Resumo: Este artigo tem como objetivo analisar a contratação direta nas Estatais, com ênfase na inexigibilidade de licitação, abordando os fundamentos legais e constitucionais que sustentam essa exceção à regra geral das licitações, com destaque para a Lei nº 13.303/2016, conhecida como Lei das Estatais. A pesquisa examina os requisitos e as condições para a aplicação da inexigibilidade de licitação, principalmente em contratações de serviços técnicos especializados, considerando os princípios da legalidade, moralidade, eficiência e transparência. A partir de uma revisão da doutrina especializada e da jurisprudência dos tribunais superiores, como o STF e o TCU, o estudo busca fornecer diretrizes claras sobre a utilização dessa medida excepcional, destacando as implicações jurídicas e práticas para a administração pública. Utilizando o método jurídico-compreensivo, a pesquisa visa refletir sobre os riscos da utilização indevida dessa ferramenta e a necessidade de justificar a contratação direta de maneira robusta, alinhada aos princípios constitucionais da administração pública.
Palavras-chave: Licitação. Lei das Estatais. Inexigibilidade. Contratação Direta.
Abstract: The main characteristic of this article is to address direct contracting within the scope of State-owned companies, in particular, the non-requirement for bidding in the event of specialized technical services. For that, some aspects applicable to the species will be treated, such as, concepts, principles, and Laws 8.666 / 1993 and 13.303 / 2016 (State Law). In addition, a jurisprudential and doctrinal analysis on the subject will be carried out in order to provide the necessary guidelines for verifying the requirements for the framework of direct contracting by specialized technical service by public companies and mixed-capital companies.
Keywords: Bidding. State Law. Unenforceability. Direct Contracting. Specialized.
Sumário: Introdução. 1. Do Dever de Licitar nas Empresas Estatais e suas Exceções: Análise das Hipóteses de Dispensa e Inexigibilidade. 2. A Inexigibilidade para Serviços Técnicos Especializados na Lei 13.303/2016. 3. Breve reflexão sobre a possibilidade de aplicação da nova lei de licitações às empresas estatais. Conclusão. Referências.
Introdução
Este artigo tem como objetivo analisar o enquadramento da contratação direta de serviços técnicos especializados pelas empresas públicas e sociedades de economia mista, com foco na inexigibilidade de licitação, uma vez que se trata de uma exceção ao princípio da obrigatoriedade de licitação no setor público. Utilizando o método jurídico-compreensivo, a pesquisa se baseará na análise dos marcos regulatórios, legislações e doutrinas pertinentes, com a finalidade de compreender o significado e alcance dessa prática no contexto jurídico e fático.
Serão abordados os conceitos fundamentais e os aspectos relacionados à contratação direta pelas Estatais, analisando as normativas existentes, as jurisprudências e doutrinas relevantes para a área, com o intuito de identificar os requisitos necessários para a aplicação da inexigibilidade de licitação em casos de serviços técnicos especializados.
Além disso, o estudo buscará apresentar uma visão crítica e detalhada das condições em que as Estatais podem, legalmente, realizar tais contratações, distinguindo os limites e as possibilidades legais, a fim de garantir a conformidade com os princípios que regem a administração pública, como a eficiência, a legalidade e a transparência. Dessa forma, o presente trabalho visa proporcionar uma maior clareza e segurança jurídica sobre as hipóteses em que a contratação direta por inexigibilidade de licitação é permitida, oferecendo subsídios importantes para a correta aplicação dessa modalidade nas Estatais, conforme será detalhado nos tópicos subsequentes.
1.Do Dever de Licitar nas Empresas Estatais e suas Exceções: Análise das Hipóteses de Dispensa e Inexigibilidade
A licitação é um princípio essencial do direito administrativo, estabelecido no artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal de 1988, com o intuito de garantir a eficiência, a transparência, a isonomia e a legalidade nas contratações públicas. Por meio desse instituto, busca-se assegurar que a Administração Pública contrate da melhor maneira possível, atendendo ao interesse público e utilizando de forma eficiente os recursos públicos. No entanto, como qualquer princípio jurídico, a obrigatoriedade da licitação não é absoluta, e o próprio ordenamento jurídico prevê hipóteses excepcionais em que a licitação pode ser dispensada ou considerada inexigível. Tais exceções têm como objetivo permitir que a contratação seja adequadamente ajustada ao interesse público, levando em consideração a natureza do objeto da contratação ou as circunstâncias que tornam o procedimento licitatório inviável ou desnecessário.
