RESUMO: O presente trabalho pesquisará acerca da possibilidade de se suspender o fornecimento de energia elétrica quando se tratar de poder público inadimplente que presta serviços essenciais. Consistem nos objetivos deste trabalho pesquisar sobre a possibilidade de a empresa concessionária suspender o fornecimento de eletricidade. O tipo de pesquisa adotado neste trabalho será a doutrinária, bem como destacará a leis sobre o assunto. Os resultados alcançados implicam na impossibilidade de interromper o serviço de eletricidade, quando se tratar de poder público inadimplente que presta serviço essencial, sob pena de colocar em risco a segurança da população.
Palavras-chave: poder público, serviço público essencial, energia elétrica, empresa concessionária.
ABSTRACT: This paper will investigate the possibility of suspending the supply of electricity when it is a public power of default that provides essential services. The objectives of this work are to investigate the possibility of the concessionary company suspending the supply of eletricity. The type of research adopted in this work will be the doctrine, as well as highlight the laws on the subject. The results achieved imply that it is impossible to interrupt the electricity service, when it is a public power in default, which provides essential service, otherwise the safety of the population will be jeopardized.
Keywords: public power, essential public service, electricity, utility company.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho científico terá por finalidade discorrer acerca da possibilidade de ser interrompido pela empresa concessionária o fornecimento de eletricidade quando a administração pública prestadora de serviço essencial a população se tornar inadimplente.
Assim sendo, o presente artigo será divido em três capítulos. No primeiro capítulo observará quais são considerados serviços essenciais nos termos da Lei nº 7.783/89. O segundo capítulo abordará a possibilidade de ocorrer a suspensão do fornecimento de energia elétrica para o poder público inadimplente prestador de serviço essencial. No terceiro capítulo será destacada jurisprudência dos tribunais acerca do tema.
Para alcançar o desiderato científico proposto, será utilizada a metodologia doutrinária. Será levantada informação acerca do tema a partir da doutrina de Rafael Carvalho Rezende de Oliveira, Fernanda Marinela, José dos Santos Carvalho Filho, entre outros, bem como destacará a lei nº 8.987/95 e nº 7.783/89 e o Código de Defesa do Consumidor. O caminho metodológico utilizado proporcionará um maior entendimento acerca do problema, vez que a doutrina também destaca o entendimento dos tribunais acerca do objeto de estudo.
Por fim, o objeto deste trabalho científico voltará em investigar se a empresa concessionária poderá suspender o fornecimento de eletricidade ao poder público inadimplente prestador de serviço essencial.
1. SERVIÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS
Serviço público é toda atividade prestada pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes com a finalidade de atender ao interesse público.
Para Maria Sylvia Zanella di Pietro a definição de serviço público é “toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente público”. (DI PIETRO, 2017, p. 178).
Hely Lopes Meirelles possui um conceito mais restrito, tendo em vista que afasta os atos prestados pelo Poder Legislativo e Judiciário, ao considerar que serviço público é aquele prestado pela Administração Pública e também por seus delegados, respeitando as normas e controles estatais, a fim de satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da comunidade ou para atender conveniência do Estado. (MEIRELLES, 2016, p.418).
Aplica-se como princípios norteadores do serviço público as Leis de Rolland, elaborados pelo francês Louis Rolland, sendo: o princípio da continuidade, da igualdade e o da mutabilidade, dentre outros elencados pela doutrina atual.
Pelo princípio da igualdade o Estado deve tratar a todos de maneira isonômica, sendo que apenas nos casos previstos em lei este princípio terá sua aplicação atenuada.
