RESUMO: Este artigo analisa a possibilidade de desconsideração do tempo de serviço de militares condenados à pena privativa de liberdade que tenha sido substituída por pena restritiva de direitos, conforme previsto no Estatuto dos Militares (Lei nº 6.880, de 1980). O estudo é fundamentado em pareceres jurídicos, jurisprudências e na legislação pertinente, com o objetivo de defender a tese de que, mesmo diante da substituição da pena, o tempo de serviço correspondente deve ser excluído. A análise considera a evolução legislativa e os impactos dessa desconsideração no âmbito da carreira militar, propondo um entendimento que alinha a prática militar à preservação da disciplina e da hierarquia.
Palavras-chave: Tempo de Serviço. Pena Privativa de Liberdade. Pena Restritiva de Direitos. Estatuto dos Militares. Desconsideração de Tempo de Serviço.
ABSTRACT: This article examines the possibility of disregarding the service time of military personnel convicted of a custodial sentence that has been replaced by a sentence of restriction of rights, as provided in the Military Statute (Law No. 6,880, 1980). The study is based on legal opinions, case law, and relevant legislation, aiming to argue that even in the case of sentence substitution, the corresponding service time should be excluded. The analysis considers the legislative evolution and the impacts of this disregard on the military career, proposing an understanding that aligns military practice with the preservation of discipline and hierarchy.
Keywords: Service Time. Custodial Sentence. Restriction of Rights. Military Statute. Disregard of Service Time.
1 INTRODUÇÃO
s Forças Armadas brasileiras são estruturadas em torno de valores essenciais, como a disciplina e a hierarquia, que garantem a coesão e a eficiência na defesa nacional. O Estatuto dos Militares, ao estabelecer as diretrizes que regem a vida militar, reflete a importância desses valores, especialmente no que tange às consequências jurídicas das infrações penais cometidas pelos militares. O presente artigo foca na análise da desconsideração do tempo de serviço de militares condenados à pena privativa de liberdade, substituída por pena restritiva de direitos, questão que tem gerado debates na doutrina e na jurisprudência.
É crucial compreender que a substituição de penas, introduzida pela reforma penal de 1984, visa proporcionar uma alternativa à prisão, mas sem eliminar as consequências penais da condenação. No contexto militar, essa substituição levanta a questão da manutenção da disciplina e da hierarquia, visto que o tempo de serviço é um fator determinante na progressão de carreira e na concessão de benefícios.
A relevância do tema reside no impacto direto que a contagem ou desconsideração do tempo de serviço tem sobre a carreira militar. A aplicação das penas e suas consequências no âmbito militar devem estar em consonância com os princípios que regem a vida castrense, de modo a não comprometer a ordem interna. Assim, a discussão sobre a perda de tempo de serviço vai além de uma simples interpretação legal, envolvendo também aspectos éticos e de manutenção da disciplina.
Além disso, a questão da desconsideração do tempo de serviço em casos de penas substitutivas toca em pontos sensíveis da legislação, como a omissão do Estatuto dos Militares sobre a possibilidade de substituição de penas, e a necessidade de interpretação extensiva ou integrativa com o Código Penal comum. A ausência de menção específica no Estatuto dos Militares gera uma lacuna que precisa ser preenchida com base em princípios gerais de direito e na preservação da disciplina militar.
Portanto, o objetivo deste estudo é apresentar uma análise detalhada das implicações jurídicas da desconsideração do tempo de serviço para militares que, condenados à pena privativa de liberdade, tiveram sua pena substituída por restritiva de direitos. Através da revisão de jurisprudências e doutrinas, busca-se defender a tese de que tal desconsideração é necessária para manter a integridade dos valores militares e assegurar a justa aplicação da lei.
2 ANÁLISE JURÍDICA DA DESCONSIDERAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO
Os arts. 136 e 137 da Lei nº 6.880, de 9 de dezembro de 1980 – Estatuto dos Militares diferenciam os conceitos de “tempo de efetivo serviço” e “anos de serviço”.
