RESUMO: O presente artigo analisa as condições precárias das pessoas que vivem em situação de rua no Brasil, colocando em evidência a ineficiência dos sistemas de proteção social brasileiros e enfatizando como a atuação do Estado perante essas pessoas se mostra omissa e ineficaz, reduzindo de forma considerável a proteção constitucional e normativa dos direitos à dignidade da pessoa humana, da família e da pessoa idosa, retrocedendo como um Estado democrático e igualitário para todos, e inobservando os direitos fundamentais dessas pessoas, como moradia, alimentação, saúde, educação, entre outros previsto no art. 6º da Constituição Federal.
Palavras-chave: pessoas em situação de rua; direitos humanos; dignidade da pessoa humana.
ABSTRACT: This article analyzes the precarious conditions of people living on the streets in Brazil, highlighting the inefficiency of Brazilian social protection systems and emphasizing how the State's action towards these people is silent and ineffective, reducing considerable constitutional and normative protection of the rights to the dignity of the person, the family and the elderly, receding as a democratic and egalitarian State for all, disregarding the fundamental rights of these people, such as housing, food, health, education, among others provided for in the art. 6 of the Federal Constitution.
Keywords: homeless people; human rights; dignity of human person.
INTRODUÇÃO
O presente artigo irá abordar, sem pretensão de exaurir o tema, em virtude de sua complexidade e extensão, o contexto em que vivem as pessoas em situação de rua no Brasil, bem como os direitos fundamentais dessa população, que visam resguardar direitos como moradia, alimentação, saúde, educação, entre outros, todos previstos no art. 6º da Constituição Federal.
Ademais, a discussão terá enfoque na violação dos direitos fundamentais pelos entes federativos e nas políticas públicas que o Estado proporciona às pessoas em situação de rua, identificando quais são as políticas públicas voltadas para essa população, e se essas políticas são suficientes para assegurar-lhes o mínimo existencial, para que tenham uma vida digna, ou se as políticas públicas estatais estão defasadas e não conseguem alcançar esse público.
Constitucionalmente, no rol dos direitos sociais encontra-se o direito à moradia, todavia, não é um direito assegurado a todos, visto que existe uma parte da população brasileira que vive em situação de rua, tornando essa parte da população invisível perante a sociedade e o Poder Público, pois estas situações se desencadeiam em razão da pobreza e da desigualdade social, violando gravemente a Constituição Federal.
Diante da problemática apresentada, o presente estudo delineará como se dá o acesso da população em situação de rua aos seus direitos fundamentais, e em seguida, exporá argumentos para que se realize uma reflexão teórica, iniciada pela análise sobre o perfil da população em situação de rua, com destaque aos direitos fundamentais e o direito à moradia, além de analisar a ressocialização e o acolhimento social desses sujeitos.
Ainda será abordada a Política Nacional para a População de Rua, as recentes decisões do Supremo Tribunal Federal acerca do tema, bem como quais resultados poderão ser alcançados por esta parcela da sociedade.
1. PESSOAS EM SITUAÇÃO DE RUA: CONCEITUAÇÃO
De forma objetiva, a situação de rua se refere ao modo em que as pessoas se utilizam da rua como moradia ou pernoite, ficando em todo tipo de espaço, como pontes, marquises, viadutos, em frente a prédios públicos e privados, preferindo lugares públicos que não são utilizados durante a noite, como parques, praças, calçadas, praias, embarcações, estações de trem e rodoviárias, a margem de rodovias, abrigados em esconderijos, metrôs, galerias subterrâneas e outras construções com áreas internas que possam ser ocupadas ou servir como abrigos temporários, além de depósitos e prédios que estão em desuso, porém que possam oferecer proteção do frio e da exposição à violência. Além disso, também são considerados como população de rua, aqueles que dormem em albergues e abrigos de forma preferencial ou ocasional, alterando o local de repouso noturno entre esses tipos de instituições e as ruas. (Política Nacional de Assistência Social, 2018).
Antes mesmo da implementação da Política Nacional para a população em situação de rua, proposta pelo Decreto nº 7.053/2009, já havia discussões acerca da necessidade de prover moradia para as pessoas em situação de rua. Após a implementação da Política Nacional e também do Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento (CIAMP-Rua), foram viabilizadas várias políticas sociais para as pessoas em situação de rua, tendo grandes avanços entre o ano de 2009 até 2016, como a inclusão da Pop Rua no Cadastro Único, Consultórios na Rua e Definição da moradia como prioridade (Housing First).
No entanto, embora o país tenha avançado nas implantações voltadas para esses indivíduos, uma grande parte da sociedade reproduz comportamentos retrógrados, conservadores e antidemocráticos, ignorando essas pessoas, fazendo com que elas se tornem cada vez mais invisíveis. Por outro lado, existe uma parte da sociedade que intervém na vida dessas pessoas fazendo ações de caridade, projetos voluntários, porém temporários, que, apesar das boas intenções, não resolvem o maior problema dessas pessoas, que é a falta de moradia.
