionalidade declarada pelo STF seja, em obediência ao principio da legalidade, superada por uma norma coletiva ou por meio de lei.
De todas as correntes aqui apresentadas, essa indubitavelmente é a de implantação mais pratica. Esta é, inclusive, a corrente acolhida pelo STF. Data a máxima vênia, em que pese a praticidade deste entendimento, o próprio Supremo, em seu enunciado vinculante nº 4 afirmou que a indexação do salário mínimo a qualquer vantagem econômica é considerado inconstitucional.
Não nos parece sensato, diante do exposto, que o art. 192 tenha sido considerado inconstitucional sem pronuncia de nulidade e ainda continue sendo utilizado como base de cálculo do adicional de insalubridade. Ao nosso sentir, a referida decisão não propôs uma solução que pôs termo a controvérsia jurídica, mas definiu uma solução de fácil implantação haja vista que em nada modificou o panorama das relações de trabalho, que já vinham utilizando o referido parâmetro anteriormente.
Quem ficou desassistido, com a adoção desta corrente, foi o trabalhador que mais precisa desse acrescimento salarial ao seu patrimônio; aquele que dia a dia tem a sua saúde diminuída por trabalhar numa condição não hígida.
Fica muito evidente o desamparo ao trabalhador com a escolha desta corrente, a uma porque a assistência publica à saúde em nosso País notadamente é, de modo geral, deficiente; e a duas, sob um viés pratico, porque quase sempre, salvo raras exceções, o trabalhador tem que se socorrer a assistência privada de saúde para tratar de um problema de saúde.
Desta forma,o trabalhador que atue nessa situação, por estar exposto a uma condição de trabalho insalubre, fatalmente estará mais propenso a precisar de assistência de saúde. Naturalmente, com o intuito de previnir ao desgaste da saúde, o obreiro se socorrerá a um plano de saúde.
Assim, considerando que atualmente a gradação do salário mínimo na forma do art. 192 não consegue cobrir um plano de saúde, o trabalhador além de ter a sua saúde diminuída terá, na verdade, um decréscimo salarial ao trabalhar naquelas condições.
4.3 Terceira Corrente:
Já a terceira corrente, defende que a base de cálculo do adicional de insalubridade deve ser a remuneração do empregado, haja vista o teor contido no art. 7º XXIII da constituição federal que prevê como direito do empregado o adicional de insalubridade na forma da lei.
Antes de adentrarmos nas explanações acerca desta tese, inicialmente, devemos esclarecer o conceito de remuneração. Neste interim, conforme preleciona o Professor Ricardo Resende (2014), entende-se por remuneração a integralidade dos pagamentos diretos (os efetuados diretamente pelo empregador) e dos pagamentos indiretos (feitos por terceiros) ao empregado em virtude do contrato de trabalho.
Portanto, devemos entender a remuneração como a integralidade dos valores percebidos pelo obreiro em virtude da relação de trabalho que o mesmo possua com o empregador. A remuneração, em suma, se trata de um gênero do qual o salário pertence.
Feito o esclarecimento supra, do ponto de vista econômico, podemos afirmar que essa corrente é a que mais atende aos anseios do trabalhador. Não apenas pela perspectiva econômica, mas esta corrente consegue de uma forma efetiva recompor a perda da saúde do trabalhador.
Sobre outro aspecto, temos que esse parâmetro de cálculo do adicional agrega ao obreiro qualidade de vida, já que com um efetivo acréscimo patrimonial ao salário, o trabalhador conseguirá, além de cobrir a suas despesas com saúde, que naturalmente será mais desgastada ante a de um empregado que labore em condições hígidas, poderá ainda desfrutar de uma melhoria da sua condição social (CF, art. 7º parte final e IV) com o acréscimo pecuniário que o referido complemente salarial irá lhe trazer.
Em que pese os benefícios, a classe mais atingida com a atividade insalubre, a trabalhadora, entendemos que do ponto de vista jurídico essa tese padece de algumas incongruências. É que o adicional de insalubridade possui natureza salarial e é percebido em virtude da contraprestação do trabalho nas condições não hígidas.
