INGO DIETER PIETZSCH[1]
(orientador)
Resumo: A Lei da Reforma Trabalhista efetivada através da Lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017, fez alterações significativas no texto celetista, dentre elas, as relativas ao trabalho da mulher, que passou a ser regulado e protegido há pouco tempo, em relação ao trabalho dos homens, sendo, no entanto, ainda hoje, vítimas de discriminação no ambiente de trabalho. O presente artigo visa analisar a relação de trabalho da mulher e os impactos da flexibilização decorrentes das alterações realizadas pela Reforma Trabalhista. Para tanto, serão estudados inicialmente aspectos gerais sobre a evolução dos direitos das mulheres no âmbito do Direito do Trabalho, examinando como era tratada a proteção do trabalho da mulher antes e após a Reforma. Na segunda parte do trabalho far-se-á um questionamento acerca dos limites da flexibilização analisando até que ponto ela afeta a mulher inserida no mercado de trabalho. Adotou-se na pesquisa a metodologia referência bibliográfica, utilizando-se livros, artigos e obras que versam a respeito do tema ora estudado e da legislação brasileira.
Palavras-chaves: Direito da Mulher. Reforma Trabalhista. Flexibilização.
Abstract: The Labor Reform Law, implemented through Law No. 13,467 of July 13, 2017, made significant changes to the CLT text, including those relating to women's work, which has recently been regulated and protected in relation to to men's work, being, however, still today, victims of discrimination in the work environment. This article aims to analyze the working relationship of women and the impacts of flexibilization resulting from the changes made by the Labor Reform. To this end, general aspects of the evolution of women's rights within the scope of Labor Law will be initially studied, examining how the protection of women's labor was treated before and after the Reform. In the second part of the work, a question will be made about the limits of flexibilization, analyzing the extent to which it affects women in the labor market. The bibliographical referential methodology was adopted in the research, using books, articles and works that deal with the subject studied and Brazilian legislation.
Keywords: Women's Rights. Labor Reform. Flexibilization.
1 INTRODUÇÃO
Ao longo da história, coube a mulher a ocupação de determinados postos, sempre relacionados ao trabalho doméstico e familiar. Com a Revolução Industrial, as relações de trabalho foram sendo modificadas e a mulher foi explorada, mal remunerada e com jornada que poderia chegar até 14 horas diárias. Essa situação foi o passo inicial para a produção normativa de proteção dessa classe trabalhadora, a fim de proibir a exploração excessiva da mulher.
No Brasil, a partir da Constituição de 1934, há uma igualdade formal entre os gêneros, o que não garantia a efetividade dos seus direitos. A Consolidação das Leis do Trabalho, CLT, 1943, trouxe artigos que tratavam do trabalho da obreira, da proteção à maternidade, um avanço para a época. No primeiro momento, o legislativo produzia normas com caráter de proteção, o que em certa medida, discriminava a obreira. Foi com a Constituição de 1988, depois de o Brasil ratificar a Convenção Internacional sobre eliminação de formas de discriminação contra a mulher, importante instrumento para a efetivação dos direitos das mulheres, que a imagem feminina começou a modificar, tendo a Constituição um caráter amplo de igualdade, abrangendo a formal e material.
Assim sendo, a presente pesquisa pretende mostrar a evolução do direito das mulheres no âmbito do direito do trabalho, fazendo uma análise crítica de até que ponto a flexibilização das leis trabalhistas tem impactado sobre as condições de trabalho da mulher. Houve mitigação de direitos e tentativa de precarização das condições de trabalho?
2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DAS MULHERES NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
A luta por igualdade de gênero no Brasil passa por uma evolução lenta, mas gradual. A mulher, durante toda a história, foi tratada de forma preconceituosa e com alto grau de desrespeito. É notório, no entanto, o caráter evolutivo da temática em nosso constitucionalismo, o que impõe conhecermos a trajetória traçada ao longo do tempo.
2.1 A mulher na Constituição de 1824
A Constituição do Império, outorgada por D. Pedro I em 23 de março de 1824, manteve o tratamento que já era dispensado às mulheres no Brasil colônia, ou seja, continuou a conceber a ideia de que a atuação da mulher se restringe ao âmbito privado, cuidando da família e exercendo funções domésticas.
Tanto era dominante a ideia de que a mulher cumpria apenas tarefas domésticas que a Constituição de 1824 sequer se preocupou em negar-lhe direitos. Não há exclusão expressa nessa Constituição à direitos políticos às mulheres. Todavia, não houve, à época, quem reivindicasse tal atuação política. A certeza de exclusão da mulher do que se compreendia como cidadão bastava para excluir esses direitos às pessoas do gênero feminino. Outro fator que evidencia essa questão é o fato de que as únicas referências à mulher no texto da Constituição do Império tratavam da esposa do Imperador e das princesas, como se verifica nos dispositivos a seguir transcritos, in verbis:
Art. 108. A Dotação assinada ao presente Imperador, e à Sua Augusta Esposa deverá ser aumentada, visto que as circunstâncias atuais não permitem, que se fixe desde já uma soma adequada ao decoro de Suas Augustas Pessoas, e Dignidade da Nação.
