EMENTA: Apelação cível. Ação de Reintegração de posse. Legitimidade ativa. Composse pro indiviso. Cessão de direitos. Terceiros. Recurso Improvido. É parte legítima para propor ação possessória de reintegração, aquele que comprova situação de posse sobre o imóvel, decorrente de cessão de direitos, a despeito de subsistir situação de indivisibilidade sobre o bem, nos termos do art. 926 do Código de Processo Civil. Composse pro indiviso comprovada pelos depoimentos e documentos acostados aos autos. Aplicação do art. 1.199, do Código Civil e art. 926 do Código de Processo Civil. Hipótese em que a cessão de direitos outorgada em favor de cessionário, deu-se por escritura pública, restando autorizada a defesa do imóvel contra terceiros (art. 1.199 e 1.314, do Código Civil). Posse exercida por terceiro sem o consenso dos comunheiros, a evidenciar situação de esbulho. Violação ao art. 1.314, Parágrafo único, do Código Civil. Recurso improvido para manter Reintegração.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível, que figuram os acima enunciados, ACORDAM os Senhores Desembargadores da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por votação unânime, e de acordo com parecer do Ministério Público, em negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Desembargador Relator.
Votaram os Senhores Desembargadores José Stélio Nunes Muniz, Cleones Carvalho Cunha e Anildes de Jesus Bernardes Chaves Cruz.
Presidiu o julgamento o Desembargador José Stélio Nunes Muniz.
Presente pela Procuradoria Geral de Justiça a Dra. Themis Maria Pacheco de Carvalho.
São Luís, 16 de agosto de 2010.
Des. José Stélio Nunes Muniz
Presidente e Relator
NÚMERO ÚNICO 0014225-26.2010.8.10.0000
APELAÇÃO CÍVEL Nº 020592/2010 – São João Batista
RELATÓRIO
Cuida-se de Apelação Cível interposta contra sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz da Comarca de São João Batista que, nos autos de ação de reintegração de posse, julgou procedente o pedido para determinar a restituição do imóvel “Ilha Duas Irmãs”, sem prejuízo da apuração, em execução de sentença, de eventuais perdas e danos; fixando, ainda, multa diária pelo descumprimento do preceito no valor de R$ 1.000,00 (um mil reais).
Irresignado alega o apelante que não restou comprovada a posse pela apelada, sendo, esta, parte ilegítima para a causa.
Aduz que a ação foi proposta sem cumprimento do requisito constante do art. 927, do Código de Processo Civil, não tendo sido feito inventário ou arrolamento dos bens deixados por herança, tal como prova o documento de fls. 11-verso.
Ainda, argumenta que o imóvel possui outros donos, a exemplo da Sra. Cir Conceição de Jesus Abreu, filha de um dos co-herdeiros (sra. Martinha Abreu), tendo a mesma consentido com a sua permanência na área, outorgando-lhe, posteriormente, seus direitos sobre a parte que lhe cabia no bem, conforme fls. 42, 69, 91, 93 e 97, não tendo sido tais fatos considerados pela decisão apelada, razão pela qual pede que o recurso seja provido com vistas à anulação ou reforma da sentença.
Às fls. 169/175, novas razões recursais, desta feita, pugnando pela improcedência dos pedidos formulados na ação.
Intimada para oferecer contrarrazões de recurso, refutou a apelada tese recursal, notadamente, quanto às alegações decorrentes do documento de fls. 69, já que o mesmo não comprovou que a suposta área de terras adquiridas pertença à Ilha Duas Irmãs, em São João Batista-MA.
Ainda, entende que o recibo acostado aos autos, dando conta da suposta venda da área esbulhada pelo Sr. José Domingos Abreu, não reflete a verdade, tendo em vista o teor do documento de fls. 97.
Por fim, ressalta a limitação da área esbulhada e pede o improvimento do apelo com vistas à manutenção da sentença atacada.
Com vista dos autos, a Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo não provimento do recurso interposto.
É o relatório.
VOTO
O apelo atende aos pressupostos intrínsecos e extrínsecos indispensáveis à admissibilidade recursal, devendo ser conhecido.
Sobre a preliminar de ilegitimidade ativa, adianto não assistir razão ao apelante.
É que a legitimidade guarda relação com a pertinência subjetiva da ação, restando provado nos autos da reintegração de posse, que a pretensão da apelada sobre o imóvel decorreu de cessão da área objeto de litígio, feita a título oneroso, pelo Sr. José Domingos Abreu e sua esposa.
Ainda que pese sobre imóvel suposta situação de composse, como alegado pelo apelante, assegura o ordenamento jurídico ao possuidor, nos termos do art. 926 do Código de Processo Civil, o direito à reintegração em caso de esbulho praticado por terceiros ou por outro compossuidor.
No mérito, a questão cinge-se à comprovação da melhor posse sobre imóvel indiviso.
Compulsando os autos, verifico dos depoimentos das testemunhas e dos documentos acostados, que o imóvel encontra-se pendente de partilha, possuindo vários herdeiros, não restando nenhuma dúvida de que o caso deva ser analisado à luz do art. 1.199, do Código Civil c/c art. 926 do Código de Processo Civil.
