Resumo: Corrupção e direitos humanos possuem interseções que são, muitas vezes, ignoradas pelos sistemas de justiça e pelos juristas. A corrupção subtrai consideráveis montantes de recursos públicos e atinge a concretização de inúmeros direitos humanos na sociedade. Igualmente é capaz de, por si só, ser causa da violação de direitos humanos ou facilitadora de outros delitos que os lesam. Identifica-se, a partir daí, a importância em correlacionar os dois temas, no sentido de promover uma leitura das medidas anticorrupção sob o viés da proteção dos direitos humanos, e vice-versa. Os sistemas internacionais de proteção dos direitos humanos já se atentaram a essa necessidade, contudo os estudos ainda estão incipientes e a implementação nos países, por sua vez, encontra-se em marcha lenta. O microssistema da tutela da probidade no Brasil e nos Sistemas Global e Interamericano mostra-se em evolução constante, todavia é preciso que seja promovida uma releitura de todas as normas, nacionais e internacionais, visando a proteção dos direitos humanos diante das sequelas provocadas pelos atos corruptos.
Palavras-chave: Corrupção. Direitos humanos. Violações.
Sumário: 1 Introdução. 2 Interseções entre os direitos humanos e a corrupção. 3 Corrupção e as sequelas causadas nos direitos humanos em espécie. 3.1 Caso Ramirez Escobar vs. Guatemala (adoção internacional). 3.2 Tráfico de pessoas e contrabando de migrantes. 4 Conclusões.
1. Introdução
A corrupção é fenômeno antigo e recorrente no panorama mundial, podendo ser relacionada com a estruturação das normas jurídicas de prevenção e repressão do país, diferenciando-se se mais rigorosas ou mais flexíveis. Todavia, não basta a mera existência de regramentos jurídicos, demandando força normativa e o controle dos órgãos públicos organizados, seja de natureza judicial, administrativa ou parlamentar. É fator relevante, ainda, o controle social realizado sob tais práticas que, muitas vezes, encontram-se enraizadas e passam a ser aceitas culturalmente em dissonância com a ordem jurídica.
No Brasil, os movimentos da sociedade civil contra os sucessivos escândalos de corrupção ganharam palco no ano de 2013[1], chamando atenção para a ausência de medidas eficazes ao combate à corrupção. Internamente, as normas jurídicas e as decisões judiciais foram recrudescidas no intento de coibir a prática, contudo estamos muito aquém de alcançar a justiça nessa seara.
A problemática envolvida remanesce no fato de que as sequelas da corrupção não se limitam aos danos ao patrimônio da Administração Pública, nacional ou estrangeira, ou à sua moralidade. É consenso na atualidade que a corrupção afeta os mais diversos setores de desenvolvimento de um país, seja humano, econômico, social, cultural, ambiental, civil e político.
A corrupção desborda no desvio de verbas públicas ou na substituição da finalidade do interesse público pelo particular, dificultando a concreção de políticas públicas de saúde, educação, saneamento básico, segurança, assim como de enfrentamento à pobreza e à fome, comprometendo os recursos materiais para tanto. Projetos de infraestrutura são superfaturados; obras públicas são abandonadas; serviços públicos são negligenciados; delitos ambientais tornam-se expressivos e remanescem na impunidade; órgãos de fiscalização são desmantelados, dentre outras inúmeras sequelas. Fica evidente que o estudo da proteção dos direitos humanos perpassa o combate à corrupção.
É nesse contexto que o presente artigo, a partir do método analítico, de vertente jurídico teórica, propõe-se a analisar as intersecções entre a corrupção e os direitos humanos, englobando também a análise exemplificativa das sequelas causadas a alguns dos direitos humanos, em si, e aos serviços públicos que os propiciam, tais como os direitos relacionados à saúde, educação, justiça, segurança, democracia, cidadania, liberdade de expressão, pobreza, não-discriminação, empresas, meio ambiente sustentável, desenvolvimento humano e econômico.
Ademais, sem a pretensão de se esgotar o tema, o presente artigo apresentará proposições práticas a serem adotadas pelos órgãos públicos objetivando minorar o impacto da corrupção nos direitos humanos.
2. Interseções entre os Direitos Humanos e a corrupção
O combate à corrupção começou a evoluir após o fim da Guerra Fria, enquanto a proteção aos direitos humanos ganhou especial atenção em décadas antes com o final da Segunda Guerra Mundial e as violações massivas e generalizadas de direitos humanos. Com a evolução e o desenvolvimento econômico decorrente das novas conformações da sociedade na década de 90, ficou cada vez mais evidente que a corrupção impede o pleno gozo dos direitos humanos, sejam direitos civis e políticos, ou econômicos, sociais, culturais e ambientais.
Constatou-se um importante nexo entre os direitos humanos e a corrupção, elevando o combate à corrupção aos objetivos primordiais das sociedades contemporâneas. A corrupção afeta a todos os Poderes da República, podendo culminar no suborno que conduz à proteção do interesse particular em uma decisão judicial ou em uma votação parlamentar, ou na destinação indevida das verbas pelo gestor da res publica.