Art. 112. Quando as Princesas houverem de casar, a Assembleia lhes assinará o seu Dote, e com a entrega dele cessarão os alimentos.
Art. 117. Sua Descendência legitima sucederá no Trono, Segundo a ordem regular da primogenitura, e representação, preferindo sempre a linha anterior ás posteriores; na mesma linha, o grau mais próximo ao mais remoto; no mesmo grau, o sexo masculino ao feminino; no mesmo sexo, a pessoa mais velha á mais moça. (CONSTITUIÇÃO IMPERIAL – 1824).
Destaque-se, ainda, que em que pese o desprestígio à figura feminina, a Constituição de 1824 manteve a previsão de a mulher governar, mas apenas por sucessão, nos termos da Constituição Imperial, conforme se lê:
Art. 107. A Assembleia Geral, logo que o Imperador suceder no Império, lhe assinará, e à Imperatriz Sua Augusta Esposa uma Dotação correspondente ao decoro de Sua Alta Dignidade.
Art. 124. Em quanto esta Regência se não eleger, governará o Império uma Regência provisional, composta dos Ministros de Estado do Império, e da Justiça; e dos dois Conselheiros de Estado mais antigos em exercício, presidida pela Imperatriz Viúva, e na sua falta, pelo mais antigo Conselheiro de Estado.
Art. 130. Durante a menoridade do Sucessor da Coroa, será seu Tutor, quem seu Pai lhe tiver nomeado em Testamento; na falta deste, a Imperatriz- Mãe, enquanto não tornar a casar: faltando esta, a Assembleia Geral nomeará Tutor, contanto que nunca poderá ser Tutor do Imperador menor aquele, a quem possa tocar a sucessão da Coroa na sua falta. (CONSTITUIÇÃO IMPERIAL – 1824).
Assim, verifica-se que a Constituição do Império, outorgada em 1824, considerava cidadão apenas aquele pertencente ao sexo masculino, omitindo a proteção ao princípio da isonomia em relação às mulheres. Verifica-se, ainda, que o texto constitucional concedia às mulheres a possibilidade de trabalharem em empresas privadas, mas as impedia do exercício de função pública, bem como do direito de votar e de serem votadas, conforme o relato do historiador Rainer Gonçalves Sousa (2015).
A constituição outorgada pelo imperador Dom Pedro I determinava a realização de eleições para a escolha de representantes dos poderes legislativo e executivo. Para ser considerado um eleitor apto, o cidadão deveria pertencer ao sexo masculino e ter no mínimo 25 anos.
2.2 A mulher na Constituição de 1891
A Constituição de 1891 foi a segunda Carta da história brasileira e a primeira do período republicano. Foi promulgada em fevereiro de 1891, como uma consequência direta da alteração da forma de governo. Ela implementou mudanças significativas para o Brasil, ratificando o sistema republicano presidencialista, implantando o federalismo e determinando a separação entre a Igreja e o Estado.
Além disso, conforme a historiadora Maria Efigênia Lage de Resende (1990), a nova Constituição enquadrou o Brasil na tradição liberal norte-americana de organização federativa e do individualismo político e econômico. Ela afirma também que a grande inovação da Constituição de 1891 foi o federalismo, um sistema implantado de maneira inédita a partir de 1891.
As transformações trazidas pela Constituição de 1891 não ficaram reclusas às questões relativas ao federalismo e à forma de governo. Com a nova Carta, o Brasil deu garantias a diversas liberdades individuais, das quais, a liberdade de reunião, de culto, de expressão, de direito à propriedade privada etc. Um avanço significativo aconteceu também com a garantia do direito ao habeas corpus.
A nova Constituição, no entanto, não fez menção às mulheres, o que significa dizer que esse grupo não tinha direito ao voto e que os constituintes ainda não enxergavam as mulheres como cidadãs, e a igualdade de todos perante a Lei era relativa, apesar dos termos do § 2º, do Art. 72, in verbis:
Art.72 - A Constituição assegura a brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
§ 2º Todos são iguais perante a lei.
A República não admite privilégios de nascimento, desconhece foros de nobreza, e extingue as ordens honoríficas existentes e todas as suas prerrogativas e regalias, bem como os títulos nobiliárquicos e de conselho. (CONSTITUIÇÃO DE 1891).
Neste ano de 2021, mais precisamente no dia 24 de fevereiro, a Constituição Republicana de 1891 completou 130 anos, quando 234 congressistas escolheram o Marechal Deodoro da Fonseca como Presidente da República pelo voto indireto. Quanto à mulher, não houve avanço, apesar das muitas manifestações das mulheres pelo Brasil afora.
2.3 A mulher na Constituição de 1934
A Constituição de 1934, na Nova República com Getúlio Vargas, consagrou, pela primeira vez, o princípio da igualdade entre os sexos. Nesse sentido, o texto constitucional estabeleceu o voto das mulheres; garantiu a igualdade de todos; proibiu as diferenças de salários para um mesmo trabalho por motivo de sexo; proibiu o trabalho de mulheres em indústrias insalubres; garantiu a assistência médica e sanitária à gestante e descanso antes e depois do parto, através da Previdência Social; e dispensou as mulheres do Serviço Militar, conforme se lê, in verbis:
Art 108 - São eleitores os brasileiros de um e de outro sexo, maiores de 18 anos, que se alistarem na forma da lei.
