EMENTA: AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE CUMPRIMENTO CONTRATUAL COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - SEGURO DE VIDA - CONTRATO RENOVADO SUCESSIVAMENTE EM CONTINUAÇÃO - NOTIFICAÇÃO DOS SEGURADOS - NOVAS OPÇÕES PARA RENOVAÇÃO - POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DE CLÁUSULAS OU CESSAÇÃO DA AVENÇA.- Nos termos dos artigos 1.448 do Código Civil/ 1916, reproduzido no artigo 760 do atual, o contrato de seguro é obrigatoriamente estabelecido com prazo determinado.- Embora renovado, pode, qualquer das partes, manifestar vontade de renovação, ou não e, ao seu término, fixar novas bases contratuais.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0702.06.323317-6/002 - COMARCA DE UBERLÂNDIA - APELANTE(S): AMERICO ANTONIO ZARDO NETO E OUTRO(A)(S) - APELADO(A)(S): SUL AMÉRICA SEGUROS VIDA PREVIDÊNCIA S/A E OUTRO(A)(S) - RELATOR: EXMO. SR. DES. OSMANDO ALMEIDA
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 9ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO.
Belo Horizonte, 02 de fevereiro de 2010.
DES. OSMANDO ALMEIDA - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. OSMANDO ALMEIDA:
VOTO
Trata-se de APELAÇÃO aviada por AMÉRICO ANTÔNIO ZARDO NETO, CARLOS AUGUSTO GUIMARÃES GUILHERME e LUIZ FERNANDO PUCCI visando a reforma da r. sentença de fls. 689/693, proferida pelo MM. Juiz de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Uberlândia nos autos da Ação Obrigação de Cumprimento Contratual com Pedido de Antecipação de Tutela movida pelos ora apelantes contra SUL AMÉRICA SEGUROS DE VIDA E PREVIDÊNCIA S/A e CLUBE AMÉRICA SAÚDE VIDA E PREVIDÊNCIA.
Em suas razões - fls.696/724 - afirmam que ingressaram com a presente ação, pois que possuíam com as apeladas um contrato de seguro e vida com diversas garantias e que, "sem qualquer razão juridicamente relevante e sem o respaldo do ordenamento jurídico pátrio" foram notificados do desinteresse das apeladas em manter o seguro nos termos contratados, oferecendo aos recorrentes alternativas para aderirem a um novo molde contratual, excluindo várias garantias, sob pena de cancelamento. Afirmam que o d. julgador deferiu a antecipação dos efeitos da tutela, mas, "surpreendentemente, o juiz primevo julgou improcedente o feito, desdizendo todo o entendimento antes manifesto em favor dos segurados" - fls. 697 - alegando que ficaram por compreender, pois a decisão, tal como proferida, não lhes fez justiça. Asseveram que o d. julgador "sucumbiu aos argumentos da Apelada, cuja 'coluna cervical' é a afirmação de que tais contratos possuem vigência anual" cometendo "um absurdo engano e grave injustiça será feita aos Apelantes, caso o presente recurso não seja acolhido"- fls. 698. Afirmam que depois de longos anos de fiel pagamento do prêmio não podem as apeladas invocar o caráter anual do seguro, pelo contrário, pelo contexto dos fatos, demonstra-se que na realidade as apólices possuem vigência "extra-anual", tendo ficado demonstrado que a longevidade do contrato restou reconhecida pelas próprias recorridas, v.g. pelo documento de fls. 34. Sustentam que "ninguém contrata um seguro de vida como se simplesmente fosse um seguro de veículo, uma compra e venda, uma locação, etc... Por isso mesmo, a análise jurídica do contrato de seguro também deve ser diferenciada, atrelada a várias outras questões e princípios sócio-jurídicos, os quais a sentença ora guerreada simplesmente desprezou" - fls. 702. Invocam a aplicação do princípio da boa-fé e asseveram que o comportamento das apeladas nos longos anos de vigência do seguro gerou a expectativa dos recorrentes que, agora, restou frustrada pela sua ação contrária ao anterior posicionamento de manutenção do seguro nos moldes pactuados, até porque