No tocante ao princípio da mutabilidade, Marçal Justen Filho expressa que:
A mutabilidade significa a adaptação permanente e contínua das condições jurídicas e técnicas pertinentes à atividade, de modo a incorporar avanços e aperfeiçoamentos. A modificação das necessidades e o surgimento de novas soluções deve refletir-se no modo de desempenho do serviço público. (JUSTEN FILHO, 2016, p. 888)
Observa-se pelo princípio da mutabilidade, também denominado de adaptabilidade que a Administração Pública deve manter-se atualizada para melhor prestação de seus serviços, tanto em âmbito tecnológico, quanto jurídico e econômico.
Em relação ao serviço público adequado, Rafael Carvalho Rezende Oliveira preconiza que:
Daí que o art. 6.º, § 1.º, da Lei 8.987/1995 considera serviço adequado aquele que satisfaz “as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas”. Na mesma linha, o Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 22, exige que os serviços públicos sejam “adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos”. É a consagração, no direito positivo brasileiro, do conhecimento jurídico produzido nas últimas décadas, em âmbito nacional e internacional. (OLIVEIRA, 2013, p. 136 e 137)
Desta forma, destaca-se os serviços ou atividades que são considerados essenciais, elencados pela Lei nº 7.783/89, que dispõe sobre a greve dos empregados celetistas, em seu art. 10. São estes: tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de eletricidade, gás e combustíveis; assistência médica; distribuição e comercialização de medicação e alimentos; funerários; transporte coletivo; tratamento de esgoto e lixo; telecomunicações; controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares; processamento de dados ligados a serviços essenciais; controle de tráfego aéreo; compensação bancária. Trata-se de rol exemplificativo.
Assim, é importante mencionar que os serviços ou atividades supracitadas deverão atender a regularidade na sua prestação (princípio da continuidade do serviço público) e demais princípios acima elencados, sendo prestados de forma ininterrupta, a fim de evitar perigo iminente a subsistência, a higidez ou a segurança da população, nos termos do art. 11, em seu parágrafo único da mencionada lei.
2. DO PODER PÚBLICO INADIMPLENTE PRESTADOR DE SERVIÇO PÚBLICO
2.1 DO PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO
O princípio da continuidade não se encontra previsto expressamente no texto constitucional trata-se, pois de princípio infraconstitucional e traduz a ideia de que a atividade prestacional pública deve ser prestada de forma contínua e ininterrupta, vez que é destinada a atender as necessidades básicas da população. Desta forma, observa-se que o referido princípio é atinente aos serviços públicos.
Celso Antônio Bandeira de Mello esclarece que “por esse princípio entende-se que o serviço público, sendo a forma pela qual o Estado desempenha funções essenciais ou necessárias à coletividade, não pode parar” (MELLO, 2014, p. 70).
A continuidade propiciando os serviços públicos é assegurada por tal princípio e guarda relação com o princípio da eficiência, introduzido no ordenamento jurídico pela Emenda Completar nº 19/98, bem como com o princípio da supremacia do interesse público.
No entanto, não se traduz em um princípio absoluto, sendo certo que, em determinados casos será admitida a paralização temporária da atividade prestacional pública.
José dos Santos Carvalho Filho destaca que “é evidente que a continuidade dos serviços públicos não pode ter caráter absoluto, embora deva constituir a regra geral. Existem certas situações específicas que excepcionam o princípio, permitindo a paralisação temporária da atividade (CARVALHO FILHO, 2017, p. 56)”.
Desta forma, sendo evidente que o supracitado princípio norteia as atividades do poder público, os serviços prestados por este deverão ser contínuos, em regra, a fim de atender o bem maior, que neste caso, é o interesse público.
2.2 DA POSSIBILIDADE DE SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA AO PODER PÚBLICO INADIMPLENTE
Acerca do tema, é importante esclarecer que em um primeiro momento as jurisprudências dos tribunais rechaçavam a possibilidade de interrupção do fornecimento de energia elétrica diante de qualquer situação.