No recente contexto da Operação Lava Jato (MPF, 2021), uma das maiores iniciativas de combate à corrupção e lavagem de dinheiro da história recente do Brasil, iniciada em março de 2014, apurou-se que o valor a ser ressarcido aos cofres públicos alcança o patamar inacreditável de R$ 44,4 bilhões (BBC News Brasil, 2018). Para fins de comparação, o investimento do governo federal em educação infantil no ano de 2019 correspondeu a R$ 83,4 milhões (Governo Federal, 2019), assim como outros inúmeros investimentos na área da educação poderiam ter sido integralmente custeados pelo saldo da corrupção.
Segundo o estudo publicado em março de 2010 pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP, 2010), o custo médio da corrupção no Brasil é estimado entre 1,38% a 2,3% do PIB nacional, isto é, de R$ 41,5 bilhões a R$ 69,1 bilhões (em reais de 2008), por ano.
Em suma, os recursos públicos que se destinariam à consecução dos interesses públicos em um país marcado pela desigualdade social, fome e pobreza, perdem o seu traçado na rota da corrupção e deixam vitimadas milhões de pessoas e violados inúmeros direitos humanos. A corrupção reforça a desigualdade social, reduz a riqueza nacional e impede o avanço das nações nos índices de desenvolvimento humano (ARAS, 2018).
A situação piora quando analisamos os impactos causados às pessoas pertencentes a grupos vulneráveis que encontram maior dificuldade na proteção dos seus direitos humanos, como é o caso dos índios, quilombolas, ribeirinhos, ciganos, pessoas com deficiência, mulheres, crianças e adolescentes, idosos, população LGBTQIA+, pessoas em situação de rua, dentre outros. As vulnerabilidades, muitas vezes, interseccionam-se e exigem maior esforço das políticas públicas, como exemplo tem-se a necessidade de proteção das terras indígenas contra invasões ou grilagens para a prática do garimpo ilegal ou outros fins, não sendo raro ter notícia da omissão da União e da Funai na fiscalização (MPF, 2021).
A Transparency International Organization (2020) divulga anualmente um índice de percepção da corrupção no Setor Público em diversos países, sendo que, desde a sua criação em 1995, o Brasil vem ocupando posições desanimadoras. O Corruption Perceptions Index, em sua última aferição em 2020, registrou o Brasil na 94ª posição em comparação com 180 países, em um índice decrescente de confiabilidade.
O quadro deixa claro que a corrupção é um problema mundial, não sendo atoa que os sistemas internacionais de proteção de direitos humanos, assim como os tribunais internacionais, passaram a envidar esforços para a resolução dessa mazela, especialmente a partir da elaboração de Tratados Internacionais especializados no tema. A cooperação jurídica internacional mostrou-se essencial ao combate à corrupção, uma vez que a improbidade administrativa e o delito de corrupção não encontram fronteiras no mundo globalizado de atualmente.
Cabe pontuar que a Convenção Interamericana contra a Corrupção e a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção estabeleceram deveres de tipificação dos delitos de corrupção e afins aos Estados, assim como de implementação de medidas essenciais à política anticorrupção. Por sua vez, a Convenção da OCDE tipificou o crime de corrupção dos funcionários públicos estrangeiros e, ao lado da CICC e da UNCAC, foram as responsáveis por consideráveis avanços na busca pela transparência, probidade e lisura nas funções públicas.
Acrescenta-se, ainda, de grande valia para a atualidade, a previsão dos 17 ODS na Agenda 2030 da ONU, destacando a preocupação com a paz, a solidez das instituições democráticas e o combate à corrupção.
Especificando no tema em debate, o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) analisou o nexo entre a corrupção e os direitos humanos, explanando que:
A corrupção não apenas conduz a violações de direitos humanos específicos, mas também representa um obstáculo estrutural à implementação e gozo de todos os direitos humanos (UNHRC, 2015; Wouters, Ryngaert e Cloots, 2013, p. 35). Em alguns casos, a corrupção conduz à falência das instituições governamentais, tornando mais difícil aos países desenvolverem e implementarem os direitos humanos de forma apropriada. Além disso, a corrupção torna mais difícil aos Estados protegerem importantes direitos que ainda não encontram proteção à luz do direito internacional, mas que surgem consagrados e protegidos por muitas das constituições e leis nacionais, como o direito a um ambiente limpo e sadio. Assim, se uma fábrica polui, de forma regular, o ar de uma certa região, mas as autoridades não tomam medidas para reprimir tal comportamento porque foram subornadas nesse sentido, então os direitos ambientais (e, possivelmente, o direito à proteção da saúde) são violados em resultado da corrupção. A corrupção pode apresentar efeitos nefastos face à paz e à segurança, criando condições favoráveis para o incremento do risco de violação dos direitos humanos.
No mesmo artigo, a UNODC pontuou que a corrupção, o suborno, o furto e a evasão fiscal custam, por ano, cerca de 1,26 trilhões de dólares aos países em desenvolvimento; este montante de dinheiro poderia ser utilizado para auxiliar aqueles que sobrevivem com menos de 1,25 dólares por dia por, pelo menos, seis anos.
O Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas (UNHRC, 2015, p. 8) elaborou relatório acerca dos problemas ocasionados pelo impacto negativo da corrupção no gozo dos direitos humanos em 2015 (Final report of the Human Rights Council Advisory Committee on the issue of the negative impact of corruption on the enjoyment of human rights), mencionando que existem dois aspectos a serem considerados quando nos referimos aos impactos negativos nos direitos humanos.
O primeiro aspecto relaciona-se com os recursos econômicos e financeiros afetados pela corrupção, destacando que os atos corruptos desviam os fundos para o desenvolvimento e implicam na realocação de verbas que podem interferir na efetiva realização dos direitos humanos, especialmente das pessoas vulneráveis. A corrupção reduz os recursos disponíveis para a concretização progressiva dos direitos econômicos, sociais e culturais.
Já o segundo aspecto relaciona-se com a realização da democracia e a implementação do rule of law - Estado de Direito. Caso as autoridades do país estejam impregnadas pela corrupção, a confiança do povo no governo, e eventualmente na ordem democrática e no Estado de Direito, é minada.
O relatório explicita, ainda, que a violação dos direitos humanos pela corrupção pode se dar de forma direta ou indiretamente. A corrupção pode constituir, diretamente, uma violação de um direito humano quando um ato corrupto é usado deliberadamente como meio de violar um direito, ou quando o ato da autoridade impede que os indivíduos gozem desse direito ou deixam de agir de forma a garantir que os indivíduos possam gozar desse direito. Em outras situações, a corrupção é um fator essencial que contribui para uma cadeia de eventos que, eventualmente, leva à violação de um direito humano. Nesse caso, o direito é violado por um ato que decorre do ato corrupto e este último é condição necessária para a violação.
Nesse sentido, os organismos internacionais valem-se da abordagem de direitos humanos para o combate à corrupção em complementariedade à lei penal e administrativa, pugnando pela criminalização das condutas e o fim da impunidade. Analisando a evolução da legislação brasileira na contenda ao ato corrupto, no exercício da sanção penal ou do direito administrativo sancionador, verifica-se que tratou-se de uma resposta às pressões internacionais pelo cumprimento dos compromissos firmados pelo país, contudo os tribunais nacionais mostraram-se tímidos e restritivos na aplicação das normas, o que as destituiu de eficácia por um longo período.
3. Corrupção e as sequelas causadas nos Direitos Humanos em espécie
Evidenciou-se, ao longo do estudo, que a corrupção é causadora da violação de direitos humanos, seja de forma direta – quando o ato corrupto tem por finalidade violar um direito humano, ou de forma indireta – quando o ato tem finalidade diversa, mas atinge de forma reflexa um direito humano. A violação indireta está presente, muitas vezes, quando a corrupção atua como facilitadora para a prática de outro delito.
A título de exemplo, a corrupção no sistema de justiça, voltada a prejudicar determinada parte em um processo judicial, atinge diretamente o direito humano de ser ouvida por um juiz independente e imparcial (art. 8º, CADH; art. 14, PIDCP). Noutro giro, a corrupção no desvio de verbas públicas da saúde atinge, de forma reflexa, o direito humano à saúde (art. XI, DADDH; art. 12, PIDESC), uma vez que precariza o sistema público de saúde que, no caso do Brasil, sofre de escassez de recursos e alta demanda. É possível citar diversas formas como desenvolve-se essa relação de causa e efeito entre a corrupção e os direitos humanos.
O art. 1º do PIDCP prevê a todos os povos o direito à autodeterminação, de modo que possam determinar livremente seu estatuto político e assegurar livremente seu desenvolvimento econômico, social e cultural. Em um Estado permeado pela corrupção, não há segurança nas instituições públicas, tampouco confiança dos cidadãos, razão pela qual o direito à autodeterminação é violado ab initio.
Igualmente, a corrupção mina o direito à igualdade de tratamento e à não discriminação, uma vez que a vantagem remanesce, geralmente, com aquele que detém poder econômico ou influência política e atua em conluio com o agente público corruptor.
A Operação Lava Jato, em 2014, explicitou como a corrupção está imbricada no Brasil nos mais diversos setores, atingindo partidos políticos, parlamentares, empresas de construção civil e a Petrobras. Na ocasião, restou demonstrado como o poder econômico controla a política brasileira e, esta, imbuída da ausência de princípios de integridade, moralidade e legalidade, corrompe-se na medida em que os agentes políticos enriquecem ilicitamente. A Operação demonstrou o impacto da corrupção nas decisões políticas do país, passando-se pela compra de votos nas sessões de votação de projetos de leis por parlamentares, ao financiamento ilegal de campanhas, dentre outras medidas que minaram a democracia no país. Cite-se (MOHALLEM, 2015, p. 103):
Democracia e dinheiro coexistem sob tensão quando o assunto é campanha eleitoral. Ainda que a realização da democracia em contextos atuais dependa de vultosos recursos financeiros, seu uso excessivo ou desigual arrisca corroê-la. O princípio de que os indivíduos são igualmente partícipes do processo de construção da política depende de que suas capacidades de controle e influência sejam também equivalentes. Mas o acesso desigual a recursos financeiros durante a disputa eleitoral permite o surgimento de espaços privilegiados de acesso ao poder.
