Resumo: O nome da pessoa natural, atributo do direito da personalidade, registrado no Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais, recebeu muitas inovações com o advento da Lei Federal 14.382/22, permitindo na via administrativa extrajudicial a modificação de prenome e inclusão de apelidos de família. Por sua vez, o Provimento 149/2023 do Conselho Nacional de Justiça, autorizou pela via extrajudicial diversos procedimentos que modificam o nome da pessoa física, como, por exemplo, a alteração de prenome e do gênero, o reconhecimento da filiação socioafetiva e outros. O nome da pessoa natural não apresenta a estabilidade que outrora havia, criando muitas exceções na conservadora doutrina da imutabilidade dos nomes, as quais se processam diariamente no Registro Civil, no âmbito extrajudicial
Palavras-chave: Nome. Mutabilidade. Extrajudicial. Averbação. Retificação.
Abstract: The name of the natural person, an attribute of personality rights, registered at the Civil Registry Office of Natural Persons, received many innovations with the advent of Federal Law 14.382/22, allowing the modification of first name and inclusion of family nicknames in extrajudicial administrative channels. and other changes. Before this law, the name of the natural person was already a normative object in the National Council of Justice and in the General Inspectorate of Justice of the States, which, through extrajudicial means, authorized several procedures that authorized the modification of the name, such as, for example, the change of first name and gender, the recognition of socio-affective affiliation and others. The name of the natural person does not present the stability that it once had, creating many exceptions in the conservative doctrine of the immutability of names, which are processed daily in the Civil Registry, in the extrajudicial sphere.
Keywords: Name. Mutability. Extrajudicial. Endorsement. Rectification.
Sumário: Introdução. 1- Alteração do nome em até 15 (quinze) dias após o registro. 2- Inclusões de sobrenome familiar de descendentes. 3- Alteração de prenome. 4- Da possibilidade das pessoas viúvas voltarem utilizar o nome de solteira. 5- Inclusão ou exclusão de sobrenome do cônjuge na constância do casamento. 6- Inclusões de sobrenome dos conviventes em união estável. 7- Inclusão de sobrenome em decorrência de reconhecimento de filiação biológica. 8- Inclusão de sobrenome de padrasto ou madrasta. 9- Inclusão de apelido de família em decorrência de reconhecimento socioafetivo. 10- Mudança de nome em virtude de alteração de prenome e gênero no registro de nascimento e casamento. 11- Alteração de sobrenome de genitores nos registros de nascimentos de filhos em razão de subsequente casamento ou união estável ou dissolução de casamento. 12- Alteração de apelido de família decorrente de retificação. Conclusão. Referências.
Introdução
O nome individualiza a pessoa natural, identificando-a na sua família, na convivência social e perante o Estado.
É um direito humano, recebendo proteção e regras legislativas, formando normas que devem ser interpretadas em conformidade com os princípios constitucionais, garantindo a dignidade da pessoa humana.
Este artigo faz uma abordagem quanto às alterações trazidas pela Lei 14.382/22 e Provimento 149/23 do CNJ quanto à mutabilidade do nome da pessoa natural no âmbito dos Cartórios Extrajudiciais, especificamente nos Cartórios de Registros Civis das Pessoas Naturais.
Demonstraremos que atualmente, após as edições normativas citadas, a alteração do nome da pessoa natural poderá ocorrer em diversas hipóteses, aumentando e muito o rol das exceções da imutabilidade do nome.
Exporemos que a desjudicialização de alteração de nome diretamente nos Cartórios de Registros Civis das Pessoas Naturais, sem intervenção do Poder Judiciário e do Ministério Público, é a postura adotada pelo legislador e pelo Conselho Nacional da Justiça (CNJ).
O desenvolvimento do artigo está estrutura na abordagem de assuntos que autorizam a modificação de nome extrajudicialmente.
1- Alteração do nome em até 15 (quinze) dias após o registro
Vigorava até a edição da Lei 14.382/2022, que entrou em vigor em 28 de junho de 2022, o preceito de que o nome escolhido era imutável a partir do seu registro.
Na prática o que se notava eram situações de equívocos dos genitores ao declararem o registro, fatos que poderiam ser corrigidos no âmbito administrativo, mas que acabavam tendo que ser solucionadas pelo Poder Judiciário.
