EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. PESSOA JURÍDICA. PRESUNÇÃO DE MISERABILIDADE. AUSÊNCIA. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA FINANCEIRA. ESTADO DE FALÊNCIA. IRRELEVÂNCIA. INDEFERIMENTO. CUSTAS AO FINAL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. RESTITUIÇÃO. SUCUMBÊNCIA.- A concessão de Justiça Gratuita para pessoa jurídica demanda prova do postulante de seu estado de miserabilidade, não sendo suficiente para tal desiderato o mero estado de falência.- Não há, para a massa falida, a necessidade de recolhimento prévio das custas processuais dos litígios em que participa, nos termos do artigo 84, IV, da Lei nº 11.101/05.- Os bens dados em alienação fiduciária em contrato de abertura de crédito fixo devem ser restituídos ao credor, seu legítimo possuidor, em razão da resilição do contrato decorrente da falência e do conseqüente inadimplemento da obrigação assumida.- A massa falida, quando demandante ou demandada, sujeita-se ao princípio da sucumbência.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0431.07.033177-9/001 - COMARCA DE MONTE CARMELO - APELANTE(S): CERAMICA MONTE CARLO LTDA MASSA FALIDA DE CERÂMICA MONTE CARLO LTDA - APELADO(A)(S): BANCO BRADESCO S/A - RELATOR: EXMO. SR. DES. PEDRO BERNARDES
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 9ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador PEDRO BERNARDES , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM INDEFERIR PEDIDO DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA, CONCEDENDO À PARTE O DIREITO DE RECOLHER AS CUSTAS INICIAIS E RECURSAIS AO FINAL. REJEITAR PRELIMINAR E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
Belo Horizonte, 10 de janeiro de 2012.
DES. PEDRO BERNARDES - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. PEDRO BERNARDES:
VOTO
Cuida-se de apelação cível, interposta por Eunice Maria Brasiliense, síndica da Massa Falida de Cerâmica Monte Carlo Ltda., contra sentença de f. 36-38, proferida nos autos de Ação de Restituição, ajuizada pelo apelado contra a apelante, julgando parcialmente procedente o pedido inicial, condenando a recorrente a restituir o bem móvel objeto de contrato de alienação fiduciária ou, em caso de inexistência do bem, a pagar a quantia a ser apurada pela Contadoria Judicial relativa a 12 (doze) últimas prestações que deveriam ter sido pagas, descontados os juros, multa, comissão de permanência e juros de mora, corrigida monetariamente pela tabela da Corregedoria de Justiça, a contar do ajuizamento da ação, incidindo juros de 1% ao mês, a partir da data do protocolo de juntada da petição da síndica (17/03/2008), e ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais).
Nas razões de f. 39-41, a apelante alega, preliminarmente, ilegitimidade passiva, pois a ação foi ajuizada contra Cerâmica Monte Carlo Ltda., além de não lhe caber responder por todos os credores da massa falida, que deveria compor a lide.
No mérito propriamente dito, alega a recorrente que o bem objeto do pedido de restituição não consta dentre os bens existentes; que o valor restante do contrato corresponde a 1/4 do valor real do bem, sendo descabida a sua restituição, ainda que o bem existisse; que cabe à massa falida pagar o saldo devedor remanescente, descontados os juros, multas e comissão de permanência nas prestações vincendas, em ação corretamente ajuizada; que não há arbitramento de honorários de sucumbência a credores que se habilitam em processo falimentar, bem como condenação ao pagamento de custas processuais.
Ao final, requer seja acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva, para cassar a r. decisão de 1º grau, extinguindo o processo sem julgamento do mérito, ou seja reformada a sentença, para excluir a condenação ao pagamento das custas processuais e honorários de sucumbência. Requer, ainda, a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita.