Dessa forma, as condições das pessoas em situação de rua é uma pauta que vem sendo discutida nas políticas públicas, com a complexidade e necessidade de intervenção dos campos, sendo a saúde, assistência social, habitação, educação e outros. Essas pessoas convivem com a falta de garantia e acesso aos direitos sociais conquistados pela Constituição Federal de 1988 (ABREU & SALVADORI, 2015).
A população em situação de rua apresenta uma relação variável entre o tempo na rua e os mais diversos vínculos sociais. Visualizando por esta perspectiva, faz-se interessante listar três grandes situações que, de alguma maneira, ajudam a traçar o perfil desse grupo: ficar na rua (momento circunstancial), estar na rua (a rua como o local de pernoite) ou ser de rua (a rua torna-se um espaço de moradia de forma praticamente definitiva). Logo, apesar da dignidade humana ser assegurada para todos, nos termos da lei, ela não se encontra plenamente desenvolvida e acessível a essas pessoas (VIEIRA e COL, 2004).
Frisa-se que ao ficarem em situação de rua, essas pessoas ficam expostas à insegurança, desprotegidos, sujeitos à violência permanente, e ainda são vistas como marginais por diversas vezes necessitarem se defenderem de agressões verbais e físicas, ou para não ocorrer alguma situação desagradável. A instalação das pessoas nas ruas é sinônimo de perigo pela sociedade, apenas pelo fato de morarem em rua, independente das circunstâncias que as levaram até lá (OLIVEIRA, 2011).
Além da definição do que seria população em situação de rua, a identificação dos fatores que levam estes indivíduos a viverem nas ruas deveria ser o primeiro passo na elaboração de políticas capazes de minimizar esta condição social. Questões como baixa renda e problemas com álcool e outras drogas são os principais determinantes que levam os indivíduos à situação de rua, além dos desastres naturais ou provocados pelo homem. (EARLY, 2005; UN, 2015). Contudo, independente da causa primária que leva os indivíduos para as ruas, uma das questões centrais que deve ser elencada é a falta de estrutura por parte dos Estados na defesa dos direitos. “Pessoas ficam nas ruas quando causas estruturais aparentemente externas vão ao encontro de padrões sistêmicos da exclusão social e discriminação e os governos fracassam em lidar com os novos desafios dentro da perspectiva dos direitos humanos." (UN, 2015, p.10)
Em fevereiro de 2023, foi realizada uma pesquisa pelo IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, no Brasil, demonstrando que já no início deste ano, o número da população de rua havia superado as 281 mil pessoas que estavam em situação de rua no Brasil em 2022. Isso representa um aumento de 38% desde 2019, após a pandemia causada pela Covid-19.
Existem diversos fatores que levam as pessoas a permanecerem nas ruas, como vícios, problemas familiares, ausência de ajuda estatal, e é razoavelmente difícil elencar tais fatores com precisão, podendo ser o mais aleatório, visto que pessoas de diferentes graus de instrução se encontram nesta situação, mas um fato é que ninguém escolhe essa vida, existem razões para essas pessoas não terem onde morar, e é mais que necessário que o Estado assuma seus deveres para preservar a dignidade, a vida e os direitos que essas pessoas têm.
2. ANÁLISE DOS PRINCIPAIS DIREITOS VIOLADOS
A dignidade da pessoa humana é um dos maiores, se não o maior, fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, III, CF/88), sendo dever do Estado zelar pelos direitos humanos, com a finalidade de garantir o mínimo existencial digno para todas as pessoas. Portanto, é a partir do princípio da dignidade da pessoa humana que se deve olhar e interpretar todas as normas jurídicas ou administrativas que visam modificar, resguardar ou ampliar os direitos das pessoas em situação de rua, pois, “pensar em dignidade da pessoa humana significa, acima de tudo, colocar a pessoa humana como centro e norte para qualquer processo jurídico de interpretação, seja na elaboração da norma, seja na sua aplicação” (OLIVEIRA; LAZARI, 2018, p. 129).
Uma das principais finalidades que o princípio da dignidade da pessoa humana possui é o de colocar todo ser humano como sujeito pleno de direitos e obrigações, independentemente de qualquer tipo de discriminação. Portanto, é a partir deste fundamento da República Federativa do Brasil que serão analisados os principais direitos violados da população em situação de rua.
2.1 Direito à alimentação, ao vestuário e à moradia
O direito à alimentação, ao vestuário e à moradia constituem o tripé básico para que qualquer pessoa possa alcançar uma vida com o mínimo de dignidade. Baseado nesta tríade, o ser humano se torna apto a conquistar melhores condições para promover um padrão de vida digno.
Enfatizando a importância destes direitos, cita-se os tratados internacionais que endossam a sua importância:
Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948): Art. 25: 1. Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle.
