AMANDA DE ALMEIDA SCAVAZINI[1]
SABRINA DE ALMEIDA CONCEIÇÃO[2]
(coautoras)
ELAINE DORO MARDEGAN COSTA[3]
(orientadora)
RESUMO: Planejamento Orçamentário contribui para auxiliar gerenciamento de tempo, produtividade e melhora de resultados financeiros. Por isso, é fundamental para qualquer atividade, porém, para pequenos produtores rurais o acesso à contabilidade rural limita-se por diversos fatores, dentre os quais se cita alguns impedimentos: indisponibilidade de profissionais com capacitação para o setor, ausência de recursos e informações etc. Este estudo objetivou-se identificar os desafios da contabilidade rural na agropecuária e verificar eficácia da aplicação do planejamento orçamentário na produção de laticínios. Assim aplicou-se a revisão bibliográfica descritiva, cuja base foi a análise de livros, artigos científicos e trabalhos acadêmicos publicados ou impressos sobre o tema. Com o estudo pode-se identificar falta de interesse da área científica no tema planejamento orçamentário na atividade pecuarista leiteira, especialmente, à participação das pequenas propriedades rurais que ainda não dispõem da profissionalização na realização de suas atividades. Porém apresenta-se como ferramenta gerencial importante para empresários de laticínios no país, já que abrange desde a tomada de decisão quanto à administração de custos, receitas e despesas até o fornecimento de matéria-prima e gerenciamento do orçamento. Portanto, o estudo demonstra falta de interesse dos produtores manterem efetivamente o planejamento na administração rural, o que acaba por torna-se um desafio aos profissionais da contabilidade rural; assim, sugere-se a necessidade de maior atenção da área acadêmico-científica quanto ao planejamento orçamentário para pequenos produtores rurais, o que pode significar fator relevante para que haja eficácia no cenário nacional e, consequentemente, melhora no crescimento e avanço da pecuária leiteira para a economia brasileira.
Palavras-chave: Contabilidade Rural. Pecuária. Planejamento. Produtor Rural. Pecuária. Orçamento.
ABSTRACT: Budget Planning contributes to assist time management, productivity and improvement of financial results. Therefore, it is essential for any activity, however, for small rural producers the access to rural accounting is limited by several factors, among which some impediments are cited: unavailability of professionals with training for the sector, lack of resources and information etc. This study aimed to identify the challenges of rural accounting in agriculture and cattle raising and verify the effectiveness of the application of budgetary planning in dairy production. The descriptive bibliographic review was applied, which was based on the analysis of books, scientific articles and academic projects published or printed on the subject. The study identifies lack of interest of the scientific area in the subject of budget planning in the dairy farming activity, especially the participation of small rural properties that do not yet have the professionalism to carry out their activities. Although, it presents itself as an important management tool for dairy entrepreneurs in the country, since it covers from the decision making regarding cost management, revenues and expenses until raw material supply and budget management. Therefore, the study demonstrates lack of interest of producers to effectively maintain planning in rural administration, what ends up becoming a challenge to rural accounting professionals; thus, it is suggested the need for more attention from the academic-scientific area regarding budget planning for small rural producers, what may mean a relevant factor for the effectiveness in the national scenario and, consequently, improves the growth and advancement of dairy farming for the Brazilian economy.
Keywords: Rural Accounting. Cattle. Planning. Rural Producer. Budget.
1 INTRODUÇÃO
Planejamento é ferramenta contábil importante, pois ao ser aplicada a administração rural se torna fundamental tanto para grandes como pequenos produtores rurais, já que o acesso à assessoria contábil rural profissional é limitado por diversos fatores como: indisponibilidade de profissionais com capacitação para o setor ou a própria falta de recursos e informações.
A escolha pela área de produção de laticínios se dá justamente por se tratar de uma área que precisa de planejamento orçamentário para viabilizar e fazer controle satisfatório da produção. Assim, de acordo com Carvalho (2020) analisar os custos, tempo de produção, condições climáticas, riscos e lucros se tornam ações de extrema relevância nesse setor.
O estudo do tema se justifica, sobretudo, pela necessidade de se formar profissionais mais capacitados para atuar nos setores diversos das atividades rurais. Já existem muitos estudos de universidades e pesquisas de campo que comprovam a necessidade de inovação e de informação, inclusive apontam como foco as necessidades dos pequenos produtores que buscam sobrevivência e crescimento no mercado cada vez mais amplo e, ao mesmo tempo, restrito pela alta concorrência com grandes produtores de diversas regiões do Brasil e até de outros países em um mercado economicamente globalizado.