Para exemplificar, podemos mencionar a situação corriqueira na qual somente o pai comparece para declarar o registro, sabido que a maternidade é certa e a genitora em regra está se recuperando do parto. Por vezes, o genitor declara um nome diferente do que acordou com a mãe, seja por esquecimento ou pela emoção que lhe retira a atenção devida ao registro, e o mesmo se dará conta do ocorrido somente quando exibe a certidão do registro a genitora, a qual não participou do ato registrário.
Situações como a mencionada somente poderiam ser contornadas com ordem judicial, a qual não se revelava tão simples quanto ao acesso e deslinde.
Era comum, principalmente quando a declaração era feita somente por um dos genitores, o apontamento de erro quanto à escolha do prenome como também a omissão de apelidos de famílias que gostariam que constasse do registro.
A Lei 14.382/2022, solucionando estas questões e outras relacionadas à escolha do nome, passou a permitir que no prazo de 15 (quinze) dias após o registro, os genitores possam realizar a alteração do nome colocado ao filho, utilizando-se de procedimento administrativo em Cartório de Registro Civil[1].
Exige-se, para tanto, que ocorra consenso entre os genitores quanto ao nome, razão pela qual deve ser colhida a manifestação de ambos.
Na hipótese de discordância entre os genitores, fica afastada a via administrativa, devendo o pedido ser realizado pela via judicial para averbar a retificação pretendida.
2- Inclusões de sobrenome familiar de ascendentes
Há a possibilidade das pessoas registradas incluírem apelido de família de algum dos seus ascendentes em seu nome.
Muitas vezes com o casamento, principalmente o sobrenome familiar materno, passa a não ser utilizado na descendência, ficando esquecido.
Permite assim o legislador que o descendente possa resgatar o sobrenome em desuso e incluir em seu nome.
Antes da entrada em vigor da Lei 14.382/2022, era permitida a inclusão de apelido familiar somente no primeiro ano após a maioridade.
A partir de 28/06/2022 a inclusão de sobrenome familiar passou a ser requerida pessoalmente perante o oficial de registro civil em qualquer tempo após a maioridade.
Cuida-se de ato personalíssimo a ser realizado pela pessoa registrada, a qual poderá incluir patronímico familiar de qualquer ascendente de sua família, demonstrando o parentesco, nos termos do artigo 57 da Lei 6.015/73, atualizada pela Lei 14382/22[2].
3- Alteração de prenome.
Após atingir a maioridade civil, a pessoa natural poderá requerer pessoalmente no Cartório de Registro Civil a alteração de seu prenome, nos termos da Lei de Registros Público (Lei 6.015/73).[3]
O direito de alterar o prenome não está sujeito a prazo de limitação do seu exercício, uma vez que a exigência da lei é somente que seja alcançada a maioridade civil.
Esta inovação, também trazida pela Lei 14.382/22, dispensa a exposição dos motivos que fundamentam o pedido de alteração, bastando a pessoa registrada comparecer no Cartório de Registro Civil e solicitar a mudança através de procedimento administrativo.
O pedido imotivado de alteração de prenome pela via administrativa pode ser realizado uma única vez, não dependendo de autorização judicial ou manifestação do Ministério Público.
Realizada a alteração não é possível, administrativamente, voltar a utilizar o nome anterior, dependendo neste caso de mandado judicial de averbação a ser expedido por Juiz de Direito.
O prenome escolhido poderá ser simples ou composto, não estabelecendo a lei qualquer tipo de limitação à quantidade de prenomes.
Em caso de suspeita de fraude, má-fé, vício de vontade ou simulação, poderá o oficial de Registro Civil, fundamentadamente, recusar a retificação.
Quando é acrescido ao nome do cônjuge o sobrenome do outro, poderá surgir o questionamento quanto às pessoas que possuem agnomes (Junior, Neto e outros), uma vez que o seu nome ficará diferente daquele ascendente que justificou a adoção do elemento diferenciador.
Quanto à continuação do uso do agnome após o acréscimo do sobrenome do outro sugiram duas correntes, a primeira que sustenta que o agnome não pode ser mantido, já que a razão de sua mantença deixou de existir com a diferenciação posterior de seu nome em relação ao ascendente. A segunda corrente sustenta que havendo justificativa relevante pode ser mantido o agnome, como o fato de ser conhecido e se identificar pelo agnome, evocando para tanto o direito da personalidade, corrente esta que tem prevalecido pela índole subjetiva do nome.