Pacto internacional sobre direitos econômicos, sociais e culturais (ONU, 1966): Art. 11: 1. Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa a um nível de vida adequando para si próprio e sua família, inclusive à alimentação, vestimenta e moradia adequadas, assim como a uma melhoria contínua de suas condições de vida. Os Estados Partes tomarão medidas apropriadas para assegurar a consecução desse direito, reconhecendo, nesse sentido, a importância essencial da cooperação internacional fundada no livre consentimento. 2. Os Estados Partes do presente Pacto, reconhecendo o direito fundamental de toda pessoa de estar protegida contra a fome, adotarão, individualmente e mediante cooperação internacional, as medidas, inclusive programas concretos, que se façam necessárias para: a) Melhorar os métodos de produção, conservação e distribuição de gêneros alimentícios pela plena utilização dos conhecimentos técnicos e científicos, pela difusão de princípios de educação nutricional e pelo aperfeiçoamento ou reforma dos regimes agrários, de maneira que se assegurem a exploração e a utilização mais eficazes dos recursos naturais; b) Assegurar uma repartição equitativa dos recursos alimentícios mundiais em relação às necessidades, levando-se em conta os problemas tanto dos países importadores quanto dos exportadores de gêneros alimentícios.
Protocolo de San Salvador (OEA, 1988): Art. 12: 1. Toda pessoa tem direito a uma nutrição adequada que assegure a possibilidade de gozar do mais alto nível de desenvolvimento físico, emocional e intelectual. 2. A fim de tornar efetivo esse direito e de eliminar a desnutrição, os Estados Partes comprometem‑se a aperfeiçoar os métodos de produção, abastecimento e distribuição de alimentos, para o que se comprometem a promover maior cooperação internacional com vistas a apoiar as políticas nacionais sobre o tema.
Observa-se, portanto, que as pessoas em situação de rua se enquadram no grupo de vulneráveis que mais sofrem com a questão da fome, vestuário e moradia. Desta forma, necessitam de uma proteção especial para que possam atingir a igualdade em dignidade e direitos em relação aos demais membros da sociedade. Reforçando este entendimento, a Convenção Interamericana sobre a Obrigação Alimentar prescreveu em seu art. 4º, que: “Toda pessoa tem direito a receber alimentos sem distinção de nacionalidade, raça, sexo, religião, filiação, origem, situação migratória ou qualquer outro tipo de discriminação” (OEA, 1989).
Impende ressaltar que a falta de moradia é uma das formas mais extremas de exclusão e de depreciação da dignidade da pessoa humana. Além do que, a alimentação, a moradia e a assistência aos desamparados constituem direitos fundamentais expressos no art. 6º da Constituição Federal. Portanto, é dever estatal garantir a população em situação de rua este suporte material que se configura no mínimo existencial para uma vida digna.
O Programa Minha Casa, Minha Vida, instituído pela Lei n. 11.977/2009, embora tenha ofertado a milhares de brasileiros o acesso à casa própria, não contemplou a população em situação de rua, visto que priorizou os integrantes que pertencem a um determinado grupo familiar e, é de notório saber, que as pessoas em situação de rua não estão nesta condição, muitas vezes porque foram afastadas de seus núcleos familiares, como observa-se o que está elencado no art. 3º da mencionada lei:
Art. 3º Para a indicação dos beneficiários do PMCMV, deverão ser observados os seguintes requisitos:
I - comprovação de que o interessado integra família com renda mensal de até R$ 4.650,00 (quatro mil, seiscentos e cinquenta reais);
II - faixas de renda definidas pelo Poder Executivo federal para cada uma das modalidades de operações;
III - prioridade de atendimento às famílias residentes em áreas de risco, insalubres, que tenham sido desabrigadas ou que perderam a moradia em razão de enchente, alagamento, transbordamento ou em decorrência de qualquer desastre natural do gênero;
IV - prioridade de atendimento às famílias com mulheres responsáveis pela unidade familiar; e
V - prioridade de atendimento às famílias de que façam parte pessoas com deficiência. (BRASIL, 2009).
Por fim, é possível afirmar uma ineficiência estatal no que concerne à provisão de moradia às pessoas em situação de rua e que, dentre outras situações, as políticas habitacionais existentes, como o do Programa Minha Casa, Minha Vida, não atendem à determinada parcela da população em situação de rua, qual seja, homens solteiros e/ou sem família, pois têm como beneficiários, em geral, núcleos familiares com mulheres responsáveis pela unidade familiar.