Conforme destacou Michael Freitas Mohallem (2015, p. 120):
Portanto, as eleições brasileiras nos últimos anos se caracterizaram por um forte desequilíbrio de aporte financeiro em campanhas ligadas aos grupos empresariais posteriormente investigados. Neste contexto, é razoável afirmar que algum grau de distorção dos resultados eleitorais deva ter ocorrido, o que nos permite estabelecer o elo direto entre a distribuição dos valores obtidos por meio da corrupção e a violação dos direitos políticos de cidadãos brasileiros.
O papel da Corte IDH no julgamento de casos contenciosos aumentou consideravelmente com o início do século XX, o que demonstra a importância da jurisdição interamericana nos Estados americanos e, principalmente, no combate à corrupção sob um viés de proteção dos direitos humanos.
O Caderno de Jurisprudência da Corte IDH nº 23 apresenta um compilado de casos contenciosos julgados pela Corte, em que é possível encontrar a correlação entre a corrupção e os direitos humanos ofendidos (Corte IDH, 2019).
O Caso "Instituto de Reeducación del Menor Vs. Paraguay” foi sentenciado em 2004 e a Corte condenou o Paraguai por incluir menores reeducandos em instituições sem as devidas condições para que os privados de liberdade possam desenvolver a sua vida de maneira digna, mantendo-os em condições desumanas e degradantes e expondo-os a um ambiente permeado por violência, abusos, promiscuidade e corrupção. Nesse caso, a corrupção é tida como um fator violador da integridade física, psíquica e moral dos menores detidos (art. 5º da CADH).
O Caso “Pueblo Indígena Kichwa de Sarayaku Vs. Ecuador”, sentenciado em 2012, condenou o Equador por não proceder à consulta da comunidade indígena para obter o seu consentimento prévio, livre e informado, com base na Convenção nº 189 da OIT, em razão dos impactos que determinado empreendimento causaria nas terras indígenas. Constatou-se que o Estado se omitiu e delegou à empresa o procedimento de consulta, vindo a obter o consentimento por meio do oferecimento de vantagens econômicas e meios fraudulentos.
Assim, a atuação omissiva do Estado favoreceu as práticas corruptas e violou o direito aos processos de consulta prévia aos povos indígenas (arts. 21 e 23 da CADH).
“Caso Carvajal Carvajal y otros Vs. Colombia” (sentença 2018), a Corte considerou a liberdade de expressão como pedra fundamental da sociedade democrática e enfatizou a necessidade de proteção dos jornalistas, assim como a devida apuração de homicídios cometidos contra eles. O caso remonta a um jornalista, que divulgava casos de corrupção e lavagem de dinheiro, assassinado e sem a devida persecução penal para identificar os autores do crime. Ressalta-se a necessidade de proteção das pessoas que denunciam atos de corrupção, bem como o fim da impunidade como proteção também do direito à liberdade de expressão.
Destacam-se outros casos que tratam da proteção de pessoas em risco por sua luta contra a corrupção (jornalistas, vítimas, defensores de direitos humanos, membros da justiça e de órgãos de persecução, dentre outros): “Caso Fleury y otros Vs. Haiti” (sentença 2011); “Caso Luna López Vs. Honduras” (sentença 2013); “Caso Gutiérrez y familia Vs. Argentina.” (sentença 2013); “Caso Defensor de Derechos Humanos y otros Vs. Guatemala.” (sentença 2014); “Caso Acosta y otros Vs. Nicaragua.” (sentença 2017);
“Caso Claude Reyes y otros Vs. Chile.” (sentença 2006), a Corte IDH considerou que o direito a buscar e a receber informações, protege o direito das pessoas em solicitarem o acesso à informação sob controle do Estado, salvo legítimas restrições. Esse entendimento é importantíssimo no combate à corrupção, uma vez que a transparência pública é meio de controle social.
Caso emblemático da Corte IDH, que analisa os impactos da corrupção nos direitos humanos, é o Caso Ramirez Escobar vs. Guatemala, razão pela qual será tratado em separado no tópico a seguir.
3.1 Caso Ramirez Escobar vs. Guatemala (adoção internacional)
A Corte Interamericana de Direitos Humanos manifestou-se sobre o tema, na maior parte das vezes, de forma lateral. Contudo, em 09 de março de 2018 a Corte IDH proferiu sentença no caso Ramírez Escobar y Otros vs. Guatemala reconhecendo que a violação do direito humano em análise decorreu também da corrupção, abordando o tema de forma aprofundada (Corte IDH, 2018).
O caso chegou à Corte IDH com a denúncia, datada de 1997, de que diversas irregularidades ocorreram nos procedimentos de adoção internacional na Guatemala. Segundo o contexto da notícia, teria ocorrido a separação dos irmãos Ramirez, enquanto crianças, de sua família biológica, sendo colocados em acolhimento institucional e, após, adotados por famílias norte-americana diferentes (Paiva; Heemann, 2020, p. 351).