Em contra-razões (f. 42/44), alega o apelado Banco Bradesco S/A, em breve relato, que não há que se falar em ilegitimidade passiva, eis que a manifestação da síndica supriu o eventual vício no processo; que o bem que se pretende seja restituído é comum tanto à empresa Cerâmica Monte Carlo Ltda., quanto à sua massa falida, razão pela qual o pólo passivo da ação não necessita ser alterado. Ao final, requer seja negado provimento ao recurso, condenando a recorrente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios.
Sem preparo, pois a apelante requereu a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita.
Conheço do recurso, pois presentes os pressupostos de admissibilidade.
Banco Bradesco S/A ajuizou Ação de Restituição em face de Cerâmica Monte Carmelo Ltda., alegando ter firmado com a empresa requerida um contrato de abertura de crédito fixo, com garantia de alienação fiduciária e outras avenças, no valor de R$ 130.845,16 (cento e trinta mil, oitocentos e quarenta e cinco reais e dezesseis centavos), a ser pago em 48 parcelas, sendo que a obrigação não foi cumprida.
O MM. Juiz de primeiro grau julgou parcialmente procedente o pedido inicial, condenando a recorrente a restituir o bem móvel objeto de contrato de alienação fiduciária ou, em caso de inexistência do bem, a pagar a quantia a ser apurada pela Contadoria Judicial relativa a 12 (doze) últimas prestações que deveriam ter sido pagas, descontados os juros, multa, comissão de permanência e juros de mora, corrigida monetariamente pela tabela da Corregedoria de Justiça, a contar do ajuizamento da ação, incidindo juros de 1% ao mês, a partir da data do protocolo de juntada da petição da síndica (17/03/2008), e ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais).
Justiça Gratuita
Requer a apelante a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita.
Em análise dos autos, constata-se que a apelante não realizou o preparo do recurso interposto, constando, entretanto pedido de Assistência Judiciária formulado nas razões recursais (f. 39).
O Juízo a quo, ao analisar os pressupostos de admissibilidade do recurso, não se manifestou a respeito, recebendo a apelação nos efeitos suspensivo e devolutivo, determinando a intimação do apelado para apresentar contra-razões (f.41verso)
A apelante consiste em pessoa jurídica de direito privado.
Não obstante a interpretação literal da Lei nº 1.060/50 apontar que o benefício da Assistência Judiciária somente seria cabível a pessoas naturais, a exegese teleológica do aludido ato normativo transcende a tais estreitos limites.
O próprio preceito constitucional do artigo 5º, inciso LXXIV, permite tal conclusão, não exigindo nem mesmo o atributo da personalidade jurídica como requisito para a concessão do benefício, in verbis:
"Artigo 5º - (...)
LXXIV - O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos."
A despeito da viabilidade de concessão de Assistência Judiciária às pessoas jurídicas, o entendimento jurisprudencial majoritário consolidou-se no sentido de que a presunção legal de miserabilidade, disposta no §1º, do artigo 4º, da Lei nº 1.060/50, é restrita apenas às pessoas naturais.
Logo, as pessoas jurídicas devem demonstrar o efetivo estado de miserabilidade legal para que possam fazer jus ao benefício pretendido.
Esse é o entendimento do STJ:
"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. PESSOA JURÍDICA COM FINS LUCRATIVOS. APLICABILIDADE, EM TESE. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL. EXAME DO ESTADO DE NECESSIDADE. CONCLUSÃO ADVERSA. PROVA. REEXAME. SÚMULA N. 7-STJ. LEI N. 1.060/1950, ART. 2º. - A pessoa jurídica, independentemente de ter fins lucrativos, pode ser beneficiária da gratuidade prevista na Lei n. 1.060/1950, art. 2º, parágrafo único, desde que comprove, concretamente, achar-se em estado de necessidade impeditivo de arcar com as custas e despesas do processo. (...)" (STJ - REsp 803194 - 4ª Turma - Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior - Julgamento em 15/02/2007 - Publicação no DJ em 26/03/2007, página 251).