“Tempo de serviço” ou “tempo de efetivo serviço” é o período computado entre a data de ingresso e a data de saída do militar do serviço ativo, ainda que tenha havido interrupções ao longo desse período ou, ainda, acréscimos previstos em outras normas.
A expressão “anos de serviço”, por sua vez, representa o tempo de efetivo serviço acrescido ou decrescido de alguns períodos, conforme previsto no estatuto castrense:
Art. 136. Tempo de efetivo serviço é o espaço de tempo computado dia a dia entre a data de ingresso e a data-limite estabelecida para a contagem ou a data do desligamento em conseqüência da exclusão do serviço ativo, mesmo que tal espaço de tempo seja parcelado.
Art. 137. Anos de serviço é a expressão que designa o tempo de efetivo serviço a que se refere o artigo anterior, com os seguintes acréscimos: [...]
O art. 137 prevê, também, alguns casos em que os anos de serviço sofrerão descontos por motivos diversos:
Art. 137, § 4º Não é computável para efeito algum, salvo para fins de indicação para a quota compulsória, o tempo:
a) que ultrapassar de 1 ano, contínuo ou não, em licença para tratamento de saúde de pessoa da família;
b) passado em licença para tratar de interesse particular ou para acompanhar cônjuge ou companheiro(a);
c) passado como desertor;
d) decorrido em cumprimento de pena de suspensão do exercício do posto, graduação, cargo ou função por sentença transitada em julgado; e
e) decorrido em cumprimento de pena restritiva da liberdade, por sentença transitada em julgado, desde que não tenha sido concedida suspensão condicional de pena, quando, então, o tempo correspondente ao período da pena será computado apenas para fins de indicação para a quota compulsória e o que dele exceder, para todos os efeitos, caso as condições estipuladas na sentença não o impeçam.
O artigo 137, § 4º, alínea “e”, do Estatuto dos Militares estabelece que o tempo de serviço correspondente ao cumprimento de pena privativa de liberdade não é computável para nenhum fim, exceto para inclusão na quota compulsória. Este dispositivo tem como finalidade penalizar o militar que infringiu a lei, retirando-lhe o direito de contar o período de pena para progressão em sua carreira. No entanto, o Estatuto, promulgado em 1980, não prevê expressamente a situação em que a pena privativa de liberdade é convertida em pena restritiva de direitos, o que requer uma interpretação extensiva para aplicação dessa norma.
Uma interpretação literal do artigo poderia sugerir que a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos não afetaria a contagem do tempo de serviço, uma vez que a execução da pena privativa de liberdade, em si, não ocorre. No entanto, tal interpretação seria incompatível com a lógica punitiva do Estatuto, que visa impor uma consequência real e efetiva para a quebra da disciplina militar. A substituição da pena, nesse sentido, deve ser vista como uma alteração na forma de cumprimento, mas não como uma anulação das consequências da condenação.
Além disso, o Código Penal Militar, que rege as infrações penais no âmbito castrense, não sofreu modificações significativas após a reforma de 1984, criando uma lacuna quanto à aplicabilidade das penas alternativas no contexto militar. Essa ausência de previsão expressa requer que a norma seja interpretada de maneira a preservar a finalidade disciplinar e a hierarquia nas Forças Armadas. A aplicação supletiva do Código Penal comum, que admite a substituição de penas, deve ser feita com cautela para não enfraquecer a estrutura normativa militar.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 4ª Região apoia a tese de que a substituição da pena não exime o militar das consequências previstas no Estatuto dos Militares. Em ambos os casos, as Cortes decidiram pela desconsideração do tempo de serviço correspondente ao período de cumprimento de pena, seja ela restritiva de liberdade ou restritiva de direitos.
Essas decisões reforçam o entendimento de que a substituição da pena não altera a natureza punitiva da condenação.