Com essa perspectiva pondera Gianfrancesco Genoso:
Fundamentalmente, tal entendimento assenta-se em três premissas ou argumentos: (i) a interrupção do serviço malfere o disposto no art. 42, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor; (ii) tal interrupção caracteriza exercício arbitrário das próprias razões; (iii) implica em verdadeira justiça privada ou autotutela, providência essa que não encontra amparo constitucional nem legal. (GENOSO, 2011, p. 90)
No entanto, o entendimento dos tribunais evoluiu a respeito do tema, passando a admitir a interrupção do serviço de energia elétrica desde que haja prévio aviso, bem como em se tratando das dívidas atuais com o fim de medida coercitiva para satisfazer o débito.
Ademais, cumpre destacar que o art. 6º, § 3º e incisos da Lei nº 8.987/95 lista as hipóteses em que será possível a suspensão do fornecimento de eletricidade, destacando-se as seguintes: em razão de ordem técnica ou segurança das instalações e, ainda, por inadimplência do usuário.
No entanto, conforme prevê o inciso II do referido artigo, para a suspensão por inadimplemento do usuário será considerado o interesse público. Desta forma, na probabilidade de afetar o interesse da população não será realizado o corte ou a suspensão da eletricidade.
Assim, faz-se imperioso ressaltar que não será em todos os casos em que o corte ou a suspensão do fornecimento de energia elétrica não será realizado, mas sim quando não atingir necessidades inadiáveis da comunidade.
Destaca José dos Santos Carvalho Filho que:
Em outra decisão, o STJ procurou conciliar a situação de inadimplência e a natureza do devedor. Sendo inadimplente Município na obrigação do pagamento da tarifa de energia elétrica, ficou decidido que a suspensão do serviço poderá atingir certos órgãos (ginásio de esportes, piscina municipal, biblioteca, almoxarifado, paço municipal, a Câmara Municipal, Correios, velório, oficinas e depósito), mas não poderia alcançar serviços essenciais (escolas, hospitais, usinas, repartições públicas). (CARVALHO FILHO, 2017, p. 242)
Consoante se observa do julgado do Superior Tribunal de Justiça, os serviços públicos considerados essenciais não serão prejudicados por corte ou suspensão de eletricidade, no entanto, aqueles que não sejam considerados essenciais, mesmo quando fornecidos pela Administração Pública, poderá haver o corte ou suspensão diante da falta de pagamento.
Neste sentido assevera Fernanda Marinela “nesse raciocínio, os nossos Tribunais impedem o corte quando a ausência do serviço causar um prejuízo irreparável, como ocorre na prestação de energia elétrica a hospitais, logradouros, repartições públicas e outros” (MARINELA, 2014, p. 555).
Desta forma, visando evitar perigo a saúde, segurança da população, em se tratando de atividade prestacional pública essencial, listadas pelo art. 10 da Lei nº 7.783/89, prestado pelo Poder Público não haverá o corte ou a suspensão diante do inadimplemento deste, considerando a aplicação do princípio da supremacia do interesse público sobre o privado.
José dos Santos Carvalho Filho afirma que:
[...] há decisões que entenderam inadmissível a suspensão do serviço, mesmo pago por tarifa, quando usuário é o Poder Público. No caso, invoca-se o argumento de que prédios públicos não podem deixar de funcionar, tendo em vista a supremacia do interesse público sobre o privado. (CARVALHO FILHO, 2017, p. 242)
Destaca-se que nestes casos, mesmo que haja o prévio aviso à Administração Pública, não haverá o corte ou a suspensão de eletricidade. Além disso, como o corte da energia elétrica em se tratando de serviço essencial não é licito, caberá a concessionária, portanto, realizar a cobrança na via ordinária.
Por outro lado, o art. 22 do Código de Defesa do Consumidor traz a ideia do princípio da continuidade do serviço público “os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos”.
O referido princípio é inerente à atividade prestacional pública e dispõe o serviço público deverá ser realizado de forma ininterrupta visado o bem maior, que nesse caso é a coletividade.