Esse, também, é o entendimento deste Tribunal:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. PESSOA FÍSICA. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA. CONCESSÃO. PESSOA JURÍDICA. NÃO-DEMONSTRAÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. DEFERIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. - (...) O acesso à justiça é uma garantia que tem foro constitucional, admitindo a jurisprudência que a pessoa jurídica possa ser contemplada com o benefício da assistência judiciária, sendo, entretanto, necessária e imprescindível prova de sua hipossuficiência econômica para isentá-la das custas do processo" (TJMG - AGI 1.0702.07.389478-5/001 - Rel. Des. Osmando Almeida - Julgamento em 29/01/2008 - Publicação no DJ em 23/02/2008).
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. JUSTIÇA GRATUITA. PESSOA FÍSICA. INDEFERIMENTO DE OFICIO. DESCABIMENTO. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE DA DECLARAÇÃO. JUSTIÇA GRATUITA. PESSOA JURÍDICA. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA INCAPACIDADE PARA ARCAR COM AS DESPESAS DO PROCESSO. - (...) É possível a concessão dos benefícios da assistência judiciária às pessoas jurídicas, somente quando comprovada a impossibilidade de arcar com as despesas do processo, dada a sua insuficiência de recursos, ex vi do inciso LXXIV, do artigo 5º, da Constituição Federal de 1988" (TJMG - AGI 1.0702.06.322963-8/001 - Rel. Des. Renato Martins Jacob - Julgamento em 26/04/2007 - Publicação no DJ em 04/06/2007).
A apelante pretende a concessão da Assistência Judiciária pelo mero fato de que se encontra em estado de falência, devidamente comprovado nos autos.
No entanto, tal situação, por si só, não é suficiente para evidenciar sua miserabilidade legal, não se podendo presumi-la, sob pena de inverter ônus probatório que lhe é imposto por lei.
Esse é o entendimento do STJ:
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. MASSA FALIDA. GRATUIDADE DA JUSTIÇA (LEI N.º 1.060/50) HIPOSSUFICIÊNCIA PRESUMIDA INEXISTÊNCIA. SUCUMBÊNCIA. - (...) Tratando-se de massa falida, não se pode presumir pela simples quebra o estado de miserabilidade jurídica, tanto mais que os benefícios de que pode gozar a "massa falida" já estão legal e expressamente previstos, dado que a massa falida é decorrência exatamente não da "precária" saúde financeira (passivo superior ao ativo), mas da própria "falta" ou "perda" dessa saúde financeira. Destarte, não é presumível a existência de dificuldade financeira da empresa em face de sua insolvabilidade pela decretação da falência para justificar a concessão dos benefícios da justiça gratuita. A massa falida, quando demandante ou demandada, sujeita-se ao princípio da sucumbência (Precedentes: REsp 148.296/SP, Rel. Min. Adhemar Maciel, Segunda Turma, DJ 07.12.1998; REsp 8.353/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, Primeira Turma, DJ 17.05.1993; STF - RE 95.146/RS, Rel. Min. Sydney Sanches, Primeira Turma, DJ 03-05-1985). (...)" (STJ - AgRg no Ag 1292537/MG - 1ª Turma - Rel. Min. Luiz Fux - Julgamento em 05/08/2010 - Publicação no DJe em 18/08/2010).
No mesmo sentido é o entendimento deste Tribunal:
"IMPUGNAÇÃO À CONCESSÃO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. PESSOA JURÍDICA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO ESTADO DE NECESSIDADE. - Em se tratando de pessoa jurídica, exige-se a comprovação do estado de necessidade para a concessão da assistência judiciária gratuita. A recuperação judicial ou o estado de falência não gera a favor da empresa a presunção da impossibilidade do pagamento das custas processuais. Não demonstrada a alegada hipossuficiência de recursos, impõe-se a revogação do benefício indevidamente concedido. Recurso provido" (TJMG - Apelação Cível 1.0079.08.398393-6/001 - Rel. Des. Wagner Wilson - Julgamento em 03/12/2010 - Publicação no DJe em 28/01/2011).