a anualidade eventualmente prevista nos certificados deixou de ser relevante. Dizem que não se aplicam as normas da SUSEP, porquanto posteriores aos contratos celebrados entre as partes, além do que são normas reguladoras de seguro coletivo, imprestáveis para regular o seguro de vida individual como é o caso dos autos. Sustentam o caráter adesivo dos contratos e, desta forma, submissos às regras do CÓDIGO de Defesa do Consumidor, asseverando que "a continuidade do pagamento das mensalidades e perpetuação do contrato ao longo do tempo indicam a compreensão da natureza de trato sucessivo do contrato, principalmente nos casos em que os consumidores firmaram contrato há anos" - fls. 705 - e a sua rescisão unilateral desrespeita princípios legais vigentes. Reafirmam e argumentam longamente sobre o tema em análise, acrescentando que a r. sentença fundou-se em "direito já ultrapassado, num contratualismo descompromissado com valores éticos, solidários e sociais, já superados pelo novo ordenamento constitucional, vigente em nosso território" - fls. 707 - (destaque do texto). Pontuam ainda sobre a aplicação dos princípios da boa-fé objetiva, da conservação e equivalência dos contratos, da vedação de práticas abusivas e vantagem excessiva, proibição e vedação ou variação do preço sem justa causa e de forma unilateral. Invocam o artigo 770 do CÓDIGO CIVIL, afirmado a impossibilidade da imposição pela seguradora de alteração unilateral dos termos contratados, mormente com a supressão de garantia e aumento dos prêmios conforme faixa etária. Colacionando variada jurisprudência a respeito do tema, postulam o provimento do apelo.
As contrarrazões encontram-se às fls. 724/741 em evidente contrariedade, aplaudindo a correção da r. sentença. Trouxe prequestionamento.
Presentes os pressupostos para sua admissibilidade, conheço do recurso que foi regularmente preparado - fls. 725.
Preliminares não foram deduzidas nem as vi de ofício para serem enfocadas.
Observo, inicialmente que a decisão que concedeu a antecipação dos efeitos da tutela - fls. 177/179 - foi revogada pelo acórdão de fls. 651/666, proferido no agravo de instrumento em apenso e já transitou em julgado.
A questão central travada nestes autos, diz respeito à possibilidade, ou não, da empresa seguradora não renovar o contrato de seguro firmado entre as partes, oferecendo ao segurado novas opções de contratação, mesmo considerando o longo tempo da vigência e as sucessivas renovações.
E à detida e minuciosa análise da matéria aqui tratada, entendo que, conquanto louvável o empenho do digno patrono dos recorrentes, o feito não comporta outra solução que não o decreto de improcedência.
Inicialmente, cumpre diferenciar o direito à não renovação e a possibilidade de resolução do contrato.
A bilateralidade do contrato de seguro é composta pelas seguintes contraprestações: compete ao segurado o pagamento do prêmio e ao segurador o pagamento da indenização. A obrigação do segurador, todavia, é aleatória, pois somente surge caso advenha o risco previsto no contrato. O mencionado risco é a figura mais importante desse contrato, servindo também como parâmetro para o cálculo do prêmio.
Consoante as disposições do artigo 1.448 do CÓDIGO CIVIL/1916, equivalente ao artigo 760 do CÓDIGO CIVIL vigente, o contrato de seguro deve conter alguns elementos. Tratando-se de seguro de vida, a necessidade de se limitar no tempo os riscos assumidos, se ressalta, pois do contrário, estar-se-ia retirando a alea do contrato. A alea reside justamente no momento em que advirá. Assim é que, vencido o prazo, não se discute mais a possibilidade de resolução, mas, sim, o direito à não renovação, o que afasta qualquer violação ao artigo 39, V, do CÓDIGO de Defesa do Consumidor.