Permite-se também que ambos os cônjuges adotem sobrenome um dos outros, sendo adequado que os Cartórios orientem na formação do nome, salientando que o acréscimo pode ocorrer em ordens diferentes, ou seja, não são obrigados a efetuarem a adição no fim, podendo um colocar em ordem diferente ou mesmo mesclar com o já existente, procurando assim manter similitude na formação do novo nome de família decorrente do casamento.
4- Da possibilidade das pessoas viúvas voltarem a utilizar o nome de solteira
Qualquer dos nubentes poderá, por ocasião do casamento, acrescer ao seu nome o apelido de família do outro, é o que proclama o §1º do artigo 1565 do Código Civil[4].
O acréscimo deste apelido de família ocorrerá após o prenome, podendo ser colocado em qualquer ordem em relação ao sobrenome que já possua, ou seja, antes ou no fim, podendo inclusive mesclar com o já existente.
No Estado de São Paulo, interpretando extensivamente o artigo em comento, permite-se a exclusão de um dos apelidos de família, desde que o nubente possua mais de um em seu registro, não se permitindo que realize a exclusão total dos apelidos de família que possua em registro de nascimento. Esta previsão normativa encontramos nas Normas Extrajudiciais da Corregedoria Geral da Justiça, a qual tem alcance no Estado de São Paulo (item 70 do Capítulo XVII)[5].
Com a dissolução do casamento em decorrência do óbito, a pessoa que acrescentou sobrenome do falecido ficava com o nome de casada.
Caso desejasse voltar a utilizar o nome de solteira (o), deveria realizar pedido pela via judicial.
A solução não era a mais adequada, uma vez que se movimentava a estrutura Judiciária para resolver questão administrativa, onde não há qualquer litígio a ser resolvido, tratando-se de questão decorrente do direito de personalidade do detentor do nome.
Resolvendo a questão, a Lei 14.382/2022 trouxe a possiblidade de que a alteração seja realizada pela via administrativa, diretamente no Cartório de Registro Civil, dispondo que é possível a exclusão de sobrenome do ex-cônjuge, após a dissolução da sociedade conjugal, por qualquer de suas causas[6].
Assim, competirá exclusivamente à pessoa que adquiriu o apelido de família do cônjuge que faleceu, a melhor oportunidade para voltar a utilizar o nome que possuía antes do casamento, em decorrência do exercício do direito de personalidade, podendo ainda, caso queira, permanecer utilizando o apelido de família da pessoa que faleceu.
Salutar o novo regramento, visto que opera a desjudicialização de questão meramente administrativa, antes posta ao crivo do Poder Judiciário, levando para o âmbito dos Cartórios Extrajudiciais, sem intervenção Judiciária ou do Ministério Público.
5- Inclusão ou exclusão de sobrenome do cônjuge na constância do casamento.
Na sistemática que constava do Código Civil, tanto o revogado quanto o atual, os nubentes durante o curso do Processo de Habilitação de Casamento poderiam acrescentar ao seu nome o apelido de família do outro cônjuge.
Superada a fase de habilitação e registrado o casamento, a opção quanto ao acréscimo de patronímico não poderia mais ser exercida na via administrativa.
Aquele cônjuge que realizou a opção por acrescer o sobrenome, também não poderia retirar o que acresceu na constância do casamento.
Os pedidos de alteração de nome na constância do casamento, quando se pretendia acrescentar o sobrenome do outro ou retirar o que havia acrescido, deveriam ser submetidos ao crivo judicial, o qual expedia mandado judicial direcionado ao Cartório de Registro Civil do casamento para averbação no caso de procedência.
A Lei 14.382/22 inovou ao permitir que na constância do casamento possa o cônjuge exercer a opção pelo acréscimo do sobrenome do outro cônjuge[7] .
Assim, a opção que antes era restrita por ocasião da habilitação de casamento, passa a ser possível enquanto o casamento não for dissolvido, podendo qualquer um dos cônjuges acrescer ao seu nome o patronímico do outro cônjuge.
O normativo mencionado permite também que aquele quer exerceu a opção possa declinar do acréscimo efetuado, exercendo a qualquer tempo durante o casamento o direito subjetivo de voltar a utilizar nome anterior.