No contexto das Estatais, como as empresas públicas e sociedades de economia mista, a Lei nº 13.303/2016 (Lei das Estatais) introduz um regime jurídico próprio para essas entidades, reconhecendo suas peculiaridades e necessidades. Diferentemente da Administração Pública direta, as Estatais desempenham atividades econômicas, frequentemente em setores concorrenciais, e, portanto, necessitam de regras mais flexíveis e ajustadas à sua dinâmica de mercado. No entanto, a Lei das Estatais não afasta a obrigatoriedade da licitação, mas concede maior flexibilidade, permitindo a contratação direta em determinadas circunstâncias, com a devida justificação e observância dos princípios constitucionais.
A Lei nº 13.303/2016, especificamente em seu artigo 30, delineia as hipóteses de dispensa de licitação para as Estatais, de forma análoga àquelas previstas na Lei nº 8.666/1993. Tais hipóteses visam garantir a celeridade e a simplificação nas contratações, especialmente em situações de baixo valor ou em casos de emergência ou calamidade pública, onde o procedimento licitatório poderia prejudicar a continuidade de serviços essenciais. A legislação também prevê a dispensa para a contratação de serviços de natureza singular, que exigem conhecimento especializado e único, como é o caso da inexigibilidade de licitação.
A inexigibilidade de licitação ocorre quando a Administração Pública, embora tenha a possibilidade de realizar uma licitação, opta pela contratação direta devido à impossibilidade de competição. Essa impossibilidade de competição refere-se à inexistência de fornecedores ou prestadores de serviços que atendam às especificidades do objeto a ser contratado. A inexigibilidade, portanto, é uma medida excepcional, aplicada a situações onde não há condições de realizar uma licitação competitiva, como no caso de serviços técnicos especializados, que exigem um alto grau de especialização, ou de exclusividade, como em serviços médicos especializados ou consultorias técnicas.
Nas Estatais, a inexigibilidade de licitação também deve ser devidamente justificada, comprovando a singularidade do serviço e a impossibilidade de competição. O artigo 30 da Lei nº 13.303/2016 estabelece que as empresas públicas e sociedades de economia mista podem contratar diretamente profissionais ou empresas com notória especialização, desde que fundamentada a necessidade de dispensa de licitação. Isso é particularmente relevante em setores como saúde, onde a contratação de serviços médicos especializados, a exemplo daqueles contratados pela Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares), que gerencia hospitais universitários, exige a escolha de profissionais ou empresas com expertise e conhecimento técnico específico para a realização de determinados serviços.
A doutrina administrativa é unânime em afirmar que as exceções à obrigatoriedade de licitação devem ser aplicadas com cautela e rigor, pois, se não forem corretamente fundamentadas, podem violar os princípios constitucionais da isonomia, da moralidade e da eficiência. Segundo José dos Santos Carvalho Filho, em sua obra Manual de Direito Administrativo, embora a licitação seja o instrumento preferencial de contratação, as exceções a esse princípio devem ser estritamente fundamentadas e documentadas. A Administração Pública, em especial nas Estatais, deve ser transparente ao justificar a adoção das hipóteses de dispensa ou inexigibilidade, de modo a garantir a efetividade no uso dos recursos públicos e a observância dos princípios constitucionais que norteiam a Administração Pública.
No campo da jurisprudência, o Tribunal de Contas da União (TCU) tem reforçado a exigência de uma justificativa robusta e clara nas contratações realizadas sem licitação. Em diversos acórdãos, o TCU tem afirmado que as Estatais devem demonstrar a singularidade do serviço contratado e a impossibilidade de competição, a fim de garantir que a contratação direta esteja em conformidade com o interesse público. O Acórdão nº 1.596/2019 é um exemplo disso, em que o TCU determinou que a contratação de serviços médicos e de consultoria sem licitação deveria ser devidamente justificada, com a apresentação de documentos que comprovassem a especialização e a exclusividade do contratado.