Trata-se de caso de aplicação de princípio básico do direito privado, concretizado na manifestação de vontade da seguradora de não mais prosseguir na avença. Sem lei que assegure a continuidade pretendida, não há como manter-se a relação jurídica contratual entre as partes, nos moldes pretendidos pelos recorrentes. Assim, tendo a ré enviado a correspondência aos autores mencionando a intenção de não renovação da apólice em julho/agosto de 2006, fls. 24/40, agiu dentro da legalidade.
O contrato de seguro é complexo, envolvendo cálculos atuariais para a apuração do prêmio a ser pago, considerando o risco coberto, a probabilidade de ocorrência do sinistro, bem como a dimensão da garantia do seguro. A variação desses elementos resulta na variação do próprio valor do prêmio.
Com o fim do contrato, as recorridas, visando à busca do equilíbrio contratual, manifestaram o seu desinteresse pela renovação do contrato em seus exatos termos, coberturas e valores, até então vigentes, sendo consabido que o contrato de seguro não é perpétuo: tem prazo de vigência delimitado, renovável periodicamente, se assim o quiserem as partes contratantes. Dispunha o artigo 1448, "caput' do CÓDIGO CIVIL de 1916:
"A apólice declarará também o começo e o fim dos riscos, por ano, mês, dia e hora".
O CÓDIGO atua, no artigo 760, repete a periodicidade da avença, acrescida dos demais elementos componentes do contrato, verbis:
"A apólice ou o bilhete de seguro serão nominativos, à ordem ou ao portador, e mencionarão os riscos assumidos, o início e o fim de sua validade, o limite da garantia e o prêmio devido, e , quando for o caso, o nome do segurado e o do beneficiário". (destaquei)
Ora, não há como impor à seguradora a obrigação de manter-se vinculada ao contrato antigo, com condições que se tornaram inviáveis para mesma, nem se sustenta, até porque "contra legis", a afirmação dos apelantes de vigência "extra anual das apólices", à alegação de que foram vários anos que se encontrava o mesmo em vigor, e que a anualidade "prevista ou não nos certificados de seguro... passou a ser irrelevante" .
PEDRO ALVIM, em seu Contrato de Seguro, 2ª edição, observa com precisão:
"0 começo e o fim da garantia do seguro depende da natureza do risco. A possibilidade de sua ocorrência pode ser permanente, verificar-se a todo instante, como acontece no seguro-incêndio, de acidentes pessoais e na maioria dos riscos. Há, pois, necessidade de fixação do início e do término da obrigação do segurador". (p. 514)
E um pouco mais à frente assevera:
"0 segurado nem sempre toma o cuidado de verificar a data de vencimento de seu contrato. Se não houver diligência ou interesse do corretor em alertá-lo para a renovação, poderá ficar sem a garantia do seguro.
Para evitar que isso aconteça, admite a legislação de alguns países a inclusão na apólice, em caráter facultativo, da cláusula de recondução tácita. O contrato é prorrogado automaticamente por determinado período que, segundo a lei francesa é de um ano e pela italiana, de dois anos.
Desapareceu das apólices do seguro de nosso país a cláusula de renovação tácita, por força da norma legal que exige o pagamento antecipado do prêmio para vinculação da obrigação do segurador. Mas ainda se conserva na apólice coletiva de seguros e acidentes pessoais, constante das Condições Gerais, assim redigida:
'A apólice será automaticamente renovada ao fim de cada período de vigência - anual ou a prazo longo - salvo se a Sociedade Seguradora ou o Estipulante, mediante aviso prévio de 30 (trinta) dias antes do seu vencimento, denunciar o desinteresse pela sua renovação'". (p. 518).
