Por unanimidade, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) substituiu, nesta terça-feira (10), a prisão preventiva do ex-governador do Rio de Janeiro Luiz Fernando de Souza, o Pezão, por medidas cautelares alternativas previstas no Código de Processo Penal (CPP).
Pezão foi preso em 29 de novembro de 2018, durante a Operação Boca de Lobo, por decisão do ministro do STJ Felix Fischer. Após o STJ ter enviado o processo para a primeira instância, a prisão do ex-governador foi mantida pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região.
Segundo o Ministério Público Federal, Pezão manteve o funcionamento da organização criminosa chefiada pelo ex-governador Sérgio Cabral, dando prosseguimento à cobrança de 5% de propina nos grandes contratos firmados pelo governo estadual. O MP denunciou Pezão pelos crimes de corrupção ativa, corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
No recurso em habeas corpus interposto no STJ, a defesa disse que a prisão é ilegal, pois se baseia em uma "fantasiosa narrativa" contada por um delator, sem a existência de fatos concretos que comprovem o cometimento de crimes.
Medidas cautelares
Ao dar provimento ao recurso da defesa, a Sexta Turma estabeleceu as seguintes medidas cautelares:
1- Compromisso de comparecimento em juízo, para todos os atos designados pela autoridade competente;
2- Monitoramento eletrônico;
3- Proibição de se aproximar e de manter contato pessoal, telefônico ou por meio eletrônico ou virtual com os outros réus ou pessoas acusadas de pertencer à mesma organização criminosa;
4- Proibição de ocupar cargos ou funções públicas no estado ou no município do Rio de Janeiro, enquanto durar o processo;
5- Proibição de se ausentar do estado do Rio de Janeiro sem autorização judicial;
6- Comunicação imediata ao juiz da causa sobre qualquer operação bancária superior a R$ 10 mil; e
7- Recolhimento domiciliar noturno (das 20h às 6h).
Punição antecipada
Para o ministro Rogerio Schietti Cruz, relator do recurso, o decreto de prisão preventiva não apresenta vício de fundamentação, pois demonstrou por diversos meios não somente os pressupostos necessários para a medida, mas também o alto nível de sofisticação e audácia da organização criminosa.
Entretanto, destacou o ministro, apesar de os fatos sob apuração serem significativos, a prisão preventiva não pode ser utilizada como punição antecipada.
"A população em geral não entende o porquê de alguém haver sido solto durante o processo (ou antes dele), sobretudo nos casos em que não parece haver dúvidas de que ele praticou o crime sob apuração", comentou Schietti.
Mas, segundo o relator, "é assim que funciona o processo penal no Brasil (e na grande maioria dos povos ocidentais), visto que a presunção de inocência (ou de não culpabilidade) assegura ao acusado o direito de não ser tratado como se já estivesse condenado".
Pena versus processo
Rogerio Schietti lembrou que o direito penal cumpre sua função de punir após o encerramento do processo, com a aplicação da pena ao culpado. Já o processo penal – fase em que se encontra o ex-governador – não pune, apenas provê meios para se chegar ao resultado final, e somente em situações excepcionais autoriza o uso de uma medida drástica como a prisão preventiva.
Ao justificar a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, o ministro considerou o fato de não haver indicativos concretos de pretensão de fuga ou de tentativa de interferência nas investigações por parte do ex-governador. Além disso, observou o relator, a organização criminosa que se instalou no governo estadual está desarticulada, sem sinais de continuidade, e não há informações de que a aliança entre Pezão e Cabral tenha se mantido durante o tempo da prisão preventiva.
"Com o término de seu mandato e a consolidação de partido de oposição no governo, o risco de continuidade de esquema de corrupção no Poder Executivo não é tão elevado a ponto de justificar a medida extrema, se outras, menos invasivas, custosas e estigmatizantes podem, com igual idoneidade e suficiência, alcançar o mesmo objetivo de evitar a prática de novos crimes", disse Schietti.
"Insisto em enfatizar que eventual substituição da prisão por outras cautelas não importa em desoneração do réu ao processo e muito menos representa um atestado de inocência ou uma chancela judicial pelas eventuais ilicitudes que tenha cometido", ressaltou.
Ele afirmou que, como qualquer outro cidadão acusado de crimes, Pezão deverá se submeter à jurisdição criminal e será julgado oportunamente. "A extensão e a gravidade dos ilícitos descritos na denúncia lhe ensejarão, se comprovados os fatos, severas sanções. Porém, não há mais a necessidade de manter o acusado sob a mais gravosa das cautelas pessoais", concluiu.
Leia o voto do relator.