SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO; 2. VISÃO ARISTOTÉLICA DE JUSTIÇA; 2.1 BREVE ANÁLISE DO PENSAMENTO DE ARISTÓTELES COM ÊNFASE NA JUSTIÇA; 2.2 INFLUÊNCIA DA VISÃO ARISTOTÉLICA AOS PENSAMENTOS DE SÃO TOMÁS DE AQUINO; 3. O QUE É JUSTIÇA PARA TOMÁS DE AQUINO; 3.1 DIMENSÕES DA LEI; 3.1.1 Lei Eterna; 3.1.2 Lei Natural; 3.1.3 Lei Divina; 3.1.4 Lei Humana; 3.2 JUSTIÇA COMO VIRTUDE; 4. CONCLUSÃO 13 5. BIBLIOGRAFIA;
1. INTRODUÇÃO
O desenvolvimento do conceito de justiça por São Tomás de Aquino, em concordâncias parciais ou totais com outros filósofos, precedentes ou posteriores, influenciou nas teorias de direito natural (em latim lex naturalis) ou jusnaturalismo, que passou ser uma teoria que postula a existência de um direito cujo conteúdo é estabelecido pela própria natureza da realidade.
O jusnaturalismo, por vezes contrasta ao juspositivismo (direito positivo). Assim, para os que defendem o direito natural, o direito positivo não pode ser conhecido sem inferências ao direito natural.
Essa teoria do direito natural ou jusnaturalismo que abrange grande parte da filosofia de Tomás de Aquino e outros filósofos, dentre eles Francisco Suárez, Richard Hooker, Thomas Hobbes, Hugo Grócio, Samuel Von Pufendorf e John Locke, promoveu profunda influência no movimento do racionalismo jurídico do século XVIII, ocasião em surgem as noções de “direitos fundamentais” e o desenvolvimento da common law inglesa.
Tomás de Aquino, além de filósofo foi um teólogo que influenciou e continua influenciando de forma espetacular o cristianismo. Nesse sentido, por ter sido um filósofo com bases racionalistas herdadas de Aristóteles, não fechou os olhos para a transcendência da racionalidade, no conhecimento metafísico ou, melhor dizendo, no conhecimento e nas experiências com Deus.
A filosofia grega deu ênfase a distinção entre “natureza” (physis) e o “direito”, “costume” ou “convenção” (nomos), por isso para o gregos a natureza era única em qualquer lugar, enquanto que o direito poderia mudar de acordo com o lugar, assim, afirmar a existência do “direito da natureza”, para os gregos parecia um paradoxo. Nessa temática, Sócrates, e posteriormente seus herdeiros filosóficos, Platão e Aristóteles propuseram uma justiça natural ou um direito natural (latim: ius naturales), no entanto, Aristóteles é considerado o pai do direito natural, que passou influenciar de grande monta a Tomás de Aquino.
Aristóteles chegou afirmar que justiça natural é uma espécie de justiça política (justiça distributiva e corretiva) que ao se tornar lei seria chamada de “direito natural”.
Aristóteles nessa discussão do direito natural, através da “Retórica” apresenta que além das leis particulares que cada povo estabelece a si próprio, há uma lei “comum” conforme a natureza, não que necessariamente tal lei comum realmente exista, mas que deveria ser considerada.
Estas teorias tiveram grande influência sobre os juristas romanos e foram bases centrais para o futuro da teoria do direito.
Cícero, em sua obra De Republica, afirmou que “há uma lei verdadeira, norma racional, conforme à natureza, inscrita em todos os corações, constante e eterna, a mesma em Roma e em Atenas; tem Deus por autor; não pode, por isso, ser revogada nem pelo senado nem pelo povo; e o homem não a pode violar sem negar a si mesmo e à sua natureza, e receber o maior castigo”.[1]
Na visão teológica a teoria do direito natural passou ter significado através dos esforços de Agostinho de Hipona, que igualou o direito natural ao estado do homem antes da “queda”, o que lhe impede uma vida conforme a natureza, assim, os homens precisariam procurar a salvação por meio da lei divina e da graça. Os elementos bons existentes na natureza humana não foram erradicados, porém se tornaram vulneráveis e facilmente frustrados pelas más predisposições.[2]
Tomás de Aquino enfatizou que o homem pode aproximar-se do direito natural através de seu estado independente, com base na perfeição de sua razão, apesar de mesmo assim não conseguir compreender completamente o direito eterno. Nesse sentido as leis humanas deveriam ser medidas com base no direito natural. Assim, o direito natural passou ser uma forma, além de avaliar a validade moral das leis, de determinar a intenção das leis.