2.3 Direito à Saúde
A falta de moradia ocasiona inúmeras consequências às pessoas em situação de rua, visto que se torna um obstáculo ao próprio direito à saúde, além de maximizar a violação a este direito humano. Da mesma forma, a falta de uma nutrição adequada é fator desencadeador de diversas doenças. Tal afirmação foi constatada na pesquisa de Efren Fernandez Pousa Junior (2012, p. 67):
Em relação à saúde: 29,7% dos entrevistados afirmaram ter algum problema de saúde, dentre os mais apontados incluem-se transtornos mentais decorrentes de consumo de drogas e álcool, deficiências físicas e mentais causadas por doenças infecto-contagiosas e complicações físicas envolvendo violência. O fator alimentação encontra-se diretamente ligado ao fator saúde: a maioria (79,6%) faz ao menos uma refeição por dia, sendo que 27,4% compram comida com o dinheiro que conseguem nas ruas. Não conseguem se alimentar todos os dias 19% dos entrevistados. Os problemas de saúde mais citados são a hipertensão (10,1%), problema psiquiátrico/mental (6,1%), AIDS (54%) e problemas de visão/cegueira (4,6%). Do espaço amostral analisado 18,7% fazem uso de algum medicamento e os Postos de Saúde são as principais vias de acesso a eles (48,6% afirmaram consegui-los por esse meio). Quando doentes 43,8% dos entrevistados procuram em primeiro lugar o hospital/setor de emergência e em segundo lugar (27,4%) procuram os Postos de saúde.
Portanto, para que qualquer ser humano possa usufruir do mais elevado nível de saúde, se faz necessário proporcionar ao indivíduo as melhores condições de bem-estar possíveis, visto que o direito à saúde não se resume ao tratamento médico/hospitalar das patologias, já que “envolve muito mais do que cuidar de doenças que surjam, abrangendo a prevenção de condições que diminuam o bem-estar da pessoa” (OLIVEIRA; LAZARI, 2018, p. 468). Este entendimento foi bem ratificado pela Declaração Americana de Direitos Humanos (DADH):
Artigo XI. Toda pessoa tem direito a que sua saúde seja resguardada por medidas sanitárias e sociais relativas à alimentação, roupas, habitação e cuidados médicos correspondentes ao nível permitido pelos recursos públicos e os da coletividade. (OEA, 1948)
Dessa forma, ante o exposto acerca dos tratados internacionais delineados acima, e por se tratar de direito fundamental expresso na Constituição Federal, conclui-se que é dever do Estado assegurar o direito à saúde da população em situação de rua, sendo necessário levar em consideração o mais alto nível de bem-estar físico, mental e social.
2.4 Direito à Educação
No que se refere ao direito à educação, o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), em seu artigo 13 (ONU, 1966), aduz que a educação é o caminho que o ser humano deve seguir para alcançar seu pleno desenvolvimento, tendo sempre como base o respeito aos direitos humanos, in verbis:
1. Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa à educação. Concordam em que a educação deverá visar ao pleno desenvolvimento da personalidade humana e do sentido de sua dignidade e fortalecer o respeito pelos direitos humanos e liberdades fundamentais. Concordam ainda em que a educação deverá capacitar todas as pessoas a participar efetivamente de uma sociedade livre, favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e entre todos os grupos raciais, étnicos ou religiosos e promover as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.
Salienta-se a importância que possui o referido dispositivo, pois, ao declarar que toda pessoa tem direito à educação, deve-se ter como objetivo o fortalecimento do respeito pelos direitos humanos, incentivando-se, assim, a formação de uma sociedade mais justa e igualitária, pautada pelo respeito ao próximo e adquirindo consciência que é dever de todos cobrar do Estado a realização de políticas públicas voltadas para os grupos mais vulneráveis da população.
No que se refere às pessoas em situação de rua, de forma mais direta e objetiva, cita-se a alínea “d”, §3º, do art. 13, do Protocolo de San Salvador (OEA, 1988): “Deve‑se promover ou intensificar, na medida do possível, o ensino básico para as pessoas que não tiverem recebido ou terminado o ciclo completo de instrução do primeiro grau”. Todavia, sabe-se que a grande maioria das pessoas em situação de rua não tiveram acesso ao ensino fundamental e ao ensino médio, o que dificulta e impossibilita a introdução desta parte da sociedade nos setores de trabalho. Destaca-se, ainda, que o direito à educação constitui um direito fundamental para a Lei Maior, prevista no art. 6º da Constituição Federal.
2.5 Direito ao trabalho
Atualmente, o trabalho configura-se como o principal meio de sobrevivência dos indivíduos em uma sociedade, é por meio dele que se realiza um conjunto de atividades propostas pelo empregador com a pretensão de receber uma remuneração justa, sendo por meio desta contraprestação pecuniária que a pessoa conseguirá manter o sustento próprio e de sua família, podendo proporcionar para si e para os seus, uma vida digna. Por este motivo, a Constituição Federal (art. 7º, IV) garante o recebimento de um:
salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender às suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo. (BRASIL, 1988)
Portanto, sendo o trabalho o meio pelo qual as pessoas conseguem garantir sua subsistência, se faz necessário que o Estado seja capaz de realizar políticas públicas para qualificar as pessoas em situação de rua para o mercado de trabalho, além de promover formas em que eles consigam ser reinseridos na sociedade e, consequentemente, possam ser contratados, não sofram preconceito por seu passado e consigam prover o próprio sustento.