Diante o cenário exposto acima, o referido estudo, poderá contribuir com levantamentos situacionais em pesquisa na literatura científica e, de forma geral, objetiva-se mostrar a importância do planejamento orçamentário nas atividades pecuaristas, torna-se muito importante para a formação dos contabilistas que poderão atender com maior eficiência esse setor em suas futuras atuações profissionais.
A questão problema da pesquisa envolve o tema que tem como objetivo geral identificar os desafios da contabilidade rural na agropecuária e verificar eficácia da aplicação do planejamento orçamentário na produção de laticínios.
Sendo apontada a hipótese de que o agropecuarista, principalmente, os pequenos produtores rurais, enfrentam dificuldades estruturais para a aplicação do planejamento orçamentário em suas atividades. Porém, aqueles que conseguem contar com um bom planejamento podem melhorar o controle de sua produção e, consequentemente, obter resultados mais satisfatórios em suas atividades.
Para realizar e analisar a temática proposta do referido trabalho adotou-se o método da pesquisa descritiva bibliográfica, sendo a investigação fundamentada em informações publicadas na forma impressa ou eletrônica, em banco de dados, seja em livros, artigos científicos e/ou trabalhos acadêmicos sobre o tema proposto. Para a busca do material eletrônico, a busca ocorreu por meio das Bibliotecas Online do Google Acadêmico e artigos científicos, teses, dissertações e trabalhos publicados no idioma Português no SciELO.
Conforme ensina Gil (2008), as pesquisas descritivas possibilitam a apresentação de descrições das características do fenômeno, bem como as suas variáveis, no caso desse estudo, o planejamento orçamentário no setor pecuarista. Também o referido autor menciona que a pesquisa bibliográfica contribui para melhorar a discussão e relação entre autores diferentes, sendo ressaltados os principais interlocutores desse estudo: Valle (1987), Zoccal (2005), Machado (2012), Viana, Costa e Santos (2014) e Ideagri (2018).
Destaca-se que o trabalho seguirá a proposta dos objetivos específicos para o estabelecimento de 3 capítulos para a Revisão da literatura, sendo o primeiro, para verificar a importância da contabilidade rural e do planejamento orçamentário na agropecuária; o segundo, para identificar os desafios da aplicação do planejamento orçamentário na produção de laticínios. E o terceiro, para apresentar a eficácia do planejamento orçamentário na produção de laticínios.
2.1 Contabilidade Rural e Planejamento Orçamentário na Agropecuária
O termo atividades rurais resume a exploração de atividades agrícolas, pecuárias, a extração e a exploração vegetal e animal, dentre outras.
A transformação de produtos agrícolas ou pecuários, sem que sejam alteradas a composição e as características do produto, realizadas pelo próprio agricultor ou criador, com equipamentos e utensílios usualmente empregados nas atividades rurais, utilizando-se exclusivamente de matéria-prima produzida na área explorada, tais como: descasque de arroz, conservação de frutas, moagem de trigo e milho, pasteurização e o acondicionamento do leite, assim como o mel e o suco de laranja, acondicionados em embalagem de apresentação, produção de carvão vegetal, produção de embriões de rebanho em geral, independentemente de sua destinação, comercial ou reprodução (VIANA; COSTA, SANTOS, 2014, p.7).
Marion (2014, p. 24) define as empresas rurais como: “aquelas que exploram a capacidade produtiva do solo por meio do cultivo da terra, da criação de animais e da transformação de determinados produtos agrícolas”.
Nesse contexto, Viana, Costa e Santos (2014) explicam que a atividade agrícola-produção vegetal se divide em dois grupos:
· As culturas hortícolas e forrageiras: responsáveis pela produção de cereais, hortaliças, fibras, floricultura, dentre outras, que são consideradas culturas de curto prazo, cuja vida útil é inferior a um ano, e ocupam na contabilidade a posição de ativo circulante.
· E a arboricultura: como florestamento, pomares, seringueiras, dentre outras culturas de longo prazo, estas na contabilidade rural ocupam o ativo não circulante, porque produzem por mais de um ano.