Poderíamos dizer, com Aristóteles e São Tomás, que o Direito natural está para o Direito positivo, assim como os princípios da razão estão para a ordem especulativa.[3]
Thomas Hobbes deu novo rumo ao conceito do direito natural, nos tratados “Leviatã” e “De Cive”, em que direito natural seria um preceito ou regra geral, descoberto pela razão, pelo qual a um homem é proibido fazer aquilo que é ruinoso para com a sua vida ou que lhe tira os meios de preservá-la; e de omitir aquilo que ele pensa que pode melhor preservá-la.
Thomas Hobbes, apesar de um defensor do direito natural, considerava que a sociedade não poderia se sustentar apenas no direito natural, o que culminaria em guerra de todos contra todos, portanto, a necessidade da criação de um direito positivo ou um contrato social, garantido por um poder centralizado que estabeleceria regras de convívio pacífico. Essa crítica de Thomas Hobbes da impossibilidade de uma sociedade se sustentar apenas com o direito natural foi a base dos seguidores do positivismo jurídico.
Com base nessa visão geral da história que norteou o direito natural, o presente estudo em como base principal visualizar o processo de formação do conceito de justiça por São Tomás de Aquino, para que fique compreensível e conclusivo o que norteou a teoria do direito natural.
Apesar do avanço que Tomás de Aquino deu a Teoria do Direito Natural em razão de sua visão de justiça, não podemos esquecer que antes da Idade Média o Apóstolo Paulo, na sua Epístola aos Romanos[4], afirma a existência de um “direito natural” quando diz que há uma lei escrita no coração do homem, e por isso até os gentios que desconhecem a lei são capazes de proceder “por natureza de conformidade com a lei”. Há nesse texto uma base de senso moral inato no homem, que o conduz ao bem, ainda que sem conhecer a lei escrita.
2. VISÃO ARISTOTÉLICA DE JUSTIÇA
São Tomás de Aquino através de sua filosofia tomista, no desenvolvimento do pensamento sobre justiça, tem pleno comprometimento com as Sagradas Escrituras e com o pensamento aristotélico, uma vez que dá enfoque teológico à doutrinas aristotélicas. “...utiliza la teoria aristotélica em la perspectiva teológica”.[5]
2.1 Breve análise do pensamento de Aristóteles com ênfase na justiça
Aristóteles como discípulo de Platão desenvolve o tema da justiça com olhos para o campo da ética. Essa ética passa ser observada no campo da ciência como uma ciência prática.
“É da reunião das opiniões dos sábios, da opinião do povo, da experiência prática, avaliados e analisados criticamente, dentro de uma visão de todo do problema (justiça da cidade, justiça doméstica, justiça senhorial...) que surgiu uma concepção propriamente aristotélica”.[6]
A justiça para Aristóteles foi tratada como virtude. Assim, nessa temática, a justiça ao ser considerada como virtude passa ser alvo de estudos do comportamento humano, portanto, essa ciência prática que é chamada de ética passa investigar e dar definições do que é justo e injusto, bom e mau..., assim, “justiça não é uma parte da virtude, mas a virtude inteira”. [7]
Aristóteles ao observar na prática o comportamento humano numa análise ética, através de sua obra Ética a Nicômaco [1095 a], faz a seguinte observação: “Cada homem julga bem as coisas que conhece, e desses assuntos ele é bom juiz. Assim, o homem instruído a respeito de um assunto é bom juiz nesse assunto, e o homem que recebeu instrução a respeito de todas as coisas é bom juiz em geral. Por isso, um homem jovem não é bom ouvinte de aulas de ciência política. Com efeito, ele não tem experiência dos fatos da vida...”.[8]
Observa-se que Aristóteles desenvolve a temática da análise prática da virtude (concepção ética) dentro de um viés totalmente racional.