2.6 Direito à assistência social
A assistência social para as pessoas em situação de rua não está garantida apenas na Constituição Federal (artigos 6º e 194), mas também na Declaração Universal dos Direitos Humanos, e, além da população em situação de rua, devem atender qualquer outra pessoa que não tenha condições de manter o próprio sustento, seja por falta de trabalho ou por alguma doença incapacitante, sendo constituído um direito humano a ser assegurado pelo Estado, conforme preceitua o art. 25, da DUDH:
Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948): Art. 25: 1. Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle.
Pode-se definir que a assistência social é um direito cujo conteúdo determina a atuação do Estado brasileiro frente a situações de desigualdade, vulnerabilidade e risco social, sendo essa a motivação pela qual é considerado um direito de prestação material, que exige dos poderes estatais, sobretudo do Poder Legislativo, a adoção das medidas necessárias à sua viabilização. Portanto, trata-se de uma relação que possui dois entendimentos, sendo um compreendido como direito subjetivo, que assiste a quem dele necessitar, e em outro vértice, uma obrigação de prestação jurídica e material por parte dos Poderes Públicos.
Impende destacar que em 30 de dezembro de 2005, ocorreu umas das mais importantes conquistas para a população em situação de rua com a publicação da Lei nº 11.258, a qual alterou o art. 23, da Lei nº 8.742/1993, conhecida como Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), e estabeleceu a obrigatoriedade de criação de programas assistenciais direcionados a este contingente populacional, sendo a primeira lei a tratar da questão a nível nacional.
A Lei nº 11.258 regulamentou os artigos 203 e 204 da Constituição Federal, passando a determinar a estrutura do direito por meio de execução de uma política pública. Dessa forma, ratificou as diretrizes definidas no texto constitucional, no art. 204, ao estabelecer a primazia da responsabilidade do Estado na condução da política de assistência social em cada esfera de governo (art. 5º, II) o que reforça a centralidade e o papel do Estado nesta prestação, e como se pode observar em seu art. 1º, a LOAS define que:
[...] a assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento das necessidades básicas. (BRASIL, 1993)
Todavia, de forma contraditória, o que se nota é a ausência de políticas públicas assistenciais ou, quando presentes, ineficazes para atingir o público-alvo, tendo em vista que a quantidade e as necessidades da população em situação de rua só aumentam, e raríssimos são os casos dos indivíduos que se tornaram aptos ao ambiente de trabalho e conseguiram promover seu próprio sustento, por meio do auxílio governamental ou da prestação de assistência social.
3. POLÍTICA NACIONAL PARA A POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA
Inicialmente, faz-se imprescindível destacar que foi a partir de um trágico acontecimento, que ficou conhecido como “Massacre da Praça da Sé”, ocorrido em 19 de agosto de 2004, em que pessoas em situação de rua foram assassinadas por meio de golpes na cabeça, que esta parte da sociedade, até então invisível e esquecida pelo Estado e o restante da população, ganhou visibilidade mediante forte comoção social. A referida tragédia é considerada um marco histórico, pois somente a partir deste fato, o Estado passou a tratar as pessoas em situação de rua como sujeitos de direitos, compreendendo suas especificidades e necessidades.
O “Massacre da Praça da Sé”, apesar de trágico, foi um marco importante para as pessoas em situação de rua sentirem a necessidade de se organizarem e buscarem meios para reivindicar seus direitos. Por isso, mediante uma proximidade com os catadores de materiais recicláveis, devido ao 4º Festival Lixo e Cidadania, promovido pela Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis (Asmare), ocorrido em 05 de setembro de 2005 (MMA, 2005), nasce, oficialmente, o Movimento Nacional da População de Rua (FURTADO, 2017, p. 47), e, ainda no mês de setembro de 2005, foi promovido o I Encontro Nacional Sobre População em Situação de Rua pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, o qual apresentou os seguintes objetivos:
Reunir os diversos atores sociais que estão desenvolvendo ações com população em situação de rua visando discutir os desafios e estratégias para construção de políticas públicas nacionalmente articuladas para população em situação de rua no país; Informar os governos municipais, organizações não-governamentais e entidades representativas da população em situação de rua sobre as iniciativas do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) em relação às políticas de atenção à população em situação de rua; Conhecer as experiências de atuação com população em situação de rua que estão sendo desenvolvidas por governos municipais e organizações não-governamentais em capitais e municípios com mais de 300 mil habitantes presentes no Encontro; Conhecer as principais demandas que estão sendo dirigidas ao Estado, em suas três esferas administrativas, pelas entidades representativas da população em situação de rua; Discutir estratégias de participação popular e controle democrático das políticas públicas destinadas à população em situação de rua. A partir de uma referência ao contexto internacional acerca dos Direitos Humanos, faz-se necessário destacar que, no contexto nacional, o Decreto nº. 7.053/2009, que “instituiu a Política Nacional para População em Situação de Rua e seu Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento (...)” (BRASIL, 2012a). Também é importante salientar, ainda, a implementação de forma descentralizada e articulada entre a União e os demais entes federativos para acolhimento das pessoas em situação de rua.