Atualmente não é mais necessário ação judicial ou dissolver o casamento para promover alteração de nome dos cônjuges, bastando a solicitação de procedimento administrativo no Cartório de Registro Civil do casamento para ser realizada a averbação do novo nome que passará a utilizar.
6- Inclusões de sobrenomes dos conviventes em união estável
As pessoas que estabelecem convivência pública, continua e duradoura, com o objetivo de constituição de família, podem formalizar esta convivência por escrito público, neste podendo, semelhante ao casamento civil, acrescentar ao seu o apelido de família do outro convivente[8].
A formalização desta convivência em Cartórios Extrajudiciais poderá ser realizada por Escritura Pública ou Termo Declaratório de União Estável, este realizado em Cartório de Registro Civil e aquele em Cartório de Notas, ambos providos do mesmo valor legal.
Para se dar efeitos em relação a terceiros, conferindo a devida publicidade, a lei prevê o registro da Escritura Pública ou do Termo Declaratório de União Estável nos Cartórios de Registro Civil que possuam o Livro E [9].
A alteração de nomes durante a constância da união estável será realizada na mesma forma que se permite às pessoas casadas.
O retorno ao nome de solteiro e solteira decorrentes da união estável será realizada por meio de escrito público de distrato, o qual será averbado no Cartório de Registro Civil, formalizando a extinção da união estável e a volta ao nome anterior.
Importante mencionar que a lei não condiciona a extinção da união estável a feitura de escrito público de distrato da mesma, entretanto este será essencial quando os convivente desejarem que surta efeitos em relação a terceiros, quando houverem bens a serem partilhados, quando ocorrer modificação de nomes pelos acréscimos de patronímico familiar do outro convivente, quando houverem filhos menores de idade, etc.
7- Inclusão de sobrenome em decorrência de reconhecimento de filiação biológica
Após o registro de nascimento, efetuado sem declaração de paternidade, é possível aos genitores comparecer ao Cartório e efetuarem o reconhecimento espontâneo da paternidade[10].
Embora menos comum, visto que no nosso direito a maternidade é certa, é possível registros que não conste o nome da mãe, principalmente para registros de nascimentos anteriores à Constituição de 1988, período no qual o direito estabelecia diferenciação e limitações quantos às filiações legítimas e ilegítimas.
A anuência do outro genitor é necessária para instruir o procedimento administrativo de reconhecimento de filiação, sendo dispensado na hipótese do registrado ser maior de idade, uma vez que, neste caso, a anuência expressa deverá ser realizada pelo mesmo.
Realizado o reconhecimento, é permitida a inclusão do apelido de família daquele que declarou a filiação biológica, sem exclusão dos sobrenomes que já possua.
A inclusão do sobrenome no nome da pessoa registrada não é obrigatória, podendo os interessados optar pela permanência do mesmo nome, sem necessidade de expor os motivos da escolha.
Na hipótese da pessoa ser casada, deve a mesma providenciar a alteração por procedimento administrativo no local do seu registro de casamento, a fim de constar o eventual apelido de família que tenha adquirido, bem como a nova filiação.
Pode ocorrer do registrado que foi reconhecido possuir filhos, demandando a necessidade de procedimento administrativo também nos registros de seus filhos, a fim de incluir o nome do avô ou avó e modificação de nome, caso tenha optado pela inclusão de apelido de família da pessoa que o reconheceu.
8- Inclusão de sobrenome de padrasto ou madrasta
A Lei 11.924/2009, conhecida como Lei Clodovil, passou a permitir a inclusão no assento de nascimento do nome de família do padrasto ou madrasta, entretanto para realização da averbação dependia o interessado de manifestação judicial, devendo o interessado requerer ao juiz competente a inclusão, expondo o motivo ponderável para tanto.
A Lei 14.382/22 trouxe importante alteração quanto à inclusão do apelido de família do padrasto ou madrasta, prevendo que a alteração seja realizada diretamente no Cartório de Registro Civil detentor do assento [11].
Determina a Lei citada que o interessado apresente motivo justificável para inclusão do sobrenome pretendido, cabendo ao oficial do Registro Civil efetuar a análise dos motivos ao acréscimo.
A inclusão depende da expressa concordância do padrasto ou madrasta, devendo a serventia extrajudicial colher esta manifestação por escrito ou exigir declaração particular reconhecida firma ou escrito público.