Portanto, ao considerar o objetivo punitivo do Estatuto dos Militares e a necessidade de manter a disciplina e a hierarquia nas Forças Armadas, conclui-se que a desconsideração do tempo de serviço deve ser aplicada também nos casos em que a pena privativa de liberdade é substituída por restritiva de direitos. Tal interpretação garante que a substituição da pena não seja utilizada como uma forma de evitar as consequências previstas para as infrações penais no âmbito militar.
2.1 EVOLUÇÃO LEGISLATIVA E INTEGRAÇÃO DO DIREITO PENAL COMUM AO MILITAR
A reforma penal de 1984 trouxe mudanças significativas ao sistema punitivo brasileiro, incluindo a introdução de penas alternativas à privação de liberdade, como as restritivas de direitos. Essas penas foram concebidas como uma forma de humanizar o sistema penal, permitindo ao condenado cumprir sua pena de maneira menos gravosa, desde que atendidas certas condições. No entanto, no contexto militar, a aplicação dessas penas requer uma análise mais profunda, devido à especificidade das normas castrenses e à importância da manutenção da disciplina e hierarquia.
A ausência de menção explícita à substituição de penas no Estatuto dos Militares decorre do fato de que, à época de sua promulgação, a legislação penal brasileira ainda não previa tal possibilidade. O Código Penal Militar, promulgado em 1969, igualmente não contemplava a substituição de penas, uma vez que o foco estava na punição rigorosa das infrações cometidas por militares, em consonância com a natureza disciplinar das Forças Armadas.
Com a introdução das penas alternativas no Código Penal comum, surgiu a necessidade de adaptar a aplicação dessas normas ao contexto militar. O princípio da supletividade, que permite a aplicação do direito penal comum ao direito penal militar em casos de omissão, é o fundamento jurídico para essa integração. No entanto, essa aplicação deve ser feita de forma que não comprometa a finalidade das normas militares, especialmente no que diz respeito à disciplina e à hierarquia.
A integração do direito penal comum ao militar, entretanto, não é automática e requer uma análise criteriosa das especificidades de cada sistema. No caso das penas restritivas de direitos, a questão central é se o cumprimento dessas penas pode ou não ser considerado para efeito de contagem de tempo de serviço. A aplicação supletiva do direito penal comum não pode, sob hipótese alguma, enfraquecer a autoridade das normas militares, sob pena de comprometer a estrutura disciplinar das Forças Armadas.
Portanto, a evolução legislativa que trouxe as penas restritivas de direitos deve ser aplicada ao contexto militar com as devidas ressalvas, garantindo que a disciplina e a hierarquia sejam preservadas. A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos não deve implicar na manutenção do tempo de serviço imposto na condenação, sob pena de criar uma disparidade de tratamento entre os militares que cumprem penas diferentes, mas de gravidade semelhante.
2.2 JURISPRUDÊNCIA APLICÁVEL
A jurisprudência é um elemento fundamental na interpretação das normas jurídicas, especialmente quando há lacunas legislativas ou controvérsias na aplicação das leis. No caso da desconsideração do tempo de serviço para militares que tiveram a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos, a jurisprudência recente tem se manifestado de forma clara no sentido de que essa substituição não exime o condenado das consequências previstas no Estatuto dos Militares.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em decisão de 2021, afirmou que a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos não elimina a possibilidade de exclusão do tempo de serviço do militar condenado. A decisão foi baseada na interpretação do artigo 137, § 4º, alínea “e”, do Estatuto dos Militares, que prevê a desconsideração do tempo de serviço para aqueles que cumprem pena privativa de liberdade, salvo para fins de indicação para a quota compulsória.
ADMINISTRATIVO. MILITAR. CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO. CONDENAÇÃO PENAL. DETENÇÃO SUBSTITUÍDA POR PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. IMPOSSIBILIDADE.
1. Conforme dispõe o artigo 137, § 4º, "e", do Estatuto dos Militares (Lei 6.880/80), não é computável para efeito algum, salvo para fins de indicação para a quota compulsória, o tempo decorrido em cumprimento de pena restritiva da liberdade por sentença transitada em julgado, desde que não tenha sido concedida a suspensão condicional da pena.
