Porte de drogas para consumo próprio e medida socioeducativa de internação - 1
É incabível a imposição da medida socioeducativa de internação ao adolescente que pratique ato infracional equiparado ao porte de drogas para consumo próprio, tipificado no art. 28 da Lei 11.343/2006. Com base nessa orientação, a 2ª Turma não conheceu de pedido formulado em “habeas corpus”, mas concedeu, de ofício, a ordem para invalidar a imposição da medida socioeducativa de internação aplicada ao ora paciente, sem prejuízo da aplicação de qualquer outra das medidas previstas no artigo 112 do ECA, contanto que não resultasse, em qualquer dessas outras hipóteses, privação, ainda que parcial, de sua liberdade de locomoção física. O Colegiado destacou, inicialmente, que a criança e o adolescente receberiam especial amparo, que lhes seria dispensado pela própria Constituição, cujo texto consagraria, como diretriz fundamental e vetor condicionante da atuação da família, da sociedade e do Estado, o princípio da proteção integral (CF, art. 227). Nesse contexto, as medidas socioeducativas orientar-se-iam, nos casos de atos infracionais cometidos por adolescente, no sentido de neutralizar a situação de perigo ou de risco em que esse se encontrasse, quando, por ação ou omissão, se colocasse em estado de conflito com o ordenamento positivo. Buscar-se-ia, sempre, não obstante o caráter excepcional daquelas medidas, a adoção de providências que, respeitado o estágio de desenvolvimento e a capacidade de compreensão do menor inimputável, viabilizassem sua reintegração ao convívio social e, notadamente, à vida familiar. O sistema de direito positivo, ao dispor sobre o menor adolescente em situação de conflito com a lei, objetivaria implementar programas e planos de atendimento socioeducativo mediante ações articuladas nas áreas de educação, saúde, assistência social, capacitação para o trabalho, cultura e esporte, isso no sentido de conferir efetividade e dar concreção aos fins a que se destinariam as medidas socioeducativas, cuja função estaria definida no art. 1º, § 2º, da Lei 12.594/2012. Outrossim, o alto significado social e o irrecusável valor constitucional de que se revestiria o direito à proteção da criança e do adolescente — ainda mais se considerado em face do dever que incumbiria, ao Poder Público, de torná-lo real, mediante concreta efetivação da garantia de assistência integral à criança e ao adolescente — não poderiam ser menosprezados pelo Estado, sob pena de grave e injusta frustração de um inafastável compromisso constitucional, que teria, no aparelho estatal, um de seus precípuos destinatários.
HC 124682/SP, rel. Min. Celso de Mello, 16.12.2014. (HC-124682)
Porte de drogas para consumo próprio e medida socioeducativa de internação - 2
A Turma ressaltou, por outro lado, que o art. 28 da Lei 11.343/2006 — que pune a posse de drogas para consumo próprio — não autorizaria sequer a privação da liberdade do autor desse ilícito penal, ainda que cometido por pessoa plenamente imputável. O citado dispositivo da Lei de Drogas somente cominaria, para esse delito, penas meramente restritivas de direitos. Portanto, revelar-se-ia contrário ao sistema jurídico, por subverter o princípio da proteção integral do menor inimputável, impor ao adolescente — que eventualmente praticasse ato infracional consistente em possuir drogas para consumo próprio — a medida extraordinária de internação, pois, como verificado, nem mesmo a pessoa maior de 18 anos de idade, imputável, poderia sofrer a privação da liberdade por efeito de transgressão ao referido art. 28 da Lei 11.343/2006.
HC 124682/SP, rel. Min. Celso de Mello, 16.12.2014. (HC-124682)
Decisão publicada no Informativo 772 do STF - 2014
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