RESUMO: O trabalho aqui apresentado tem a intenção de esmiuçar algumas questões envolvidas no aspecto temporal de incidência do Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) que, por mais simples que pareçam, podem abrir espaços para interpretações e aplicações controvertidas, demandando, por parte do intérprete, maior cautela quanto ao transporte dos conceitos básicos de bens do Direito Civil para a esfera tributária. O escrito partirá, também, do pressuposto de que, por mais inovador que o Direito Civil possa ser em alguns temas relacionados à propriedade e demais direitos reais, demanda-se uma elasticidade maior para que o tributo em estudo não sofra corrosão em seus pressupostos básicos de incidência.
PALAVRAS-CHAVE: Tributo – ITBI – Incidência – Temporal - Controvérsias
SUMÁRIO: I – INTRODUÇÃO. II – ITBI – LINHAS BÁSICAS SOBRE SUA INCIDÊNCIA. III – CONTROVÉRSIAS PRÁTICAS. IV – CONSIDERAÇÕES FINAIS.
I – INTRODUÇÃO
De todos os fatos da vida, a manifestação de riqueza mediante o direito de propriedade certamente é o que mais desperta a atração do Direito Tributário, sendo essa a essência da maior parte dos fatos geradores dos impostos brasileiros. E tal manifestação, inclusive, se configura com a circulação de bens, móveis ou imóveis.
Na circulação imobiliária, o imposto que se manifesta como pertinente é o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis, originado da bifurcação feita pela Constituição da República ao tributo previsto nos artigos 35 a 42 do Código Tributário Nacional. De cunho eminentemente arrecadatório (fiscal), o ITBI tem como matriz principal a transmissão onerosa de bens imóveis ou de direitos a eles relativos, remontando figura essencial no sistema de trespasse imobiliário adotado no Brasil.
Todavia, com a modernização das relações contratuais, diversas manifestações vêm surgindo quanto à adoção do tradicional critério de trespasse imobiliário brasileiro diante de novas e dinâmicas figuras contratuais (e.g. a promessa de compra e venda) que, malgrado o reconhecimento de força obrigacional, criou-se uma gama de celeumas quanto ao reconhecimento de força real independentemente de registro.
Para tanto, no presente trabalho, analisar-se-ão os aspectos básicos da matriz material de incidência do ITBI, conciliando-os com os parâmetros civilísticos de aquisição e transmissão imobiliárias e, também , abordando repercussões práticas quanto a alguns questionamentos que podem ser levantados nas transmissões imobiliárias.
II – ITBI – LINHAS BÁSICAS SOBRE SUA INCIDÊNCIA
Dentre os impostos atribuídos constitucionalmente aos Municípios, fixou-se o Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis – ITBI. Lançando mão do conceito dado pela Constituição Federal, seu art. 156, inciso II apregoa a hipótese de incidência do tributo em estudo, sendo este incidente sobre transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição”.
Derivado de uma separação do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), o ITBI possui três fatos geradores, sendo:
a) A transmissão onerosa de bens imóveis: Trata-se da efetiva transmissão da propriedade imobiliária, por meio de ato solene no qual o proprietário transmite seu direito de propriedade, mediante preço, a outrem, constando tal ato no efetivo registro da matrícula do imóvel, tendo em vista a formalidade prevista no art. 1.245 do Código Civil[i]. Aqui, caracterizada a onerosidade na transmissão do bem imóvel, outras figuras jurídicas podem desencadear a incidência do ITBI, como a permuta, a dação em pagamento, a arrematação, a cessão da posse e a cessão de direitos hereditários;
b) A transmissão onerosa de direitos reais imobiliários, exceto os de garantia: Considerando que os direitos reais são taxativamente previstos em lei, aqui, a hipótese de incidência está na transferência de direitos sobre imóveis (devidamente registrada), abrangendo figuras como uso, usufruto, servidão, direito do promitente comprador, direito de superfície etc. Tal incidência não atinge os casos de penhor (pois, além de direito real, só incide em bens móveis), hipoteca e anticrese (nestes dois últimos casos, haverá tão somente a utilização do imóvel como garantia de uma obrigação pessoal); e
c) Cessão de direitos: instrumento através do qual se opera a transmissão de um direito sobre determinado bem. Sua estrutura demonstra ser um negócio jurídico distinto do próprio direito real, que, in casu, será o objeto translativo.
Percebida a variedade de hipóteses que podem atrair a incidência do ITBI, é seguro dizer que todas elas remontam situações jurídicas: são fatos já conhecidos pelo direito, caracterizados como institutos jurídicos, tendo a lei dado um regime específico de tratamento para cada um[ii].
E tal caracterização é importante para a fixação do momento de ocorrência do fato gerador (aspecto temporal). Nos moldes do Código Tributário Nacional:
Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:
II - tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável.
[...]
(GRIFAMOS)
Portanto, no caso do ITBI, a legislação tributária deve se socorrer das regras dadas pelo Direito Privado (Civil) para saber qual é o momento que se consideram ocorridos os fatos geradores mencionados nos itens ‘a’, ‘b’ e ‘c’ dos parágrafos anteriores.