Não é permitida a exclusão de apelido de família que o registrado possua, devendo permanecer inalterados os demais dados do registro.
9- Inclusão de apelido de família em decorrência de reconhecimento socioafetivo
Antes a filiação era somente a biológica, declarada no registro de nascimento, e a adotiva, constituída por decisão judicial.
Passou a admitir o nosso ordenamento jurídico a filiação decorrente do afeto, do convívio familiar, reconhecendo a estrutura de novas famílias constituídas, que não sejam sanguíneas, dando espaço a multiparentalidade.
No âmbito extrajudicial o Provimento 63/2017 do Conselho Nacional da Justiça, possibilitou o reconhecimento voluntário de paternidade ou maternidade socioafetiva de pessoa de qualquer idade perante os oficiais de registro civil das pessoas naturais.
Com a edição do Provimento 83/2019 do Conselho Nacional da Justiça, a idade mínima do reconhecimento socioafetivo na esfera extrajudicial passou a ser de 12 anos[12] . A matéria atualmente está tratado nos artigos 505 a 511 do Provimento 149/2023 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Assim, para registrados que não completaram 12 anos de idade, para inclusão de filiação socioafetiva, necessita de procedimento judicial, e aos que completaram 12 anos pode se efetuado o requerimento na via administrativa.
Incluída a paternidade ou maternidade, poderá ser acrescentado o apelido de família ao registro de nascimento da pessoa reconhecida.
Importante esclarecer que não poderá ser suprimido apelido de família já constante do registro de nascimento, conservando também a filiação biológica registrada.
10- Mudança de nome em virtude de alteração de prenome e gênero no registro de nascimento e casamento
Em decorrência da decisão do Supremo Tribunal Federal que reconheceu o direito da pessoa transgênero que desejar, independentemente de cirurgia de redesignação ou da realização de tratamentos hormonais ou patologizantes, à substituição de prenome e gênero diretamente no ofício do Registro Civil das Pessoas Naturais, o Conselho Nacional da Justiça editou o Provimento 73/2018, disciplinando a alteração de prenome e gênero.
O Provimento em questão permite que a pessoa maior de 18 anos de idade requeira no Cartório de Registro Civil de seu nascimento e de eventual casamento, a alteração e averbação do prenome e gênero, com a finalidade de adequá-lo à identidade autopercebida [13].
Para tanto, não é exigido laudo médico, parecer psicológico, nem manifestação do Ministério Público ou intervenção do Poder Judiciário.
A pessoa requerente deverá apresentar ao ofício do Registro Civil das Pessoas Naturais, no ato do requerimento, os seguintes documentos:
I – certidão de nascimento atualizada;
II – certidão de casamento atualizada, se for o caso;
III – cópia do registro geral de identidade (RG);
IV – cópia da identificação civil nacional (ICN), se for o caso;
V – cópia do passaporte brasileiro, se for o caso;
VI – cópia do cadastro de pessoa física (CPF) no Ministério da Fazenda;
VII – cópia do título de eleitor;
IX – cópia de carteira de identidade social, se for o caso;
X – comprovante de endereço;
XI – certidão do distribuidor cível do local de residência dos últimos cinco anos (estadual/federal);
XII – certidão do distribuidor criminal do local de residência dos últimos cinco anos (estadual/federal);
XIII – certidão de execução criminal do local de residência dos últimos cinco anos (estadual/federal);
XIV – certidão dos tabelionatos de protestos do local de residência dos últimos cinco anos;
XV – certidão da Justiça Eleitoral do local de residência dos últimos cinco anos;
XVI – certidão da Justiça do Trabalho do local de residência dos últimos cinco anos;
XVII – certidão da Justiça Militar, se for o caso.
As certidões do Poder Judiciário, bem como informações do Cartório de Protesto, não têm o condão de impedir o exercício do direito de mudança de prenome e gênero, servindo tão somente para estabelecer a obrigatoriedade de comunicação a ser efetuada pelos Cartórios aos Órgãos que constarem processo ou procedimentos em andamento.
No requerimento a pessoa interessada poderá solicitar a alteração de seu prenome, não permitindo a alteração dos apelidos de família existente, podendo alterar para prenomes simples ou compostos.
