RESUMO: Busca o presente artigo traçar algumas linhas sobre a possibilidade de aproveitamento, pelo convenente, da licitação realizada antes da celebração do convênio para a contratação da empresa responsável pela execução do objeto conveniado.
PALAVRAS-CHAVE: convênio, licitação, execução, objeto.
Atualmente, o Decreto nº 6.170, de 25 de julho de 2007, juntamente com a Portaria Interministerial CGU/MF/MP nº 507/2011, são as normas regulamentadoras dos convênios celebrados pelos órgãos ou entidades da Administração Pública Federal. A Portaria Interministerial CGU/MF/MP nº 507/2011, ao dispor sobre a licitação a ser realizada pelo convenente para a consecução do objeto conveniado, previu o seguinte:
Art. 35. Os editais de licitação para consecução do objeto conveniado somente poderão ser publicados após a assinatura do respectivo convênio e aprovação do projeto técnico pelo concedente.
Parágrafo único. A publicação do extrato do edital de licitação deverá ser feita no Diário Oficial da União, em atendimento ao art. 21, inciso I, da Lei nº 8.666, de 1993, sem prejuízo ao uso de outros veículos de publicidade usualmente utilizados pelo convenente.
Ou seja, a princípio, a licitação para a contratação da empresa responsável pela execução do objeto conveniado somente pode ser realizada após a assinatura do convênio e a aprovação do projeto técnico pelo concedente. Todavia, o artigo 36 da Portaria Interministerial CGU/MF/MP nº 507/2011 autorizou que o convenente realizasse a licitação antes da assinatura do convênio, desde que observadas algumas condições. Vejamos:
Art. 36. Poderá ser aceita licitação realizada antes da assinatura do convênio, desde que observadas as seguintes condições:
I - que fique demonstrado que a contratação é mais vantajosa para o convenente, se comparada com a realização de uma nova licitação;
II - que a licitação tenha seguido as regras estabelecidas na Lei nº 8.666, de 1993, inclusive quanto à obrigatoriedade da existência de previsão de recursos orçamentários que assegurassem o pagamento das obrigações decorrentes de obras ou serviços a serem executadas;
III - que o projeto básico, no caso de obras de engenharia, tenha sido elaborado de acordo com o que preceitua a Lei nº 8.666, de 1993;
IV - que o objeto da licitação deve guardar compatibilidade com o objeto do convênio, caracterizado no Plano de Trabalho, sendo vedada a utilização de objetos genéricos ou indefinidos; e
V - que a empresa vencedora da licitação venha mantendo durante a execução do contrato, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação. (grifamos)
Em síntese, para os convênios celebrados sob a égide da Portaria Interministerial CGU/MF/MP nº 507/2011, somente poderão ser aceitos os procedimentos licitatórios realizados antes da assinatura do ajuste, quando comprovada a vantagem econômica da contratação; que a licitação tenha seguido todas as regras da Lei no 8.666/93, sobretudo no que se refere à obrigatoriedade da existência de previsão de recursos orçamentários que assegurem o pagamento das obrigações; que o projeto básico da obra tenha observado as prescrições da Lei no 8.666/93; que o objeto da licitação guarda compatibilidade com o objeto conveniado; e que a empresa venha mantendo todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação.
De toda sorte, mesmo antes da publicação da Portaria Interministerial CGU/MF/MP nº 507/2011, embora a Portaria Interministerial MP/MF/MCT nº 127 não tratasse do tema, pois apenas determinava que a licitação seguisse as regras da Lei no 8.666/93, sem qualquer menção sobre a contemporaneidade do certame, o Tribunal de Contas da União já não admitia que o convenente aproveitasse uma licitação realizada antes da celebração do convênio para a execução do objeto conveniado, sobretudo a licitação com objeto genérico ou indefinido. Na realidade, a Corte de Contas só aceitava a licitação pretérita quando ficava comprovada a sua estrita observância aos preceitos da Lei no 8.666/93 e às demais normas aplicáveis aos convênios, como, por exemplo, a Lei de Diretrizes Orçamentárias do ano correspondente.