2. A pena privativa da liberdade subsiste à substituição por pena restritiva de direito, podendo ser executada se descumpridas as condições da substituição, de modo que não merece guarida o apelo.
[...]
Não se extrai vício de ilegalidade na exclusão do tempo de serviço militar prestado no período abrangido pela sanção penal condenatória consubstanciada nas penas restritivas de direito.
(TRF-4, Apelação Cível nº 5009750-93.2018.4.04.7102/RS; 18/08/2021; Rel. Des. Fed. Vânia Hack de Almeida).
Além disso, a jurisprudência tem se preocupado em manter a coerência entre as diferentes modalidades de pena. Por exemplo, a suspensão condicional da pena também implica na desconsideração do período da condenação no tempo de serviço. Concedido o sursis, há previsão legal expressa de que o tempo da condenação será descontado do tempo de serviço, ainda que não haja sequer um dia de cumprimento de pena privativa de liberdade (art. 137 do Estatuto dos Militares).
DIREITO ADMINISTRATIVO. MILITAR. PREQUESTIONAMENTO. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC DE 1973. INEXISTÊNCIA. PENA DE RECLUSÃO. SUSPENSÃO CONDICIONAL DA EXECUÇÃO DA PENA. CÔMPUTO DO PERÍODO DE PROVA PARA TODOS OS EFEITOS. MELHORIA DE COMPORTAMENTO. APLICAÇÃO DO ART. 137, 8 4º, DA LEI 6.880/1980. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.
[...]
3. A questão central debatida neste Recurso diz respeito ao cômputo do período de “sursis” que excede à pena inicialmente fixada para todos os fins, inclusive para melhoria de comportamento.
4. Da análise do art. 137, § 4º, da Lei 6.880/1980, pode-se chegar às seguintes conclusões:
a) não é computável para efeito algum, salvo para fins indicação para a quota compulsória, o tempo decorrido em cumprimento de pena restritiva da liberdade, por sentença transitada em julgado;
b) concedido o sursis, o tempo da pena imposta será computado apenas para fins de indicação para a quota compulsória;
c) concedido o sursis e computado o tempo da pena apenas para fins de indicação para a quota compulsória, o que exceder será computável para todos os efeitos, inclusive melhoria de comportamento, desde que as condições estipuladas na sentença não o impeçam.
5. Recurso Especial improvido.
(REsp n. 1.516.183/PE, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 8/11/2016, DJe de 29/11/2016)
Dessa forma, a jurisprudência aplicável corrobora a tese de que a desconsideração do tempo de serviço deve ser aplicada nos casos em que a pena privativa de liberdade é substituída por restritiva de direitos. Essa interpretação assegura a coerência na aplicação das normas militares e evita que a substituição da pena seja utilizada como uma forma de escapar das consequências legais previstas para as infrações penais no âmbito castrense.
3 DA DESCONSIDERAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO
A desconsideração do tempo de serviço para militares que tiveram a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos baseia-se, primeiramente, na necessidade de preservar a disciplina e a hierarquia nas Forças Armadas. Esses princípios são essenciais para o funcionamento da instituição militar e são reforçados pelo Estatuto dos Militares, que impõe consequências severas para aqueles que cometem infrações penais.
A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos não deve ser vista como uma forma de isentar o militar das consequências de sua conduta. Ao contrário, essa substituição é uma medida que visa proporcionar uma forma mais branda de cumprimento da pena, sem, no entanto, eliminar as consequências funcionais previstas na legislação militar. A manutenção da contagem do tempo de serviço durante o cumprimento de uma pena substitutiva seria contrária ao espírito punitivo do Estatuto e poderia comprometer a disciplina nas Forças Armadas.