Ante esta clara lição não há que se falar que a atitude da requerida constitua ofensa ao artigo 51 do CÓDIGO de Defesa do Consumidor, por não ter sido caracterizada a rescisão unilateral do contrato durante sua vigência, mas sim, sua não renovação após o término do período estipulado contratualmente, mediante denúncia da seguradora, nos trinta dias que antecederam o término do contrato, como restou incontroverso nos autos. Prerrogativa esta autorizada por lei e garantida igualmente ao segurado.
Assim é que nada se opunha que as seguradoras apeladas, depois de exaurido o prazo de cobertura estabelecido na apólice, estabelecessem novas condições para a renovação anual. A regra serve para ambas as partes, reafirme-se. Dessa forma, a iniciativa poderia ser tomada pelos apelantes como pelas apeladas. Daí porque não se lhe aplicam os princípios e dispositivos invocados na inicial.
ERNESTO TZIRULNIK, FLÁVIO DE QUEIROZ B. CAVALCANTI e AYRTON PIMENTEL, na obra "Contrato de Seguro, de acordo com o Novo CÓDIGO CIVIL Brasileiro", 2ª ed., p. 38, ponderam:
"O risco é o elemento 'sine qua non' para a formação da taxa a ser aplicada para o cálculo do prêmio. Essa taxa resulta das contas atuariais que, como afirmamos, permitem compreender economicamente incertezas individuais, convolando-as em risco no contesto coletivo e nele dissolvendo-as. Essas taxas não são proporcionais aos valores das importâncias ou capitais garantidos, mas à garantia em si, que corresponde ao risco incidente sobre o interesse. Esta vinculação prêmio/risco é posta em destaque pelo art. 770, ao estabelecer que uma quebra considerável da proporcionalidade entre esses dois elementos pode levar à revisão ou mesmo à extinção do contrato".
Não é por outra razão que o citado artigo 770, do CÓDIGO CIVIL, levando em conta o equilíbrio contratual, estabelece:
"Salvo disposição em contrário, a diminuição do risco no curso do contrato não acarreta redução do prêmio estipulado; mas, se a redução do risco for considerável, o segurado poderá exigir a redução do prêmio ou a resolução do contrato".
Os referidos autores na mesma obra e página fazem as seguintes considerações a respeito do prêmio em confronto com o preço da garantia:
"O prêmio é a prestação essencial do segurado ou do estipulante. É o preço da garantia. Quem focar a indenização como elemento essencial do contrato - e não a garantia - se deparará com absurda desproporção. Uma prestação ínfima (prêmio) e outra agigantada (indenização). Esse equívoco induz à ilusória 'aleatori' e a soluções estranhas à comutatividade das relações negociais, idéia esta especialmente cara para o negócio securitário. A desproporcionalidade entre prêmio e garantia expõe a operação do negócio de seguro à insolvabilidade (frustra a garantia) ou ao enriquecimento abusivo (quebra o equilíbrio contratual).
Com base no conhecimento da regularidade dos sinistros e da intensidade de seus efeitos, pelo estudo do risco, deve ser achado o valor adequado para fazer frente aos eventos (prêmio puro de risco). Tal só é possível por meio de massificação e homogeneização dos riscos, que depende, de forma inafastável, da empresariedade, elemento adiante comentado".
Nem se pode desconsiderar que o fato motivador da não renovação do contrato pela seguradora, nos moldes originalmente contratados, foram as alterações introduzidas nos contratos sobre seguros de pessoas pelas Circulares 302/05 e 316/06 da Superintendência de Seguros Privados - SUSEP e pela Resolução 117/04 do Conselho Nacional de Seguros Privados - CNSP, as quais tornaram impossível a manutenção das antigas cláusulas.
Consta do artigo 108 da referida Circular 302 da SUSEP:
"Os planos de seguro protocolados na SUSEP antes do início de vigência desta Circular deverão ser arquivados ou adaptados à presente Circular até 30 de junho de 2006, sob pena de aplicação das penalidades cabíveis".