Realizada a alteração no assento de nascimento é permitida a solicitação de alteração de eventual registro de casamento, desde que com consentimento do outro cônjuge, conforme Artigo 522, § 2º, do Provimento 149/2023 do CNJ [14].
A alteração do prenome e gênero passou a ser disciplinada pelos artigos 516 a 523 do Provimento 149/2023 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ.
11- Alteração de sobrenome de genitores nos registros de nascimentos de filhos em razão de subsequente casamento ou união estável ou dissolução
No registro de nascimento irá constar o nome que os genitores tinham na época de sua lavratura.
Entretanto, realizado o registro de nascimento, poderão ocorrer situações posteriores que determinam a alteração de nome dos genitores, restando o registro de nascimento lavrado com dados da época divergente dos nomes atuais, necessitando de atualização.
A alteração pode ser necessária em virtude de casamento ou união estável ocorridas após o registro de nascimento, nas quais um ou ambos os genitores optem por acrescer apelido de família. Nesta situação, para evitar que a identificação do filho (a) fique divergente do nome atual do pai ou da mãe é aconselhável a solicitação de averbação do novo nome, a fim de corresponda aos dados atuais de identificação.
A mesma situação de desatualização será verificada quando ocorrer a dissolução do casamento ou da união estável, fato que demanda a solicitação de averbação para atualização dos registros de nascimentos.
A fim de que a atualização não dependa autorização judicial, no Estado de São Paulo, a Corregedoria Geral da Justiça, disciplinou o assunto, permitindo que a averbação seja realizada sem manifestação do Ministério Público e decisão judicial, bastando os interessados solicitarem o procedimento no Cartório de Registro Civil do registro de nascimento, consoante Item 128 e 128.1, ambos do Capítulo XVII, das Normas Extrajudiciais da Corregedoria Geral da Justiça[15].
12- Alteração de apelido de família decorrente de retificação
Ao realizar o registro de nascimento os genitores têm a opção da escolha dos prenomes, podendo livremente adotá-los, desde que não seja nome que exponha o registrado a situações ridículas[16].
Quanto aos apelidos de famílias a escolha dos pais se restringe aos já existentes na família dos mesmos, seja e em seus nomes ou existentes nos dos ascendentes, devidamente comprovado através de certidões [17].
O apelido de família poderá ser diretamente alterado nos Cartório de Registro Civil que realizou o registro de nascimento quando há erros evidentes, ocorridos durante a declaração ou transcrição do sobrenome.
Para estes erros evidentes não é exigida a intervenção judicial ou manifestação do Ministério Público, podendo o oficial do Registro Civil ex officio ou a requerimento do interessado promover a alteração [18].
Os apelidos de famílias estrangeiros são os que apresentam maiores distorções em relação aos registros realizados no Brasil, principalmente porque na época muitos registros eram feitos a partir de declarações dos genitores.
Hoje com a facilidade de obtenção de registros dos antepassados no estrangeiro e pelo fato de muitos países, principalmente europeus, terem possibilidade a obtenção de cidadania de descendentes, é comum que os interessados busquem adequar a grafia dos sobrenomes aos registros estrangeiros.
Assim, na via administrativa, diretamente nos Cartórios de Registro Civil, com fulcro no artigo 110 da Lei 6.015/73, é possível à solicitação de correção, observado os princípios da anterioridade, continuidade, uniformidade e veracidade dos registros públicos.
Os princípios citados utilizados nos registros públicos, determinam que os assentos devem observar a ordem de correção, partindo dos registros mais antigos até chegar aos mais novos.
Conclusão
O nome da pessoa natural, elemento identificador familiar, social e perante o Estado, tem passado recentemente por importantes alterações, evidenciando que a abordagem doutrinária antiga da imutabilidade se encontra superada.
Com a edição da Lei 14.382/22 a mutabilidade do nome recebeu tratamento simplificado, podendo ser efetuado na via extrajudicial, por procedimento administrativo direto no Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais, sem qualquer interferência do Judiciário ou participação do Ministério Público.
O Poder Judiciário também tem disciplinado a mutabilidade do nome por atos administrativos, como o Provimento 149/2023 do Conselho Nacional da Justiça (CNJ), que trata da alteração de prenome e sexo.
Ainda no âmbito administrativo regulatório do Conselho Nacional da Justiça, podemos citar a disciplina da formação da família socioafetiva.