Direitos imobiliários que são, os atos/fatos que constituem hipótese de incidência do ITBI são os que, além da necessária onerosidade, devem, também a) transmitir bens e direitos e b) constar com o devido registro no cartório imobiliário competente. Sendo situação jurídica, os atos e fatos demandam prévio registro para reconhecimento jurídico e perante terceiros.
E assim dispõe o Código Civil:
Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código.
Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.
§ 1o Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.
§ 2o Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do imóvel.
Art. 1.246. O registro é eficaz desde o momento em que se apresentar o título ao oficial do registro, e este o prenotar no protocolo.
Art. 1.247. Se o teor do registro não exprimir a verdade, poderá o interessado reclamar que se retifique ou anule.
Parágrafo único. Cancelado o registro, poderá o proprietário reivindicar o imóvel, independentemente da boa-fé ou do título do terceiro adquirente.
Como o Direito Tributário se socorre das definições de direito privado (art. 109 do CTN[iii]), é plausível que o mecanismo que habilita a incidência do ITBI será o momento em que os atos/negócios jurídicos que demandarem alguma das hipóteses previstas na CRFB forem idoneamente levados a registro público; antes disso, não há a efetiva transmissão de bens, instituição ou cessão de direitos que justifique a incidência tributária.
Ainda, mesmo que o referido art. 109 do CTN apregoe que os conceitos privatísticos não podem fixar os efeitos tributários, a CRFB e o próprio CTN escolheram, por política tributária, manter a ideia do registro como elemento apto para a geração dos efeitos tributários para fins de ITBI.
O registro público, como exigência para a transmissão de propriedade ou instituição e cessão de direitos, remontando típica tradição do direito brasileiro, também possui outra razão de ser: a estrutura dos direitos sobre imóveis, ao contrário do que ocorre com as obrigações comuns, é adjetivada com o caráter erga omnes, gozando de efeitos contra todos no meio social. E, para usufruir de tal efeito contra terceiros (i.e., pessoas além das que fizeram parte de eventual negócio translativo), é necessário que algum instrumento público permita seu conhecimento por todas as pessoas: essa é a função do registro público.
Nos moldes da Lei de Registros Públicos (Lei Federal nº 6.015/1973), os atos de registro e de averbação, relacionados às hipóteses que atraem o ITBI, são obrigatórios[iv], sendo elemento base para a imposição do direito real perante terceiros.
Embora se reconheça que a informalidade e a celeridade dos contratos entre as pessoas sejam crescentes no meio social, é correto dizer que referida prática não tem o condão de mudar a regra de incidência do ITBI (em seu aspecto temporal, em seu momento), pois, se o regime jurídico do registro público permanece como a hipótese de transmissão onerosa de bens imóveis e de direitos a eles relativos, não cabe ao Direito Tributário alterar tal sentido.
E assim entende o Superior Tribunal de Justiça em pacífica inteligência, a saber:
TRIBUTÁRIO. ITBI. FATO GERADOR. OCORRÊNCIA. REGISTRO DE TRANSMISSÃO DO BEM IMÓVEL. O fato gerador do imposto de transmissão (art. 35, I, do CTN) é a transferência da propriedade imobiliária, que somente se opera mediante registro do negócio jurídico no ofício competente. Precedentes do STJ. 3, Agravo Regimental não provido.
(STJ. Segunda Turma. AgRg no AREsp 215.273/SP. Rel. Min. Herman Benjamin. Julgado em 02/10/2012. DJe 15/10/2012)
E manter a linha traçada pelo Código Tributário Nacional e pela jurisprudência atual gera dois benefícios à Fazenda Pública:
Primeiro, evita-se que o Município viole a legalidade tributária[v], exigindo ITBI em casos não previstos em lei, terminando, além de gerar frustrações à iniciativa privada (com assédio constante às tratativas ou a negócios informais que, mesmo não caracterizadores de direito real, são protegidos pelas normas obrigacionais e pela dinâmica do mercado), causará danos ao próprio erário, inflando o número de processos administrativos de impugnação e, de médio a longo prazo, responsabilizando o Município em ações de repetição do indébito e pagamento de verbas sucumbenciais em alçada judicial.
Segundo, adotar o entendimento de que negócios jurídicos sem registro podem gerar a incidência do ITBI pode lesar o erário com o reconhecimento da decadência: como o próprio nome já diz, como tais negócios não são levados ao registro imobiliário competente, o Município terá grandes dificuldades em fiscalizar as atividades negociais, o que poderia, contra legem, gerar o reconhecimento da decadência do crédito tributário.
Portanto, os atos/negócios jurídicos que, mesmo possuindo o potencial de transmitir bens imóveis ou instituir/transmitir direitos reais imobiliários, enquanto não levados ao registro público competente, não produzem efeitos transmissivos sob a ótica do Direito Tributário[vi], restringindo-se, tão somente, aos efeitos de uma obrigação pessoal simples, ao crédito[vii].