Nesse contexto, obrigar a seguradora a renovar o contrato de seguro nos mesmos moldes anteriormente pactuados, seria obrigá-la a descumprir o que restou expressamente definido pelo órgão fiscalizador dos contratos de seguro, expondo-a às penalidades previstas para a hipótese, o que não afigura-se-me legítimo, mostrando-se cabível, assim, a não renovação do seguro, findo o prazo de vigência contratado.
De outro lado, impor à recorrida tal obrigação afrontaria o princípio da autonomia da vontade em sua mais tradicional expressão, a liberdade de contratar.
Confira-se a lição de CARLOS ROBERTO GONÇALVES:
"6.1. Princípio da autonomia da vontade.
Tradicionalmente, desde o direito romano, as pessoas são livres para contratar. Essa liberdade abrange o direito de contratar, se quiserem, com quem quiserem e sobre o que quiserem, ou seja, o direito de contratar e de não contratar, de escolher a pessoa com quem faze-lo e de estabelecer o conteúdo do contrato.
O princípio da autonomia da vontade se alicerça exatamente na ampla liberdade contratual, no poder dos contratantes de disciplinar os seus interesses mediante acordo de vontade, suscitando efeitos tutelados pela ordem jurídica. Têm as partes a faculdade de celebrar ou não contratos, sem qualquer interferência do Estado'. ("Direito CIVIL Brasileiro", v. III, Saraiva, 2004, p. 20).
Afrontar-se-ia, ademais, o real objetivo do CÓDIGO de Defesa do Consumidor, que não é o de atribuir direitos absolutos ao sujeito tutelado trazendo desequilíbrio à relação jurídica estabelecida, mas, sim, o de dar harmonia às relações massificadas, trazendo equilíbrio às prestações das partes contratantes, conforme determina o seu artigo 4º, inc. III:
"A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (Redação dada ao 'caput' pela Lei nº 9.008, de 21.03.1995)
(...)
III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (artigo 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores".
Sobre o tema confira-se os ensinamentos de JOSÉ GERALDO BRITO FILOMENO, um dos autores do anteprojeto do CDC:
"Trata ainda o CÓDIGO de uma 'política nacional de relações de consumo', justificando nossa assertiva já feita no pórtico do presente tópico no sentido de que se trata em última análise de uma 'filosofia de ação', exatamente porque não se trata tão-somente do consumidor, senão da almejada harmonia das sobreditas 'relações de consumo'". ("CÓDIGO Brasileiro de Defesa do Consumidor": comentado pelos autores do anteprojeto, 8ª ed., Forense Universitária, 2005, p. 17).
Como visto, a política abraçada pela norma consumerista não busca conferir aos direitos ali previstos aplicação descomedida e indiscriminada, de forma a sempre beneficiar o consumidor em detrimento do fornecedor mas, ao contrário, visa à harmonia das relações de consumo, à igualdade entre as partes. O que o ordenamento jurídico impõe ao fornecedor é o dever de manutenção do contrato em vigor, a fim de não frustrar a confiança que o consumidor deposita nas obrigações e no vínculo criado no momento da contratação. Contudo, isso não significa que o fornecedor seja obrigado a manter o vínculo indeterminadamente, mesmo quando a renovação do contrato não lhe seja mais conveniente, ou, até mesmo, lucrativa, pois não se pode olvidar que a atividade empresarial busca o lucro, e que o equilíbrio econômico-financeiro do contrato deve ser observado sob a ótica de ambos os contratantes, consumidor e fornecedor, sob pena de se inviabilizar a própria atividade de fornecimento de produtos ou serviços.
Assim, repita-se, não se pode compelir o fornecedor à contratação, ainda mais quando as condições exigidas lhe são amplamente desfavoráveis, contemplando uma relação jurídica desequilibrada, em favor da parte presumivelmente mais fraca.
Acerca da matéria, confiram-se os seguintes julgados deste eg. Tribunal:
"Agravo de instrumento - Contrato de plano de saúde - Notificação pela seguradora quanto a não-renovação - Possibilidade da denúncia unilateral nos planos de saúde coletivos ou empresariais - Antecipação de tutela para manutenção do contrato - Ausência da verossimilhança das alegações - Revogação da medida. (...)