Outro argumento em defesa da desconsideração do tempo de serviço é a coerência na aplicação das normas. Se a pena privativa de liberdade, quando cumprida na forma tradicional, resulta na perda do tempo de serviço, não há razão lógica para que a substituição dessa pena por uma medida restritiva de direitos tenha efeito diferente. A uniformidade na aplicação das consequências penais é crucial para a manutenção da justiça e da disciplina no ambiente militar.
Além disso, a desconsideração do tempo de serviço serve como um elemento dissuasório, desestimulando condutas que possam levar à condenação penal. A certeza de que uma condenação resultará em perda de tempo de serviço, mesmo que a pena seja substituída, reforça o respeito às normas e a adesão aos valores militares. Sem essa consequência, o risco é que a substituição da pena seja vista como uma "válvula de escape", minimizando o impacto da condenação sobre a carreira militar.
Portanto, a desconsideração do tempo de serviço para militares que tiveram a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos é fundamental para assegurar a integridade dos valores militares e a aplicação justa e coerente das normas jurídicas. Essa medida contribui para a preservação da disciplina e da hierarquia nas Forças Armadas, garantindo que a substituição da pena não enfraqueça o regime previsto no Estatuto dos Militares.
3.1 COMPARAÇÃO COM A SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA (SURSIS)
A suspensão condicional da pena, conhecida como sursis, é outra modalidade de pena alternativa que também gera implicações quanto à contagem do tempo de serviço. O sursis permite que o condenado não cumpra a pena privativa de liberdade, desde que atenda a certas condições impostas pelo juiz, como o cumprimento de requisitos comportamentais ou a prestação de serviços à comunidade. No contexto militar, o sursis também resulta na desconsideração do tempo imposto na condenação no tempo de serviço.
A comparação entre o sursis e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos revela semelhanças importantes, especialmente no que diz respeito às consequências funcionais. Em ambos os casos, o condenado não cumpre a pena privativa de liberdade na forma tradicional, mas é submetido a condições que, se descumpridas, podem resultar na execução da pena original. No entanto, a jurisprudência e a legislação são unânimes em determinar que o tempo de serviço correspondente à condenação não deve ser contado, o que reforça a necessidade de aplicar a mesma lógica às penas substitutivas.
Além disso, o sursis é concedido apenas para penas privativas de liberdade de até dois anos, enquanto a substituição por pena restritiva de direitos pode ser aplicada para penas de até quatro anos. Essa diferença de gravidade justifica, ainda mais, a desconsideração do tempo de serviço nas penas substitutivas, uma vez que envolvem infrações mais sérias. Permitir que o tempo de serviço seja contado durante o cumprimento de uma pena substitutiva seria, na prática, conferir um tratamento mais brando para crimes mais graves, o que seria um contrassenso do ponto de vista jurídico e disciplinar.
O tratamento uniforme entre o sursis e a substituição de penas é essencial para garantir a coerência na aplicação das normas militares. A desconsideração do tempo de serviço em ambos os casos assegura que os militares sejam responsabilizados de forma justa e proporcional pelas infrações cometidas, independentemente da modalidade de pena aplicada. Essa uniformidade é crucial para a manutenção da disciplina e da hierarquia, pilares fundamentais das Forças Armadas.
Por fim, é importante destacar que o sursis e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos são medidas que visam reintegrar o condenado à sociedade de forma gradual e controlada, sem, no entanto, eliminar as consequências legais de sua condenação. No ambiente militar, essas consequências incluem a perda de tempo de serviço, que é uma forma de penalizar o comportamento inadequado e desestimular futuras infrações. A aplicação desse princípio de forma consistente fortalece o regime disciplinar das Forças Armadas e contribui para a justiça na aplicação das normas.
Portanto, a comparação entre o sursis e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos reforça a necessidade de desconsideração do tempo de serviço em ambos os casos, garantindo a aplicação uniforme das normas e a preservação dos valores militares.
