EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – CULPA CONCORRENTE – RECONHECIMENTO – DANO MORAL – DIMINUIÇÃO – RECURSO PROVIDO.
Se restar devidamente constatado que a vítima contribuiu para o evento danoso, é cabível o reconhecimento da culpa concorrente e a diminuição dos danos morais.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da Primeira Turma Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator.
Campo Grande, 18 de dezembro de 2007.
Des. João Maria Lós – Relator
RELATÓRIO
O Sr. Des. João Maria Lós
Antonio Carlos Machado de Vilhena Moraes e Alexandre Gonçalves de Vilhena Moraes apresentam recurso de apelação contra a sentença proferida nos autos da ação de indenização por danos morais que move Juliandro Melo Medeiros, na qual o magistrado a quo condenou os apelantes ao pagamento de R$ 17.500,00 (dezessete mil e quinhentos reais), corrigidos a partir da sentença e com juros de mora a partir da citação, mais custas e honorários advocatícios.
Alegam os recorrentes que a confusão envolvendo as partes não passou de mera discussão, sendo que não houve agressão verbal e física, havendo somente um empurrão, não sendo suficiente para configurar o dano moral.
Aduzem que, o apelado deu causa ao incidente, em razão de que não seguiu as orientações que o estacionamento tinha do banco. No mesmo sentido, alegam que a conduta adotada pelo apelado não era justificável, pois ainda que os Apelantes não pretendessem efetuar o pagamento do estacionamento, caberia à empresa valer-se das vias judiciais para receber seu crédito, não cerceando o direito fundamental de ir e vir.
Argumentam que o próprio apelado confessou em seu depoimento pessoal que, após o incidente, nada teria mudado em sua vida cotidiana, não havendo falar em dano moral.
Também alega que em nenhum momento restou demonstrado e provado que o apelado fora exposto à situação vexatória capaz de lhe causar qualquer espécie de prejuízo de ordem interna.
Por fim, alegam que o valor da condenação por danos morais é exacerbado, devendo ser reduzido.
VOTO
O Sr. Des. João Maria Lós (Relator)
Antonio Carlos Machado de Vilhena Moraes e Alexandre Gonçalves de Vilhena Moraes apresentam recurso de apelação contra a sentença proferida nos autos da ação de indenização por danos morais que move Juliandro Melo Medeiros, na qual o magistrado a quo condenou os apelantes ao pagamento de R$ 17.500,00 (dezessete mil e quinhentos reais), corrigidos a partir da sentença e com juros de mora a partir da citação, mais custas e honorários advocatícios.
Na peça vestibular consta que o autor/apelado é funcionário da empresa “Estacionamento Estacenter Ltda.” e que na data de 23 de dezembro de 2004, quando exercia função de recepcionista, os apelantes tentaram sair do referido estacionamento sem realizar o pagamento (R$ 1,00 real).
Afirma que, diante da recusa no pagamento, alega que fechou o portão, impedindo a saída do automóvel ocupado pelos apelantes, logo após sofrendo lesões corporais e injúrias.
O juízo de primeiro grau julgou procedente a ação, condenando os apelados ao pagamento de R$ 17.500,00 (dezessete mil e quinhentos reais), a ser solidariamente dividido e pago pelos apelantes.
Delineadas as ponderações inicias necessárias, passo à análise dos apelos, que cinge-se à verificação da culpa das partes envolvidas no evento, em apreciação conjunta.
Como se sabe, para que o autor tenha êxito na demanda, deverá provar os fatos constitutivos de seu direito, entretanto, para que o réu obtenha êxito na demanda que lhe é proposta, é necessário que prove fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
No caso dos autos, não há dúvida quanto à ocorrência do evento narrado, porém, somente haverá a responsabilidade de indenizar, se, contudo, restar demonstrado o nexo causal, que, segundo a lição do Professor Silvio Rodrigues consiste na “prova de existência de uma relação de causalidade entre a ação ou omissão culposa do agente e o dano experimentado pela vitima. Se a vítima experimentar um dano, mas não se evidenciar que o mesmo resultou do comportamento ou da atitude do réu, o pedido de indenização, formulado por aquela, deverá ser julgado improcedente.” (Direito Civil, - vol. 4 – Responsabilidade Civil, Ed. Saraiva, 10a. Ed. – 1986, p. 14).
No caso, restou devidamente comprovado através das provas carreadas nos autos que, de fato, os apelantes agrediram fisicamente o autor.
Entretanto, ao analisar o depoimento da testemunha Paulo Alexandre Pelho (Gerente Geral da Agência Prime do Banco Bradesco) às f. 107-108, verificamos que:
“(...) a orientação que o estacionamento tinha do banco, nos casos em que houvesse confusão com os selos e vistos e o cliente não quisesse pagar, era para que deixasse o cliente ir. (...)”
Daí verifica-se que ambas as partes deram causa ao evento, cada um com sua conduta: os apelantes que desferiram socos e pontapés no apelado; o apelado por não cumprir a orientação do banco e fechar o portão do estabelecimento, cerceando o direito de ir e vir dos apelantes.
O novo Código Civil, em seu art. 945, prevê que:
“Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano”, ou seja, trata da culpa concorrente da vítima”.