Art 109 - O alistamento e o voto são obrigatórios para os homens e para as mulheres, quando estas exerçam função pública remunerada, sob as sanções e salvas as exceções que a lei determinar.
Art 113 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à subsistência, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
1) Todos são iguais perante a lei. Não haverá privilégios, nem distinções, por motivo de nascimento, sexo, raça, profissões próprias ou dos pais, classe social, riqueza, crenças religiosas ou idéias políticas.
Art 121 - A lei promoverá o amparo da produção e estabelecerá as condições do trabalho, na cidade e nos campos, tendo em vista a proteção social do trabalhador e os interesses econômicos do País.
d) proibição de trabalho a menores de 14 anos; de trabalho noturno a menores de 16 e em indústrias insalubres, a menores de 18 anos e a mulheres; outros encargos, necessários à defesa da Pátria, e, em caso de mobilização, serão aproveitados conforme as suas aptidões, quer nas forças armadas, quer nas organizações do interior. As mulheres ficam excetuadas do serviço militar. (CONSTITUIÇÃO DE 1934).
Apesar das manifestações e da inclusão da mulher no contexto social e político da Constituição de 1934, a literatura registra uma forte tendência de manter a mulher dentro de casa. Para o Ministro da Educação do Governo Vargas, Gustavo Capanema, a família era a “base da nossa organização social e por isto colocada sob a proteção especial do Estado” e as jovens mulheres deveriam ser educadas de modo que tomassem consciência de sua importante missão de conservar o lar. (CAPANEMA, 1937, apud BOMENY, COSTA, SCHWARTZMAN, 2000, p. 213).
2.4 A mulher na Constituição de 1937
A Constituição de 1937, apesar do seu contexto excepcional, manteve as conquistas das Constituições anteriores, e trouxe um acréscimo importante que foi o direito ao voto das mulheres
Em 1937, Getúlio Vargas concretizou um golpe de estado que iniciaria um período de ditadura de oito anos, que se estendeu até 1945: o Estado Novo. Para que entendamos o pretexto utilizado por Vargas ao dar o golpe, é necessário analisar a radicalização política ocorrida tanto na direita, quanto na esquerda durante os anos que o precederam, bem como a postura do governo diante dessa oposição.
2.5 A mulher na Constituição de 1946
A Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946, ou Constituição de 1946, foi a quinta constituição brasileira, sua quarta republicana e terceira de caráter republicano-democrático, promulgada após a queda do Estado Novo em 1945. Um texto redemocratizador, a Carta de 1946 espelhava a derrocada dos regimes totalitários na Europa e o retorno, ainda que tênue, dos valores liberais no mundo.
De certo modo, ela tratou de restabelecer os valores democráticos e republicanos da Constituição de 1934, como a liberdades de expressão e as eleições diretas para os principais cargos do Executivo e Legislativo, e de instituir alguns novos preceitos, como a ampliação do voto feminino para todas as mulheres e a inviolabilidade dos sigilos postais. No entanto, indicando tendências centralistas do Poder Executivo, esta Constituição também manteve algumas prerrogativas do período getulista, a exemplo do corporativismo sindical. Sua vigência durou até a Constituição de 1967, mas, na prática, ela virou "letra morta" nas mãos dos governantes militares logo após o Golpe de 1964.
Em uma análise mais pormenorizada, a Carta de 1946 representou um retrocesso para as mulheres quando eliminou a expressão "sem distinção de sexo" quando fez referência a expressão “todos são iguais perante a Lei”.
2.6 A mulher na Constituição de 1967
A Constituição de 1967, foi a sexta constituição do Brasil e quinta de sua república, bem como sua segunda e última constituição republicana de caráter autoritário. Elaborada sob supervisão dos militares no poder, esta Carta legitimava o regime iniciado pelo Golpe de 1964, abandonando sua fachada democrática e formalizando a ditadura militar.
Talvez a mais repressiva de todas as constituições, ela desfazia boa parte dos preceitos democráticos da Constituição de 1946, servindo, na prática, de mero pretexto para a ação do governo militar sobre a vida pública. Por si só muito autocrática, concentrando poderes no Executivo e autorizando a extinção de partidos políticos, ela foi suplementada por diversas emendas, decretos-lei e, mais famosamente, atos institucionais, que foram incorporados ao seu texto na Emenda Constitucional de 1969. Sua vigência seguiu até a promulgação da Constituição de 1988, símbolo da Nova República (1985 - atual) e da redemocratização do país.
O único avanço no tocante à condição da mulher na Constituição de 1967 foi a redução do prazo para a aposentadoria, de 35 para 30 anos.
2.7 A mulher na Constituição de 1988
E chegamos aos nossos dias! A Constituição de 1988, conhecida como Constituição Cidadã, é a que rege todo o ordenamento jurídico brasileiro hoje. Desde a independência do Brasil em 1822, é a sétima constituição que nosso país tem – e a sexta desde que somos uma República.