Nesse contexto, cumpre ressaltar que o Tribunal de Contas da União há muito tempo repudia a celebração de contratos com objeto genérico e impreciso, conforme pode se verificar pelo seguinte trecho do voto condutor do Acórdão nº 0922/2012 – TCU – 2ª Câmara:
9. Ademais, embora o ajuste estadual (subcláusula quarta da cláusula sexta) tenha previsto a possibilidade de utilização de contrato que estivesse em vigor, bem ilustrou a unidade técnica que a situação em espécie não se amolda aos precedentes deste Tribunal (a exemplo dos Acórdãos 270/2004 e 1.832/2010, ambos do Plenário, e Acórdão 6.840/2011 – 1ª Câmara), em que a Corte admitiu, excepcionalmente, o aproveitamento de licitações ou contratações pretéritas.
10. Deveras, como destacou a instrução, a contratação da empresa Oliveira Melo Ltda. resultou de uma licitação com objeto indefinido que acabou por transformar o contrato 36/1998 em um ajuste de prazo indeterminado, sendo sua abrangência (execução de obras das obras de infra estrutura urbana e sub urbana) característica dos contratos do tipo “guarda-chuva”, prática há muito repudiada neste Tribunal.
11. Tal procedimento, além de estar em desconformidade com os precedentes desta Corte e com a Lei de Licitações, descumpriu a própria disposição convenial permissiva que condicionava a utilização de contrato pretérito somente se o objeto fosse obras de saneamento básico e que houvesse sido celebrado com observância da lei de licitações, o que não é o caso, evidenciando-se, assim, a sua irregularidade. (grifamos)
Aliás, é só observar que, em 26 de outubro de 1982, o Tribunal de Contas da União aprovou a Súmula nº 177, com a seguinte redação:
A definição precisa e suficiente do objeto licitado constitui regra indispensável da competição, até mesmo como pressuposto do postulado de igualdade entre os licitantes, do qual é subsidiário o princípio da publicidade, que envolve o conhecimento, pelos concorrentes potenciais das condições básicas da licitação, constituindo, na hipótese particular da licitação para compra, a quantidade demandada em uma das especificações mínimas e essenciais à definição do objeto do pregão. (g.n.)
No Acórdão nº 0922/2012 – TCU – 2ª Câmara, o TCU afirmou expressamente que “há entendimento pacificado na Corte de Contas quanto à ilegalidade do aproveitamento de licitação anterior com objeto genérico e impreciso”. Portanto, observa-se que a maior preocupação da Corte de Contas no tocante ao aproveitamento de licitação realizada antes da celebração do convênio é a licitação com objeto genérico ou impreciso, prática que, por si só, representa uma violação à Lei no 8.666/93, em especial ao princípio da isonomia, previsto em seu artigo 3º.
Nesse sentido, convém transcrever trecho do Acórdão nº 2026/2011 – TCU – Plenário:
9.4 alertar ao Município de Planaltina/GO:
9.4.1 que as obras custeadas com recursos federais devem contemplar em seus respectivos editais licitatórios a correspondente previsão orçamentária, nos termos do art. 7º, § 2º da Lei 8.666/1993;
9.4.2 que, por ocasião da execução de contratos de repasse de recursos federais, abstenha-se de permitir o aproveitamento de licitações já realizadas sem a estrita observância da Lei 8.666/93, tendo em vista o previsto na Cláusula Terceira, item 3.2, alínea “i” do texto padrão dos contratos de repasse da CEF, reproduzido no contrato de repasse nº 0213.494-69/2006;
9.4.3 para não aplicar recursos públicos federais transferidos à municipalidade na consecução de obras e serviços cujos editais licitatórios sejam de conteúdo genérico (objeto amplo e impreciso), em desacordo com o art. 6º, IX, 7º, § 2º, II e III da Lei 8.666/1993, ou contemplem critérios de habilitação indevidos, da forma como se segue: (g.n.)