III – CONTROVÉRSIAS PRÁTICAS
Tendo em vista o trabalhado alhures, poderia surgir a dúvida de se, com base no inciso II do art. 156, “in fine” da Constituição Federal, seria possível ao Município editar Lei Complementar para instituir como fato gerador do ITBI a celebração de compromisso de compra e venda (“direitos reais sobre imóveis”) e não o registro no RGI. E, em caso afirmativo, se ainda poderia o Município controlar a celebração destes compromissos particulares, para cobrar o imposto, impondo às imobiliárias, aos corretores e aos particulares em geral a obrigação de apresentar cópia do compromisso para pagamento do imposto, sob pena de sanção por descumprimento. Para dar ainda maior complexidade à matéria, e no caso de compromissos públicos, registrados em Cartório de Notas, e.g., poderia o Município obrigar os cartórios a informar a Fazenda para cobrar o ITBI na sequência? Pois bem.
A primeira pergunta deve ser respondida negativamente, pois a) a Lei Complementar Municipal não pode alterar os conceitos dados por leis superiores e b) a mera celebração de compromisso de compra e venda, por si só, não é reconhecida como fato imponível de ITBI, existindo divisão jurisprudencial sobre tal ponto, mas havendo posição favorável ao Fisco em casos de compromisso registrado.
Sobre o primeiro ponto, como já trabalhado em linhas anteriores, o Código Tributário Nacional e a Constituição da República traçaram as linhas-base para a incidência do ITBI, sendo eleito o registro público como o momento no qual a incidência tributária ocorrerá.
Como, neste caso, manteve-se o registro público como elemento de observância, não poderá a legislação municipal, via lei complementar, alterar o aspecto da incidência do ITBI, sob pena de infringir tanto o disposto na CRFB/88 quanto às diretrizes gerais do Código Tributário Nacional.
Em complemento, também para as promessas de compra e venda, o Código Civil elegeu o registro competente como elemento básico para sua constituição como direito real (art. 1.417do CC)[viii].
Registre-se, ainda, que cabe à Lei Complementar Geral (Código Tributário Nacional) definir o aspecto de incidência dos impostos[ix], tendo o Texto constitucional tão somente complementado as diretrizes básicas do CTN. Portanto, não cabe à lei complementar municipal alterar a forma como a CRFB/88 e o CTN traçaram os fatos geradores do ITBI.
Quanto ao segundo ponto, embora o ITBI tenha ampla abrangência em sua incidência, existe grande divergência em tais casos. Em um primeiro momento, o registro de compromisso de compra e venda não caracteriza, por si só, fato tributável, pois não realiza transmissão de propriedade nem de direito real: representa, tão somente, mera instituição de direito real sem conteúdo translativo.
Assim tem entendido o Supremo Tribunal Federal, como se vê em acórdãos recentes:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO TRIBUTÁRIO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DEVIDO PROCESSO LEGAL. ITBI. FATO GERADOR. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. 1. A jurisprudência do STF se consolidou no sentido de que suposta ofensa aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório e dos limites da coisa julgada, quando a violação é debatida sob a ótica infraconstitucional, não apresenta repercussão geral. Precedente: RE-RG 748.371, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, DJe 1º.8.2013. 2. A transferência do domínio sobre o bem torna-se eficaz a partir do registro público, momento em que incide o Imposto Sobre Transferência de Bens Imóveis (ITBI), de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Logo, a promessa de compra e venda não representa fato gerador idôneo para propiciar o surgimento de obrigação tributária. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(ARE 807255 AgR, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 06/10/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-218 DIVULG 29-10-2015 PUBLIC 03-11-2015)
“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. IMPOSTO SOBRETRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS. FATO GERADOR PROMESSA DE COMPRA E VENDA. IMPOSSIBILIDADE. A obrigação tributária surge a partir da verificação de ocorrência da situação fática prevista na legislação tributária, a qual, no caso dos autos, deriva da transmissão da propriedade imóvel. Nos termos da legislação civil, a transferência do domínio sobre o bem torna-se eficaz a partir do registro. Assim, pretender a cobrança do ITBI sobre a celebração de contrato de promessa de compra e venda implica considerar constituído o crédito antes da ocorrência do fato imponível. Agravo regimental a que se nega provimento” (ARE 805.859-AgR/RJ, Rel. Min. Luís Roberto Barroso)
“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. PRELIMINAR DE REPERCUSSÃO GERAL. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. ÔNUS DO RECORRENTE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356 DO STF. TRIBUTÁRIO. ITBI. CONTRATOS DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. COBRANÇA INDEVIDA. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO”.
(ARE 798.004-AgR/RJ, Rel. Min. Teori Zavascki).