A CIDH entendeu que todo o procedimento, desde o acolhimento à adoção, não respeitou as garantias substantivas e processuais mínimas da CADH, vindo a ser o caso submetido à Corte IDH em 2016.
A Corte proferiu a sentença em 2018 responsabilizando o Estado da Guatemala pela violação da proibição de interferências arbitrárias na vida familiar, das garantias judiciais e do direito à proteção da família, reconhecidos pelos artigos 8.1, 11.2 e 17.1 da CADH, em conjunto aos artigos 1.1 e 2, em prejuízo dos pais biológicos e do filho (apenas um participou do caso), assim como violou o art. 19 em relação a ele.
A sentença da Corte demonstra que, no início dos anos 90 até o final da primeira década dos anos 2000, as adoções internacionais representaram um negócio muito lucrativo para a Guatemala. O país encontrava-se em extrema pobreza, com altas taxas de natalidade e ausência de um controle e supervisão eficazes quanto aos procedimentos de adoção, favorecendo o comércio de venda de crianças. Verificou-se que o Estado privatizou o procedimento de adoção internacional, de modo que os agentes a quem se atribuiu a autorização foram responsáveis pela elevação massiva das adoções no período (parágrafos 61 a 71).
Prossegue, sustentando que as sérias irregularidades nos processos de adoção internacional foram favorecidas pela debilidade institucional e corrupção dos órgãos de controle, além de uma legislação flexível e adequada que facilitou a formação de redes e estruturas de delinquência organizadas dedicadas ao lucrativo negócio de venda das adoções internacionais (parágrafo 145).
A Corte ressaltou as consequências negativas da corrupção e os obstáculos que representa para o gozo efetivo dos direitos humanos, assim como o fato de que a corrupção das autoridades estatais e prestadores privados de serviços públicos afeta de uma maneira particular a grupos vulneráveis. Acrescentou que a corrupção não só afeta os direitos dos particulares individualmente afetados, como também repercute negativamente em toda a sociedade, na medida em que se quebra a confiança da população no governo e, com o tempo, na ordem democrática e no Estado de Direito.
Assim, reforçou as previsões da Convenção Interamericana contra a Corrupção diante da imprescindibilidade de combater todas as formas de corrupção no exercício das funções públicas, bem como recordou aos Estados o dever de adotar medidas para prevenir, sancionar e erradicar eficazmente a corrupção (parágrafos 241 e 242).
No caso em questão, é possível visualizar os efeitos nefastos que a corrupção pode alcançar, sendo certo que a rede de adoções internacionais arbitrárias na Guatemala, privando inúmeras crianças de seus familiares, só se tornou possível em razão da corrupção dos órgãos públicos de controle e fiscalização. Verifica-se que, nos termos da sentença da Corte IDH, muitos direitos humanos foram violados a partir do ato corrupto, citando-se: os direitos à identidade e ao nome do art. 18, o direito à integridade pessoal do art. 5, os direitos da vida familiar do art. 11.2, a garantia de proteção à família do art. 17.1, a proteção judicial do art. 25.1, as garantias judiciais do art. 8.1 e o acesso à justiça do art. 8, todos da CADH.
3.2 Tráfico de pessoas e contrabando de migrantes
Recentemente, as Câmaras Criminal (2CCR) e de Combate à Corrupção (5CCR), com a participação da Secretaria de Cooperação Internacional (SCI) e da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal (MPF) divulgaram orientação conjunta para nortear a atuação dos membros em casos de contrabando de migrantes e tráfico de pessoas, em quaisquer de suas modalidades: exploração sexual, laboral, adoção ilegal e tráfico de órgãos. O objetivo da orientação foi demonstrar a necessidade de melhor compreender a correlação entre aspectos de gênero e corrupção, em especial como tais práticas delitivas afetam mulheres e meninas de maneira diferenciada (MPF, 2021).
Como órgão de investigação e persecução penal, o MPF observou que os crimes de contrabando de migrantes e tráfico de seres humanos comumente estão relacionados com a corrupção de agentes públicos, que facilitam a consumação do delito em troca de vantagens ilícitas – que podem chegar a ser de cunho sexual com uso de ameaças ou extorsão. Assim, destacou-se que essa modalidade de corrupção acarreta vulnerabilidades particulares às partícipes do sexo feminino, especialmente no contexto de tráfico de pessoas para fins de exploração sexual.
Destaca-se da orientação conjunta importantes esclarecimentos:
“Apesar de um em cada cinco latino-americanos se identificar como vítima ou como conhecedor de alguém que tenha sido sexualmente extorquido por agente público, em troca de acesso a direitos ou serviços básicos, a corrupção como crime auxiliar do tráfico de pessoas e da prostituição internacional é prática ilícita estatisticamente subnotificada em âmbito interno. (...)