2 - Vencido o prazo de duração de contrato de plano de saúde coletivo ou empresarial, e tendo manifestado a seguradora, em tempo hábil e conforme contratado, a intenção de não renová-lo, descabe conceder ao consumidor tutela antecipada para conservar os efeitos do antigo contrato. 3 - Ausente a verossimilhança da alegação, a antecipação de tutela deferida deve ser revogada". (Ap. nº 1.0342.06.079458-9/001, Rel. Des. Pedro Bernardes, 9ª Câmara Cível, j. 26/6/2007).
Ainda:
"Contrato de seguro - Cancelamento - Notificação premonitória - Alteração da cobertura - Possibilidade - Contrato por prazo determinado - Termo final.
- O contrato de seguro é celebrado por prazo determinado, sendo renovável a critério dos contratantes, não sendo possível impor à Seguradora a obrigação de contratar. - Se uma das coberturas contratadas não mais interessa à Seguradora, tem esta autonomia para contratar ou não. - Apelação não provida" (Ap. n.º 2.0000.00.459783-3/000 - Rel. Des. Evangelina Castilho Duarte, 2ª Câmara Cível, extinto TAMG, j. 1/2/2005).
"Agravo de instrumento - Declaratória - Contrato de seguro de vida - Prazo vencido - Não-renovação - Tutela antecipada - Impossibilidade - Voto vencido.
- Vencido o prazo de duração de contrato de seguro de vida em grupo e tendo manifestado a seguradora, em tempo hábil, a intenção de não renová-lo, descabe conceder ao consumidor tutela antecipada para conservar os efeitos do antigo contrato.
- A ausência de verossimilhança da alegação autoriza a revogação da tutela antecipada ou de medida equivalente concedida pela autoridade judiciária. Recurso provido.(...)". (AI - n.º 2.0000.00.430265-8/000 - Rel. Des. Alberto Aluízio Pacheco de Andrade - DJ 15/05/2004).
Acrescenta-se o meu posicionamento sobre a questão:
"Ação de cobrança - Seguro de vida - Término do prazo de vigência - Não renovação por parte da seguradora - Notificação prévia rescisão - Licitude - Risco suportado pelo segurador - Princípio da mutualidade - Proposição de novas opções para renovação - Não aceitação pelo segurado.
- Age dentro da legalidade a seguradora que, mediante notificação prévia e antes do término do prazo contratual, comunica formalmente ao segurado acerca do desinteresse em renovar a apólice do seguro de vida em grupo nos moldes até então estabelecidos, utilizando faculdade prevista na apólice e conforme normas especiais aplicáveis à espécie. - O seguro de vida em grupo sustenta-se no regime de repartição simples e no princípio da mutualidade, onde os prêmios pagos individualmente por cada segurado são provisionados para o custeio de eventuais indenizações. (Ap. 1.0701.06.165367-4/002, j. unân. em 22/4/2008).
Ainda a respeito a jurisprudência de outros Tribunais:
"Ações cautelar e principal propostas para impor a renovação do contrato de seguro de vida. Sentença de improcedência. A autora contratou o seguro com vigência de um ano e foi notificada da não renovação do contrato antes do vencimento do período de cobertura. Sendo assim, não há violação ao princípio da boa-fé na medida em que a lei assegura a contratação por prazo certo e a não renovação do contrato. A seguradora, de outra parte, não criou qualquer expectativa de renovação em favor da autora. A situação difere daquelas que têm sido julgadas neste Tribunal, quando a automática renovação do seguro é interrompida injustificadamente, violando a boa-fé do consumidor. Sentença confirmada. Negado provimento ao recurso".(Ap. 1153902- 0/0, 26ª Câmara -Seção de Direito Privado - TJSP, Rel. des. Des. Carlos Alberto Garbi, j. em 28/4/2009).