As Corregedorias Gerais da Justiça dos Estados, que também tem força normativa para disciplina extrajudicial, têm estabelecido regras que permitem a mutabilidade do nome, retirando da esfera judiciária a sua apreciação.
No Estado de São Paulo verificamos nas Normas Extrajudiciais da Corregedoria Geral da Justiça[19] situações de alterações de nomes decorrentes, por exemplo, da alteração de patronímico familiar, subsequente matrimônio dos pais ou da dissolução do casamento destes, retificações oriundas de erros evidentes, reconhecimentos de filiação após o registro de nascimento etc.
As alterações de nome que passaram a ser permitidas na forma tratada neste trabalho decorrem principalmente do exercício do direito constitucional da dignidade da pessoa humana e também do exercício do direito subjetivo da personalidade.
Nota-se que o Estado não tem encontrado dificuldades de identificação da pessoa natural com as alterações de nomes que são autorizadas administrativamente, visto que se concentram no âmbito do Registro Público, a qual embora constitua atividade de exercício privado, é totalmente regulada pelo ente Estatal, que exerce o controle, fiscalização e poder normativo [20] das unidades delegadas registrarias.
Destarte, apropriado hoje, diante de tantas alterações legislativas e normativas, sustentar que o nome da pessoa natural tem como característica principal a mutabilidade regrada, a qual é requerida em regra no âmbito administrativo, diretamente nos Cartórios de Registros Civis das Pessoas Naturais, através de procedimentos administrativos simplificados e acessíveis, nos quais não há previsão de submissão à decisão judicial ou manifestações estatais do Ministério Público.
Referências
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[1] Lei 6.015/73, §4º : Em até 15 (quinze) dias após o registro, qualquer dos genitores poderá apresentar, perante o registro civil onde foi lavrado o assento de nascimento, oposição fundamentada ao prenome e sobrenomes indicados pelo declarante, observado que, se houver manifestação consensual dos genitores, será realizado o procedimento de retificação administrativa do registro, mas, se não houver consenso, a oposição será encaminhada ao juiz competente para decisão. (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)
[2]Art. 57. A alteração posterior de sobrenomes poderá ser requerida pessoalmente perante o oficial de registro civil, com a apresentação de certidões e de documentos necessários, e será averbada nos assentos de nascimento e casamento, independentemente de autorização judicial, a fim de: I - inclusão de sobrenomes familiares;
[3]Art. 56. A pessoa registrada poderá, após ter atingido a maioridade civil, requerer pessoalmente e imotivadamente a alteração de seu prenome, independentemente de decisão judicial, e a alteração será averbada e publicada em meio eletrônico. (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022).
[4] § 1 o Qualquer dos nubentes, querendo, poderá acrescer ao seu o sobrenome do outro.
[5] 70. Qualquer dos nubentes, querendo, poderá acrescer ao seu o sobrenome do outro, em qualquer ordem, permitida a intercalação, sendo vedada a supressão total do sobrenome de solteiro
[6] Artigo 57, inciso IV, da Lei 6.015/73, atualizada pela Lei 14.382/22.
[7] Art. 57. A alteração posterior de sobrenomes poderá ser requerida pessoalmente perante o oficial de registro civil, com a apresentação de certidões e de documentos necessários, e será averbada nos assentos de nascimento e casamento, independentemente de autorização judicial, a fim de: (...)
II - inclusão ou exclusão de sobrenome do cônjuge, na constância do casamento; (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)
[8] Artigo 57,§ 2º, da Lei 6015/73: Os conviventes em união estável devidamente registrada no registro civil de pessoas naturais poderão requerer a inclusão de sobrenome de seu companheiro, a qualquer tempo, bem como alterar seus sobrenomes nas mesmas hipóteses previstas para as pessoas casadas. (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022)
[9] Art. 94-A, da Lei 6.015/73: Os registros das sentenças declaratórias de reconhecimento e dissolução, bem como dos termos declaratórios formalizados perante o oficial de registro civil e das escrituras públicas declaratórias e dos distratos que envolvam união estável, serão feitos no Livro E do registro civil de pessoas naturais em que os companheiros têm ou tiveram sua última residência, e dele deverão constar: (...) (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)
[10] Artigo 502 do Provimento 149/2023 do Conselho Nacional da Justiça: A averbação do reconhecimento de filho realizado sob a égide do presente Provimento será concretizada diretamente pelo Oficial da serventia em que lavrado o assento de nascimento, independentemente de manifestação do Ministério Público ou decisão judicial, mas dependerá de anuência escrita do filho maior, ou, se menor, da mãe.