Carlos Alberto Gonçalves, em sua obra “Comentários ao Código Civil”, v. 11, São Paulo, Saraiva, 2003, p. 523-524, preconiza:
“(...) Algumas vezes a culpa da vítima é apenas parcial ou concorrente com a do agente causador do dano. Autor e vítima contribuem, ao mesmo tempo, para a produção de um mesmo fato danoso.
Fala-se em culpa concorrente quando, paralelamente à conduta do agente causador do dano, há também conduta culposa da vítima, de modo que o evento danoso decorre do comportamento culposo de ambos. A doutrina atual tem preferido falar, em lugar de concorrência de culpas, em concorrência de causas ou de responsabilidade, porque a questão é mais de concorrência de causa do que de culpa. A vítima também concorre para o evento, e não apenas aquele que é apontado como único causador do dano.
Anota Aguiar Dias que, na redação do art. 945 do Código Civil, ora comentado, “volta-se a considerar a gravidade da culpa concorrente, para determinar a participação na obrigação de indenizar, quando o melhor e mais exato critério, na espécie, é o da causalidade. Não é o grau de culpa, mas o grau de participação na produção do evento danoso, reduzindo-se ao até excluindo a responsabilidade dos demais, que deve indicar a quem toca contribuir com a cota maior ou até com toda a indenização. (...)”.
Arrematando o assunto, Rui Stoco, na obra “Tratado de Responsabilidade Civil”, 6ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 1.496, explana:
“(...) Assim, a culpa da vítima quando contribui para a eclosão do evento, sem ser a sua causa exclusiva, influi na indenização, ensejando a repartição proporcional dos prejuízos sofridos”.
A jurisprudência também é neste sentido:
“INDENIZAÇÃO – CULPA CONCORRENTE – RECONHECIMENTO – DANO MATERIAL E MORAL – DIMINUIÇÃO – Constatado que as vítimas contribuíram para o evento danoso, é cabível o reconhecimento da culpa concorrente e diminuição dos danos materiais e morais.” (TJRO – AC 100.007.2001.004336-1 – 2ª C.Esp. – Rel. Des. Rowilson Teixeira – J. 16.05.2006).
“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – CULPA CONCORRENTE – RECONHECIMENTO – Não tendo a autora tomado os devidos cuidados ao permitir que seu preposto, que anteriormente já havia se envolvido em outro acidente, dirigisse seu caminhão, impõe-se reconhecer que também obrou com culpa para a ocorrência do evento. Age com culpa o motorista que ao trafegar pela rodovia não toma as cautelas necessárias para evitar que o caminhão que dirigia saísse da pista, vindo, em conseqüência, a ocasionar danos no veículo. Reconhecia a culpa concorrente. Apelação parcialmente provida.” (TJRS – APC 70000869156 – 11ª C.Cív. – Rel. Des. Voltaire de Lima Moraes – J. 05.12.2001).
Tal reconhecimento de culpa concorrente pode ser extraído dos autos mesmo diante de uma análise perfunctória, haja vista que o incidente entre as partes poderia ser evitado caso o apelado tivesse aberto o portão de saída do estacionamento. Ainda, poderia ter se informado com a gerência do banco sobre a liberação do veículo dos apelantes.
Logo, parece-me evidente a concorrência de culpas, já que não se pode falar em culpa exclusiva do apelado.
Passado isto, com relação ao quantum fixado na sentença a título de danos morais, entendo que merece ser revisto, em razão da culpa concorrente reconhecida acima.
Isto porque, na culpa concorrente da vítima, a conduta culposa do agente concorre com a conduta culposa da vítima, sendo que ambas proporcionam o resultado danoso. Não é considerada excludente de causalidade, apenas atenua a obrigação de indenizar a vítima não desaparecendo o dano.
O entendimento dominante é que deve ser aferido o grau de culpabilidade de cada uma das partes, para se estabelecer o justo valor indenizatório, conforme transcrito no artigo 945 do Código Civil.
No caso, levando em consideração que a indenização por dano moral não tem o objetivo de reparar a dor, que não tem preço, mas de compensá-la de alguma forma, minimizando os sofrimentos do beneficiário, já que o julgador deve agir com bom senso, de acordo com as particularidades de cada caso.
Nesta esteira, é evidente que o valor não deve ser baixo a ponto de ser irrelevante para o condenado nem alto de modo a proporcionar o enriquecimento sem causa do beneficiado, razão pela qual entendo que o valor de R$ 17.500,00 (dezessete mil e quinhentos reais) deve ser reduzido para R$ 3.000,00 (três mil reais).
Por essas razões, dou provimento ao recurso, para reduzir o valor da condenação por danos morais para R$ 3.000,00 (três mil reais), em razão do reconhecimento da culpa concorrente, mantendo a r. sentença em seus demais pontos.
DECISÃO
Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:
POR UNANIMIDADE, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.
Presidência do Exmo. Sr. Des. João Maria Lós.
Relator, o Exmo. Sr. Des. João Maria Lós.
Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores João Maria Lós, Sérgio Fernandes Martins e Josué de Oliveira.
Campo Grande, 18 de dezembro de 2007
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