E, a atividade zootécnica, produção animal, segundo Marion (2014) e Viana, Costa e Santos (2014) compreendem aos seguintes setores: a apicultura (criação de abelhas); a avicultura (criação de aves); e a pecuária (criação de gado), dentre outras criações de animais;
Outra atividade classificada na contabilidade rural, citada por Marion (2014), é atividade agroindustrial, são as chamadas indústrias rurais, desenvolvidas em unidades empresariais que acontecem por meio das atividades de beneficiamento, processamento e transformação de produtos agrícolas e animais, como:
· beneficiamento do produto agrícola (arroz, café, milho);
· transformação de produtos de origem animal (mel, laticínios, casulos de seda);
· transformação de produtos agrícolas (como a cana-de-açúcar em álcool, aguardente, açúcar; a soja em óleo; as uvas em vinho e vinagre; e moagem de trigo e milho, por exemplo).
Destas atividades rurais destaca-se no Brasil, de forma bem especial, a pecuária de corte bovina, que segundo Macedo (2006) apresenta-se em processo crescente de modernização, embora ainda caracterizada, em grande parte, pela produção extensiva com animais criados em pasto.
Fornecimento de suplementação alimentar e de sal mineral, além do manejo adequado das pastagens, são cada vez mais adotados pelos pecuaristas para garantir maior qualidade da carne ou do leite e colocando a pecuária nacional em um bom patamar concorrencial no mercado de carne.
Viana, Costa e Santos (2014) citam que das atividades rurais, a que mais se destaca no Brasil hoje é a pecuária. Embora as outras atividades também sejam bastante comuns, a pecuária, cuja atividade é forte no Brasil, devido sua grande extensão territorial e clima que beneficiam a criação de gados leiteiros ou para abate.
Hoje, a pecuária brasileira passa por transformações para se adaptar a realidade do mercado globalizado. Além da prática da suplementação alimentar e manejo de pastagem, os programas de melhoramento genético, segundo Macedo (2006), intensificaram-se e multiplicaram-se as produções de animais de elite, avaliados por sumários que classificam a conformação genética dos reprodutores, com identificação dos animais e maior capacidade de transferir características desejadas (boas) aos seus descendentes.
Marion (2014) corrobora com Viana, Costa e Santos (2014) ao reafirmar que a pecuária se divide em dois grupos de produção: a de gado leiteiro e a de gado de corte, sendo a primeira atividade o objeto deste estudo. Todavia a pecuária de corte passa por três fases de produção diferentes até chegar ao abate, são elas: criar: fase de criação do bezerro até o desmame; recriar: fase que vai da compra do bezerro desmamado até a venda do novilho magro; engordar: engorda do novilho magro até a venda do boi gordo para o abate. Já a pecuária de gado leiteiro por duas fases diferentes, sendo: cria: fase que inicia do nascimento bezerro ate o desmame; e, recria: toda a fase que vai desde o desmame ate iniciar atividade reprodutiva.
Neste sentido a contabilidade rural se faz importante, pois segundo a Agrodex (2017), o proprietário rural, tem se tornado empresário rural, ou melhor, um administrador rural, que consolida os resultados a partir da mensuração dos riscos e controles de ganhos e perdas nas propriedades rurais ao realizar estratégias na gestão comercial da produção (compra, venda e armazenamento), controle econômico-financeiro, planejamento do orçamento e orçamento comparativo.
Vianna, Costa e Santos (2014) reafirmam que a contabilidade rural, possibilita a obtenção de informações claras e objetivas para que o proprietário rural as possa utilizar adequadamente no desempenho de suas propriedades, em cada fase da produção, com planejamento e controle de custos que influenciam no preço final e na lucratividade dos rebanhos. Porém, a maioria dos proprietários rurais ainda não reconhece a importância da contabilidade em suas atividades e negócios, embora seja essencial para auxiliá-los na obtenção de maior rentabilidade.
[...] a contabilidade tem valor, pelas informações que possa passar, e uma melhor visão do cumprimento da Legislação. A contabilidade surgiu com o intuito de registrar e controlar o patrimônio, sendo um trabalho que exige agilidade e confiança, organização e análise da situação (VIANA; COSTA; SANTOS, 2014, p.2).