Nesse contexto, os requisitos necessários à proteção possessória restaram provados pela apelada, quais sejam, a posse legítima sobre o imóvel; a prática do esbulho pelo apelante e a data em que o mesmo ocorreu; bem como a perda do respectivo direito por aquela.
A posse legítima do imóvel por parte da apelada, ao contrário da tese defendida na apelação, restou comprovada através da escritura pública de cessão de direitos outorgada pelo Sr. José Domingos Abreu. Ao menos em relação aos direitos deste herdeiro sobre o imóvel denominado “Ilha Duas Irmãs”, sub-rogou-se a apelada, ficando autorizada a promover, nesta qualidade, a defesa da composse contra terceiros.
Aliás, assim determina o art. 1.793, do Código Civil, verbis: “O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública."
E nem se fale na transferência da posse em relação às frações dos demais herdeiros, já que, sobre estas, a apelada não satisfez o ônus processual de provar respectivas aquisições, na forma como prevista supra, ficando restrita a pretensão possessória aos direitos decorrentes da parcela do imóvel cedida por José Domingos Abreu.
Ressalte-se que, o próprio art. 1.793, §2º, da Lei Adjetiva Civil, determina a ineficácia da cessão feita, por co-herdeiro, de bem da herança considerado singularmente, restando claro que o documento de fls. 97, não produziu efeitos em relação aos demais consortes, ausente manifestação expressa destes.
Logo, independentemente de possuir ou não a apelada a totalidade do bem herdado, sua pretensão encontra respaldo jurídico, já que, como dito, a mera cessão de direitos sobre fração do imóvel autoriza-lhe o resguardo da posse do todo contra terceiros.
É o que se depreende do art. 1.199, do Código Civil:
“Art. 1.199. Se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada uma exercer sobre ela atos possessórios, contanto que não excluam os dos outros compossuidores."
E mais adiante, do art. 1.314:
“Art. 1.314. Cada condômino pode usar da coisa conforme sua destinação, sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de terceiro, defender a sua posse e alhear a respectiva parte ideal, ou gravá-la.
Com efeito, a alegação do apelante no sentido de que a posse da apelada não seria legítima ante a falta de partilha do imóvel objeto de litígio não deve ser acolhida, já que a lei, apenas, inviabiliza que o exercício de direitos por um comunheiro ocorra em detrimento dos demais, o que não se deu na situação dos autos.
No caso, conquanto o apelante reconheça-se como legítimo compossuidor do imóvel em virtude da aquisição de quinhão hereditário do Sr. Vicente Abreu (falecido), referida situação não ficou suficientemente provada, já que necessário, ante o estado de indivisão do bem, o cumprimento de certos requisitos.
O primeiro deles se refere à posse do apelante, que não foi revestida da forma prevista em lei (escritura pública), autorizando a apelada a defender a totalidade da composse contra estranhos, descabendo a estes discutir a legitimidade do direito daquela ou extensão de sua cota-parte, dentre outros assuntos relacionados
O outro requisito diz respeito à falta de consenso sobre o exercício da posse do apelante, constituindo-se em óbice para o uso regular da coisa, nos termos do art. 1.314, Parágrafo único, do Código Civil, a evidenciar situação de esbulho cometida por este.
Na situação posta em análise, embora alegue o apelante ter sido autorizado a permanecer no imóvel por ato exclusivo da Sra. Circonceição de Jesus Cutrim Abreu, filha do co-herdeiro Vicente Abreu (falecido), tal permissão caracterizou-se como mera tolerância, ausente o consenso dos demais condôminos, dentre os quais, a apelada, tornando-se injusta a posse a partir do momento em que foi reivindicada e negada.
Feitas tais considerações, observa-se que a melhor posse ainda assiste à apelada, devendo a sentença ser mantida, presentes os requisitos constantes do art. 927, do Código de Processo Civil.
À vista do exposto, nego provimento ao recurso de apelação para manter integralmente a sentença atacada.
Sobre o pedido de fls. 169/175, indefiro o mesmo ante a impossibilidade de o apelante variar o recurso ou complementar suas razões, uma vez exercida a faculdade de recorrer.
Sala das Sessões da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luís, 12 de agosto de 2010.
Des. Stélio Muniz
Relator
Poder Judiciário do Estado do Maranhão - Tribunal de Justiça do Maranhão. Praça D. Pedro II s/n - Centro - São Luís - Maranhão - Cep: 65.010-905
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, TJMA - Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. TJMA - Processo Civil. Ação de reintegração de posse. Legitimidade ativa. Composse pro indiviso. Cessão de direitos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 out 2011, 10:17. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/jurisprudencias/25824/tjma-processo-civil-acao-de-reintegracao-de-posse-legitimidade-ativa-composse-pro-indiviso-cessao-de-direitos. Acesso em: 04 dez 2024.
Por: TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Por: TRF3 - Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Por: TJSC - Tribunal de Justiça de Santa Catarina Brasil
Precisa estar logado para fazer comentários.