Não há, portanto, como presumir miserabilidade na falência, porquanto, a despeito da preferência legal de determinados créditos, subsistem, apenas, interesses de credores na preservação do montante patrimonial a ser rateado. Frise-se que a massa falida, quando demandante ou demanda, se sujeita aos ônus sucumbenciais.
Assim, o estado de falência, por si só, não é idôneo a comprovar a miserabilidade legal da apelante, sendo imprescindível a comprovação cabal da hipossuficiência financeira, o que não ocorreu no caso, cingindo-se a recorrente a apenas requerer a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita.
Sendo o caso de imprescindibilidade de comprovação cabal da hipossuficiência financeira alegada e não se desincumbindo a apelante do ônus que lhe foi atribuído por lei, não resta outra alternativa senão o indeferimento do benefício pleiteado.
Por outro lado, apesar de não haver pedido expresso, entendo que é o caso de conceder à apelante o direito de recolher as custas iniciais ao final, na hipótese de ser vencida na demanda.
A atual Lei de Falência (Lei nº 11.101/05) estabelece a obrigação da massa de arcar com as custas dos processos nos quais foi parte e restou sucumbida, como se pode observar:
"Artigo 5º - Não são exigíveis do devedor, na recuperação judicial ou na falência:
I - as obrigações a título gratuito;
II - as despesas que os credores fizeram para tomar parte na recuperação judicial ou na falência, salvo as custas judiciais decorrentes de litígio com o devedor."
No entanto, não há necessidade de haver pagamento prévio das custas processuais dos litígios em que a massa restou vencida, nos termos do artigo 84, inciso IV, da Lei nº 11.101/2005, que prevê o pagamento desta despesa em precedência aos demais créditos habilitados na falência, in verbis:
"Artigo 84 - Serão considerados créditos extraconcursais e serão pagos com precedência sobre os mencionados no art. 83 desta Lei, na ordem a seguir, os relativos a:
(...)
IV - custas judiciais relativas às ações e execuções em que a massa falida tenha sido vencida."
Ademais, esse é o entendimento deste Tribunal:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. PESSOA JURÍDICA. FALÊNCIA. AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS. - O inc. LXXIV do art. 5º da CF exige para a obtenção do benefício, o requerente comprove a insuficiência de recursos, ou seja, é uma norma de eficácia limitada, seu destinatário não é universal, mas sim um grupo específico de pessoas, que são aqueles que demonstrarem de forma convincente a impossibilidade de litigar sem o benefício da assistência judiciária. O simples fato de estar em curso processo de falência contra a recorrente, não implica na concessão automática do benefício, contudo, fica facultado o recolhimento das custas processuais e recursais, ao final, se vencida" (TJMG - Agravo 1.0024.04.539780-9/001 - Relª Desª Selma Marques - Julgamento em 01/04/2009 - Publicação no DJe em 08/05/2009).
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. PESSOA JURÍDICA. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO. AUSENTE. INDEFERIMENTO. RECOLHIMENTO DAS CUSTAS AO FINAL. - O simples decreto falimentar ou estado de recuperação judicial não implica na automática concessão do beneficio da gratuidade de justiça, sendo, da mesma forma, necessário a comprovação do estado de miserabilidade da empresa. Não há, para a massa falida, a necessidade de recolhimento prévio das custas processuais dos litígios em que participa. Ante o contido no art.5º, II c/c art.84, IV da Lei de Falências (Lei 11.101/05) as custas das 'ações e execuções em que a massa tenha sido vencida' serão recolhidas ao final da demanda posta em juízo. Recurso parcialmente provido" (TJMG - Agravo 0298324-24.2011.8.13.0000 - Rel. Des. Wanderley Paiva - Julgamento em 17/08/2011 - Publicação no DJe em 26/08/2011).
Nestes termos, indefiro o pedido de concessão dos benefícios da Justiça Gratuita, mas concedo à recorrente o direito de recolher as custas iniciais e recursais ao final.
