A desconsideração da personalidade jurídica fundamentada no parágrafo 5º do artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor não pode atingir o patrimônio pessoal de membros do conselho fiscal sem que haja indícios de que tenham participado da gestão e contribuído, ao menos de forma culposa, e com desvio de função, para a prática de atos de administração.
Esse foi o entendimento da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao dar provimento, por maioria, ao recurso de dois integrantes do conselho fiscal de uma cooperativa para excluí-los do polo passivo de uma execução.
No curso da execução, o juízo da 6ª Vara Cível de Barueri (SP) deferiu o pedido de desconsideração da personalidade jurídica da cooperativa, responsável por empreendimentos imobiliários, e incluiu os dois membros do conselho fiscal no polo passivo.
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a decisão. No recurso especial dirigido ao STJ, os dois executados alegaram que, na qualidade de simples membros do conselho, não poderiam ser responsabilizados pessoalmente por atos imputáveis à diretoria da entidade.
Teoria Menor
Ao proferir o voto que prevaleceu no julgamento do recurso, o ministro Villas Bôas Cueva fez uma distinção entre o instituto da desconsideração da personalidade jurídica orientado pelo artigo 50 do Código Civil (que adota a chamada Teoria Maior) e aquele previsto no parágrafo 5º do artigo 28 do CDC (Teoria Menor).
Ao justificar a aplicação da Teoria Menor ao caso julgado, o ministro invocou a Súmula 602 do STJ, segundo a qual o CDC é aplicável aos empreendimentos habitacionais promovidos pelas sociedades cooperativas.
Villas Bôas Cueva explicou que a desconsideração, tal como entendida pela Teoria Menor, é mais ampla e benéfica ao consumidor, não exigindo prova de fraude ou abuso de direito. "Tampouco é necessária a prova da confusão patrimonial, bastando que o consumidor demonstre o estado de insolvência do fornecedor ou o fato de a personalidade jurídica representar um obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados", ressaltou.
Ele disse, porém, que a desconsideração com base no CDC somente pode atingir o patrimônio de pessoas que praticaram atos de gestão.
"A despeito de não se exigir prova de abuso ou fraude para fins de aplicação da Teoria Menor, tampouco de confusão patrimonial, o parágrafo 5º do artigo 28 do CDC não dá margem para admitir a responsabilização pessoal de quem jamais atuou como gestor da empresa", declarou.
Hipótese temerária
O ministro destacou que a regra do artigo 1.070 do Código Civil, com base na qual o magistrado de primeira instância manteve os dois recorrentes no polo passivo da execução, submete os membros do conselho fiscal, em matéria de responsabilidade, às mesmas regras aplicáveis aos administradores.
"No entanto, ao fazer expressa remissão ao artigo 1.016 do mesmo código, condiciona a responsabilização do membro do conselho fiscal perante a sociedade e terceiros prejudicados à demonstração de culpa no desempenho de suas funções", explicou.
Para o ministro, é temerário admitir que a desconsideração da personalidade jurídica de uma sociedade cooperativa – ainda que com fundamento no CDC – possa atingir o patrimônio pessoal de membros do conselho fiscal sem que haja a mínima presença de indícios de que estes contribuíram, ao menos culposamente – e com desvio de função –, para a prática de atos de administração.
A absoluta ausência desses indícios, segundo Villas Bôas Cueva, justifica o provimento do recurso para excluir os membros do conselho do polo passivo da execução.
Leia o acórdão.