Conforme Rafael Carvalho Rezende de Oliveira:
Em hipóteses excepcionais, a interrupção do serviço público pode ser afastada, garantindo a continuidade do atendimento de direitos fundamentais, sendo lícito mencionar dois exemplos:
a) Poder Público como usuário do serviço concedido e prestação de serviços essenciais à população: a concessionária não pode interromper a prestação do serviço público ao Poder Público inadimplente quando este último prestar serviços essenciais à coletividade (ex.: impossibilidade de interrupção do serviço de energia para hospitais públicos, postos de saúde, escolas públicas), admitindo-se, por outro lado, o corte do serviço para as unidades estatais que não prestam serviços não essenciais (ex.: possibilidade de interrupção do serviço concedido para ginásio de esportes, piscina municipal, biblioteca pública), conforme jurisprudência do STJ.
Destarte, considerando que o princípio da continuidade não é absoluto, conclui-se que a manutenção do fornecimento de energia elétrica traduz em hipóteses excepcionais, de forma a imperar o interesse público, em se tratando de serviços essenciais. De modo a obstar perigo a saúde, subsistência e segurança da comunidade.
3. DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Em se tratando de atividade prestacional pública essencial a jurisprudência possui entendimento de que não é possível a suspensão do fornecimento de eletricidade pela concessionária ao poder público inadimplente. Tal fato encontra respaldo no princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, de modo que é protegido primeiramente os interesses da coletividade.
Não obstante a isso, a concessionária pública poderá se valer de ação ordinária a fim de receber pelos serviços prestados.
Abaixo destaca-se julgado do Superior Tribunal de Justiça a respeito do tema em análise:
RECURSO ESPECIAL Nº 1.531.966 - GO (2015/0108916-2) RELATOR: MINISTRO OG FERNANDES RECORRENTE : CELG DISTRIBUIÇÃO S/A ADVOGADOS : THYAGO MELLO MORAES GUALBERTO - GO018771 KEREN KAJITA E OUTRO (S) - GO021001 RECORRIDO : MUNICÍPIO DE TRINDADE ADVOGADOS : LEONARDO CAETANO DA SILVA - GO029850 GUSTAVO ALVES PIRES TEIXEIRA - GO024685 DECISÃO Vistos, etc. Trata-se de recurso especial interposto por CELG Distribuição S.A., com base nas alíneas a e c do inciso III do art. 105 da CF/1988, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, assim ementado (e-STJ, fl. 151): INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL. DÍVIDA PRETÉRITA. INADMISSIBILIDADE. MULTA DIÁRIA. REDUÇÃO. 1 - Possível a suspensão do fornecimento de energia elétrica na hipótese de inadimplemento, desde que não haja prejuízo à continuidade dos serviços públicos essenciais. Tal suspensão deve se dar em função de débitos atuais, do mês em que ocorrido o inadimplemento ou dos imediatamente anteriores, não se admitindo a interrupção por dívida pretérita. Precedentes. [...] No ponto, o Tribunal de origem consignou que: Entretanto, cumpre observar que mesmo que a interrupção no fornecimento de energia seja possível, é fato que a jurisprudência dos Tribunais vem adotando o entendimento de que, quando se trata de serviço público, prevalece o interesse social na manutenção da continuidade do serviço, não sendo possível, nestes casos, o corte. Assim, inobstante a legalidade do procedimento adotado e o cabimento do corte no fornecimento de energia elétrica no caso de inadimplemento do usuário, à luz do dispositivo acima reproduzido, em particular, do inciso II, os serviços essenciais do Estado devem ser excluídos do corte de energia elétrica, em razão da relevância na sua continuidade. Não há como acolher a tese defendida, que se fundamenta na possibilidade de corte no fornecimento de energia elétrica em razão de inadimplência do usuário, pois pacificada neste Tribunal Superior a orientação de que "é ilegítima a suspensão do fornecimento de energia elétrica como forma de compelir o