Assim, não é legitimo pensarmos que a base de cálculo do adicional de insalubridade esteja agregada de valores de caráter indenizatório ou ainda de remunerações indiretas como as gorjetas e gueltas ou ainda daquelas que não possuem caráter salarial contidas no art. 457 da CLT.
4.4 Quarta corrente:
A quarta corrente, enfim, por interpretação analógica ao parâmetro conferido ao adicional de periculosidade, define como base de cálculo do suplemento de insalubridade o salário básico do trabalhador.
Esta analogia é pertinente haja vista que em âmbito normativo, ambos os adicionais caminham juntos na maioria das vezes, seja na constituição (art. 7º, XXIII da CF) ou no próprio diploma trabalhista, por toda a seção XIII (que regula as atividades insalubres e perigosas).
Diante desta estreita ligação entre os referidos institutos, com a devida vênia, em nossa ótica não é concebível qualquer motivo para o legislador diferenciar a base de cálculo do adicional de periculosidade do adicional de insalubridade, desprivilegiando os trabalhadores submetidos a uma condição de trabalho não salubre daqueles que laboram numa condição perigosa.
Esta corrente caminhou dentro do paradigma normativo constitucional a medida que em estrita observância ao princípio da razoabilidade, teve a cautela de criar um parâmetro que não onerasse demasiadamente qualquer das classes envolvidas na relação de trabalho; seja a patronal, à medida que não a onerou completamente, não fazendo incidir como parâmetro de cálculo a totalidade das remunerações devidas ao obreiro, com vistas inclusive a se evitar o enriquecimento ilícito; e a classe laboral, se observarmos que buscou-se o equilíbrio entre a perda de saúde sofrida pelo obreiro com uma efetiva e justa recomposição econômica, fazendo incidir apenas o salário contratual na base de cálculo do adicional em comento.
Essa é inclusive a posição adotada pela corte superior trabalhista, ficando muito evidente no enunciado de sua súmula 228, cuja redação original (antes da suspensão da eficácia pela decisão liminar do STF) possui o seguinte teor:
Súmula nº 228 – ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. BASE DE CÁLCULO. A partir de 9 de maio de 2008, data da publicação da súmula vinculante nº 4 do Supremo Tribunal Federal, o adicional de insalubridade será calculado sobre o salário básico, salvo critério mais vantajoso fixado em instrumento coletivo.
No mesmo sentido, temos ainda a súmula 17 editada pelo TST, hoje cancelada pela resolução nº 148, de 26/06/2008, que previa a seguinte disposição:
Súmula nº 17 – Adicional de insalubridade. O adicional de Insalubridade devido a empregado que, por força de lei, convenção coletiva ou sentença normativa, percebe salário profissional será sobre este calculado.
Diante destes enunciados, fica clara a adoção desta corrente pelo TST. Como afirmado alhures, privilegiou-se aqui uma regra condizente com a realidade de cada região, a medida que cada contrato de trabalho teria a sua própria base de cálculo, o seu próprio salário contratual.
Dentre as correntes apresentadas, não obstante, esta é a que mais guarda obediência à baliza constitucional, a medida que, como demonstrado supra, observa o princípio basilar da isonomia (lato sensu) e outros princípios, como o da razoabilidade, tendo em vista que o parâmetro definido é adequado (quando se aproxima do equilíbrio de contraprestações pelo obreiro e patrão) e necessário (a medida que se buscou uma solução como o mínimo de ônus para as partes envolvidas), bem como, enfim, a regra do art. 7ª caput da Carta Magna já que regula o adicional de insalubridade de uma forma que efetivamente melhore a condição social do trabalhador.
