RESUMO: O presente artigo tem como objetivo fazer um breve relato sobre a origem das medidas antidumping.
PALAVRAS-CHAVE: direito antidumping, origem, histórico, dumping.
1. ORIGEM DAS MEDIDAS ANTIDUMPING
O dumping, conforme definição veiculada pelo artigo 784 do Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009, consiste na “introdução de um bem no mercado doméstico, inclusive sobre as modalidades de drawback, a preço de exportação inferior ao preço efetivamente praticado para o produto similar nas operações mercantis normais, que o destinem a consumo interno no país exportado”.
A prática do dumping, eventualmente, pode criar circunstâncias consideradas monopolistas, já que a introdução de bens com preços de exportação inferiores aos preços praticados no mercado nacional, pode provocar uma redução na concorrência desse mercado. Por esta razão, muitos produtores nacionais, sentindo-se prejudicados, solicitaram a elaboração de leis para a verificação da referida prática e possíveis punições.
Nesse contexto, as medidas antidumping surgiram no início do século XX, quando, ao invés de promoverem uma elevação generalizada da tarifa aduaneira aplicável à sua pauta de importações, os Estados optaram por soluções pontuais e seletivas, sem que houvesse maior prejuízo à abertura comercial promovida com a redução das tarifas.
O primeiro país a implementar normas contra a prática de dumping foi o Canadá em 1904. As regras criadas previam a imposição de direitos antidumping com valores referentes à diferença entre o preço do produto praticado no Canadá e o preço do produto no país exportador[1]. Tratava-se, na realidade, de uma medida protecionista, na qual não se questionava a intenção do exportador em atingir a indústria canadense, nem tampouco se a indústria canadense sofreria algum dano em função daquelas importações.
O exemplo da legislação canadense foi logo seguido por outros países. Assim, passaram a adotar normas similares, a Nova Zelândia (1905), a Austrália (1906), o Japão (1910), a África do Sul (1914), os Estados Unidos (1916) e o Reino Unido (1921).
É possível deduzir que a expansão das normas antidumping naquele momento histórico ocorreu, dentre outras razões, pelo crescimento do comércio internacional, pela revolução dos transportes e pelo longo período de paz entre as principais potências do mundo. Além disso, observa-se que as normas antidumping foram rapidamente recepcionadas por alguns países que compartilhavam de uma tradição jurídica comum, com a exceção do Japão.
Nos Estados Unidos, o Revenue Act de 1916, de caráter penal, previa a punição em razão do dumping, quando provada a intenção de o exportador eliminar os concorrentes nacionais. O processo era julgado nos tribunais comuns, possibilitando, inclusive, o pagamento de indenização à empresa concorrente prejudicada.
A dificuldade em provar a intenção predatória do exportador levou o Congresso dos Estados Unidos, em 1921, a emitir outra norma, de caráter administrativo, o US Antidumping Act. A partir daquele momento, uma autoridade administrativa era responsável por decretar a prática de dumping e verificar se esta prática gerava dano ao mercado nacional.
Esse último requisito representou uma inovação de grande importância na aplicação das regras antidumping, sobretudo porque a norma norte-americana de 1921 serviu como modelo para a redação das normas correspondentes da Carta de Havana de 1948, na qual se previu a criação da Organização Mundial do Comércio - OMC. Iniciava-se, então, o processo de internacionalização das normas antidumping.
Aliás, no ano de 1947, com o objetivo de harmonizar suas políticas aduaneiras, 23 (vinte e três) países assinaram o Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio (General Agreement on Tariffs and Trade - GATT), consistindo em um conjunto de normas e concessões tarifárias, que instituiu, dentre outras regras, a possibilidade de aplicação das medidas antidumping. O referido acordo objetivava estimular a liberalização comercial, combatendo práticas protecionistas. A primeira rodada de negociações teve como resultado 45.000 (quarenta e cinco mil) concessões tarifárias.
Após cinco rodadas de negociações comerciais multilaterais, que tiveram por objetivo a redução das tarifas aduaneiras, verificou-se que novos empecilhos tarifários passaram a figurar como obstáculos inibidores ao livre fluxo do comércio. Cresceu, assim, a preocupação com os efeitos que as medidas antidumping poderiam trazer ao comércio internacional, já que sua aplicação poderia ter efeitos protecionistas, reduzindo o valor dos esforços feitos desde a assinatura do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio, no sentido de se remover as barreiras comerciais.
Desta forma, a partir do ano de 1964, com o início da Rodada Kennedy, que contou com a participação de 62 (sessenta e dois) países, foram estabelecidas disciplinas comuns para as autoridades investigadoras nacionais, visando à transparência e previsibilidade na aplicação das medidas antidumping. Naquele momento, foi assinado o primeiro Código Antidumping, que foi revisado e aprimorado na Rodada de Tóquio (1973-79) e, mais adiante, na Rodada Uruguai (1986-94).