“A justiça aqui é entendida como sendo uma virtude, e, portanto, trata-se de uma aptidão ética humana que apela para a razão prática, ou seja, para a capacidade humana de eleger comportamentos para a realização de fins. [...] A justiça total vem complementada pela noção de justiça particular, corretiva, presidida pela noção de igualdade aritmética (comutativa, nas relações voluntárias; reparativa, nas relações involuntárias) ou distributiva, presidida pela noção de igualdade geométrica”. [9]
2.2 Influência da visão aristotélica aos pensamentos de São Tomás de Aquino
São Tomás de Aquino dentro de uma visão da ciência prática, ainda que voltado às questões metafísicas, teológicas, políticas, sociais e outras, desenvolve seus pensamentos de forma racional, metódico e lógico, nos mesmos padrões de atuação de Aristóteles.
“A influência recebida do aristotelismo dota as lições tomistas de clarividência particular”.[10]
3. O QUE É JUSTIÇA PARA TOMÁS DE AQUINO
Tomás de Aquino se posiciona em face de conceitos éticos, para afirmar que a justiça é uma virtude, assim, em sua suma teológica aborda a assertiva dos especialistas do direito que afirmam que “a justiça é uma constante e perpétua vontade de dar a cada um o seu direito”.
Algumas de suas objeções esbarram no conceito de vontade e retidão, como as seguintes observações: 1. Se a vontade é potencia ou ato, é incorreto afirmar que justiça é vontade; 2. Se a retidão da vontade não é a vontade, e se a vontade fosse retidão, então, nenhuma vontade seria perversa, portanto, justiça não é vontade; 3. Se somente a vontade de Deus é perpétua; e, 4. Se a justiça é perpétua vontade. Então a justiça está somente em Deus. Todavia, todo o perpétuo é constante, porque é imutável. Portanto, carece de sentido dizer que a justiça é perpétua e constante, o que leva observar que a vontade do homem em buscar a justiça é que tem que ser perpétua.
“se requiere que el hombre tenga perpetuamente y em todas ellas la vonluntad de observar la justicia”.[11]
Se, dar a cada um seu direito pertence ao príncipe. Se a justiça é quem atribui o direito a cada um. Então, a justiça não é senão o príncipe, o que é inadmissível pensar.
A definição de justiça estará correta se se compreender o “bem”.
Para que toda virtude seja hábito, que é o princípio do ato bom, é necessário que a virtude seja definida mediante ato bom, sobre a mesma matéria da virtude. Assim, o ato da justiça se expressa quando se diz que dá o direito a cada um. Portanto, para que qualquer ato sobre alguma coisa seja virtuoso, se requer seja voluntário, estável e firme.
“para que cualquier acto sobre alguna cosa sea virtuoso, se requiere que sea vonluntario, que sea estable y sea firme”.[12]
Aristóteles apresentou que os atos que tem conformidade com as virtudes, têm determinado caráter, para tanto o agente que pratica o ato dotado de virtude deve conhecer o que faz, deve escolhê-los em função dos próprios atos e por fim “sua ação deve proceder de uma disposição moral firme e imutável”.[13]
Nessa temática da virtude, Aristóteles (base dos conceitos de Santo Agostinho) afirma que “a virtude é um meio-termo, em que sentido devemos entender esta expressão, e que é o meio-termo em que dois vícios, um dos quais envolve excesso e o outro falta, e isso porque a natureza da virtude é visar à mediania nas paixões e nos atos. Por conseguinte, não é fácil ser bom, pois em todas as coisas é difícil encontrar o meio. Por exemplo, determinar o meio de um círculo não é para qualquer pessoa, mas só para aquela que sabe; do mesmo modo, qualquer um pode encolerizar-se, dar ou gastar dinheiro, pois isso é fácil; mas proceder assim em relação à pessoa que convém, na medida, ocasião, motivo e da maneira que convém, não é para qualquer um, e nem é fácil”.[14]
Tomás de Aquino ao observar a exteriorização da virtude da justiça, relacionada ao direito, passa admitir várias dimensões de leis: eterna, natural, divina e humana.
A lei eterna, que é de natureza divina, é conhecida parcialmente pelos homens por suas manifestações. “A ordem universal é dada pela lei eterna. Trata-se de uma lei eterna, porque promulgada por Deus, e, assim, não está sujeita às vicissitudes a que as leis humanas estão”.[15]
A lei eterna é a lei universal, a que todos os seres humanos estão sujeitos, e apesar de ser de natureza divina, não é lei divina.