A CF/88 já vai completar 33 anos e é um marco aos direitos dos cidadãos brasileiros, por garantir liberdades civis e os deveres do Estado. Em 05 de outubro de 1988, sua promulgação foi marcada pelo discurso do então deputado federal e participante da Assembleia Constituinte, Ulysses Guimarães: “A Constituição pretende ser a voz, a letra, a vontade política da sociedade rumo à mudança. Que a promulgação seja nosso grito: Muda para vencer! Muda, Brasil!”
Quanto à realidade das mulheres, o texto constitucional contemplou o tema da isonomia e reconheceu a igualdade de todos perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza; Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, seja na vida civil, no trabalho, e na família.
Quanto aos direitos trabalhistas, o texto constitucional estabeleceu:
Proibição de diferença de salário, admissão e função, por motivo de sexo;
Licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com duração de 120 dias;
Proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos;
Assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 6 anos de idade em creches e pré-escolas.
Quanto aos direitos das trabalhadoras domésticas, a Constituição garantiu:
Salário-mínimo, proibição da redução do salário, 13º salário, folga semanal, férias anuais remuneradas, licença à gestante de 120 dias, licença paternidade, aposentadoria, integração à previdência Social.
Quanto aos direitos políticos, o texto constitucional garantiu à mulher votar e ser votada; e na família,
Direitos e deveres referentes à sociedade conjugal passam a ser exercidos igualmente pelo homem e pela mulher;
É reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar;
A família pode ser formada por qualquer dos pais e seus filhos;
O prazo do divórcio diminui para 1 (um) ano, em caso de separação judicial; e para 2 (dois) anos, em caso de separação de fato;
O Estado criará mecanismos para coibir a violência familiar.
A mulher passa a ter direito ao título de domínio e à concessão de uso da terra, independentemente de seu estado civil, tanto na área urbana como rural.
Infere-se, assim, a evolução dos direitos e garantias conferidas às mulheres no contexto constitucional brasileiro, desde a Constituição Imperial, até a Constituição Cidadã de 1988
3 A PROTEÇÃO DO TRABALHO DA MULHER ANTES DA LEI 13.467/2017.
Durante toda a história, a mulher sempre foi tratada como um ser inferior ao homem, principalmente nas questões salariais e sobre jornadas de trabalho. Essa realidade se intensificou a partir da Revolução Industrial (1760), onde o trabalho feminino era explorado em jornadas exorbitantes, com salários inferiores aos dos homens, inclusive exercendo as mesmas funções, onde eram expostas a péssimas condições de trabalho e sem quaisquer direitos e garantias.
O trabalho feminino era definido como trabalho de “meias-forças”, ou seja, menor, inferior e abaixo do trabalho masculino, o que resultava numa discriminação e uma opressão da massa trabalhadora feminina, que recebia menos e trabalhava nas mesmas funções que os homens, conforme se observa no fragmento a seguir:
A completar o quadro, era usual a utilização das chamadas “meias-forças”, ou seja, trabalho do menor, trabalho da mulher, cuja remuneração era ainda inferior a do trabalhador maior, do sexo masculino. A consequência foi o aviltamento das condições de trabalho” (SOUZA; CARNEIRO,2008)
Percebe-se, no entanto, que a partir da Revolução Francesa (1789), onde surge ideais de igualdade, fraternidade e liberdade, ideias iluministas começam a influenciar toda a sociedade francesa que se expande por todo o mundo. A partir destas ideais, veio à tona a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, a qual influenciou diversos movimentos sociais e que também ensejou a criação de diversas normas trazidas pela CF/88.
No Brasil, a primeira Constituição a tratar dos direitos das mulheres expressamente no que tange trabalho, a não discriminação de sexo, etnia, cor, foi a de 1934, como vista acima, com diversas garantias nunca anteriormente asseguradas às mulheres, abrangendo igualdade de salários e proibindo o trabalho de gestantes em locais insalubres. Este foi um verdadeiro marco em relação aos avanços das normas protetoras da mulher, preconizando direitos fundamentais.
A partir da influência de Organismos Internacionais a legislação Brasileira foi aprimorando e evoluindo no que concerne à expansão de uma gama de direitos e garantias das mulheres, como por exemplo a Convenção n°3 OIT (Organização Internacional do Trabalho) de 1934, que tinha como tema o emprego das mulheres antes e depois do parto, conforme se vê em destaque:
ARTIGO 2° Para a aplicação da presente Convenção, o termo “mulher” designa toda a pessoa do sexo feminino, qualquer que seja a idade ou a nacionalidade, casada ou não, e o termo “filho” designa, todo o filho, legitimo ou não.