Malgrado o que se afirmou, bem como o entendimento da egrégia corte Superior do Trabalho, após a Reclamação constitucional ajuizada pela confederação nacional da indústria, o STF, em decisão liminar em medida cautelar proferida em 2008 de relatoria do Min. Gilmar Mendes, suspendeu a eficácia da súmula 228 na parte em que se autorizou a utilização do salário base como parâmetro de cálculo do adicional de insalubridade, sob o argumento de que teria a referido enunciado, ao permitir o uso do salário base como cálculo do adicional em tela, criado parâmetro sem base normativa.
Desta forma, nos dias de hoje, o entendimento neste tópico não pode ser utilizado nas relações trabalhistas em face da expressa suspensão do pretório excelso.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por tudo o que aqui se explanou, fica claro que diante de uma pluralidade de correntes e do vácuo normativo criado com a declaração de inconstitucionalidade sem pronuncia de nulidade da parte final do art. 192 deu margem a uma grande controvérsia doutrinária.
Ao nosso entender, sob um viés pratico a saída criada pelo STF em nada alterou o status quo anterior, haja vista que diante da morosidade do poder legislativo em regular a matéria, lamentavelmente a classe trabalhadora ficará desassistida, por que a solução provisória atende, sobretudo, aos interesses da classe patronal já que o parâmetro a ser utilizado continuará sendo o salário mínimo, ou seja, a menor base de cálculo que se poderia alcançar. E o trabalhador, enquanto não houver uma edição de uma lei pelo poder legislativo, continua "a ver navios" tendo a sua saúde depreciada mês a mês.
Salientamos, enfim, que o artigo em tela não tem o condão de resolver a controvérsia que aqui se discute mas tenta, de alguma forma, evidenciar o debate apresentando as possíveis soluções e trazendo um ponto de vista sobre o tema.
Referências Bibliográficas:
MARTINS, Sergio Pinto. 28 ed. – São Paulo; Atlas, 2012.
CABANELLAS, Guillermo. Derecho de los riesgos del trabajo, Omeba, 1968, p. 48.
TST.Notícias do TST. Turma mantém acumulação de adicionais de insalubridade e periculosidade. Disponível em: <http://www.tst.jus.br/noticias/-/asset_publisher/89Dk/content/turma-mantem-acumulacao-de-adicionais-de-insalubridade-e-periculosidade> Acesso em 01/11/2022.
TRT 3ª Região . Empregador deve fiscalizar e cobrar uso do EPI. Disponível em: <trt-3.jusbrasil.com.br/noticias/100477786/empregador-deve-fiscalizar-e-cobrar-uso-do-epi> acesso em: 06/09/2022
CASSAR, Vólia Bomfim. “Direito do Trabalho.” iBooks. Acesso em 25/08/2022
SARAIVA, Renato. Como se preparar para a 2ª fase do Exame de Ordem: trabalho. 8ª ed.. São Paulo: Método, 2012.
RESENDE, Ricardo. Direito do Trabalho Esquematizado. iBooks. 2014. Acesso em: 15/09/2022.
BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. IRR-E-ED-RR-239-55.2011.5.02.0319, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Redator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 15/05/2020 Disponível em: < https://www.trt6.jus.br/portal/jurisprudencia/temas-e-precedentes/15129>
Acesso em: 17/09/2022
Bacharel em Direito pela Sociedade de Ensino Universitário do Nordeste – SEUNE (2014), Pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Anhanguera – Uniderp (2019), Pós-graduado em Direito Processual pela Escola Superior da Magistratura do Estado de Alagoas – ESMAL (2020). Qualificação Profissional: Gestor da Pós-Graduação ESMAL desde 2018 até os dias atuais, Gestor do Mestrado ESMAL/UNIT desde 2020, Professor Acadêmico ESMAL (2023). Técnico Judiciário desde 2013.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FIRMINO, Diego Ramon Omena. Adicional de insalubridade: a base de cálculo para a sua incidência e os seus reflexos nas relações de trabalho Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 jun 2023, 04:27. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/61819/adicional-de-insalubridade-a-base-de-clculo-para-a-sua-incidncia-e-os-seus-reflexos-nas-relaes-de-trabalho. Acesso em: 21 nov 2024.
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