Tomás de Aquino apresenta o que é lei ou o direito divino é promulgado pela divindade:
“Que el derecho divino se llama de este modo porque es promulgado por la divinidad. Y, efectivamente, este, en parte, es de las cosas que son naturalmente justas, pero, sin embargo, su justicia no es manifesta a los hombres; y, en parte, es de las cosas que se hacen justas por institución divina. De donde se decuce que también el derecho divino pude dividir-se en dos, del mismo modo que el derecho humano; pues, em la ley divina, existen algunas cosas mandadas por ser buenas y otras prohibidas por ser malas; por el contrario, existen ciertas cosas buenas por ser mandadas y outras malas por ser prohibidas”.[16]
Na temática de que a lei eterna não é a mesma que lei divina, Miguel Reale afirma que: O elemento mais alto da filosofia jurídico-moral tomista é a lex aeterna, expressão mesma da razão divina, inseparável dela, que governa todo o universo, como um fim ao qual o universo tende. A idéia de lex aeterna não deve ser confundida com a de lex divina, ou revelada, a qual é uma expressão da primeira, a mais alta forma de suas participação aos homens, porque dada por Deus, como no exemplo das Sagradas Escrituras.[17]
Embora nenhum mortal comum possa conhecer a lei eterna na sua inteira verdade, pode ele ter dela uma noção parcial, mediante a faculdade da razão, de que foi dotado por Deus.[18]
Seria praticamente uma participação racional da lei eterna, a lei natural conhecida pelos homens através da razão.
A formação da lex naturalis não é declarada pelo legislador porque já pré-existe na natureza.
O jusnaturalismo de Tomás de Aquino, ante a mutabilidade da natureza humana, entende que não há um código incondicionado ou absoluto de uma justiça invariável, tendo em vista que a razão humana é variável.
“...lo que es natural es imutable e idêntico para todos. Mas em las cosas humanas no se halla nada semejante, porque todas las reglas del derecho humano fallan en ciertos casos y no tienen fuerza em todas partes”.[19]
Em 12.08.1950 o Papa Pio XII divulgou uma Carta Encíclica – Humani Generis[20], que demonstrava ser a Filosofia de São Tomás de Aquino como a Filosofia da Verdade, e dentre os termos apresentados fez uma menção de que, a lei natural fora imprimida pelo Criador na alma humana.
A lei divina está relacionada com o “faz” (verbo fazer) enquanto que as demais leis estão relacionadas ao ius.
O direito natural, como um corpo de princípios gerais e abstratos, é complementado na filosofia tomista por diretrizes mais particulares, emanadas de Deus, sobre a maneira de conduzirem os homens a suas vidas. Essa função é exercida pela lei divina (Lex divina), a Lei revelada através das Sagradas Escrituras e registrada no Velho e no Novo Testamento.[21]
A lei humana não existe por si só, é fruto de convenções, e somente produzirá força a partir do momento em que for instituída.
Seria a concretização e institucionalização da lei natural, assim, Tomás de Aquino afirma que a Lei Humana não pode derrogar as disposições de direito natural e divino.
São Tomás de Aquino estabelece diferenças entre as virtudes morais e as virtudes da justiça, em que as virtudes morais têm como objetivo estabelecer a justa medida atendendo às disposições do sujeito. Já, as virtudes da justiça se estabelecem igualando com a coisa anteriormente dada ou recebida.
“Una de las diferencias fundamentales entre las otras virtudes morales y la virtud de la justicia es que el objeto de las primeras se establece en su justa medida atendiendo a las disposiciones del sujeto, mientras el de la segunda se establece igualándolo con la cosa anteriormente dada o recibida. Las fórmulas médium rationis y médium rei quierem recoger esta diferencia. Para entenderla hay que recordar la doctrina aristotélica de que la virtud estriba en el justo médio. Significa esto que la razón, regla de los actos humanos, calcula las dimensiones correctas del objeto de la virtud trazando la media entre dos extremos, uno que supera la mdedida y outro que no la da”. [22]
É a virtude da justiça, entre as demais virtudes, que cuida da conduta exterior do homem, assim, para melhor entender, a virtude como prudência, temperança, bondade... está intimamente ligada à conduta interior, uma vez que convém a si próprio, no entanto, a justiça como fator exterior está diretamente relacionada ao direito, ou seja, uma virtude que estabelece relação com o próximo.