A partir do artigo citado acima, podemos analisar que a mulher começa a ter um tipo de tratamento diferenciado, pois, tal menção era muito clara ao afirmar que independente se a mulher for casada ou não, de qualquer nacionalidade e idade, ela possuirá as mesmas garantias. Doravante, o artigo 3° alcança o tema da licença após o parto, que seria de seis semanas, assegurando ainda o direito de indenização suficiente para subsistência do filho no período de afastamento. E para as mulheres que estivessem no período de lactação, o direito a dois intervalos intrajornada de meia hora cada para amamentação. Segue as menções:
ARTIGO 3º Em todos os estabelecimentos industriais ou comerciais, públicos ou privados, ou nas suas dependências, com excepção dos estabelecimentos onde só são empregadas os membros de uma mesma família, uma mulher
a) não será autorizada a trabalhar durante um período de seis semanas, depois do parto;
b) terá o direito de deixar o seu trabalho, mediante a exibição de um atestado médico que declare esperar-se o parto, provavelmente dentro em seis semanas;
c) receberá, durante todo o período em que permanecer ausente, em virtude dos parágrafos (a) e (b), uma indemnização suficiente para a sua manutenção e a do filho, em boas condições de higiene; a referida indenização, cujo total exato será fixado pela autoridade competente em cada país, terá dotada pelos fundos públicos ou satisfeita por meio de um sistema de seguros. Terá direito, ainda, aos cuidados gratuitos de um médico ou de uma parteira. Nenhum erro, da parte do médico ou da parteira, no cálculo da data do parto, poderá impedir uma mulher de receber a indemnização, a qual tem direito a contar da data do atestado médico até aquela em que se produzir o parto;
d) terá direito em todos os casos, se amamentar o filho, duas folgas de meia hora que lhe permitam o aleitamento.
Adiante, no artigo 4°, demonstra-se o direito de a mulher não ser dispensada pelo empregador no período em que deve ser afastada das atividades laborais por conta da gravidez ou de doença provada por atestado médico que aponte como causa o resultado da gestação ou parto e que reduza sua capacidade laborativa.
ARTIGO 4º No caso em que uma mulher se ausente do trabalho em virtude dos parágrafos (a) e (b) do artigo 3º da presente Convenção ou dele se afaste, por um período mais longo, depois de uma doença provada por atestado medico, como resultado da gravidez ou do parto, e que a reduza á incapacidade de voltar ao trabalho, será ilegal, para o seu patrão, até que a sua ausência tenha atingido uma duração máxima, fixada pela autoridade competente de cada país, notificar à sua, dispensa, durante a referida ausência ou em uma data tal que, produzindo-se o pré-aviso expire o prazo no decurso da, ausência acima mencionada.
Por sua vez, o Decreto-Lei N° 2548 DE 1940, trouxe uma disposição na qual contemplava diferença salarial entre obreiros do sexo feminino e masculino, no percentual de 10% sobre o salário-mínimo sob a justificativa de que as medidas utilizadas para segurança e higiene no trabalho já oneravam o trabalho feminino, ou seja, trazia um maior gasto para o empregador, uma justificativa pautada na discriminação pelo sexo. Adiante a Convenção n. 4 da OIT de 1937, incorporada posteriormente no Decreto-Lei N° 2548 de 1940, proibia o trabalho noturno das mulheres, com exceção àquelas que trabalhavam apenas com membros de sua família, ou seja, mais uma vez condicionando o trabalho da mulher à aceitação do marido.
Posteriormente, na Constituição de 1946, foi consolidada a proibição de diferenças salariais por questões de raça, idade, sexo, nacionalidade ou estado civil. Ou seja, mais um avanço em questões garantistas, as mulheres que antes eram tratadas como seres não possuidoras de direitos e que não possuía capacidade plena de forma alguma. O que só veio mudar a partir da Lei n° 4.121 de 1962, o Estatuto da Mulher Casada estabeleceu que não havia mais obrigatoriedade de a mulher ter autorização do marido para trabalhar, bem como receber heranças e comprar imóveis.
Avante, na Constituição atual de 1988, celebra-se principalmente o princípio da dignidade da pessoa humana, a qual veda a distinção entre pessoas do sexo feminino e masculino, afirmando todos serem passíveis de ter uma vida digna, na qualidade de seres humanos. Além das garantias estendidas aos trabalhadores urbanos, rurais e domésticos, a CF/88 assegura a proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante objetivos específicos como a proibição de diferenças salariais por motivo de sexo, idade ou estado civil e ainda concede licença à gestante a serem gozadas por 120 dias após o parto sem o prejuízo da sua respectiva remuneração.
Sobre a perspectiva do atual texto constitucional, o livro “Os Direitos das mulheres na legislação Brasileira Pós Constituinte”, declara:
Quanto aos direitos das mulheres, a CF/88 foi um marco, pela consideração de homens e mulheres iguais em direitos e obrigações (art. 5o, I). A Constituição acolheu a ampla maioria das demandas dos movimentos de mulheres e é uma das mais avançadas no mundo.
O trabalho é considerado um direito social e está amplamente assegurado no Art.6º da CF/88 e no Art.7º, XXX da CLT de 1943, que proíbe diferenciação de salários e de critérios discriminatórios de admissão por motivos de sexo, cor, idade ou estado civil e motivos específicos trazidos no livro citado acima de autoria do Centro Feminista de estudos e assessoria (2006), onde se lê:
A CF/88 proibiu a diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil (art. 7o, XXX e CLT/1943, art. 5º). Devido à grande discriminação e abusos cometidos contra as mulheres no mercado de trabalho, Legislação posterior proibiu a exigência de atestados de gravidez e esterilização e outras práticas discriminatórias, para efeitos admissionais ou de permanência da relação jurídica de trabalho (Lei 9.029/1995). Posteriormente, foi sancionada legislação inserindo regras sobre o acesso da mulher ao mercado de trabalho na CLT (Lei 9.799/1999). Foi retirada, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) a expressão “aborto criminoso” (Lei 8.921/1994) em referência a redução dos dias de férias motivada pelo licenciamento compulsório da trabalhadora por motivo de aborto (Art. 131, II). Entretanto, na Seção V – Da Proteção à Maternidade, ainda consta a expressão “aborto não criminoso” (Art. 395) quando se refere ao repouso remunerado e ao direito de retornar à função que ocupava antes de seu afastamento.