Ainda como relatam os autores Viana, Costa e Santos (2014), é importante considerar independente da atividade que exerça o esforço no sentido de organizar e gerenciar lucros. Mas, foi por meio da contabilidade rural que se se tornou viável e essencial tal gerenciamento de lucros, pois possibilita em grande parte a redução de custos nos processos produtivos, nas atividades e negócios rurais.
Diante o contexto, Kruger et al. (2009 apud CARVALHO, 2011, p. 3) afirmar que a contabilidade rural é fundamental, pois se tornou ferramenta de apoio, planejamento e controle, para tomada de decisões, quando relacionada a gestão da atividade rural. “Ademais, a contabilidade é configurada como um diferencial, por todos os benefícios que suas informações trazem acerca das tomadas de decisões sobre as receitas, custos e despesas, desenvolvida por cada unidade produzida dentro de uma propriedade rural”.
A Contabilidade Rural possui inúmeras finalidades relacionadas ao controle e planejamento das atividades do meio rural, independente das atividades realizadas na propriedade, torna-se um mecanismo de apoio à tomada de decisão, pois fornece informações sobre condições de expandirem-se, sobre a necessidade de redução de custos ou despesas, necessidades de buscar recursos, possibilidades de investimentos, etc. (KRUGER, 2009, p. 4 apud CARVALHO, 2011, p. 3).
Neste sentido, Crepaldi (2012) enfatiza que o planejamento organizado realizado em conjunto com a contabilidade rural pode modificar a sociedade e acelerar o ritmo de seu desenvolvimento. Assim, planejamento orçamentário rural torna-se necessário; é antes de tudo, um processo dinâmico, programado, que possibilita a formulação do projeto e organização das ações para, melhorar planos de produção e, posteriormente, dinamizar a eficiência técnica e econômica da produção com obtenção e melhoria da rentabilidade econômica e, por conseguinte, possibilitar subsídios para a tomada de decisões.
Diante disso, o planejamento orçamentário aliado a informações contábeis é uma ferramenta que poderá auxiliar o produtor rural a reduzir os custos de sua propriedade e aumentar a sua capacidade produtiva, através da antecipação dos riscos e planejamento de suas ações. Além disso, poderá prever ou estimar os seus resultados para um período posterior, podendo assim permitir a tomada de decisões de forma mais assertiva (OLIVEIRA, 2011 apud CARVALHO, 2011, p. 1).
Valle (1987) considera que o gestor rural, assim como qualquer administrador de um negócio empresarial precisa dispor de conhecimento técnico, sensibilidade e competência para garantir o sucesso na agropecuária, pois se trata de ramo que envolve múltiplas atividades e volume financeiro de operações que se constituiu tal como uma empresa, embora nem sempre esteja legalmente estruturada e denominada dessa forma.
O mesmo autor acima descrito explica que as operações de gestão na agropecuária são consideradas sob três aspectos, sendo: técnico, econômico e financeiro.
Estes por sua vez, são explicados por Valle (1987) da seguinte forma:
● Aspecto técnico: estudos sobre plantios de determinadas culturas vegetais ou criação de gados, sendo exigido conhecimento necessário para fazer escolhas certas das sementes, implementos a serem usados, tipo de gado, alimentação e suplementação, sistema de trabalho e etc.
● Aspecto econômico: operações a serem executadas, como: custos e resultados, cuja analise do custo de cada produção e recuperação, poderá resultar em lucro ou prejuízo.
● Aspecto financeiro: abrange possibilidades na obtenção dos recursos financeiros e como aplicá-los; trata-se do movimento de entradas e saídas de numerários, sendo importante manter o equilíbrio financeiro e rentabilidade ao negócio do produtor.
Conforme afirma Crepaldi (2012), o gestor rural precisa se atentar às tarefas como: planejamento, organização e direcionamento, com efetivo controle administrativo, além de apresentar planos como orçamentos e controles para acompanhamento da atividade.
Segundo o autor acima citado, com o planejamento e programações anuais, mantidas e aprimoradas diariamente nas atividades rurais, o gestor terá base para seu orçamento, que é tido como elemento fundamental para a administração da atividade rural, pois pode auxiliar na previsão das necessidades, geração dos recursos e controle do andamento, além de facilitar a comparação do real e do orçado.
Nas palavras de Nepomuceno (2004, p. 91), “o orçamento é uma ferramenta de aperfeiçoamento da administração na atividade rural, que permite trabalhar com os olhos voltados para o que vai acontecer”.