Foi através do Decreto nº 7.053, de 23 de dezembro de 2009 que foi instituída a Política Nacional para a População em Situação de Rua (PNPSR), medida legal para assegurar o acesso amplo, simplificado e seguro aos serviços e programas que integram as diversas políticas públicas desenvolvidas pelos órgãos do Governo Federal.
A PNPSR tem como objetivo garantir que as pessoas em situação de rua participem dos processos de controle social, e possui entre seus princípios, além da igualdade e equidade, o respeito à dignidade da pessoa humana; o direito à convivência familiar e comunitária; a valorização e respeito à vida e à cidadania; o atendimento humanizado e universalizado; e o respeito às condições sociais e diferenças de origem, raça, idade, nacionalidade, gênero, orientação sexual e religiosa, com atenção especial às pessoas com deficiência.
O Decreto nº. 7.053/2009, em seu parágrafo único do art. 1º, define a população em situação de rua como:
[...] grupo populacional heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema, os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular, e que utiliza os logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma temporária ou permanente, bem como as unidades de acolhimento para pernoite temporário ou com moradia provisória
É possível elencar os seguintes objetivos que a Política Nacional para População em Situação de Rua pretende realizar:
I - Assegurar o acesso amplo, simplificado e seguro aos serviços e programas que integram as políticas públicas de saúde, educação, previdência, assistência social, esporte, moradia, segurança, cultura, lazer, trabalho e renda;
II - Garantir a formação e capacitação permanente de profissionais e gestores para atuação no desenvolvimento de políticas públicas intersetoriais transversais e intergovernamentais direcionadas às pessoas em situação de rua;
III- Instituir a contagem oficial da população em situação de rua;
IV- Produzir, sistematizar e disseminar dados e indicadores sociais, econômicos e culturais sobre a rede existente de cobertura de serviços públicos à população em situação de rua;
V- Desenvolver ações educativas permanentes que contribuam para a formação de cultura de respeito, ética e solidariedade entre a população em situação de rua e os demais grupos sociais, de modo a resguardar a observância aos direitos humanos;
VI- Incentivar a pesquisa, produção e divulgação de conhecimentos sobre a população em situação de rua, contemplando a diversidade humana em toda a sua amplitude étnico-racial, sexual, de gênero e geracional, nas diversas áreas do conhecimento;
VII- Implantar centros de defesa dos direitos humanos para a população em situação de rua;
VIII- Incentivar a criação, divulgação e disponibilização de canais de comunicação para o recebimento de denúncias de violência contra a população em situação de rua, bem como de sugestões para o aperfeiçoamento e melhoria das políticas públicas voltadas a este segmento;
IX- Proporcionar o acesso das pessoas em situação de rua aos benefícios previdenciários e assistenciais e aos programas de transferência de renda, na forma da lei;
X- Criar meios de articulação entre o Sistema Único de Assistência Social e o Sistema Único de Saúde para qualificar a oferta de serviços;
XI- Adotar padrão básico de qualidade, segurança e conforto na estruturação dos serviços de acolhimento temporário, de acordo com o disposto no artigo 8º;
XII- Implementar centros de referências especializados para atendimento da população em situação de rua, no âmbito da proteção social especial do Sistema Único de Assistência Social;
XIII- Implementar ações de segurança alimentar e nutricional suficiente para proporcionar acesso permanente à alimentação de rua, com qualidade;
XIV- Disponibilizar programas de qualificação profissional para às pessoas em situação de rua, com o objetivo de proporcionar o seu acesso ao mercado de trabalho.
Os objetivos elencados demonstram a tentativa de buscar amenizar ou evitar que a população em situação de rua sofra violência, bem como que tenha ao seu alcance todos os seus direitos enquanto cidadãos.
3.1 Decisão do Supremo Tribunal Federal na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 976
Recentemente, em 25 de julho de 2023, na ADPF nº 976, o ministro relator Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, em decisão liminar, tornou obrigatória a observância pelos Estados, Distrito Federal e Municípios das diretrizes contidas no Decreto Federal nº 7.053/2009, que instituiu a Política Nacional para a População em Situação de Rua, dentre outras determinações.