Preliminar: ilegitimidade passiva
Alega a apelante ilegitimidade passiva, pois a ação foi ajuizada contra Cerâmica Monte Carlo Ltda., além de não lhe caber responder por todos os credores da massa falida, que deveria compor a lide.
Dispõe o artigo 12, inciso III, do CPC:
"Artigo 12 - Serão representados em juízo, ativa e passivamente:
III - a massa falida, pelo síndico."
Como se vê, a massa falida é representada em Juízo pelo síndico, por expressa previsão legal.
No caso, a apelante está representada nos autos por Eunice Maria Brasiliense, síndica da Massa Falida de Cerâmica Monte Carlo Ltda.
Nestes termos, não há ilegitimidade passiva a ser reconhecida, por a ação ter sido ajuizada em face de Cerâmica Monte Carlo Ltda., já que a síndica da massa falida da empresa se apresentou nos autos, opondo-se ao pedido (f. 27).
Assim, rejeito a suscitada preliminar.
Mérito
Em um processo falimentar, o síndico tão logo assine seu termo de compromisso, deve tomar atitudes rápidas, como efetuar a arrecadação dos bens do falido, pois depende da agilidade da arrecadação para sua efetivação vitoriosa e evitar o desvio de bens.
Assim, não cabe ao síndico, pelo menos neste momento, julgar e opinar o que deve ser arrecadado, ou mesmo o que deve ser entregues a terceiros. Ele tem de arrecadar tudo que estiver em poder do falido, de forma rápida e incontinenti.
Na hipótese de ser injusta a arrecadação de algum bem, por pertencer a terceiros, o legislador criou mecanismos para sanar tais problemas que são constantes nos processos falimentares, sendo este o pedido de restituição ou os embargos de terceiro.
Dispõem os artigos 85 e 86, da Lei nº 11.101/2005:
"Artigo 85 - O proprietário de bem arrecadado no processo de falência ou que se encontre em poder do devedor na data da decretação da falência poderá pedir sua restituição.
Parágrafo único. Também pode ser pedida a restituição de coisa vendida a crédito e entregue ao devedor nos 15 (quinze) dias anteriores ao requerimento de sua falência, se ainda não alienada.
Artigo 86 - Proceder-se-á à restituição em dinheiro:
I - se a coisa não mais existir ao tempo do pedido de restituição, hipótese em que o requerente receberá o valor da avaliação do bem, ou, no caso de ter ocorrido sua venda, o respectivo preço, em ambos os casos no valor atualizado.
(...)"
Para ser deferida a restituição do bem arrecadado pelo síndico, o reivindicante deve comprovar ter sobre ele um direito pessoal ou real.
No caso, verifica-se às f. 7-10, que a empresa Cerâmica Monte Carmelo Ltda. firmou com o Banco Bradesco um contrato de abertura de crédito fixo, com garantia de alienação fiduciária.
No contrato de alienação fiduciária, o devedor transfere a posse de um bem móvel ou imóvel ao credor, para garantir o cumprimento de uma obrigação.
Assim, aquele bem dado em garantia não pertence ao devedor, mas ao credor.
Como a síndica da massa falida, ora apelante, não negou a existência de tal contrato, os bens dados em garantia ao contrato de abertura de crédito fixo devem ser restituídos ao credor, seu legítimo possuidor, em razão da resilição do contrato decorrente da falência e do conseqüente inadimplemento da obrigação assumida.
E na hipótese de tais bens não mais existirem, o artigo 86, inciso I, da Lei nº 11.101/2005, autoriza a restituição pecuniária.
Por outro lado, alega a apelante que cabe à massa falida pagar o saldo devedor remanescente, descontados os juros, multas e comissão de permanência nas prestações vincendas, em ação corretamente ajuizada.
Ora, tal alegação não está em desacordo com a sentença, que a condenou a pagar a quantia a ser apurada pela Contadoria Judicial relativa a 12 (doze) últimas prestações que deveriam ter sido pagas, descontados os juros, multa, comissão de permanência e juros de mora.