Alinhando-se com a tese exposta nos julgados supra, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo parece andar pelo mesmo caminho:
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ANULATÓRIA – ITBI – INSTRUMENTO PARTICULAR DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – O REGISTRO DO COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA NÃO ESTÁ SUJEITO À INCIDÊNCIA DO ITBI – FATO GERADOR DO TRIBUTO É A TRANSMISSÃO DA PROPRIEDADE DO IMÓVEL – PRECEDENTES DO STJ E STF – IMPOSSIBILIDADE DE COBRANÇA – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO IMPROVIDO.
(TJSP. 15ª Câmara de Direito Público. Apelação nº 1004376-73.2014.8.26.0114. Rel. Des. Eutálio Porto. Julgado em 15/12/2016)
Todavia, diversos outros Tribunais de Justiça têm aprofundado a questão em outras óticas.
Sob a óptica da promessa de compra e venda não levada a registro, é forte a inteligência de que realmente não incide ITBI[x]. Para os casos de promessa de compra e venda registrada, embora exista a ideia de que esta não traduza efetiva transmissão de bem ou de direito real, os Tribunais têm acentuado que, havendo cláusula de irretratabilidade e/ou havendo quitação integral do valor pelos contratados, comprovada a efetiva utilização do imóvel pelo promitente comprador, o Fisco estará autorizado a cobrar ITBI.
Confira-se:
"PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE ATIVA, IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO E INCOMPETÊNCIA DA CORTE ESPECIAL DO TJPE PARA DECLARAR A INCONSTITUCIONALIDADE DA NORMA MUNICIPAL ATACADA. REJEIÇÃO Á UNANIMIDADE. DISPOSITIVO DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO DO MUNICÍPIO DE OLINDA. INCIDÊNCIA DE ITBI SOBRE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL SEM CLÁUSULA DE ARREPENDIMENTO E DEVIDAMENTE REGISTRADA NO CARTÓRIO IMOBILIÁRIO COMPETENTE. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À CONSTITUIÇÃO ESTADUAL E FEDERAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA IMPROCEDENTE. DECISÃO POR MAIORIA.
1. As preliminares de ilegitimidade ativa, de impossibilidade jurídica do pedido e de incompetência desta Corte Especial para declarar a eventual inconstitucionalidade da norma municipal questionada foram rejeitadas ante a ausência de amparo legal.
2. O Código Civil de 2002, adotando nova sistemática, estabelece em seus artigos 1.225 e 1.417 que a promessa de compra e venda de bem imóvel se caracteriza como direito real, de forma que incidirá o tributo correspondente (ITBI) quando da constituição desse direito. Para além disso, o Código Tributário Nacional, em seu artigo 35, II, é claro ao reconhecer que a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis também é fato gerador do ITBI.
3. Considerando que o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis e de Direitos a eles relativos (ITBI) tem como fato gerador a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis e, sendo a promessa de compra e venda irretratável e irrevogável devidamente registrada no Cartório imobiliário um direito real - segundo a nova sistemática da Lei Adjetiva Civil Pátria - resta incontroversa ser devida/exigível a exação fiscal (cobrança do ITBI) a partir do momento em que se registra o aludido contrato (promessa de compra e venda) perante o Cartório de Imóveis, ficando o promissário comprador, consequentemente, desincumbido do ônus de pagar o imposto quando do registro da escritura definitiva.
4. Verifica-se, assim, que tanto a transmissão definitiva da propriedade imóvel, quanto a promessa de compra e venda com cláusula de irretratabilidade, são fatos geradores da exação fiscal (ITBI), posto se tratarem de cessões irretratáveis de direitos reais sobre a propriedade imobiliária, sendo exatamente esta a hipótese fático-jurídica descrita na norma impugnada.
5. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada improcedente para, em consequência, reconhecer a constitucionalidade do artigo 100, inciso V, da Lei Complementar nº 003/1997 do Município de Olinda (Código Tributário Municipal) - com a redação que lhe deu o artigo 3º da Lei Complementar nº 016/2003 do mesmo Município. Decisão por maioria de votos.
(TJPE. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 241892-8, Relator Desembargador Fausto de Castro Campos, Corte Especial, Data do julgamento 01/02/2016)".
APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA. DIREITO TRIBUTÁRIO. ITBI. DISTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. INCIDÊNCIA DO IMPOSTO, NO CASO CONCRETO. PREVALÊNCIA DA REALIDADE ECONÔMICA EM DETRIMENTO DA MERA FORMA JURÍDICA. ANÁLISE DA PROVA PRODUZIDA NOS AUTOS. SITUAÇÃO QUE, NOS TERMOS DA LEI COMPLEMENTAR N.º 197/07, DO MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE, NÃO SE ENQUADRA EM NENHUMA DAS HIPÓTESES DE NÃO INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA, QUE CONDICIONAM O DISTRATO OU A RESCISÃO AO NÃO CUMPRIMENTO DE CONDIÇÃO OU AO NÃO PAGAMENTO DO PREÇO PACTUADO. - Caso em que empresa controladora e sua controlada celebraram e levaram a registro promessa de compra e venda de imóvel, com cláusula de irretratabilidade e irrevogabilidade, efetuando-se pagamento integral do preço avençado à vista, quando poderiam, desde logo e sem empecilhos, firmar o contrato definitivo, situação em que não haveria dúvidas acerca da incidência tributária. Passados mais de dez anos, as partes firmaram distrato, sem qualquer comprovação de devolução do vultoso valor envolvido no negócio jurídico, remuneração pelo tempo de utilização e, sequer, de atualização monetária, somando-se a isso o fato de que, após o registro, o imóvel foi utilizado para garantia de execuções fiscais ajuizadas contra a promitente compradora, modo de atuação que, consoante parecer técnico, também foi empregado em relação a duas outras propriedades. - Aplicação, no caso concreto, da realidade econômica, privilegiando, para efeitos tributários, a essência e os efeitos econômicos em detrimento de elementos meramente formais. As formas, embora salutares, não podem ser manipuladas pelas partes a fim de “manobrar” junto ao Fisco, permitindo a realização de operações jurídico-processuais e, ainda, por cima, dissimulando a ocorrência dos fatos geradores da obrigação tributária. - Exegese da LC 197/07, do Município de Porto Alegre, que condiciona a não incidência do tributo à rescisão da promessa de compra e venda em razão do não cumprimento de condição ou do não pagamento do preço ajustado. Situação que não se enquadra em quaisquer das hipóteses da lei municipal.
(TJRS. 22ª Câmara Cível. Apelação Cível nº 0284336-50.2017.8.21.7000. Relª. Desª Marilene Banzanini. Julgado em 09/11/2017)
Concedida máxima vênia aos entendimentos do STF e do STJ, perceptível é que estes não levaram em conta que o texto constitucional deu abrangência maior ao ITBI, abrangendo não somente a transferência da propriedade imobiliária, mas, também, a transferência e a cessão de direitos reais imobiliários com feição onerosa. Todavia, tal inteligência ainda não sofreu mutação jurisprudencial.
Quanto ao segundo questionamento, a generalidade das leis municipais sobre ITBI fixa os parâmetros básicos para a fiscalização perante os cartórios e demais instituições, cabendo à Municipalidade verificar se, de acordo com a hipótese concreta, o sujeito fiscalizado possa ter influência sobre a tributação (a ponto de ser considerado responsável tributário) para fins de acesso à informação e coleta de dados.
Agora, caso seja possível cobrar ITBI no ato da celebração do compromisso, seria lícito afirmar que o adquirente passa a ser legitimado para o IPTU (sujeito passivo da obrigação tributária)?
O presente questionamento, como se pode perceber, restou por prejudicado em razão da resposta dada anteriormente.
Todavia, quanto à incidência do IPTU, lembramos que seu fato gerador é a propriedade, o domínio útil ou a posse a qualquer título de imóvel urbano, nos moldes do art. 32 do Código Tributário Nacional.
Visando sanar as dúvidas, o Superior Tribunal de Justiça aprimorou a interpretação do art. 31 do Código Tributário Nacional, no sentido de que o termo possuidor a qualquer título engloba qualquer tipo de possuidor que esteja em tal situação de fato com animus dominii, i.e., com a cristalina intenção de agregar o imóvel ao seu patrimônio.
Também chamada de posse ad usucapionem, tal tipo de posse, para fins de sujeição passiva ao IPTU, abrange os promitentes compradores (sem o registro imobiliário) e qualquer pessoa que esteja no imóvel para, futuramente, adquiri-lo formalmente a título de propriedade. Assim sendo, se, mesmo que celebrada tão somente a promessa de compra e venda do imóvel, mas sem transferência formal, se for comprovado que o promitente comprador exerce as faculdades inerentes à propriedade do imóvel (a posse direta e por prolongado período é um indicativo), poderá sujeitar-se ao IPTU.
Referida inteligência está pacificada na alçada do E. STJ, a saber:
TRIBUTÁRIO - IPTU - CONTRIBUINTE - POSSUIDOR - ART. 34 DO CTN.
1. O IPTU é imposto que tem como contribuinte o proprietário ou o possuidor por direito real que exerce a posse com animus definitivo - art. 34 do CTN.
[...]
Examinando-se o art. 34 do CTN, pode-se ter uma errônea idéia, por apontar o artigo como contribuinte o possuidor a qualquer título. Doutrinariamente, distingue-se a posse oriunda de direito real, situação em que assume o possuidor o ônus do proprietário, da oriunda de direito pessoal, quando detém esse título pela só existência de um contrato, tal como a locação, o comodato, etc. O certo é que somente contribui para o IPTU o possuidor que tenha animus domini, como ensina o professor Odmir Fernandes (Código Tributário Nacional, Editora Revista dos Tribunais, pág. 97). Assim, jamais poderá ser chamado como contribuinte do IPTU o locatário ou o comodatário.
[...]