Além disso, o Tribunal de Contas da União entende que, financeiramente, é mais vantajoso para a administração a realização de licitações específicas para cada obra a ser realizada ou convênio celebrado. Realmente, a utilização de um único procedimento licitatório compreendendo vários empreendimentos certamente reduz a concorrência no certame, já que afasta da licitação os interessados na execução de apenas algumas obras autônomas. O Acórdão nº 2099/2011 – TCU – Plenário é bem esclarecedor nesse ponto. Veja-se o seguinte trecho extraído da Proposta de Deliberação que embasou o referido julgado:
23. No que se refere especificamente ao aproveitamento de licitações anteriores, cumpre destacar, também, a questão do parcelamento. Reportando-me à Súmula 247, observo que este Tribunal considerou que:
“SÚMULA 247 - É obrigatória a admissão da adjudicação por item e não por preço global, nos editais das licitações para a contratação de obras, serviços, compras e alienações, cujo objeto seja divisível, desde que não haja prejuízo para o conjunto ou complexo ou perda de economia de escala, tendo em vista o objetivo de propiciar a ampla participação de licitantes que, embora não dispondo de capacidade para a execução, fornecimento ou aquisição da totalidade do objeto, possam fazê-lo com relação a itens ou unidades autônomas, devendo as exigências de habilitação adequar-se a essa divisibilidade.”
24. Dessa forma, entendo não ser prudente que, ao invés de serem realizadas licitações específicas para cada contrato de repasse firmado, um único certame seja utilizado para abarcar vários empreendimentos que, à luz do entendimento sumular acima transcrito, deveriam ser implementados, em separado, no âmbito de ajustes distintos.
25. Nesse sentido cito a opinião contida na Proposta de Deliberação do Ministro-Substituto Augusto Sherman Cavalcanti que embasou o recente Acórdão n. 1.831/2010 – Plenário (TC 009.811/2009-2):
“23. No entanto, entendo que novos aportes de recursos, por meio de eventuais outros contratos de repasse, devam ser objeto de contratações específicas, haja vista a possibilidade de parcelamento de tais obras, com possibilidade, inclusive, de suas contratações a melhores preços que aqueles encontrados no Sinapi, pois esse sistema reflete apenas o parâmetro máximo para a aceitabilidade dos custos das obras, podendo elas ser executadas a menor preço, com real desconto em face dos custos unitários desse sistema, o que se obtém, naturalmente, em ambiente concorrencial.” (grifos acrescidos)
26. Diante de todo o exposto e na linha da jurisprudência deste Tribunal, não devem, em regra geral, ser utilizados contratos pretéritos e licitações antigas para empreendimentos custeados com recursos federais, objeto de contratos de repasse e termos de compromisso, ainda que se trate de obras do PAC.
27. Pode acontecer, contudo, que o ente federado tenha realizado licitação pretérita que atenda aos dispositivos previstos na Lei n. 8.666/1993, com projeto básico com adequado nível de abrangência, de tal forma que os possíveis acréscimos de serviços a serem inseridos no orçamento após o aporte de recursos federais não representem alteração substancial do objeto anteriormente pactuado. Tem-se, nessa situação, uma excepcionalidade em que pode ser admissível que essa licitação seja aproveitada após a pactuação de termo de compromisso ou contrato de repasse.
28. Feitas essas ponderações, acolho o posicionamento da 1ª Secob, no sentido de responder ao consulente que o aproveitamento de licitação pretérita pode vir a ser admitido desde que condicionado ao atendimento aos dispositivos previstos na Lei n. 8.666/1993, na respectiva Lei de Diretrizes Orçamentárias e nos demais dispositivos que regem a aplicação dos recursos públicos federais, além de estar adstrito à verificação da conveniência e oportunidade do ato, sempre de forma tecnicamente motivada, com a emissão de parecer conclusivo, ou de outro instrumento congênere, de modo a resguardar o interesse público e assim garantir o exercício do papel de controle e da fiscalização na aplicação dos recursos federais transferidos, em consonância com o disposto § 6º do art. 10 do Decreto Lei n. 200/1967. (g.n.)