Assim ao retratar, especificamente, a importância do planejamento financeiro e controle de custos na atividade pecuarista Viana, Costa e Santos (2014) narram:
Ter a informação em tempo real do custo que se tem, torna-se uma ferramenta de suma importância à administração, determinando a melhor hora para vender o rebanho, não deixando assim os custos serem maiores que o ganho de peso, e nem manter o rebanho se o preço de mercado está baixo (VIANA; COSTA; SANTOS, 2014, p.16).
Diante o exposto, torna-se importante ressaltar que a atividade rural requer estrutura de planejamento e controle orçamentário como parte de sua estrutura organizacional, já que envolve o controle do custo e da produção e, ainda, pode definir funções e responsabilidades sobre as atividades que contemplam o orçamento do produtor rural. (VIANA; COSTA; SANTOS, 2014).
2.2 Desafios da Aplicação do Planejamento Orçamentário na Produção de Laticínios
A década de 90 marca uma nova ordem de manuseamento da produção de leite entre os produtores e empresários de laticínios no Brasil, o governo de Getúlio Vargas estabeleceu o decreto de vigilância sanitária em toda a cadeia leiteira, desde a produção da matéria-prima até comercialização final de produtos lácteos (MAIA et al., 2010).
O referido decreto nº 24548 de 03 de julho de 1934 definiu questões de análise do leite e instituiu diversos aspectos como: finalidade, espécie produtora, teor de gordura e tratamento, fazendo, inclusive uma categorização do insumo como tipos: A, B e C, conforme descreve Maia et al.(2010).
O Brasil sempre esteve na posição entre os grandes produtores de leite no mundo, a inserção das tecnologias no sistema produtivo somadas à legislação impulsionou um notável crescimento na produtividade partindo de 14,5 bilhões litros de leite em 1990 para 19 bilhões litros de leite em 2000 e segue em crescimento.
Conforme levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no Censo Agrícola 2017, a produção leiteira chegou à marca de 30 bilhões de litros, sendo a região Sul a maior produtora do país. O Estado de Minas Gerais permanece como o que mais produz, seguido do Rio Grande do Sul e Paraná. E a produção de queijo e requeijão no Brasil foi de 223 mil toneladas no ano de 2016, anterior ao levantamento.
Pecuária leiteira é atividade muito praticada nas propriedades rurais de todo tamanho, desde o pequeno até grande porte. No caso das propriedades menores, chamadas de menor porte, organizar essa tarefa envolve aspectos de forma de trabalho, questões culturais e tradições familiares (ZOCCAL; SOUZA; GOMES, 2005).
Conforme já abordado até aqui, o planejamento financeiro é ferramenta de suma importância para que uma empresa, de qualquer setor ou tamanho, cresça e continue no mercado e não é diferente para a atividade agropecuária (COSTA, 2018).
Então, o planejamento financeiro é necessário para traçar os roteiros para que se possa atingir objetivo no mercado, sendo relevante, para administrar à estrutura a propriedade rural, com a finalidade de controlar e estabelecer padrão de desempenho que possibilite avaliar os eventos reais e buscar antecipar a visualização dos prováveis resultados do negócio. E, o orçamento, assume papel relevante, considerado o meio para se perceber a situação da empresa e subsidiar as decisões sempre de maneira favorável aos objetivos do negócio (ZOCCAL; SOUZA; GOMES, 2005)
Na busca pela literatura identifica-se que não há muitos estudos, especialmente recentes, que tratam da relevância do orçamento no setor pecuarista leiteiro. Contudo, Costa (2018) verificou-se em sua análise de implantação de um sistema orçamentário para indústria de laticínios em Fortaleza (CE), que ao iniciar do zero (OBZ), identificou que o orçamento foi capaz de mostrar empecilhos na implantação, bem como a resiliência de gestores e funcionários. Conforme narra à autora: “a mudança é uma variável extremamente impactante no contexto dos ambientes dos seres humanos, por mais que se explique a exaustão os benefícios.” (COSTA, 2018, p. 50).
As procrastinações e protelações decisórias por parte dos executivos reforçam quão difíceis é saí da zona de acomodação e mais ainda, enfrentar um desconhecido sem segurança. Somam-se a isso as discussões técnicas e às vezes sem consenso. Aqui foram os momentos mais tensos. Em verdade muitos dos personagens receosos de perda de espaço no contexto do trabalho (COSTA, 2018, p. 51).