2. O comodatário é possuidor por relação de direito pessoal e, como tal, não é contribuinte do IPTU do imóvel que ocupa.
3. Não sendo contribuinte o possuidor e confundindo-se, no Município, as posições de proprietário do imóvel e de sujeito ativo para a cobrança do IPTU, resulta indevido o tributo.
4. Recurso especial improvido.
(STJ. 2ª Turma. Recurso Especial nº 325.489/SP. Rel. Min. Eliana Calmon. Julgado em 19.11.2002)
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ALÍNEA "C". AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E O APONTADO COMO PARADIGMA. INCIDÊNCIA DO IPTU SOBRE CONDOMÍNIOS IRREGULARES.
1. A divergência jurisprudencial deve ser demonstrada segundo o disposto no arts. 541 do CPC e 255 do RISTJ, que exigem o cotejo analítico das teses dissidentes com a demonstração das circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados. O desrespeito a esses requisitos legais e regimentais impede o conhecimento do Recurso Especial com base na alínea "c" do inciso III do art. 105 da Constituição Federal.
2. Cinge-se a controvérsia dos autos acerca da incidência do IPTU sobre imóvel construído em condomínio irregular (em terrenos públicos).
3. A luz do disposto nos artigos 32 e 34 do CTN são contribuintes do IPTU o proprietário do imóvel, titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título. O CTN não estabelece qualquer limitação ou restrição ao tipo de posse, para fins de incidência do fato gerador do IPTU, e nem ao seu possuidor, como contribuinte.
4. É patente que o recorrente exerce alguns dos poderes inerentes à propriedade sobre o imóvel, já que exterioriza o seu ânimo de proprietário e, no plano fático dispõe do imóvel, ainda que por intermédio de contratos irregulares, realizados sem participação do real proprietário.
5. Cumpre esclarecer em que pese no caso o poder fático que exerce sobre os bens públicos não seja qualificado no plano jurídico como posse suficientemente capaz para gerar a aquisição da propriedade por usucapião ou a garantir a proteção possessória em face dos entes públicos, os detentores de bens públicos se caracterizam como possuidores a qualquer título, para efeito de incidência do IPTU, devendo ser considerados sujeitos passivos já que patente o seu inequívoco ânimo de se apossar definitivamente dos imóveis ou deles dispor mediante contrato oneroso.
6. Recurso especial parcialmente conhecido, e nessa parte não provido.
(STJ. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1.402.217/DF. Rel. Min. Mauro Campbell Marques. Julgado em 17/11/2015)
Portanto, podemos seguramente concluir que, para fins de cobrança de IPTU, a depender do caso concreto, o promitente comprador poderia ser considerado sujeito passivo desde sua aquisição da parcela imobiliária, o que, somado à posse do sujeito anterior e a natureza propter rem do tributo em questão, para fins de sujeição tributária, ultrapassam a pessoa do proprietário nos atos e fatos translatícios, nos moldes do art. 130 do Código Tributário Nacional[xi].
Agregando a inteligência exposta linhas acima, lembramos que, a título exemplificativo do que boa parcela dos Municípios brasileiros estabelece, a incidência do Imposto Sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana independe do cumprimento de quaisquer exigências legais, regulamentares ou administrativas, relacionadas com o imóvel, sem prejuízo das cominações legais cabíveis.
E, se por acaso as questões anteriores fossem respondidas de forma negativa, seria possível entender o compromisso como “cessão de direitos à sua aquisição” (art. 156, II, “in fine” da CF) e obrigar particulares e cartórios a informar para recolher o ITBI sob pena de sanção por descumprimento?
Levando em conta as palavras ditas nos primeiros questionamentos, salientamos que compromisso de compra e venda e cessão de direitos são institutos completamente distintos.
O compromisso de compra e venda é o contrato preliminar por meio do qual uma parte se compromete a alienar seu imóvel a outrem, imputando-se sanções e disposições diversas a depender do resultado da avença. Aqui, não há alienação propriamente dita, mas, sim, contrato cujo objeto é uma prestação futura. Referida promessa possui natureza creditícia e, se registrada no registro competente, ganhará feição de direito real, com todas as suas características básicas.
A cessão de direitos, por sua vez, é o instrumento jurídico por meio do qual se acorda a transmissão de um direito sobre determinado bem. Assim, se recair sobre bem imóvel, também dependerá de formalidade própria (como a escritura pública e o devido registro, como já assentado pelo Supremo Tribunal Federal[xii]). Vide, por exemplo, o direito à sucessão aberta que, caracterizado como bem imóvel por ficção jurídica[xiii], pode ser objeto de cessão mediante escritura pública[xiv].
Como mencionado no Tópico II de nosso parecer, o Constituinte elegeu uma terceira hipótese de incidência do ITBI, conjugada na fórmula “ceder + onerosamente + direito à aquisição de bem imóvel”. Aqui, quando se falar em direito à aquisição de bem imóvel, estar-se-á fazendo referência, propriamente, ao direito real do promitente comprador, ou seja, o fato gerador do ITBI, in casu, ocorre quando há efetivo contrato registrado de cessão onerosa cujo objeto é o direito real do promitente comprador.