Portanto, como se vê, o Magistrado de primeiro grau observou corretamente o direito, determinando o pagamento do saldo remanescente, sem juros, multas e comissão de permanência.
Assim, não há motivos para alteração da sentença quanto a esta questão.
Sucumbência
Alega a recorrente que não há arbitramento de honorários de sucumbência a credores que se habilitam em processo falimentar, bem como condenação ao pagamento de custas processuais.
O Código de Processo Civil adotou o princípio da sucumbência, que consiste em atribuir à parte vencida na causa a responsabilidade por todos os gastos do processo.
A respeito, Humberto Theodoro Júnior, in "Curso de Direito Processual Civil", volume I - Teoria Geral do Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento -, Editora Forense, Rio de Janeiro, 39ª edição, 2003, página 81, leciona:
"A responsabilidade financeira decorrente da sucumbência é objetiva e prescinde de qualquer culpa do litigante derrotado no pleito judiciário. Para sua incidência basta, portanto, o resultado negativo da solução da causa, em relação à parte."
No caso, apesar de a recorrente, vencida na ação, estar em estado de falência, tal situação não a isenta de arcar com o ônus da sucumbência.
Esse é o entendimento do STJ:
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. MASSA FALIDA. GRATUIDADE DA JUSTIÇA (LEI N.º 1.060/50) HIPOSSUFICIÊNCIA PRESUMIDA INEXISTÊNCIA. SUCUMBÊNCIA. - (...) A massa falida, quando demandante ou demandada, sujeita-se ao princípio da sucumbência (Precedentes: REsp 148.296/SP, Rel. Min. Adhemar Maciel, Segunda Turma, DJ 07.12.1998; REsp 8.353/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, Primeira Turma, DJ 17.05.1993; STF - RE 95.146/RS, Rel. Min. Sydney Sanches, Primeira Turma, DJ 03-05-1985). (...)" (STJ - AgRg no Ag 1292537/MG - 1ª Turma - Rel. Min. Luiz Fux - Julgamento em 05/08/2010 - Publicação no DJe em 18/08/2010).
Assim, cabe à apelante arcar com a verba sucumbencial, na proporção de sua derrota.
Como não houve alteração da sentença, mantém-se a distribuição do ônus da sucumbência.
Com estas razões, INDEFIRO pedido de Justiça Gratuita, concedendo o direito ao recolhimento das custas iniciais e recursais ao final, REJEITO PRELIMINAR de ilegitimidade passiva e NEGO PROVIMENTO à apelação, para confirmar a r. sentença recorrida.
Custas ao final.
Em síntese, para efeito de publicação (artigo 506, III, do CPC):
- Indeferiram o pedido de Assistência Judiciária formulado pela apelante, concedendo-lhe o direito de recolher as custas iniciais e finais ao final.
- Rejeitaram preliminar de ilegitimidade passiva.
- Negaram provimento ao recurso, para confirmar a r. sentença recorrida.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): TARCISIO MARTINS COSTA e JOSÉ ANTÔNIO BRAGA.
SÚMULA : INDEFERIRAM PEDIDO DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA, CONCEDENDO À PARTE O DIREITO DE RECOLHER AS CUSTAS INICIAIS E RECURSAIS AO FINAL. REJEITARAM PRELIMINAR E NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.
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Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STJ - Superior Tribunal de Justiça. TJMG - Comercial. Assistência judiciária. Recuperação judicial. Necessidade de comprovação. Ausente. Indeferimento. Recolhimento das custas ao final Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 jun 2013, 09:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/jurisprudencias/35485/tjmg-comercial-assistencia-judiciaria-recuperacao-judicial-necessidade-de-comprovacao-ausente-indeferimento-recolhimento-das-custas-ao-final. Acesso em: 04 dez 2024.
Por: TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Por: TRF3 - Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Por: TJSC - Tribunal de Justiça de Santa Catarina Brasil
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