Diante do avanço e da força da Constituição de 1988, cabe a análise das normas específicas de Direito do Trabalho, que ganhou força com o advento da CLT em 1943, na qual reforçou e reafirmou com clareza a proteção ao trabalho da mulher, trazendo normas que buscaram amparar as empregadas de forma a contemplar e abranger sua segurança e saúde no ambiente laboral.
Antes de adentrar nas normas atuais de proteção ao trabalho da mulher de forma mais nítida e extensiva é necessário analisar as disposições revogadas pela lei 13.467/2017. O cenário do trabalho da mulher no geral sofreu diversas modificações no que tange, jornada de trabalho, intervalos e trabalho em locais insalubres, principalmente.
A reforma trabalhista revogou o artigo que tratava sobre o intervalo de 15 minutos do qual a mulher usufruía antes de iniciar a jornada extraordinária. No caso, o empregador era obrigado, segundo o Art. 384 da CLT de 1943, a conceder uma pausa de quinze minutos antes do início da prorrogação da jornada diária de trabalho.
A CLT preceituava: “Art. 384 – Em caso de prorrogação do horário normal, será obrigatório um descanso de 15 (quinze) minutos no mínimo, antes do início do período extraordinário do trabalho.” Segundo o advogado Carlos Modanês em seu artigo “Obrigatoriedade do descanso de 15 minutos para mulheres antes do início da jornada extraordinária”, essa concessão seria devida em prol da saúde e integridade da empregada, que era um benefício a segurança e higidez da mulher.
Tal norma jurídica foi objeto de várias jurisprudências do TST entre os anos de 2014/2015, sob o argumento de que estava sendo violado o princípio da isonomia, pacificando, no entanto, que era constitucional tal intervalo, sob o argumento da recepção pela CF/88. Observa-se abaixo os julgados pertinentes a tal discussão:
RECURSO DE REVISTA DA RECLAMANTE HORAS EXTRAORDINÁRIAS. INTERVALO INTRAJORNADA. ARTIGO 384 DA CLT. DIREITO DO TRABALHO DA MULHER. PROVIMENTO. Por disciplina judiciária, curvo-me ao entendimento do Tribunal Pleno desta Corte que, reconhecendo a constitucionalidade do artigo 384 da CLT de que trata do intervalo de 15 minutos garantido às mulheres trabalhadoras antes da prestação de horas extraordinárias, considerou que a concessão de condições especiais à mulher não fere o princípio da igualdade entre homens e mulheres contido no artigo 5º, I, da Constituição Federal. Desse modo, não sendo concedido o referido intervalo, são devidas horas extraordinárias a ele pertinentes. Precedentes desta Corte. Recurso de revista conhecido e provido. A (TST – ARR: 5320920135150120, Relator: Guilherme Augusto Caputo Bastos, Data de Julgamento: 11/02/2015, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 20/02/2015).
ARTIGO 384 DA CLT. INTERVALO DE 15 MINUTOS PARA MULHERES ANTES DO LABOR EM SOBREJORNADA NÃO GOZADO. PAGAMENTO COMO HORAS EXTRAS. ARTIGO 71, § 4º, DA CLT. Esta Corte possui entendimento pacificado de que o artigo 384 da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, conforme sedimentado no julgamento do Processo nº TST-IIN-RR- 1.540/2005-046,12-00.5, ocorrido na sessão do Tribunal Pleno em 17/11/2008. Homens e mulheres, embora iguais em direitos e obrigações, diferenciam-se em alguns pontos, a exemplo do aspecto fisiológico, merecendo, assim, a mulher um tratamento distinto quando o trabalho lhe exige um desgaste físico maior, como nas ocasiões em que presta horas extras, motivo por que são devidas como extras as horas decorrentes da não concessão do intervalo previsto no artigo 384 da CLT. Recurso de revista conhecido e provido. (TST – RR: 2683320125090010, Data de Julgamento: 18/05/2015, Data de Publicação: DEJT 05/06/2015).
O empregador que não respeitasse tal imposição legal, seria obrigado a indenizar a empregada sobre os intervalos suprimidos como hora extra, incidindo nos reflexos resilitórios. O que gerava uma certa imperiosidade na norma analisada em questão.
Para a advogada Claudia Abdul Ahad em seu artigo: “Reforma Trabalhista e seus impactos no trabalho da mulher”, o motivo de existir tal legislação obrigando o empregador a conceder o intervalo de quinze minutos para a empregada antes do início das horas extras era porque na época do advento da CLT, as mulheres necessitavam de autorização dos maridos para continuar no trabalho após a jornada normal.