Adicionalmente, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem reafirmado, em diversas decisões, que a licitação deve ser dispensada apenas quando efetivamente justificada, de acordo com a natureza do objeto ou a inviabilidade de competição. Em uma decisão recente na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.934, o STF reiterou que as exceções à licitação devem ser bem fundamentadas e comprovadas, garantindo que a Administração Pública demonstre a singularidade do serviço ou a impossibilidade de competição para que a contratação direta seja válida e legal.
Portanto, as exceções à obrigatoriedade de licitação nas Estatais, embora previstas na legislação, devem ser analisadas com extrema cautela. A aplicação dessas exceções precisa ser fundamentada de maneira objetiva e clara, sempre com o respaldo de uma justificativa técnica e jurídica que demonstre a real necessidade da contratação direta. A fiscalização rigorosa e o controle sobre esses processos são essenciais para evitar abusos e garantir que o interesse público seja respeitado. Além disso, a necessidade de comprovação da singularidade do serviço e da exclusividade do fornecedor, conforme estabelece a doutrina e a jurisprudência, deve ser o fundamento central para a adoção das hipóteses de dispensa e inexigibilidade de licitação, assegurando a transparência, a isonomia e a eficiência em todos os atos administrativos das Estatais.
Assim, a aplicação responsável das hipóteses de dispensa e inexigibilidade de licitação nas Estatais deve ser orientada pelos princípios constitucionais e pela legislação vigente, garantindo que a Administração Pública atue com eficiência, legalidade e respeito ao interesse público, especialmente em setores tão estratégicos e sensíveis, como saúde e serviços essenciais.
2.A Inexigibilidade para Serviços Técnicos Especializados na Lei 13.303/2016
A inexigibilidade de licitação é uma das exceções mais relevantes ao princípio da obrigatoriedade da licitação, que é um dos pilares do direito administrativo brasileiro, conforme estabelecido no artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal de 1988. Ela permite à Administração Pública realizar contratações diretas, sem a necessidade de um processo licitatório, quando a competição é inviável. A impossibilidade de competição pode ocorrer em razão da natureza do objeto a ser contratado ou das circunstâncias específicas do processo. Neste contexto, a Lei nº 13.303/2016, conhecida como a Lei das Estatais, trouxe um regime jurídico próprio para as empresas públicas e sociedades de economia mista, que são caracterizadas por suas atividades econômicas e necessidades específicas, proporcionando uma regulamentação mais flexível, mas ainda com a necessidade de observância dos princípios da Administração Pública.
A inexigibilidade de licitação por serviço técnico especializado é uma das exceções previstas na Lei das Estatais, que tem como objetivo garantir a celeridade e a eficiência nas contratações dessas entidades, sem abrir mão dos princípios constitucionais da legalidade, moralidade, eficiência e transparência. O artigo 30 da Lei nº 13.303/2016 é o dispositivo que regulamenta essa possibilidade, permitindo que as Estatais possam contratar diretamente quando se tratar de serviço técnico especializado, desde que comprovada a inviabilidade da competição, isto é, a impossibilidade de se realizar um processo licitatório devido à natureza do serviço a ser contratado. A contratação direta, por inexigibilidade de licitação, é, portanto, uma medida excepcional e deve ser rigorosamente justificada.
A impossibilidade de competição, no caso de serviços técnicos especializados, refere-se à falta de fornecedores qualificados ou especializados no mercado que possam oferecer o serviço demandado pela Administração Pública. Tais serviços são geralmente de caráter único ou exigem um conhecimento tão específico que tornam inviável a competição. Exemplos típicos de serviços técnicos especializados incluem consultorias, auditorias, assessorias jurídicas e serviços de engenharia de alta complexidade. A natureza desses serviços é tal que há uma escassez de profissionais ou empresas capacitadas para atendê-los, sendo que a especialização demandada não pode ser facilmente encontrada no mercado competitivo.
No entanto, é importante destacar que a simples alegação da especialização ou da impossibilidade de competição não é suficiente para justificar a inexigibilidade de licitação. A Administração Pública deve apresentar uma justificativa técnica robusta que demonstre, de maneira clara e objetiva, a singularidade do serviço e a impossibilidade de competição no mercado. De acordo com a doutrina de José dos Santos Carvalho Filho (2020), a inexigibilidade de licitação não pode ser vista como uma facilidade para a Administração, mas sim como uma exceção legítima, que deve ser aplicada com rigor. Ele destaca que a Administração precisa demonstrar, com fundamentos técnicos e jurídicos adequados, que a escolha do prestador de serviços é a única opção viável para atender ao interesse público.