Doutrina de calibre advoga que tal cessão foi eleita como terceira hipótese de incidência tributária pelo fato de, ao contrário dos outros fatos geradores, não traduzir transferência de propriedade ou de elemento inerente à posse, restringindo-se tão somente à expectativa jurídica para futura aquisição da propriedade do imóvel[xv].
E a referida distinção demonstrada no parágrafo anterior é de necessária compreensão, pois tanto a promessa de compra e venda quanto a cessão de seus direitos não concretizam transferência imobiliária, mas somente esta última é eleita como fato gerador do ITBI por escolha constitucional (ressalvando-se as exceções que fizemos na resposta à pergunta nº 1).
Tal questão não é de discussão corriqueira na jurisprudência, mas referida sutileza foi percebida pelo Supremo Tribunal Federal, a saber:
Fato gerador do imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos. Compromisso de compra e venda: o compromisso de compra e venda, no sistema jurídico brasileiro, não transmite direitos reais nem configura cessão de direitos à aquisição deles, razão porque é inconstitucional a lei que o tenha como fato gerador de impostos sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos. Representação julgada procedente, declarando-se a inconstitucionalidade do inciso I do parágrafo único do art. 114 da Lei 7.730, de 30/10/73, do Estado de Goiás.
(STF. Tribunal Pleno. Representação nº 1.121/GO. Rel. Min. Moreira Alves. RTJ 109, p. 895)
[...]
Finalmente, ainda que superados os referidos óbices, a pretensão recursal não prosperaria, pois, como bem assentado na decisão agravada, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que o compromisso de compra e venda e a promessa de cessão de direitos aquisitivos não constituem meios idôneos à transmissão, pelo registro, de domínio sobre o imóvel, sendo, portanto, inconstitucional a norma que os erige a fato gerador do ITBI.
[...]
(STF. Segunda Turma. AgRg no AI nº 438.248-2/DF. Rel. Min, Carlos Velloso. Julgado em 13/12/2005. DJe 24/02/2006)
Simplificando, a promessa de compra e venda é um direito real (quando levada a registro ou, caso contrário, questão meramente obrigacional), enquanto a cessão de direitos à aquisição imobiliária é um negócio jurídico cujo direito real é o objeto. São figuras totalmente distintas.
Em complemento, e como exposto no julgado supra, a figura jurídica da promessa de cessão de direitos imobiliários também não é fato gerador de ITBI: está fora da promessa de compra e venda e não se encaixa no conceito puro de cessão de direitos (é uma “expectativa da expectativa”, no linguajar mais coloquial).
IV – CONSIDERAÇÕES FINAIS
Basicamente, o trabalho aqui redigido passou pelos conceitos básicos da incidência do ITBI e mergulhou em questões práticas pontuais e relevantes sobre a interpretação devida do aspecto temporal da incidência tributária. Todavia, é possível sentir, em todo o decorrer do texto supra, um suposto embate entre formas jurídicas tributárias e formas jurídicas civis.
Se é certo que o Direito é uno, devendo o ordenamento jurídico estar em constante processo de aperfeiçoamento de sua coerência, também é correto dizer que o Direito Tributário, com suas peculiaridades para fins de incidência, termina, muitas vezes, por fixar um critério devido para fins de concretização dos ditos fatos geradores sem, necessariamente, acompanhar mudanças sociais.
E isso é facilmente perceptível com a força dada, pelo cotidiano das negociações entre particulares, aos compromissos de compra e venda não levados ao devido registro público. Malgrado o rígido sistema notarial adotado pelo Brasil, a necessidade de dinamicidade às relações negociais tem buscado socorro em instrumentos céleres, ainda que com aspecto de mera expectativa de direito ou de direito eventual.
Como já é de conhecimento por parte dos doutos, o Direito não acompanha as mudanças sociais com a mesma velocidade. Assim, embora tenha dado cada vez mais espaço a negócios atípicos ou sem o devido registro formal (e isso com base na manutenção de princípios como os da boa-fé e da confiança legítima), é cristalino concluir que, para fins tributários, tal mudança não ocorreu por diversos fatores, dentre os quais a correspondência com o regime notarial adotado no Brasil.
Mesmo que tal sistema notário dê maior segurança à fiscalização do tributo aqui estudado, fica latente a necessidade de que as formas jurídicas dinâmicas para o trespasse imobiliário também ganhem contornos mais flexíveis, o que demandaria não somente uma modificação legislativa, mas, em verdade, uma cabal mudança de cultura das relações institucionais estabelecidas no país.
Portanto, por mais claro que tenha ficado a ideia de que a transmissão de bem imóvel e direito real a ele relativo (exceto, obviamente, os de garantia) se socorre dos institutos notariais enraizados no país, não se pode ignorar uma silenciosa demanda por adoção de sistemas contratuais imobiliários mais flexíveis, mas sem, contudo, retirar da Administração tributária o seu direito de verificar as incidências cabíveis.