Já no dia 22 de agosto de 2023, em sessão virtual do Tribunal Pleno, por unanimidade, a decisão liminar foi referendada:
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, referendou a decisão que concedeu parcialmente a cautelar, tornando obrigatória a observância, pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, imediata e independentemente de adesão formal, das diretrizes contidas no Decreto Federal nº 7.053/2009, que institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua, bem como as seguintes determinações: “I) A formulação pelo PODER EXECUTIVO FEDERAL, no prazo de 120 (cento e vinte) dias, do PLANO DE AÇÃO E MONITORAMENTO PARA A EFETIVA IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL PARA A POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA, com a participação, dentre outros órgãos, do Comitê intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da Política Nacional para População em Situação de Rua (CIAMP-Rua), do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), da Defensoria Pública da União (DPU) e do Movimento Nacional da População em Situação de Rua. O plano deverá, no mínimo, conter os seguintes tópicos: I.1) Elaboração de um diagnóstico atual da população em situação de rua, com identificação do perfil, da procedência e de suas principais necessidades, entre outros elementos a amparar a construção de políticas públicas voltadas ao segmento; I.2) Criação de instrumentos de diagnóstico permanente da população em situação de rua; I.3) Desenvolvimento de mecanismos para mapear a população em situação de rua no censo realizado pelo IBGE; I.4) Estabelecimento de meios de fiscalização de processos de despejo e de reintegração de posse no país, e seu impacto no tamanho da população em situação de rua; I.5) Elaboração de diretrizes para a intervenção do Poder Público, pautadas no tratamento humanizado e não violento da população em situação de rua, englobando, entre outros, a formação e o treinamento de agentes públicos, bem como as formas de abordagens específicas aos `hiperhipossuficientes´; I.6) Elaboração de programas de capacitação e de sensibilização de agentes públicos das áreas da saúde, assistência social, educação, segurança pública, justiça, entre outras, para atuarem junto à população em situação de rua; I.7) Incorporação na Política Nacional de Habitação das demandas da população em situação de rua; I.8) Análise de programas de transferência de renda e sua capilaridade em relação à população em situação de rua; I.9) Previsão de um canal direto de denúncias contra violência; I.10) Elaboração de medidas para garantir padrões mínimos de qualidade nos centros de acolhimento, resguardando a higiene e a segurança dos locais; I.11) Desenvolvimento de programas de prevenção de suicídio junto à população em situação de rua; I.12) Elaboração de programas educacionais e de conscientização pública sobre a aporofobia e sobre a população em situação de rua; I.13) Formulação de políticas para fomentar a saída da rua através de programas de emprego e de formação para o mercado de trabalho; I.14) Elaboração de medidas para o fortalecimento de políticas públicas voltadas à moradia, trabalho, renda, educação e cultura de pessoas em situação de rua; I.15) Indicação de possíveis incentivos fiscais para a contratação de trabalhadores em situação de rua. (II) Aos PODERES EXECUTIVOS MUNICIPAIS E DISTRITAL, bem como onde houver atuação, aos PODERES EXECUTIVOS FEDERAL E ESTADUAIS que, no âmbito de suas zeladorias urbanas e nos abrigos de suas respectivas responsabilidades: II.1) Efetivem medidas que garantam a segurança pessoal e dos bens das pessoas em situação de rua dentro dos abrigos institucionais existentes; II.2) Disponibilizem o apoio das vigilâncias sanitárias para garantir abrigo aos animais de pessoas em situação de rua; II.3) Proíbam o recolhimento forçado de bens e pertences, assim como a remoção e o transporte compulsório de pessoas em situação de rua; II.4) Vedem o emprego de técnicas de arquitetura hostil contra as populações em situação de rua, bem como efetivem o levantamento das barreiras e equipamentos que dificultam o acesso a políticas e serviços públicos, assim como mecanismos para superá-las; II.5) No âmbito das zeladorias urbanas: II.5.1) Divulguem previamente o dia, o horário e o local das ações de zeladoria urbana nos seus respectivos sites, nos abrigos, e outros meios em atendimento ao princípio da transparência dos atos da administração pública permitindo assim que a pessoa em situação de rua recolha seus pertences e que haja a limpeza do espaço sem conflitos; II.5.2) Prestem informações claras sobre a destinação de bens porventura apreendidos, o local de armazenamento dos itens e o procedimento de recuperação do bem; II.5.3) Promovam a capacitação dos agentes com vistas ao tratamento digno da população em situação de rua, informando-os sobre as instâncias de responsabilização penal e administrativa; II.5.4) Garantam a existência de bagageiros para as pessoas em situação de rua guardarem seus pertences; II.5.5) Determinem a participação de agentes de serviço social e saúde em ações de grande porte; II.5.6) Disponibilizem bebedouros, banheiros públicos e lavanderias sociais de fácil acesso para população em situação de rua; II.5.7) Realizem de inspeção periódica dos centros de acolhimento para garantir, entre outros, sua salubridade e sua segurança; II.6) Realização periódica de mutirões da cidadania para a regularização