A jurisprudência dos tribunais superiores também reforça essa ideia de que a inexigibilidade de licitação deve ser uma exceção, e não regra. O Tribunal de Contas da União (TCU) tem se posicionado de forma clara ao exigir que a Administração Pública, em especial as Estatais, apresente documentos que comprovem a impossibilidade de competição. Em acórdãos recentes, como o Acórdão nº 1.596/2019, o TCU determinou que as Estatais comprovem a especialização do contratado e a ausência de alternativas no mercado. No caso de serviços médicos e de consultoria, por exemplo, o TCU indicou que a Administração deve apresentar uma análise detalhada da falta de fornecedores qualificados e demonstrar a exclusividade do contratado.
Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal (STF), em diversas decisões, tem reafirmado que as exceções à licitação precisam ser objetivas, fundamentadas e bem documentadas, de modo a não violar os princípios constitucionais da Administração Pública. Em decisões como a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.934, o STF destacou a necessidade de comprovação da singularidade do serviço e da inviabilidade de competição, reforçando que, quando a Administração decide dispensar a licitação, deve fazê-lo com base em uma análise criteriosa das circunstâncias do caso. O STF tem frisado que qualquer decisão que envolva a inexigibilidade de licitação deve ser sustentada por razões transparentes e documentadas, de modo a preservar a moralidade, a eficiência e a transparência nos atos administrativos.
A Lei nº 13.303/2016, ao regulamentar as contratações nas Estatais, busca equilibrar a flexibilidade necessária para que essas entidades possam operar de maneira eficaz no mercado, com a necessidade de observar os princípios constitucionais que regem a Administração Pública. A contratação direta por inexigibilidade de licitação, portanto, é uma possibilidade, mas deve ser restrita a situações em que não há outra alternativa viável. A exigência de justificativa formal e fundamentada, como previsto no artigo 30 da referida lei, busca evitar que essa medida excepcional seja utilizada de forma inadequada ou em situações onde a competição seria possível.
Além disso, a Lei das Estatais também busca garantir a transparência nas contratações, com a devida motivação e justificativa por parte da Administração Pública. A contratação de serviços técnicos especializados sem licitação deve ser acompanhada de documentação detalhada que comprove a singularidade do serviço e a impossibilidade de competição. Essa medida visa assegurar que as Estatais não utilizem a exceção da inexigibilidade para fraudar o processo licitatório e burlar os princípios da isonomia, publicidade e eficiência.
A aplicação da inexigibilidade de licitação por serviço técnico especializado é, portanto, um instrumento legítimo, necessário em determinadas situações, mas que exige um rigoroso controle. A Administração Pública, ao aplicar esse instituto, deve garantir que a contratação direta seja uma exceção justificada por razões técnicas e objetivas, que atendam ao interesse público e à transparência dos atos administrativos. A flexibilização das regras de licitação não pode ser entendida como uma brecha para o desrespeito aos princípios da legalidade e da moralidade, devendo ser utilizada apenas em casos em que a inviabilidade de competição seja efetivamente comprovada.
Portanto, a inexigibilidade de licitação por serviço técnico especializado, embora seja uma ferramenta legítima e útil para a Administração Pública, deve ser utilizada com parcimônia e responsabilidade. O cumprimento das exigências legais, a justificativa adequada e a comprovação da singularidade do serviço são elementos fundamentais para garantir que a contratação direta não se torne uma prática comum, mas, sim, uma exceção bem fundamentada e transparente. Ao adotar tais práticas, as Estatais não só asseguram a conformidade com a legislação, mas também contribuem para a manutenção da eficiência, moralidade e transparência na gestão pública, promovendo o real atendimento ao interesse público.