“...la justicia, dentro de las demás virtudes, es ordenar al hombre en las cosas que están en relación con el outro. Implica, em afecto, cierta igualdad, como su próprio nombre manifiesta. Vulgarmente se dice que las cosas que se igualan se ajustan. Ahora bien: La igualdad se establece en relación a outro. Pero las demás virtudes perfeccionan al hombre solamente en aquellas cosas que le convienen a el mismo”.[23]
Tomás de Aquino em suas objeções avalia se a justiça é corretamente definida como constante e perpétua vontade de dar a cada um o seu direito.
Ele observa que não se pode falar em ato virtuoso sem voluntariedade. E para que este ato tenha firmeza é preciso constância e perpetuidade. Nesse sentido Tomás de Aquino afirma que la justicia es el hábito según el cual uno, con constante y perpetua voluntad, da a cada uno su derecho. Y esta definición es casi igual a aquella que pone el Filósofo em V Ethic, diciendo que la justicia es el hábito según el cual se dice que uno es operativo en la elección de lo justo.[24]
O conjunto de informações pesquisadas, sob o prisma da visão filosófica e teológica de Tomás de Aquino, leva às seguintes conclusões sobre a justiça, inclusive nas dimensões das leis eternas, naturais e humanas:
Goffredo Telles Junior, em sua obra Filosofia do Direito[25], apresenta exemplos para demonstrar que as leis naturais já são inerentes da natureza, sem que haja qualquer manifestação de vontades humanas, como por exemplo, se for aceso um fogo, no momento estará a ação de queimar, porque no fogo já há uma ordem, uma preordenação, uma predeterminação, para que haja ação de queimar onde quer que haja o fogo; no caso de um pássaro, por exemplo, em sua natureza já está ordenado para voar.
Partindo-se da premissa de que supostamente as leis naturais não são ordenadas, preordenadas e/ou determinadas, no caso de pássaros da mesma espécie, por exemplo, seria uma total desordem de padrões, pois uns voariam outros não. Sendo assim, quanto ao ser humano, por ter em si, leis naturais, que ordenam sua natureza, gera reflexos em suas relações sociais.
Tomás de Aquino apresenta uma temática de que a justiça é uma virtude, e que a exteriorização da virtude da justiça, relacionada ao direito, passa admitir dimensões de leis eternas, leis naturais e leis humana. Portanto, o homem dotado em si de leis naturais (virtudes da justiça) promove reflexos em suas relações sociais, daí se dizer que as leis humanas desenvolvidas pelo homem, em face de suas relações sociais, estão intimamente ligadas às leis naturais, ou seja, as leis humanas não podem se desvincular das leis naturais.
Em contra partida Hans Kelsen defensor da teoria do positivismo se contrapõe à teoria de Tomás de Aquino e diz que quando foi desenvolvida a filosofia tinha caráter essencialmente metafísico e o sistema político que imperava era a monarquia absoluta e que a burguesia do século XIX se manifesta contra do direito natural e se vale do positivismo.
En la época en que esta teoría estaba en su apogeo, la filosofia tería también un carácter esencialmente metafísico y el sistema político imperante era el de la monarquía absoluta, con su organización policial. Cuando la burguesía liberal la traslada al siglo XIX, se manifiesta una reacción muy clara contra la metafísica y la doctrina del derecho natrual. En correlación estrecha con el progreso de las ciências experimentales y con el análisis crítico de la ideologia religiosa, la ciência burguesa del derecho abandona el derecho natural se vuelve hacia el positivismo.[26]
Por outro lado, a concepção tomista de justiça, distinta da teoria do direito, revela nítida influência de Cícero e Aristóteles, em que a justiça é definida como um hábito pelo qual o homem, por vontade constante e perpétua, dá a cada um o que lhe pertence. Ela se divide em duas partes: justiça distributiva, que confere coisas diversas a pessoas diversas, na proporção da sua dignidade pessoal e justiça comutativa (corretiva), que diz respeito ao proceder dos indivíduos uns para com os outros, e aos ajustamentos a serem feitos no caso da prática de atos impróprios ou ilegais. Como Aristóteles, Aquino sustenta que a igualdade implícita no conceito de justiça distributiva não é mecânica, mas sim uma igualdade proporcional.