Depreende-se, assim, que, mesmo antes da publicação da Portaria Interministerial CGU/MF/MP nº 507/2011, o Tribunal de Contas da União somente admitia o aproveitamento de licitação pretérita em casos excepcionais e condicionado ao atendimento às regras da Lei nº 8.666/1993, da respectiva Lei de Diretrizes Orçamentárias e das demais normas que regem a aplicação dos recursos públicos federais. Contudo, não aceitava, de forma alguma, a utilização de licitação anterior com objeto genérico e impreciso, mormente pela ofensa ao postulado da isonomia entre os licitantes.
Atualmente, a Portaria Interministerial CGU/MF/MP nº 507/2011, além de elencar algumas condições para o aproveitamento da licitação realizada antes da assinatura do convênio, estabeleceu, no seu artigo 5º, II, “d”, que cabe ao concedente a verificação da licitação realizada pelo convenente, in verbis:
Art. 5º Ao concedente caberá promover:
(...)
II - a operacionalização da execução dos programas, projetos e atividades, mediante:
(...)
d) verificação de realização do procedimento licitatório pelo convenente, atendo-se à documentação no que tange: à contemporaneidade do certame; aos preços do licitante vencedor e sua compatibilidade com os preços de referência; ao respectivo enquadramento do objeto conveniado com o efetivamente licitado; e, ao fornecimento pelo convenente de declaração expressa firmada por representante legal do órgão ou entidade convenente, ou registro no SICONV que a substitua, atestando o atendimento às disposições legais aplicáveis;
Observa-se, assim, que a Portaria Interministerial CGU/MF/MP nº 507/2011 dispõe expressamente que compete ao concedente analisar, dentre outros aspectos relevantes da licitação, a contemporaneidade do certame e o enquadramento do objeto conveniado com o efetivamente licitado. Isto é, cabe ao concedente, com o intuito de zelar pela boa e regular aplicação dos recursos públicos federais, na medida do possível, acompanhar e fiscalizar o procedimento licitatório realizado pelo convenente. Aliás, a meu ver, essa verificação prevista no artigo 5º, II, “d”, acima transcrito, deve ser realizada antes mesmo da liberação da primeira parcela dos recursos, a fim de evitar o início da execução do objeto conveniado por meio de uma contratação irregular.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em 18 de junho de 2014.
BRASIL. Decreto n. 6.170, de 25 de julho de 2007. Dispõe sobre as normas relativas às transferências de recursos da União mediante convênios e contratos de repasse, e dá outras providências. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6170.htm. Acesso em 18 de junho de 2014.
BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm. Acesso em 18 de junho de 2014.
BRASIL. Portaria Interministerial CGU/MF/MP nº 507, de 24 de novembro de 2011. Disponível em https://www.convenios.gov.br/portal/arquivos/Portaria_Interministerial_n_507_24_Novembro_2011.pdf. Acesso em 18 de junho de 2014.
BRASIL. Portaria Interministerial MP/MF/MCT nº 127, de 29 de maio de 2008. Disponível em https://www.convenios.gov.br/portal/arquivos/Portaria_127_com_suas_alteracoes_ultima_19jan10.pdf. Acesso em 18 de junho de 2014.
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Procurador Federal, Especialista em Direito Administrativo pelo Instituto Brasiliense de Direito Público - IDP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TORRES, Michell Laureano. O aproveitamento da licitação realizada antes da celebração do convênio para a contratação da empresa responsável pela execução do objeto conveniado Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 jun 2014, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/39898/o-aproveitamento-da-licitacao-realizada-antes-da-celebracao-do-convenio-para-a-contratacao-da-empresa-responsavel-pela-execucao-do-objeto-conveniado. Acesso em: 22 nov 2024.
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