Em razão da elucidação da problemática em diversas regulamentações da comunidade internacional, pode-se reconhecer verdadeira importância e atualidade ao tema. A corrupção como facilitadora do tráfico de pessoas prejudica o desenvolvimento social e a igualdade de gênero na América Latina, por afetar predominantemente mulheres e meninas, tendo em vista a complexa perspectiva regional de sistêmico favorecimento do contrabando de migrantes entre as fronteiras que separam o Brasil de seus vizinhos, com especial atenção ao vínculo entre este crime, práticas de exploração sexual e escravidão moderna. (...)
No caso brasileiro, visando um diagnóstico nacional, em 2019, realizou-se pesquisa e levantamento de casos, em acompanhamento pelo MPF, com vínculos entre o tráfico de pessoas e a corrupção. O resultado, em síntese, revelou a inexistência de inquéritos, processos judiciais ou procedimentos extrajudiciais, que abarcassem ambas as práticas delitivas. Evidenciou-se, assim, uma incongruência do cenário brasileiro com as tendências criminosas identificadas pelos estudos a nível internacional, a qual constata a inviabilidade do tráfico humano, sem a influência, em algum grau, de corrupção de agentes públicos. A partir desses elementos, questiona-se sob qual ótica as autoridades brasileiras têm analisado a problemática, até o momento.”
Observou-se, assim, que no cenário da persecução penal brasileira inexistem investigações de corrupção de agentes públicos relacionadas ao crime de tráfico de pessoas, indicando uma discrepância com a situação constatada em toda a América Latina. Tal discrepância pode estar associada à dissociação dos delitos, de modo a punir o agente público apenas pelos delitos laterais, como a corrupção, a extorsão ou a ameaça; ou pode estar ligada ao fato do delito de extorsão previsto no Código Penal exigir a indevida “vantagem econômica”, não considerando a exigência de vantagens sexuais como enquadramento no tipo penal; ou pela corrupção dos agentes investigativos que se omitem, dentre outras possibilidades.
Ao final da Orientação Conjunta, o Ministério Público Federal faz as seguintes sugestões:
Assim, a título de Orientação Conjunta aos Procuradores da República que atuam em casos de contrabando de migrantes e tráfico de pessoas, em quaisquer de suas modalidades – para fins de exploração sexual, laboral, adoção ilegal e tráfico de órgãos, sugere-se:
(1) que, a despeito de não existir um tipo penal específico para a figura conhecida no direito comparado como “sextorsão”, que os procuradores considerem a possibilidade de enquadrar as condutas de solicitar, exigir, dar, oferecer, receber ou prometer favorecimento sexual como crimes de peculato eletrônico, concussão, corrupção ativa e passiva, corrupção de testemunha, todos do Código Penal comum (artigos 313-A, 316, 317, 333 e 343), ou delito de extorsão mediante sequestro (artigo 159), do Código Penal comum, além dos crimes equivalentes do Código Penal Militar (artigos 308, 309 e 347), considerando a respectiva paga sexual nas expressões “vantagem indevida” e “qualquer vantagem” previstas nesses tipos penais, sem prejuízo dos crimes sexuais ou contra a liberdade sexual eventualmente incidentes;
(2) que as investigações e persecuções sobre os fatos envolvendo os crimes de contrabando de migrantes e tráfico de seres humanos trabalhem sempre com a possibilidade de favorecimentos ilícitos com práticas corruptas de agentes públicos como contrapartida, de modo a formalizar o trato institucional com relação às associações entre esses tipos penais;
Por sua vez, a corrupção sistêmica que assola diversos países é tida como facilitadora do tráfico internacional de pessoas, sendo regularmente observada nos países da América Latina. Segundo artigo publicado no jornal El Pais, os agentes públicos envolvidos corrompem-se de diversas formas, podendo se dar pela violação do sigilo de investigações relacionadas aos criminosos de fronteiras, na omissão no seu dever de vigilância, na integração da própria organização criminosa ou ainda na efetiva falsificação de documentos migratórios.
“Siendo la corrupción un factor crucial en la trata de personas, su relevancia contrasta con la escasa efectividad en su persecución”. Em outras palavras, a corrupção ao sustentar o delito de tráfico de pessoas ostenta grande relevância, especialmente pela gravidade de tal crime transfronteiriço, contudo a sua relevância contrasta nitidamente com a escassa e ineficaz persecução penal que lhe é direcionada (El País, 2020).
É possível citar outros organismos que lutam contra a corrupção no contexto do tráfico de pessoas, como a EUROsociAL+ - programa de cooperação entre a União Europeia e a América Latina financiado pela União Europeia, a Rede contra a Corrupção e a Rede contra o Tráfico de Pessoas e o Tráfico Ilícito de Migrantes, ambas da Associação Ibero-Americana de Ministérios Públicos (AIAMP). As três instituições reuniram-se para elaborar a Declaração Conjunta para impulsionar o combate à corrupção facilitadora do tráfico de mulheres e meninas por razão do Dia Mundial contra o Tráfico de Pessoas, em 20 de julho de 2020.