[11] Lei 6.015/73, Artigo 57, § 8º: O enteado ou a enteada, se houver motivo justificável, poderá requerer ao oficial de registro civil que, nos registros de nascimento e de casamento, seja averbado o nome de família de seu padrasto ou de sua madrasta, desde que haja expressa concordância destes, sem prejuízo de seus sobrenomes de família. (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022)
[12] Art. 1º O Provimento n. 63, de 14 de novembro de 2017, passa a vigorar com as seguintes alterações:
I - o art. 10 passa a ter a seguinte redação:
Art. 10. O reconhecimento voluntário da paternidade ou da maternidade socioafetiva de pessoas acima de 12 anos será autorizado perante os oficiais de registro civil das pessoas naturais.
[13] Art. 2º Toda pessoa maior de 18 anos completos habilitada à prática de todos os atos da vida civil poderá requerer ao ofício do RCPN a alteração e a averbação do prenome e do gênero, a fim de adequá-los à identidade autopercebida.
1º A alteração referida no caput deste artigo poderá abranger a inclusão ou a exclusão de agnomes indicativos de gênero ou de descendência.
2º A alteração referida no caput não compreende a alteração dos nomes de família e não pode ensejar a identidade de prenome com outro membro da família.
3º A alteração referida no caput poderá ser desconstituída na via administrativa, mediante autorização do juiz corregedor permanente, ou na via judicial.
[14] 3º A subsequente averbação da alteração do prenome e/ou do gênero no registro de nascimento dos descendentes do requerente dependerá da anuência deles quando relativamente capazes ou maiores, bem como da autorização de ambos os pais, no caso de serem menores.
[15]128. As alterações necessárias do patronímico familiar por subseqüente matrimônio dos pais serão processadas a requerimento do interessado independentemente de procedimento de retificação e serão averbadas nos assentos de nascimento e casamento dos filhos
128.1. As alterações do patronímico familiar, em decorrência de separação ou divórcio dos pais também serão processadas a requerimento do interessado, mediante apresentação de documento comprobatório legal e autêntico, e serão averbadas nos assentos de nascimento e casamento dos filhos independentemente de procedimento de retificação.
[16] Lei 6.015/73, Artigo 55, § 1º : O oficial de registro civil não registrará prenomes suscetíveis de expor ao ridículo os seus portadores, observado que, quando os genitores não se conformarem com a recusa do oficial, este submeterá por escrito o caso à decisão do juiz competente, independentemente da cobrança de quaisquer emolumentos.
[17] Lei 6.015/73, Artigo 55: Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome, observado que ao prenome serão acrescidos os sobrenomes dos genitores ou de seus ascendentes, em qualquer ordem e, na hipótese de acréscimo de sobrenome de ascendente que não conste das certidões apresentadas, deverão ser apresentadas as certidões necessárias para comprovar a linha ascendente.
[18] Lei 6.015/73, Art. 110. O oficial retificará o registro, a averbação ou a anotação, de ofício ou a requerimento do interessado, mediante petição assinada pelo interessado, representante legal ou procurador, independentemente de prévia autorização judicial ou manifestação do Ministério Público, nos casos de: (Redação dada pela Lei nº 13.484, de 2017)
I - erros que não exijam qualquer indagação para a constatação imediata de necessidade de sua correção;
[19] Capítulo XVII das Normas Extrajudiciais (itens 36, 128, 145). Disponível em https://www.tjsp.jus.br/Corregedoria/Comunicados/NormasExtrajudiciais
[20] Constituição Federal, Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público. § 1º Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.
Mestrando em Função Social do Direito - FADISP. Oficial de Registro Civil.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Gerson Maia da. Inovações da Lei 14.382/2022 e Provimento 149/2023 do Conselho Nacional de Justiça quanto à alteração do nome da pessoa natural no Cartório de Registro Civil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 maio 2024, 04:24. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/65241/inovaes-da-lei-14-382-2022-e-provimento-149-2023-do-conselho-nacional-de-justia-quanto-alterao-do-nome-da-pessoa-natural-no-cartrio-de-registro-civil. Acesso em: 23 dez 2024.
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