Com base no parágrafo supra, sua conclusão também pode ser incrementada com a necessidade de se, ao mesmo tempo em que mecanismos contratuais mais céleres forem admitidos pelo Direito, esses não poderão, de forma alguma, legitimar evasão fiscal ou intencional (descabida) não incidência, demandando, também, armar os Municípios com os instrumentos fiscalizatórios e processuais devidos para casos mais dinâmicos como os acima apresentados como questionamentos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Publicado no Diário Oficial da União em 5-10-1988.
BRASIL. Lei Federal nº 5.172, de 25 de Outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Publicado no Diário Oficial da União em 27-10-1966.
BRASIL. Lei Federal nº 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Publicado no Diário Oficial da União em 11-1-2002.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Segunda Turma. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 215.273/SP. Relator Ministro Herman Benjamin. Julgado em 02/10/2012. DJe 15/10/2012.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1.402.217/DF. Rel. Min. Mauro Campbell Marques. Julgado em 17/11/2015.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo em Recurso Extraordinário nº 807255, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 06/10/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-218 DIVULG 29-10-2015 PUBLIC 03-11-2015
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 2ª Turma. Recurso Especial nº 325.489/SP. Rel. Min. Eliana Calmon. Julgado em 19.11.2002.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo em Recurso Extraordinário nº 805.859-AgR/RJ, Rel. Min. Luís Roberto Barroso.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo em Recurso Extraordinário nº 798.004-AgR/RJ, Rel. Min. Teori Zavascki.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário com Agravo nº 934.091/SP. Rel. Min. Roberto Barroso. Julgado em 15/08/2016
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
ESTADO DE PERNAMBUCO. Tribunal de Justiça. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 241892-8, Relator Desembargador Fausto de Castro Campos, Corte Especial, Data do julgamento 01/02/2016
ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. 15ª Câmara de Direito Público. Apelação nº 1004376-73.2014.8.26.0114. Rel. Des. Eutálio Porto. Julgado em 15/12/2016.
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. 22ª Câmara Cível. Apelação Cível nº 0284336-50.2017.8.21.7000. Relª. Desª Marilene Banzanini. Julgado em 09/11/2017.
MACEDO, José Roberto Oliveira. ITBI – Aspectos Constitucionais e Infraconstitucionais. São Paulo: Quartier Latin, 2010.
SCHREIBER, Anderson. Manual de Direito Civil Contemporâneo. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
NOTAS
[i] Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.
§ 1o Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.
§ 2o Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do imóvel.
[ii] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 281.
[iii] Art. 109. Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários.
[iv] Art. 169 - Todos os atos enumerados no art. 167 são obrigatórios e efetuar-se-ão no Cartório da situação do imóvel, salvo:
I - as averbações, que serão efetuadas na matrícula ou à margem do registro a que se referirem, ainda que o imóvel tenha passado a pertencer a outra circunscrição;
[...]
[v] CRFB, art. 150, inciso I.
[vi] BARRETO, Aires F. Curso de Direito Tributário Municipal. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 285.
[vii] SCHREIBER, Anderson. Manual de Direito Civil Contemporâneo. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. p. 682.
[viii] Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.
[ix] Art. 146. Cabe à lei complementar:
[...]
III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;
[...]
[x] STF, AgRg no AI no 603309/MG, Rel. Min. Eros Grau, DJ de 23-2-2007, p. 030; STJ, AgRg no REsp no 327188/DF, Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 24-6-2002, p. 203; STJ, AgRg no 448245, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 9-12-2002, p. 309; STJ, REsp no264064, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 11-12-2000, p. 180; STJ, REsp no 57641, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 22-5-2000, p. 91; STJ, AgRg no REsp no 327188/DF, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 24-6-2002, p. 203.
[xi] Art. 130. Os créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis, e bem assim os relativos a taxas pela prestação de serviços referentes a tais bens, ou a contribuições de melhoria, subrogam-se na pessoa dos respectivos adquirentes, salvo quando conste do título a prova de sua quitação.
Parágrafo único. No caso de arrematação em hasta pública, a sub-rogação ocorre sobre o respectivo preço.
[xii] STF. RE com Ag 934.091/SP. Rel. Min. Roberto Barroso. Julgado em 15/08/2016.
[xiii] Art. 80, II do Código Civil.
[xiv] Art. 1.793 do Código Civil.
[xv] MACEDO, José Roberto Oliveira. ITBI – Aspectos Constitucionais e Infraconstitucionais. São Paulo: Quartier Latin, 2010. p. 187.
Procurador do Município de São José dos Campos/SP. Bacharel em Direito pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - Instituto Multidisciplinar - Departamento de Ciências Jurídicas.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PEIXOTO, André Ricardo. Divagações sobre o aspecto temporal de incidência do ITBI Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 mar 2019, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/52714/divagacoes-sobre-o-aspecto-temporal-de-incidencia-do-itbi. Acesso em: 04 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Marisandra de Almeida Pimentel
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Carla Cristina Pereira Posclan
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