de documentação, inscrição em cadastros governamentais e inclusão em políticas públicas existentes; II.7) Criação de um programa de enfrentamento e prevenção à violência que atinge a população em situação de rua; II.8) Formulação de um protocolo intersetorial de atendimento na rede pública de saúde para a população em situação de rua; II.9) Ampla disponibilização e divulgação de alertas meteorológicos, por parte das Defesas Civis de todos os entes federativos, para que se possam prever as ondas de frio com a máxima antecedência e prevenir os seus impactos na população em situação de rua; II.10) Disponibilização imediata: II.10.1) Pela defesa civil, de barracas para pessoas em situação de rua com estrutura mínima compatível com a dignidade da pessoa humana, nos locais nos quais não há número de vagas em número compatível com a necessidade; II.10.2) A disponibilização de itens de higiene básica à população em situação de rua. (III) Aos PODERES EXECUTIVOS MUNICIPAIS E DISTRITAL, no prazo de 120 (cento e vinte) dias, a realização de diagnóstico pormenorizado da situação nos respectivos territórios, com a indicação do quantitativo de pessoas em situação de rua por área geográfica, quantidade e local das vagas de abrigo e de capacidade de fornecimento de alimentação”. Tudo nos termos do voto do Relator. O Ministro André Mendonça acompanhou o Relator com ressalvas. Falaram: pelos requerentes Partido Socialismo e Liberdade (P-SOL) e Movimento dos Trabalhadores Sem Teto - MTST, o Dr. André Maimoni; pelo interessado Governador do Estado do Rio de Janeiro, o Dr. Marcelo Rocha de Mello Martins, Procurador do Estado; pelo amicus curiae Grupo de Atuação Estratégica das Defensorias Públicas Estaduais e Distrital nos Tribunais Superiores – GAETS, a Dra. Fernanda Penteado Balera, e, pelos amici curiae Movimento Nacional da População de Rua – MNPR, Movimento Nacional de Luta em Defesa da População em Situação de Rua – MNLDPSR e Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos, o Dr. Daniel Sarmento. Plenário, Sessão Virtual de 11.8.2023 a 21.8.2023.
É cediço que a referida decisão visa resguardar e efetivar os direitos fundamentais das pessoas em situação de rua, fazendo com que as diretrizes instituídas pela Municípios das diretrizes contidas no Decreto Federal nº 7.053/2009, que instituiu a Política Nacional para a População em Situação de Rua sejam cumpridas pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, visto que existe decreto, tratados e convenções internacionais, jurisprudências e diversas iniciativas legais dentro do ordenamento jurídico brasileiro que asseguram direitos básicos à essas pessoas e não são cumpridos.
Garantir os direitos desse grupo tão vulnerável exige uma abordagem humanitária e eficaz por parte da sociedade e do Estado, e na recente decisão da Suprema Corte, estipulou-se o prazo de 120 (cento e vinte) dias para que todos os entes federativos cumpram as diretrizes contidas no Decreto Federal nº 7.053/2009, que instituiu a Política Nacional para a População em Situação de Rua, a fim de buscar a efetivação dos direitos da população em situação de rua. A luta tem sido desafiadora, mas a esperança pode ser uma catalisadora para a mudança e a superação de tantos obstáculos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não há dúvidas de que a efetivação do princípio da dignidade da pessoa humana nos casos das pessoas em situação de rua está longe de ser uma realidade no Brasil. O aumento significativo dessa população é um reflexo das questões sociais e econômicas que a sociedade enfrenta e a omissão estatal contribui para a violação de tantos direitos humanos.
O Estado tem a responsabilidade de garantir o bem-estar de todos os cidadãos, incluindo as pessoas em situação de rua, o que exige a adoção de políticas públicas eficazes, programas de habitação acessíveis, serviços de saúde, além de oportunidades de emprego. A conscientização pública sobre as causas e os desafios enfrentados por esse grupo populacional é fundamental para obter apoio e pressionar por mudanças políticas.
A violação dos direitos humanos das pessoas em situação de rua é uma preocupação séria e complexa que requer uma resposta abrangente por parte do Estado e comunidade em geral.
Com a recente decisão do Supremo Tribunal Federal na ADPF 976, espera-se que as diretrizes da Política Nacional para a População em Situação de Rua sejam efetivadas, contribuindo, desse modo, para que a dignidade das pessoas em situação de rua seja restabelecida, observando-se os objetivos fundamentais da República Federal do Brasil, especialmente no que tange a promoção do bem de todos, erradicação da pobreza e marginalização, redução das desigualdades sociais e regionais e construção de uma sociedade livre, justa e solidária.
REFERÊNCIAS
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Bacharel em Direito pelo Centro Universitário da Grande Dourados. Pós-graduada em Direitos Humanos pela Faculdade CERS. Assessora jurídica na Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso do Sul.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERNANDES, Cinthia de Oliveira. Pessoas em situação de rua: Análise dos Direitos Humanos Violados Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 set 2023, 04:37. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/63114/pessoas-em-situao-de-rua-anlise-dos-direitos-humanos-violados. Acesso em: 23 dez 2024.
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