Segundo Tomás de Aquino, “na justiça distributiva a pessoa recebe tanto mais bens comuns, quanto mais destacada é a sua posição na comunidade. Na justiça corretiva, por outro lado, é preciso igualar coisa com coisa, de maneira aritmética, de sorte que as perdas sofridas por alguém em virtude de um ato danoso possam ser reparadas, retificando-se também o injusto enriquecimento de um em detrimento de outro”.[27]
Na concepção da justiça tomista, Tomás de Aquino avalia a importância do Estado para o homem, assim, Giorgio del Vechio afirma que “para S. Tomás o Estado é um produto natural e necessário à satisfação das necessidades humanas. Ele deriva da natureza social do homem e existiria independentemente do pecado. O Estado tem por fim garantir a segurança dos co-associados e promover o bem comum. O Estado é a imagem de reio de Deus”.[28]
É bem verdade que Tomás de Aquino em sua análise de justiça coloca a Igreja em patamar mais elevado que o Estado, e com o passar dos séculos essa concepção sofre transformações em que Igreja tem que se submeter ao Estado. No entanto, o Estado não pode sobrepor-se ao direito natural, tampouco impedir que os homens o tenham, porque o direito natural não é inerente do Estado, mas do homem, em razão das virtudes que lhe o homem recebeu de Deus.
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DEL VECCHIO, Giorgio. 1959. Lições de Filosofia do Direito. [trad.] Antonio José Brandão. Coimbra : Arménio Amado, 1959. O autor foi professor da Universidade de Roma.
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TELLES Jr., Goffredo. 1915. Filosofia do direito. São Paulo : Max Limonad, 1915.
[1] (MONTORO, 1991 p. 258)
[2] (BODENHEIMER, 1966 p. 36)
[3] (MONTORO, 1991 p. 51)
[4] Romanos 2:14-15 – “Os não-judeus não têm a lei. Mas, quando fazem pela sua própria vontade o que a lei manda, eles são a sua própria lei, embora não tenham a lei.Eles mostram, pela sua maneira de agir, que têm a lei escrita no seu coração. A própria consciência deles mostra que isso é verdade , e os seus pensamentos, que às vezes os acusam e às vezes os defendem, também mostram isso.”
[5] (AQUINO, 1995 p. 457)
[6] (BITTAR, et al., 2002 pp. 90,91)
[7] (ARISTÓTELES, 2001 p. 106)
[8] (ARISTÓTELES, 2001 p. 19)
[9] (BITTAR, et al., 2002 pp. 123,125)
[10] (BITTAR, et al., 2002 p. 196)
[11] (AQUINO, 1995 p. 476)
[12] (AQUINO, 1995 p. 476)
[13] (ARISTÓTELES, 2001 p. 45)
[14] (ARISTÓTELES, 2001 p. 54)
[15] (BITTAR, et al., 2002 p. 205)
[16] (AQUINO, 1995 p. 472)
[17] (REALE, 1962 p. 538)
[18] (BODENHEIMER, 1966 p. 38)
[19] (AQUINO, 1995 p. 471)
[20] (HUGON, 1998 pp. 298,299)
[21] (BODENHEIMER, 1966 p. 39)
[22] (AQUINO, 1995 p. 467)
[23] (AQUINO, 1995 p. 470)
[24] (AQUINO, 1995 p. 476)
[25] (TELLES Jr., 1915)
[26] (KENSEN, 2009 p. 20)
[27] (BODENHEIMER, 1966 p. 40)
[28] (DEL VECCHIO, 1959 p. 82)
Advogado, bacharel em administração de empresa, bacharel em teologia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, pós graduado em processo penal, doutorando em ciências jurídica e sociais pela Universidad del Museo Social Argentino, empresário e especialista em: direito imobiliário, contratos empresariais e franquias.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CRISPIM, Cicero Antonio Di Salvo. Conceito de Justiça em São Tomás de Aquino: uma visão filosófica e teológica Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 jan 2011, 08:20. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/23358/conceito-de-justica-em-sao-tomas-de-aquino-uma-visao-filosofica-e-teologica. Acesso em: 22 dez 2024.
Por: EDUARDO MEDEIROS DO PACO
Por: EDUARDO MEDEIROS DO PACO
Por: Marcos Antonio Duarte Silva
Por: Marcos Antonio Duarte Silva
Por: LETICIA REGINA ANÉZIO
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