Extrai-se da declaração trecho que instrui a forma como a corrupção age no tráfico de pessoas:
La corrupción asociada a la trata se puede manifestar a lo largo de la cadena de producción criminal, pero también los sistemas de impartición de justicia o protección de víctimas. La corrupción pública puede ocurrir desde cobros periódicos de dinero o favores sexuales, por funcionarios que omiten sus deberes de vigilancia o dan aviso de actuaciones investigativas o de inspección, hasta situaciones donde son los propios funcionarios quienes controlan el negocio ilícito o son miembros de la red. Se presenta la corrupción mediante conductas como: a) pasividad, encubrimiento, obstaculización o connivencia de funcionarios (policías, jueces, fiscales, funcionarios municipales, etcétera); b) amenazas a víctimas y testigos; c) aviso a las redes de trata de operativos de intervención y otras actuaciones judiciales; d) inactividad judicial e impunidad; e) otorgamiento de licencias municipales para el funcionamiento de locales ilegales; f) falsedad documental (por ejemplo, en permisos de residencia para víctimas y documentos de identidad de menores); g) paso seguro a tratantes y sus víctimas en pasos migratorios; h) entrada de redes de prostitución a locales penitenciarios; i) actas y testigos falsos en procesos judiciales.[2]
O documento conclui pela necessidade de fortalecimento das medidas anticorrupção no contexto da elaboração de estratégias de prevenção e de persecução penal ao tráfico de pessoas. Recomenda-se a busca por um maior conhecimento sobre a forma como a corrupção facilitadora se desenvolve, estabelecer uma maior cooperação interna e internacional, superar impedimentos internos de investigação para a detecção e prova do componente corruptivo, bem como tipificar as manifestações de corrupção mediante vantagem sexual.
O Escritório das Nações Unidas contra as Drogas e o Crime elaborou ainda em 2011 o Documento Temático intitulado de “O Papel da Corrupção no Tráfico de Pessoas”, o que demonstra a demora, especialmente do Brasil, em dar atenção ao tema e buscar medidas mais eficazes de combate, inclusive tipificando a modalidade de corrupção e delitos afins consumados por meio de vantagens sexuais.
A UNDOC (2011) apresentou as seguintes recomendações:
a) transversalização dos enfoques, no sentido de aplicar estratégias e medidas anticorrupção ao processamento do tráfico de pessoas, vice-versa;
b) conexão de atores relevantes, ou seja, buscar esclarecer quais atores e agentes estão identificando os vínculos entre a corrupção e a o tráfico de pessoas, a fim de compartilhar experiências e recursos sobre o tema específico;
c) identificação dos setores públicos vulneráveis, visando aplicar medidas de combate à corrupção de funcionários direcionadas;
d) conscientização e capacitação de funcionários relevantes no âmbito da corrupção e tráfico de pessoas;
e) garantir a transparência de rendimento;
f) desenvolver e implementar códigos de conduta para agentes atuantes na temática;
g) estabelecer mecanismos de controle;
h) aplicar respostas disciplinares e judiciais aos funcionários corrompidos;
i) cooperação entre agentes no combate à corrupção e na luta contra o tráfico de pessoas;
j) melhora na compilação de dados do país, desenvolvendo análises internas de como se dá a corrupção dos funcionários públicos;
k) melhora na proteção das vítimas que denunciam atos de corrupção;
l) envolvimento da sociedade civil e do setor privado na luta;
m) implementação de incentivos e medidas de proteção;
n) desenvolvimento de estratégias conjuntas para o combate à corrupção e ao tráfico de pessoas.
4. Conclusões
Se por um tempo ignorou-se a conexão existente entre a corrupção e os direitos humanos, essa não é mais a realidade atual. A interseção fica mais evidente a medida em que aumenta-se a conscientização da corrupção enquanto causadora da violação de direitos humanos, de forma direta ou de forma indireta como facilitadora de outros delitos.
Os sistemas internacionais e organismos internacionais, assim como algumas instituições nacionais, já envidam esforços para combater a corrupção sob o viés da proteção dos direitos humanos. Com o passar dos anos ficou claro que a corrupção é fator impeditivo do desenvolvimento econômico e social dos países, contaminando a democracia e colocando em risco a confiabilidade do povo no Estado de Direito. Para além dos efeitos deletérios no regime político e democrático, a corrupção evidenciou uma série de violações de direitos humanos que atingem individualmente os seres humanos, como no caso de mulheres e meninas vítimas de tráfico de pessoas e o “Caso Ramirez Escobar” que denunciou um esquema de corrupção para a venda de crianças na Guatemala.
A análise do nexo entre a corrupção e os direitos humanos ganha relevância quando nos referimos ao Brasil, uma vez que ostenta posição desanimadora no ranking da percepção de corrupção realizado anualmente pela Transparency International Organization e é palco, constantemente, de escândalos de corrupção. Desde grandes operações, como a Lava Jato que denunciou a corrupção enquanto ela corroía a democracia, aos desvios de verbas da saúde no contexto da pandemia do Covid-19, deixando inúmeros brasileiros desamparados.
