O vocábulo profeta vem do grego prophetes e significa “falar antes”. Na acepção contemporânea, o profeta é o homem ou mulher, cuja comunhão com o Divino impregna sua vida, de um modo tão radical, que o torna capaz de interpretar todos os acontecimentos políticos, sociais e religiosos à luz de Deus e do seu projeto.
Um chamamento interior encaminha-me, neste momento, em direção a dois Bispos Profetas: Dom João Baptista da Motta e Albuquerque e Dom Hélder Câmara.
Dom João Baptista da Motta e Albuquerque, Arcebispo de Vitória, foi intimado para comparecer ao antigo Terceiro BC, Batalhão do Exército situado em Vila Velha. Seus inquisidores queriam que ele explicasse o que estava acontecendo na Arquidiocese de Vitória, onde padres pregavam um Evangelho político. Dom João devia coibir o trabalho desses sacerdotes, reprimir o envenamento da Religião por teses comunistas.
A intimação para comparecer ao Batalhão de Caçadores, onde estavam ocorrendo processos sumários para alcançar comunistas, humilhou Dom João. A convocação autoritária teria silenciado nosso Arcebispo, se ele não fosse um homem de Deus.
Vamos agora relembrar Dom Hélder.
O derradeiro encontro deste articulista pecador com o santo Hélder Câmara aconteceu no Recife, em 1997, dois anos antes de sua partida para o Reino prometido. O cenário desse ultimo encontro foi a modesta casa onde Dom Hélder morava. Ele vendeu o suntuoso palácio, que era a residência dos bispos. Aplicou o dinheiro para construir casas para os pobres, e foi morar na periferia.
A primeira coisa que observei, ao chegar, foi a completa desproteção da casa. Disse-lhe: Dom Hélder, as coisas que o senhor fala não agradam os poderosos. Fácil, fácil, o senhor pode ser assassinado aqui. Ele respondeu com um gesto e uma frase. Curvou a cabeça e disse: está vendo estes fios de cabelo que restam? Não cai um único sem que Deus permita.
Conto-lhe que durante o período em que seu nome não podia ser mencionado na imprensa, eu havia “furado” o bloqueio, no jornal “A Ordem”, de São José do Calçado, cidade do interior do Espírito Santo, onde eu exercia a magistratura. Na edição de 4 de agosto de 1969, publiquei um artigo com um título bem cândido: “Reflexões após um período de férias”. No miolo do texto havia cinco parágrafos em sua defesa.
Quem conhece a sociologia das cidades do interior sabe que, na arquitetura do poder local, jamais o redator-chefe de um jornal censuraria um artigo do Juiz de Direito da Comarca, ainda que tendo na mesa do jornal, como era o caso, ordens expressas de escalões federais proibindo referências a Dom Hélder.
Ele achou muito engraçado o episódio e finalizou: você deu uma rasteira na censura.
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