4 CONCLUSÃO
A análise conduzida neste artigo reafirma a importância de manter a disciplina e a hierarquia nas Forças Armadas, pilares fundamentais que sustentam a estrutura militar brasileira. A questão da desconsideração do tempo de serviço para militares que tiveram sua pena privativa de liberdade substituída por pena restritiva de direitos é de extrema relevância para garantir que os princípios disciplinares não sejam enfraquecidos pela aplicação de normas alternativas do direito penal comum. A legislação militar, ao prever a desconsideração do tempo de serviço em casos de penas privativas de liberdade, não menciona expressamente as penas substitutivas, mas a interpretação integrativa sugere que o mesmo tratamento deve ser aplicado a ambas as situações.
O artigo 137, § 4º, do Estatuto dos Militares foi analisado à luz da jurisprudência atual e do contexto evolutivo da legislação penal brasileira. A jurisprudência, como demonstrado, tem consistentemente apoiado a exclusão do tempo de serviço mesmo em casos onde a pena privativa de liberdade foi substituída por pena restritiva de direitos. Esse entendimento é essencial para manter a coerência jurídica e assegurar que os militares não sejam beneficiados por uma substituição de pena que, na prática, poderia levar à contagem indevida de tempo de serviço, comprometendo a integridade do regime disciplinar.
A conclusão deste estudo destaca que, para preservar a disciplina e a hierarquia nas Forças Armadas, a desconsideração do tempo de serviço deve ser aplicada não apenas nos casos de cumprimento de pena privativa de liberdade, mas também quando essa pena é substituída por restritiva de direitos. Essa interpretação é necessária para evitar uma disparidade de tratamento que poderia surgir caso as penas substitutivas fossem tratadas de maneira diferente das penas privativas de liberdade tradicionais. Além disso, a aplicação uniforme dessas normas reforça a ideia de que as penas alternativas não eximem o militar das consequências funcionais e disciplinares de sua condenação.
Outro ponto importante é a comparação com o instituto do sursis, que, assim como a substituição de penas, também resulta na desconsideração do tempo de serviço. A análise demonstrou que, tanto no sursis quanto na substituição da pena privativa de liberdade, a lógica subjacente é a mesma: garantir que o condenado não se beneficie de sua condenação e que as sanções impostas tenham um efeito real e dissuasório. Ao aplicar a mesma regra às penas substitutivas, assegura-se que não haja um tratamento mais brando para crimes mais graves, o que seria incoerente e injusto no contexto militar.
Finalmente, reitera-se que a preservação da disciplina e da hierarquia exige uma aplicação rigorosa e coerente das normas jurídicas. A desconsideração do tempo de serviço para militares que cumprem penas restritivas de direitos, em substituição às penas privativas de liberdade, é uma medida que protege os valores fundamentais das Forças Armadas e garante a justa aplicação das sanções. Este entendimento, amparado na legislação e na jurisprudência, contribui para a manutenção da ordem interna e da autoridade nas fileiras militares, prevenindo que as substituições de pena sejam utilizadas como subterfúgios para evitar as consequências de uma condenação penal.
Portanto, ao longo deste artigo, ficou evidente que a desconsideração do tempo de serviço é uma prática necessária e justa, que reflete a seriedade das infrações penais e a necessidade de manter a disciplina no ambiente militar. A aplicação uniforme das normas garante que todos os militares, independentemente da natureza da pena cumprida, sejam tratados de forma equitativa e que a disciplina e a hierarquia sejam mantidas, fortalecendo, assim, a estrutura das Forças Armadas brasileiras.
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Oficial de Assessoria Jurídica do Exército Brasileiro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GABRIEL BACCHIERI DUARTE FALCãO, . A desconsideração do tempo de serviço do militar condenado à pena restritiva de direitos: uma análise jurídica à luz do estatuto dos militares Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 nov 2024, 04:58. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigo/66934/a-desconsiderao-do-tempo-de-servio-do-militar-condenado-pena-restritiva-de-direitos-uma-anlise-jurdica-luz-do-estatuto-dos-militares. Acesso em: 05 nov 2024.
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