Outro ponto muito importante a ser destacado é que antes da reforma trabalhista era obrigatório o afastamento da mulher do ambiente de trabalho insalubre enquanto durasse o período gestacional e a lactação, pois visava garantir segurança à saúde da mãe(empregada) e do seu filho, consequentemente.
No entanto, o afastamento laboral da mulher grávida ou lactante se daria automaticamente da comunicação da gravidez pela empregada ao empregador, independentemente do nível de insalubridade do ambiente de trabalho. Ou seja, tal artigo visava não só proteger a saúde da mulher, mas proteção a integridade física do feto em desenvolvimento.
Dentre os direitos assegurados à mulher, como forma de resguardar sua igualdade e prevenir práticas discriminatórias por parte do empregador, o legislador celetista trouxe tais medidas como amparo para segurança e trabalho da mulher. Que foram modificados pela Reforma Trabalhista de 2017, como poderá ser examinado com mais descrição no capítulo seguinte.
4 RELAÇÃO DE TRABALHO DA MULHER E OS IMPACTOS DA FLEXIBILIZAÇÃO
As diretrizes trabalhistas convergem necessariamente para a integral proteção à saúde da mulher, e consequentemente a preservação da saúde e vida do bebê, no que tange às normas de proibição do trabalho insalubre para grávidas e lactantes, tendo em vista que a exposição de substâncias da mulher no período de gestação e amamentação tem consequência direta e influi na saúde e desenvolvimento do feto e bebê.
Para apenas evidenciar didaticamente o que seria atividades insalubres, a legislação trabalhista traz uma conceituação em seu art. 189 da CLT:
São consideradas atividades ou operações insalubres, aquelas que por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos.
Anteriormente à reforma, era proibido de qualquer forma o trabalho da gestante e lactante em locais de trabalho que apresentasse qualquer nível de insalubridade. Com o advento da Lei Nº 13167/2017, alterou-se tal cenário completamente. Com a mudança do Art. 394-A da CLT, subordinando apenas o afastamento imediato da mulher grávida ou que estava em período de amamentação das atividades insalubres em grau máximo.
Assim, ficou permitido pelo novo texto de lei, a realização do trabalho da gestante ou lactante em locais onde caracterizava-se o grau mínimo e médio de insalubridade, condicionando apenas, a apresentação de um mero atestado emitido por médico de confiança da trabalhadora, permitindo sua presença no trabalho. Dessa forma, determinou o artigo reformista:
Art. 394-A. Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de: (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)
I – atividades consideradas insalubres em grau máximo, enquanto durar a gestação; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
II – atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a gestação; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
III – atividades consideradas insalubres em qualquer grau, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a lactação. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017).
Outra modificação muito significativa está relacionada aos intervalos intrajornada, previsto no Art.396 da CLT. Intervalo intrajornada é aquele no qual o empregado desfruta de pausas entre a jornada normal, antes da reforma o mesmo era concedido diante de duas pausas de meia hora cada, para fins de amamentação, até os seis meses completos da criança. Valendo ressaltar que esse prazo poderia ser dilatado, perante necessidade comprovada e após autorização de autoridade competente.
Tal regramento, por incrível que pareça, foi mantido pelo legislador reformista, continuando dois intervalos de meia hora cada para a trabalhadora amamentar a criança. Porém a alteração trazida pela lei, se refere ao momento de concessão, ou seja, apenas através de acordo individual de trabalho entre a mulher e o empregador, de forma que tal acordo seja viável e interessante para ambas as partes.
Sobre as novas regras trazidas pela Lei Nº 13.467/2017, referente aos intervalos intrajornada, vigoram tais especificações, como a obrigatoriedade de serem concedidos à mulher lactante ou adotante, que seja até os seis meses de vida da criança, que tenham duração de trinta minutos cada intervalo (remunerado) e que tal acordo seja firmado entre a empregada e o empregador, essas são as exigências pós-reforma trabalhista.
Antes de dar seguimento em outros parâmetros legislativos pós-reforma, abordaremos ainda uma mudança muito relevante no que tange às normas de proteção à mulher. Houve, portanto, a revogação do Art. 384 da CLT, no qual previa o direito de a empregada gozar de 15 minutos entre o fim de sua jornada normal e início da sua jornada extraordinária.
Ou seja, com a vigência da nova reforma, a empregada não têm mais direito a usufruir uma pausa antes de iniciar sua jornada extraordinária, a nova lei trabalhista revogou o dispositivo supracitado. E logo após tal modificação, houve várias indagações entre juristas e tribunais sobre os benefícios e malefícios da revogação do Art. 384 da CLT, que serão analisadas esmiuçadamente no capítulo seguinte.
Não obstante o clima de novidades trazidas pela Lei Nº 13.467/2017, adveio a MP 808/2017 em 14 de novembro de 2017, no intuito de sanar algumas irregularidades da reforma trabalhista. E modificou totalmente o dispositivo que trata sobre o trabalho da gestante em ambientes insalubres.