De acordo com o estudo acima citado, a cultura e hábitos dos gestores e trabalhadores no ambiente de origem pequena, ruralista, dificulta a compreensão destes sobre a importância do orçamento empresarial, que por sua vez, faz com que, muitas vezes, pontos importantes do orçamento sejam tratados com menos importância do que deveria; isto pode implicar na obtenção de sucesso e crescimento da empresa no mercado.
Outro ponto destacado por Costa (2018) foi à falta de compatibilidade do sistema de gestão da empresa (ERP) com a lógica do sistema orçamentário, que acaba por demandar adaptações e até consultorias para as adequações necessárias; ações que pode gerar maior custo e tempo e, em alguns casos inviabilizar o interesse por implantar.
Carlotto, Filippi e Marcello (2011) narram que as propriedades rurais de pequeno porte não fazem controle eficiente de gastos realizados no empreendimento rural, de modo geral o negócio é administrado pela família que apresenta dificuldade de contabilizar receitas, despesas e custos da atividade agrícola.
Nesse sentido, a gestão familiar se atrapalha para realizar as contas da instituição empresarial com as da própria família e não consegue sequer separar as contas. Nessas propriedades rurais de pequena extensão membros da família exercem várias atividades da agricultura e da pecuária, pois o foco principal está na tarefa de produzir leite, a característica do sistema produtivo é de maneira manual, sem grande mecanização, o que toma praticamente toda a rotina dos pecuaristas (ZOCCAL; SOUZA; GOMES, 2005).
Viana, Costa e Santos (2014) que analisam a aplicação da contabilidade rural de modo geral nas pequenas propriedades rurais pecuaristas, destaca que a maioria dos pequenos proprietários rurais ainda não reconhece a importância da contabilidade em suas atividades e negócios, não utilizam nenhuma assessoria contábil e, não dispõem, de conhecimentos técnicos de controles contábeis e financeiros, o que, acaba por limitar as práticas de controle das atividades produtoras com o pouco conhecimento que dispõe de planejamento familiar; embora esta venha sendo essencial para auxiliá-los na administração de seus custos e manutenção da rentabilidade da atividade.
2.3 Planejamento Orçamentário na Produção de Laticínios
Planejamento familiar, usado por pequenos produtores, não é adequado para a realidade dos negócios rurais; mas, a partir do uso do planejamento financeiro estruturado e do orçamento adequado, com base em informações contábeis e de mercado, podem contribuir para evitar prejuízos e alavancar resultados, bem como crescimento no ramo da pecuária de leite e de gado de corte.
Fioravante et al. (2010) em um estudo que analisa particularidades da contabilidade de ativos biológicos cita algumas características que são de grande relevância para diferenciar ativos biológicos de outros ativos, são elas:
(a) Capacidade de mudança, particularidade encontrada nos animais e plantas;
(b) Gerenciamento de mudança, que facilita a transformação biológica, que promove condições necessárias para que o processo ocorra (nível de nutrientes, umidade, temperatura, fertilidade, luz);
(c) Mensuração da mudança, que se refere à mudança da qualidade e quantidade causada pela transformação biológica ou colheita. (FIORAVANTE et al., 2010. Não paginado).
Com base em Viana, Costa e Santos (2014) a contabilidade rural e, consequentemente, o uso de instrumentos como planejamento orçamentário, possibilita que as informações sejam mais claras e objetivas para que o proprietário as utilize adequadamente no desempenho de suas propriedades, em cada fase da produção, com planejamento e controle de receitas e custos que influenciam no preço final e na lucratividade dos rebanhos.
As propriedades rurais podem ter suas atividades exploradas de duas formas: como pessoa física ou como pessoa jurídica, sendo que no Brasil constata a predominância da pessoa física. Umas das razões disso podem ser de uma administração mais voltada para a produção do que para controles, sendo mais familiar do que profissional (VIANA; COSTA; SANTOS, 2014, p. 13).
É fato que para que a atividade do pecuarista possa se desenvolver e crescer é necessário o planejamento orçamentário que viabilize as decisões sobre investimentos em crescimento do rebanho e ampliação dos negócios. Embora a atividade possa dar lucro ao produtor, mantém-se estagnado o seu negócio e sob o risco de qualquer imprevisto comprometer sua rentabilidade e até prejudicar sua sobrevivência nesse mercado de competição acirrada, por isso, um bom controle de custos e planejamento financeiro traz maior segurança aos negócios.