2. CONCEITO DAS MEDIDAS ANTIDUMPING
Em que pese não ser proibida a prática do dumping, em algumas situações a aplicação de uma medida antidumping é recomendável e até necessária, a fim que o Estado possa oferecer uma eficiente resposta aos seus efeitos nocivos. Após uma discussão profunda sobre o assunto, com base nas experiências nacionais, os países, no âmbito da Organização Mundial do Comércio – OMC, fixaram uma regulamentação internacional para o direito antidumping através do Acordo Antidumping – ADD de 1994, até hoje vigente. No Brasil, a Lei nº 9.019, de 30 de março de 1995, dispôs sobre a aplicação interna dos direitos previstos no Acordo Antidumping.
A regulamentação internacional das medidas antidumping teve como principal objetivo reduzir a discricionariedade estatal na aplicação dessas medidas, além de fortalecer o livre comércio mediante um tratamento mais igualitário entre as empresas privadas.
Na realidade, com a aprovação da legislação antidumping, foram estabelecidas regras mais rígidas para as medidas que os países poderiam utilizar com o objetivo de responder a uma ocorrência de dumping. Assim, para a aplicação das medidas antidumping, definiu-se que o Estado, além de constatar a prática do dumping, necessariamente deve avaliar a presença de dano à indústria nacional. A partir daí, mediante um juízo de conveniência e oportunidade, decide pela adoção da medida antidumping.
Nesse sentido, configurado o dumping nos moldes relatado, pode o Estado aplicar uma medida antidumping. Convém observar, portanto, a definição de direito antidumping, veiculada pelo inciso II, do artigo 784, do Decreto 6.759/2009, in verbis:
Artigo 784 Para os efeitos deste Decreto, entende-se por:
(...)
II – direito antidumping, o montante em dinheiro, igual ou inferior à margem de dumping apurada, com o fim exclusivo de neutralizar os efeitos danosos das importações objeto de dumping, calculado mediante a aplicação de alíquotas ad valorem ou específicas, ou pela conjunção de ambas.
(...)
Desta forma, é de se concluir que as medidas antidumping são instrumentos de defesa do mercado nacional, “com o fim exclusivo de neutralizar os efeitos danosos das importações objeto de dumping”. No Brasil, para a aplicação dos direitos antidumping, a empresa que se sentir prejudicada deverá apresentar uma petição e tentar comprovar o dano perante a Câmara de Comércio Exterior (CAMEX) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Depois de apresentada a petição, o Estado irá confrontar as informações da empresa nacional com a exportadora estrangeira e, se realmente for comprovada a prática do dumping, é decretada uma medida antidumping.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMARAL JÚNIOR, Alberto do. OMC e o comércio internacional. São Paulo: Aduaneiras, 2002.
ARRUDA, Gustavo Favaro. Entendendo o dumping e o direito antidumping. Revista do IBRAC. São Paulo, v. 12, n° 6, 2005.
BARRAL. Welber. Dumping e comércio internacional: A regulamentação Antidumping após a Rodada Uruguai. Rio de Janeiro: Forense, 2000.
BRASIL. Decreto n. 6.759, de 05 de fevereiro de 2009. Disponível em: http://www.receita.fazenda.gov.br/legislacao/decretos/2009/dec6759.htm. Acesso em: 23 de maio de 2014.
BRASIL. Decreto n. 8.058, de 26 de julho de 2013. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/decreto/d8058.htm. Acesso em: 23 de maio de 2014.
LEÃES, Luiz Gastão Paes de Barros. O “dumping” como forma de abuso do poder econômico. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Paulo. v. 32, nº 91, 1993.
MELLO, Maria Chaves de. Dicionário Jurídico. 8º ed. São Paulo: Método, 2006.
SCHMIDT, Cristiane Alkmin Junqueira; SOUSA, Isabel Ramos de; LIMA, Marcos André M. de. Tipologias de Dumping. Disponível em http://www.seae.fazenda.gov.br/central-de-documentos/documentos-de-trabalho/documentos-de-trabalho-2002/DocTrab17.pdf. Acesso em 23 de maio de 2014.
[1] Act to Amend the Customs Tariff, SC 1904. Cf. Marceau, 1994.
Procurador Federal, Especialista em Direito Administrativo pelo Instituto Brasiliense de Direito Público - IDP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TORRES, Michell Laureano. Medidas antidumping: visão geral da origem da sua regulamentação Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 jun 2014, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/39614/medidas-antidumping-visao-geral-da-origem-da-sua-regulamentacao. Acesso em: 22 nov 2024.
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