3.Breve reflexão sobre a possibilidade de aplicação da nova lei de licitações às empresas estatais
A aplicação da nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021) às empresas estatais é um tema que exige um exame aprofundado das implicações práticas e jurídicas, considerando as particularidades dessas entidades, que operam sob um regime jurídico híbrido, misturando aspectos da administração pública direta e de empresas privadas. A Lei nº 13.303/2016, a chamada Lei das Estatais, já define um conjunto de normas e procedimentos que visam garantir a eficiência, transparência e a adequação das contratações nas empresas públicas e sociedades de economia mista. Por outro lado, a Lei nº 14.133/2021 busca uniformizar as normas de licitação para toda a Administração Pública, incluindo as Estatais, trazendo um novo marco legal que, em alguns pontos, pode ser mais rígido e detalhado. Assim, é necessário ponderar os benefícios e desafios que a aplicação da nova lei pode gerar para o regime das estatais.
Primeiramente, vale destacar que as empresas estatais, ao contrário da administração pública direta, operam em mercados econômicos e muitas vezes enfrentam concorrência no setor privado. Elas têm como objetivo principal a prestação de serviços públicos essenciais, mas em um ambiente que exige agilidade, competitividade e uma gestão eficiente, que nem sempre se alinha com as formalidades tradicionais da licitação pública. A Lei nº 13.303/2016 já foi construída justamente para proporcionar uma flexibilidade maior nas contratações dessas entidades, o que inclui normas específicas sobre as hipóteses de dispensa e inexigibilidade de licitação. Esse regime jurídico oferece às estatais a possibilidade de contratar diretamente em situações excepcionais, como a necessidade de adquirir serviços técnicos especializados, ou quando o valor da contratação for pequeno. Essas exceções são cruciais para garantir que as empresas públicas possam operar de forma eficiente, sem estarem excessivamente atreladas aos processos licitatórios tradicionais, que podem ser morosos e onerosos.
Por outro lado, a Lei nº 14.133/2021, embora tenha o intuito de modernizar a legislação de licitações, introduz uma série de novos requisitos e procedimentos que podem entrar em conflito com a flexibilidade desejada pelas estatais. Por exemplo, a nova lei impõe maiores exigências em relação à justificativa das contratações diretas e à elaboração de relatórios detalhados sobre a escolha do fornecedor, que pode ser visto como um aumento da burocracia. Isso pode tornar mais difíceis algumas contratações necessárias para a continuidade de serviços essenciais, especialmente quando se trata de serviços técnicos altamente especializados, como no caso das consultorias jurídicas e auditorias.
A Lei das Estatais, com seu foco em agilidade e especificidade, permite que essas entidades contratem diretamente, desde que justifiquem a singularidade do serviço e a inexistência de competição, algo que pode ser mais simples e célere do que os procedimentos exigidos pela Lei nº 14.133/2021.
Além disso, a integração da nova lei com a Lei nº 13.303/2016 pode resultar em um quadro normativo confuso, gerando insegurança jurídica nas estatais sobre qual conjunto de normas deve prevalecer em determinadas situações. Por exemplo, a nova Lei de Licitações impõe regras mais rigorosas sobre a inexigibilidade de licitação, prevendo critérios mais detalhados e exigindo um controle maior sobre os processos, o que pode se sobrepor à flexibilidade já garantida pela Lei das Estatais.
A Lei nº 13.303/2016, ao permitir uma maior margem de flexibilidade nas contratações de serviços especializados, tem como objetivo permitir que as estatais respondam de forma rápida e eficiente às necessidades do serviço público. Nesse sentido, a imposição de regras mais rígidas poderia interferir negativamente na celeridade das operações dessas empresas, especialmente quando se lida com situações de urgência ou serviços de especialização altamente específica, onde a concorrência simplesmente não é uma opção.
Em termos de controle e transparência, é evidente que as estatais devem continuar a atuar com responsabilidade e ética. O princípio da transparência deve ser rigorosamente mantido, independentemente do regime jurídico aplicável. A Lei nº 13.303/2016 já exige da administração das estatais um controle interno eficiente e a publicação detalhada das contratações realizadas, assegurando a correta aplicação dos recursos públicos. Contudo, é necessário que qualquer tentativa de aplicação da Lei nº 14.133/2021 a essas entidades seja feita com cautela, para não prejudicar a eficiência dos processos de contratação ou engessar a capacidade das estatais de atuar rapidamente em setores essenciais.