O Comitê de Pronunciamentos Contábeis define que ativos biológicos se classificam em dois grupos: os consumíveis e os de produção. No caso do leite, enquadra-se no segundo grupo. Diretamente os consumíveis são aqueles cujas matrizes não produzem mais de uma vez, por exemplo, os gados destinados à produção de carne, gado para venda, plantação de milho, trigo e árvores para obtenção de madeiras. E os ativos de produção são aqueles em que as matrizes continuam vivas, como o gado para a produção de leite, árvores frutíferas e de produção de lenha. (CPC, 2009).
Nesse sentido, conforme narra Almeida (2019), no que se refere à contabilidade agrícola, deve-se considerar, o tipo de cultura, se é temporária ou permanente.
Culturas temporárias, conforme explica Marion (2014) estão sujeitas ao replantio após a colheita da produção, ou seja, devem ser replantadas anualmente, em curto espaço de tempo após a colheita de uma safra, para que produza novamente no próximo ano. São exemplos: a soja, o milho, o arroz, o feijão, a batata, dentre outros produtos agrícolas.
Já as culturas permanentes, como relata Marion (2014) são consideradas por sobrevivem a longos períodos produzindo sem necessidade de replantio, pois uma mesma matriz possibilita duas ou mais colheitas. São exemplos de culturas permanentes: o café, citricultura (laranja, limão etc.), cultivo de oliveira e a maioria das frutas como maçã, jaca, jabuticaba, goiaba, uva e etc.
Leite como produto, para fins contábeis é comparado às plantas permanentes porque tem sua produção por meio de matriz por longo período. Embora se atribua comumente como culturas permanentes aquelas com duração mínima de quatros anos, Marion (2014) considera que basta a cultura durar mais de um ano e propiciar mais de uma colheita que deve ser considerada permanente. É o caso do leite.
Orçamento de uma fazenda de leite tem como base a evolução de seu rebanho, por isso, devem-se considerar as variações de quantidade de animais em cada categoria no período de um ano, conforme os objetivos do produtor. Sendo importante neste contexto, ressaltar que o orçamento do pecuarista pode ser traçado com base em números de outras propriedades cujo segmento e padrão de produção seja o mesmo da empresa analisada e, claro, apresente bons números para serem usados como modelo. E além desses números devem-se considerar os números da própria fazenda, desde que tais dados sejam registrados. (IDEAGRI, 2020)
Almeida (2019) explica que é possível encontrar o valor de mercado por meio dos índices econômico-financeiros divulgados por associações de representantes e produtores rurais e também pela Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F).
Contudo, para Almeida (2019) nem sempre o valor de mercado representa o valor justo, por isso, torna-se necessário recorrer a outras possibilidades de mensurações contábeis, como: o fluxo de caixa descontado para o caso de mensuração de valor justo de acordo com a KPMG.
Neste contexto, a mesma recomendação é manifestada por Quirino (2011) que também sugere a KPMG como alternativa aos problemas de mensuração ao valor justo com informações de mercado. Contudo “o valor justo de um ativo é mensurado descontando as entradas (receitas) e saídas (custos e despesas) de caixa esperadas até a venda do mesmo a uma taxa de retorno que os participantes do mercado exigiriam” (KPMG, 2018, p. 14).
Segundo identifica Quirino (2011) e, igualmente, reforçada no estudo de Almeida (2019) essa é a técnica mais utilizada para mensurar ativos biológicos como floresta. Nela o gestor deve definir tempo a serem avaliados e quais movimentações monetárias (planejamento financeiro) serão consideradas e/ou movimentações de produção e aplicação de estoque/patrimônio (planejamento econômico), bem como detalhar a análise que pretende ter a partir da avaliação.
Assim, destaca Almeida (2019), como sendo necessário solicitar relatórios que considerem as movimentações efetuadas, além do planejamento, para fazer a comparação entre o que era previsto e o que será efetivamente realizado.
Em um estudo realizado por Machado et al. (2012) que analisa os custos e a rentabilidade da produção de leite de propriedades de Granada, Minas Gerais, também destaca a importância do planejamento orçamentário para considerar mudanças na composição do rebanho, como aumento, redução, depreciação dos animais conforme a vida útil do rebanho, dentre outros fatores e particularidades do setor que devem ser considerados aos já tradicionais dados de orçamento empresarial como despesas, custos e receitas.