Município ao pagamento do débito e em prejuízo do interesse da coletividade". Nesse sentido: ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. AUSÊNCIA DE OMISSÃO NO ACÓRDÃO REGIONAL. INADIMPLÊNCIA. PRÉDIO PÚBLICO. SERVIÇO ESSENCIAL. INTERRUPÇÃO. FORMA DE COMPELIR O MUNICÍPIO AO PAGAMENTO DO DÉBITO. INTERESSE DE TODA A COLETIVIDADE. ILEGITIMIDADE. ACÓRDÃO EM CONSONÂNCIA COM JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 568/STJ. [...] (AgInt no AREsp 893.273/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 4/8/2016, DJe 17/8/2016) PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SUSPENSÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO. INTERESSE DA COLETIVIDADE. PRESERVAÇÃO DE SERVIÇOS ESSENCIAIS. 1. Imperiosa a demonstração de maneira clara e expressa das questões sobre as quais o Tribunal de origem teria se mantido silente, sob pena de inadmissibilidade do apelo nobre por afronta ao art. 535, inc. II, do CPC, a teor do que dispõe a Súmula 284/STF. [...] 3. "A suspensão do serviço de energia elétrica, por empresa concessionária, em razão de inadimplemento de unidades públicas essenciais - hospitais; pronto-socorros; escolas; creches; fontes de abastecimento d'água e iluminação pública; e serviços de segurança pública -, como forma de compelir o usuário ao pagamento de tarifa ou multa, despreza o interesse da coletividade" (EREsp 845.982/RJ, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 24/6/2009, DJe 3/8/2009). 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 543.404/RJ, de minha relatoria, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/2/2015, DJe 27/2/2015) Assim, como se verifica, o acórdão combatido está em consonância com a jurisprudência desta Corte Superior, incidindo na hipótese a Súmula 568 do STJ. Ante o exposto, com fulcro no art. 932, IV, do CPC/2015, c/c o art. 255, § 4º, II, do RISTJ e a Súmula 568/STJ, nego provimento ao recurso especial. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 26 de maio de 2017. Ministro Og Fernandes Relator
Conforme já mencionado, será viável a suspensão do fornecimento de eletricidade diante da inadimplência do ente estatal, sob a condição de que não cause danos à continuidade dos serviços públicos essenciais. A suspensão recairá sobre débitos atuais, sendo necessária a prévia notificação.
Importante destacar a decisão da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça de Relatoria da Mininistra Eliana Calmon no REsp 771.853-MT, salientado por Fernanda Marinela:
É cediço que a jurisprudência da Primeira Seção firmou-se no sentido de não se admitir a suspensão do fornecimento de energia elétrica em hospitais públicos inadimplentes, em razão do interesse da coletividade. No entanto, tal orientação não prospera na hipótese de hospital particular que funciona como empresa, isto é, com objetivo de auferir lucros, embutindo, inclusive, nos preços cobrados de seus clientes, o valor dos custos da energia elétrica consumida. Nesse sentido, já decidiu o STJ que não cabe indenização quando o corte do serviço foi precedido de todas as cautelas (REsp 771.853/MT, STJ – Segunda Turma, Rel.ª Min.ª Eliana Calmon, julg: 02.02.2010, DJe: 10.02.2010).
Consoante se extrai do julgamento do Recurso Especial, em se tratando de hospital particular que aufere lucro haverá a interrupção do serviço de eletricidade, vez que o valor para pagamento do serviço é obtido através dos preços cobrados dos clientes. Desta forma, havendo notificação prévia e cobrança de débito atual há possibilidade de suspender o serviço.
Assim, depreende-se que à administração pública inadimplente, desde que preste serviços públicos essenciais e que a sua ausência cause prejuízo irreparável à comunidade, diante da supremacia do interesse público e do princípio da continuidade, não será suspenso o fornecimento de energia elétrica, a fim de resguardar a subsistência, higidez e segurança da população.