A situação desanimadora do Brasil contrasta com o elevado número de normas jurídicas que visa punir os atos corruptos – no chamado microssistema da tutela da probidade, assim como com os tratados internacionais existentes na temática e já internalizados pelo país. Conclui-se que a existência de robusto arcabouço jurídico, nacional e internacional, não é suficiente para garantir o combate à corrupção e proteger devidamente os direitos humanos. A lei não funciona sozinha, é preciso tornar as instituições fiscalizatórias, investigativas, persecutórias e judiciais mais fortes e preparadas para a política anticorrupção, seja para atuarem em consonância com a legislação e contribuírem com a luta, seja para manterem-se íntegros e incorruptíveis.
Os sistemas internacionais de proteção de direitos humanos têm se especializado cada vez mais na temática da corrupção, reconhecendo as sequelas que a conduta provoca nos direitos humanos. Ficou claro que, diante da interseção entre a corrupção e os direitos humanos, os tratados internacionais devem ser relidos à luz dessa relação, identificando-se um sistema anticorrupção mesmo nos documentos que sequer a mencionam, como no caso dos compromissos da Carta Internacional de Direitos Humanos da ONU e dos documentos fundantes do Sistema Interamericano (Carta da OEA, DADDH e CADH).
Ademais, os sistemas de proteção aos direitos humanos mostram-se avançados no estudo da corrupção como violadora dos direitos humanos, destacando-se a atuação da CIDH, dos Comitês do PIDESC e PIDCP, assim como da UNODC, no desenvolvimento de relatórios acerca da corrupção e dos direitos humanos, buscando medidas eficazes e apresentando recomendações aos Estados. No mesmo sentido, ressalta-se sentença julgada recentemente pela Corte IDH (Caso Ramirez Escobar vs. Guatemala), que abordou diretamente as implicações da corrupção nos direitos humanos.
Por tudo o que se disse no presente estudo, concluo que a proteção aos direitos humanos e as medidas anticorrupção concretizam interesses harmônicos entre si, criando-se a necessidade de serem pautadas conjuntamente para ampliar a eficácia de ambas. Para além dos estudos das sequelas da corrupção, e respectivas medidas de combate, que precisam ser regionalizados, respeitando as características de cada país e de cada unidade federativa incluída, é imprescindível o investimento na conscientização e na educação dos funcionários públicos para as consequências nefastas que os atos de corrupção provocam.
O ensino da probidade, dos valores e princípios éticos, sob um viés consequencialista, deve vir acompanhado do treinamento de todos os funcionários públicos, reservando-se um acompanhamento especial aos funcionários mais expostos à modalidade de corrupção que provoque grave violação a direitos humanos, como é o caso daqueles que situam-se em fronteiras com denúncias de tráfico de pessoas. Como disse Montesquieu, a corrupção dos governantes quase sempre começa com a corrupção dos seus princípios.
Ainda que as leis se tornem mais rigorosas, ainda que os órgãos de investigação, o Ministério Público e o Poder Judiciário recrudesçam as suas respectivas atuações, a corrupção só será consideravelmente reduzida quando for realmente compreendida como uma violação pelos funcionários públicos. Não se dispensa, por isso, que tais medidas sejam necessárias para atenuar os casos de corrupção, contudo se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda (FREIRE, 2000, p. 67).
Referências
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[1] A exemplo do caso "Mensalão" apurado na Ação Penal nº 470 perante o Supremo Tribunal Federal, que levou à condenação de 25 réus por delitos como corrupção ativa e passiva, dentre outros correlacionados.
[2] Tradução livre: “A corrupção associada ao tráfico pode se manifestar em toda a cadeia produtiva do crime, mas também nos sistemas de administração da justiça ou proteção das vítimas. A corrupção pública pode ocorrer desde a cobrança periódica de dinheiro ou favores sexuais, por funcionários que omitem suas funções de vigilância ou notificam ações de investigação ou fiscalização, até situações em que são os próprios funcionários que controlam os negócios ilícitos ou são membros da rede. A corrupção ocorre por meio de comportamentos como: a) passividade, encobrimento, obstrução ou conluio de funcionários (polícia, juízes, promotores, funcionários municipais etc.); b) ameaças a vítimas e testemunhas; c) comunicação às redes de tráfico de operações de intervenção e outras ações judiciais; d) inatividade judicial e impunidade; e) concessão de licenças municipais para exploração de estabelecimentos ilegais; f) documentação falsa (por exemplo, em autorizações de residência para vítimas e documentos de identidade para menores); g) passagem segura para traficantes e suas vítimas nas etapas de imigração; h) entrada de redes de prostituição em estabelecimentos prisionais; i) falsos registos e testemunhas em processos judiciais.”
Assessora jurídica no Ministério Público Federal. Especialista em Direitos Humanos pelo CEI/FACICA. Bacharela em Direito pela Universidade Federal de Viçosa (UFV).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GOMES, Marcelle Pestana. Os reflexos da corrupção nos Direitos Humanos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 jul 2022, 04:39. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos /58896/os-reflexos-da-corrupo-nos-direitos-humanos. Acesso em: 29 dez 2024.
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