Portanto, a eficácia do planejamento orçamentário em propriedades rurais pecuaristas está relacionada à possibilidade de mensuração de um valor justo, e está condicionada à necessidade de se coletar informações e particularidades do fluxo de caixa descontado para evitar distorções que comprometam os resultados na aplicação do orçamento da atividade, cujas mensurações são variáveis por diversos fatores como demonstrado no presente estudo.
CONCLUSÃO
O estudo cumpre o objetivo proposto ao analisar o planejamento orçamentário na atividade rural pecuarista, sobretudo, ao demonstrar a importância da Contabilidade Rural, em especial, a necessidade do planejamento financeiro e orçamentário bem estruturado para a mensuração de um valor justo aos produtos de laticínios, conforme estudos de Crepaldi (2012) e Viana, Costa e Santos (2014).
O que se nota na literatura, é que os poucos estudos que há são realizados em empresas de laticínios e, ainda assim são estudos que se mostram incipientes quando a prática dessas empresas ainda está enraizada em cultura ruralista muito simplória diante de toda a evolução profissional da área de gestão de negócios. O que atualmente, é considerado um entrave para que essas empresas obtenham maior sucesso no mercado quando comparadas às grandes empresas e até multinacionais com as quais concorrem de perto em um mercado globalizado.
Quando se busca essa realidade no pequeno produtor rural, a realidade é mais crítica, pois, em grande parte os pequenos produtores sequer fazem algum tipo de controle mais profissionalizado, no máximo utilizam-se de mecanismos de planejamento familiar para manter suas atividades e negócios.
Estudos como o de Zoccal, Souza e Gomes (2005) e Costa (2018) evidenciam que o planejamento orçamentário pode ser o grande diferencial entre o sucesso e crescimento e a estagnação do produtor rural pecuarista nesse mercado tão competitivo, pois muitas vezes esse pequeno produtor ficará fadado a fornecer matéria-prima barata.
Por se tratar de um setor que se apresenta economicamente promissor para a Economia, o estudo identifica que essa deficiência na falta de planejamento orçamentário pode ser um fator que limita que o país cresça ainda mais nesse setor.
O presente estudo sugere o uso do planejamento orçamentário associado ao fluxo de caixa descontado da KPMG para mensurar valores na atividade pecuária leiteira e, consequentemente, dos laticínios, que tem sua matéria prima baseada na produção leiteira, como destacam os estudos de Quirino (2011), Almeida (2014) e a própria KPMG (2018), dentre outros autores importantes estudados neste artigo.
Contudo, pode-se verificar que a falta de estudos específicos sobre o planejamento orçamentário na atividade rural pecuarista e nas empresas de laticínios sugere a necessidade de maior interesse e preocupação por parte de estudantes e pesquisadores das áreas de gestão e contabilidade, para a realização de novas pesquisas que analisem resultados em unidades de elementos diferentes, como localização, estrutura, nível de controle e gestão de produtores rurais pecuaristas e empresas de laticínios vinculadas à atividade.
Somente com maior aprofundamento em pesquisas e análises será possível superar barreiras de implantação do planejamento orçamentário nas propriedades rurais do setor, especialmente, nas pequenas propriedades; e a partir disto, será possível construir um cenário de maior profissionalização dos negócios pecuaristas derivados no setor de fabricação de laticínios no Brasil.
REFERÊNCIAS
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[1] Cursando graduação em Ciências Contábeis (FEF – Fernandópolis, SP), curso Técnico em Contabilidade (ETEC -Fernandópolis, SP).
[2] Cursando graduação em Ciências Contábeis (FEF – Fernandópolis, SP).
[3] Bacharel Ciências Contábeis (FACICA); Licenciatura Plena Filosofia (CLARETIANO) e Pedagogia (FAER). Especializações em Economia Empresarial, Análise Financeira e Contábil (CEUV), Educação Inclusiva: uma perspectiva interdisciplinar (FIU) e Neuropedagogia Aplicada a Educação (FATECE). Mestre em Filosofia - área Ética (PUC-CAMPINAS), docente (FEF), UNIFUNEC e Rede Municipal de Educação de Santa Fé do Sul.
Cursando graduação em Ciências Contábeis (FEF – Fernandópolis, SP).
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