Portanto, a reflexão sobre a aplicação da nova Lei de Licitações às empresas estatais revela um dilema entre a busca por maior uniformidade no sistema de licitações públicas e a necessidade de garantir que as estatais possam continuar a operar de maneira eficiente e ágil. Embora a modernização e uniformização das regras traga benefícios gerais para a Administração Pública, é fundamental que as especificidades das estatais sejam preservadas. As particularidades dessas entidades, que frequentemente atuam em setores econômicos complexos e de interesse público estratégico, exigem uma flexibilidade que pode ser comprometida pela adoção rígida de normas gerais. Assim, é essencial que as normas específicas da Lei nº 13.303/2016, que já contemplam as necessidades das estatais, sejam respeitadas, e que as adaptações da nova Lei de Licitações sejam realizadas de maneira cuidadosa, para que não se perca a agilidade e a eficácia na execução dos serviços públicos.
Conclusão
A obrigatoriedade da licitação nas Estatais, embora flexibilizada pela Lei nº 13.303/2016, continua sendo um princípio essencial para garantir a legalidade, a moralidade e a transparência nas contratações públicas. As exceções, como a dispensa e a inexigibilidade de licitação, devem ser aplicadas de maneira restrita e cuidadosamente fundamentada. O uso dessas medidas excepcionais não pode ser visto como uma forma de contornar o processo licitatório, mas sim como uma resposta necessária e justificada a circunstâncias que realmente tornam a competição inviável ou desnecessária. A fundamentação técnica e jurídica é, portanto, imprescindível para assegurar que a aplicação da inexigibilidade e da dispensa esteja em consonância com os princípios constitucionais da Administração Pública, como a isonomia, a moralidade e a eficiência.
No caso das Estatais, a necessidade de contratar serviços técnicos especializados ou de natureza singular torna essas exceções mais frequentes, mas não menos passíveis de controle. A Lei nº 13.303/2016 permite que as empresas públicas e sociedades de economia mista contratem diretamente quando a especialização do serviço demandado seja tal que a competição no mercado se mostre impraticável. Porém, a contratação direta, mesmo em casos excepcionais, não deve ser feita de forma indiscriminada. É fundamental que a Administração Pública comprove, de maneira clara e objetiva, que a singularidade do serviço é comprovada e que a escolha do prestador de serviços é a única solução viável para atender ao interesse público, sem que se prejudique a moralidade e a transparência.
A transparência, nesse contexto, é um dos pilares mais importantes para garantir que as exceções à obrigatoriedade da licitação não sejam usadas de maneira indevida ou como justificativa para favorecimentos. A justificativa para a contratação direta deve ser sólida e bem documentada, permitindo o acompanhamento, o controle e a fiscalização pelos órgãos competentes, como o Tribunal de Contas da União (TCU) e o próprio Poder Judiciário. O princípio da publicidade, que deve nortear todos os atos administrativos, também é essencial para assegurar que as decisões relacionadas à inexigibilidade de licitação sejam tomadas de forma transparente e em estrita observância aos princípios da Administração Pública.
Por fim, a utilização das exceções à licitação deve ser acompanhada de uma gestão responsável e ética, que não apenas atenda às necessidades imediatas da Administração Pública, mas também preserve a confiança da sociedade nas Estatais e no manejo dos recursos públicos. O foco da contratação direta não deve ser apenas na celeridade ou na conveniência, mas na efetividade da entrega dos serviços essenciais à população, garantindo que as Estatais cumpram com sua função social de maneira eficiente, justa e transparente. Dessa forma, a combinação entre a flexibilidade proporcionada pela Lei nº 13.303/2016 e o rigor nas condições de sua aplicação resulta em uma gestão pública mais eficaz, com o fortalecimento da democracia e o respeito aos valores que sustentam o Estado de Direito.
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Advogada Pública com atuação em Direito Administrativo, Cível e Trabalhista, e na área da saúde. Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas. Pós-graduada, com especialização em Direito Público (Direito Constitucional) e Privado (Direito Civil). MBA em Licitações e Contratos.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MELO, Juliana Melissa Lucas Vilela e. Reflexões sobre Inexigibilidade de Licitar no Âmbito das Estatais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 dez 2024, 04:21. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos /67212/reflexes-sobre-inexigibilidade-de-licitar-no-mbito-das-estatais. Acesso em: 28 dez 2024.
Por: Benigno Núñez Novo
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
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