Ainda:
"Apelação cível - Ação declaratória de nulidade de cláusula contratual c/c constituição de obrigação de fazer c/c reparação de danos morais c/c consignação em pagamento - Pretensão do segurado de renovação 'ad eternum' da apólice securitária - Impossibilidade - Nulidade de cláusula contratual - Inocorrência - obrigação da seguradora limitada à vigência do contrato - Sentença reformada - Recurso provido.
- Em homenagem ao princípio da autonomia da vontade das partes contratantes e, em obediência ao disposto no art. 774 do atual digesto substantivo CIVIL, não é a seguradora obrigada a proceder renovação automática do contrato, mormente se existente cláusula expressa sobre opção de rescisão do pacto após notificação do segurado".(Ap. 2004.027543-4, Terceira Câmara de Direito CIVIL, TJSC, Rel. Wilson Augusto do Nascimento, j. em 28/6/2005).
Assim sendo, entendo que a Seguradora não pratica ato abusivo quando comunica previamente o consumidor acerca de sua intenção de não renovar a apólice ao fim da vigência do contrato, revelando-se exercício regular do direito de não contratar, notadamente no presente caso, onde demonstrou-se que a manutenção do vínculo, sem alteração nas condições contratuais, implicará o desequilíbrio econômico-financeiro do contrato, em razão da ausência de previsão de atualização e de reajustamento do prêmio de acordo com a faixa etária do segurado (fls. 24/40).
Ressalto, finalmente que não tem suporte a sugerida contradição da r. sentença com aquela decisão que deferiu a antecipação da tutela, porquanto não é vedado ao julgador alterar o seu entendimento, mormente quando se trata de decisão interlocutória, sendo certo que a contradição, de regra, deve ser analisada dentro do próprio julgado e não em relação a outros atos decisivos, ainda que no mesmo feito. Em relação às jurisprudências mencionadas pelos recorrentes, através das quais buscam amoldar a sua pretensão é consabido que julgados de outros juízes ou tribunais, não vinculam qualquer juiz, cuja decisão acomoda-se apenas na convicção oriunda de sua livre consciência, com aval da lei.
Sobre a vinculação do Julgador, em abono a essa minha posição, "mutatis mutandis", confira-se:
"A literalidade do preceito deve ser, desde logo, afastada, dado ser flagrantemente inconstitucional, pois em nosso sistema jurídico súmula não obriga, podendo servir as decisões dos tribunais como mero referencial não vinculante, valendo somente como precedente a ser invocado, buscando até igual pronunciamento, que nunca, porém, poderá vir fundamentado, exclusivamente, no texto sumulado". (CLITO FORNACIARI JÚNIOR "O Novo Agravo: Um Retrocesso", Forense, vol. 336, p. 66).
Com estas considerações NEGO PROVIMENTO AO RECURSO, mantido o r. comando sentencial primevo, inclusive quanto à sucumbência imposta que não foi objeto de insurgência recursal.
Custas recursais pelos apelantes.
Resumo do dispositivo (art. 506, III,CPC):
- Negar provimento à apelação.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): PEDRO BERNARDES e TARCISIO MARTINS COSTA.
SÚMULA : NEGARAM PROVIMENTO.
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Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STJ - Superior Tribunal de Justiça. TJMG - Civil. Seguro de vida. Contrato renovado sucessivamente em continuação. Notificação dos segurados. Novas opções para renovação. Possibilidade de alteração de cláusulas ou cessação da avença Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 jun 2013, 07:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/jurisprudencias/35699/tjmg-civil-seguro-de-vida-contrato-renovado-sucessivamente-em-continuacao-notificacao-dos-segurados-novas-opcoes-para-renovacao-possibilidade-de-alteracao-de-clausulas-ou-cessacao-da-avenca. Acesso em: 04 dez 2024.
Por: TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Por: TRF3 - Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Por: TJSC - Tribunal de Justiça de Santa Catarina Brasil
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