CONCLUSÃO
Os estudos realizados, demostraram que em um primeiro momento, o entendimento que predominava nos tribunais era de que não poderia haver suspensão do serviço de energia elétrica em nenhuma hipótese.
No entanto, com o passar do tempo, analisou-se que a jurisprudência evoluiu passando a não admitir a interrupção do fornecimento de eletricidade em casos específicos. Em regra, havendo notificação prévia ao usuário e em se tratando de débito atual, poderá a concessionária realizar o corte do serviço.
Não obstante a isso, concluiu-se que quando se tratar de poder público inadimplente em um primeiro momento também poderá haver o corte do serviço de eletricidade.
Em que pese tal fato, observou-se que quando a administração pública inadimplente prestar serviço de natureza essencial a comunidade, sendo aquele em que sua ausência acarreta prejuízos extensos a população, não haverá a interrupção do serviço de eletricidade. Até porque, o art. 11, parágrafo único da Lei 7.783/89, dispõe que se deve obstar de perigo iminente a subsistência, a higidez ou a segurança da população. Desta forma, concluiu-se que prevalece o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado e o princípio da continuidade.
Contudo, em que pese não poder a concessionária pública interromper o serviço de forma a compelir o pagamento, estudou-se que esta poderá se valer das vias ordinárias para efetuar a cobrança.
Por fim, analisou-se que em relação a hospitais particulares que auferem lucro, o entendimento dos tribunais é no sentido de que a estes cabe a suspensão do fornecimento de eletricidade, tendo em vista que o valor para pagamento do serviço é obtido através dos preços cobrados dos clientes.
REFERÊNCIAS
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______, Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Vade Mecum. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2015. 2184 p.
______, Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, e dá outras providências. Vade Mecum. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2015. 2184 p.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 26 ed. São Paulo: Atlas, 2013. 1266 p.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 23 ed. São Paulo: Atlas, 2010. 875 p.
GENOSO, Gianfrancesco. Princípio da continuidade do serviço público. 2011. 146 f. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011.
JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 12 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.1321 p.
MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo. 8 ed. Niterói: Impetus, 2014. 1224 p.
MEIRELLES, Hely Lopes; BURLE FILHO, José Emmanuel. Direito Administrativo Brasileiro. 42 ed. São Paulo: Malheiros, 2016. 968 p.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 32 ed. São Paulo: Malheiros, 2015.1150 p.
OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende de. Curso de Direito Administrativo. 6 ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2018. 1008 p.
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STJ. RECURSO ESPECIAL: REsp 1.531.966 GO 2015/0108916-2. Relator: Ministro Og Fernandes. DJ: 31/05/2017. JusBrasil, 2017. Disponível em: <https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/467848229/recurso-especial-resp-1531966-go-2015-0108916-2 >. Acesso em: 20 nov. 2018.
Graduação em Direito na Faculdade de Direito de Francisco Beltrão/PR - CESUL - Centro Sulamericano de Ensino Superior Vínculo de Especialização: Universidade Anhanguera-Uniderp. Pós-graduada no curso de Direito Administrativo da rede de ensino LFG/Anhanguera. Pós-graduada em Tutela Coletiva e Direitos Difusos da rede de ensino LFG/Anhanguera. Advogada. Conciliadora do Juizado Especial Cível, Criminal e da Fazenda Pública da Comarca de Francisco Beltrão, Estado do Paraná .
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AMARAL, Suzany do. Princípio da continuidade do serviço público e possibilidade de suspensão do fornecimento de energia elétrica ao poder público inadimplente Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 out 2023, 04:35. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/63530/princpio-da-continuidade-do-servio-pblico-e-possibilidade-de-suspenso-do-fornecimento-de-energia-eltrica-ao-poder-pblico-inadimplente. Acesso em: 23 dez 2024.
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