Considerada a reforma da reforma, trouxe consigo inúmeras mudanças em relação às regras direcionadas não só as gestantes, como também os trabalhadores autônomos, ao trabalho intermitente, a jornada 16×32 e aos danos morais. Retornando o entendimento trazido pela Lei Nº 13.467/2017, a gestante estava autorizada a laborar em ambientes insalubres de grau mínimo e médio mediante apresentação de atestado médico de sua confiança.
A Medida Provisória 808 de 2017, revogou totalmente esse dispositivo, determinando a proibição e o consequente afastamento enquanto durar a gestação independentemente do grau de insalubridade. Não mais condicionando a empregada à exposição de agentes químicos e físicos insalubres, colocando em risco à saúde da mulher e da criança, como pode ser analisado a seguinte:
Art. 394-A. A empregada gestante será afastada, enquanto durar a gestação, de quaisquer atividades, operações ou locais insalubres e exercerá suas atividades em local salubre, excluído, nesse caso, o pagamento de adicional de insalubridade. (Redação dada pela Medida Provisória nº 808, de 2017)
1o(VETADO)
2º O exercício de atividades e operações insalubres em grau médio ou mínimo, pela gestante, somente será permitido quando ela, voluntariamente, apresentar atestado de saúde, emitido por médico de sua confiança, do sistema privado ou público de saúde, que autorize a sua permanência no exercício de suas atividades. (Redação dada pela Medida Provisória nº 808, de 2017)
3º A empregada lactante será afastada de atividades e operações consideradas insalubres em qualquer grau quando apresentar atestado de saúde emitido por médico de sua confiança, do sistema privado ou público de saúde, que recomende o afastamento durante a lactação. (Redação dada pela Medida Provisória nº 808, de 2017).
Diante de tais modificações, as novas regras obrigariam a empregada a ser afastada de quaisquer atividades, operações ou locais insalubres e não teria direito ao referente adicional de insalubridade, pelo fato da ausência de exposição. Garantindo também a possibilidade de a gestante apresentar atestado de saúde permitindo sua atuação laboral em locais de graus mínimo e médio de atividades insalubres.
Em relação à empregada lactante, independentemente do grau de insalubridade, a mesma será afastada das atividades e operações mediante apresentação de atestado de saúde emitido também por médico de sua confiança. Não havendo qualquer citação no texto legal sobre a necessidade de perícia ou de autorização por parte das entidades competentes para atestar as condições desse local de trabalho para, consequentemente, proteger a saúde da mulher.
Ocorre que, a medida havia sido editada pelo Presidente Michel Temer juntamente com o Senado no intuito de corrigir algumas falhas trazidas pela reforma trabalhista de julho de 2017, vindo a ser várias vezes emendada, inclusive. Porém, de acordo com a CF/88 no Art. 64, § 4º, o prazo de vigência das MP’s é de 60 dias, podendo ser prorrogadas por mais 60 dias.
A MP 808 de 2017 vigorou por 120 dias corridos sem sua necessária e imprescindível conversão em lei, o que não ocorreu, fazendo com que houvesse a caducidade das normas e portanto, sua imediata revogação, retornando, no entanto, a vigorar o texto integral da Lei Nº13.467/2017.
Com o fim da sua vigência, a gestante submetida a graus de insalubridade mínima e média passa a ter seu afastamento apenas condicionado a um atestado médico emitido por seu médico de confiança, determinando seu afastamento de tais atividades, não sendo suficiente outra forma para caracterizar seu devido afastamento sem prejuízo de sua remuneração.
Vale ressaltar também que, a MP 808/2017 não contemplou nenhuma alteração referente a revogação do Art. 384 da CLT e sobre as regras que versam sobre o intervalo intrajornada concedido às mulheres gestantes.
Diante disso, é necessário analisar os pontos controversos sobre tais alterações e explorar mais a fundo os detalhes de uma forma mais elucidativa, trazendo o tema para como tem sido a aplicação atual de tais normas, tais conjunturas serão discutidas no capítulo a seguir
A lei Nº 13.467/2017 alterou mais de duzentos artigos da Consolidação das Leis do Trabalho e consequentemente revogou expressa e tacitamente diversos artigos.
As mudanças trazidas pela reforma trabalhista, afetaram diretamente o que temos como normas de proteção à saúde da mulher, claramente, violam o direito fundamental de proteção ao trabalho da mulher de forma impactante. O que havia pré-reforma era o entendimento legal de que a exposição ao local insalubre enseja por si só grandes riscos à saúde da mulher gestante.
Houve, portanto, uma precarização de direito, de garantias. Digamos que se evidencia nitidamente o retrocesso social que tal norma trouxe consigo, ao ponto que atribui a empregada o ônus de provar que deverá ser afastada de ambientes de trabalho insalubre em grau mínimo e médio. A reforma não contemplou a ideia do princípio da proteção, valor basilar do direito material do trabalho, onde protege-se a parte hipossuficiente, qual seja nesse caso, a empregada.
A ausência de submissão à realização de perícia por médico do Ministério do Trabalho e Emprego, traria maior segurança jurídica para a situação, porém não há nenhuma exigência legislativa nesse sentido. Ou seja, condicionar a empregada a permissão para exercer suas atividades laborais em locais insalubres a um mero atestado médico de um profissional de sua confiança é uma forma de precarizar os direitos femininos na esfera trabalhista.
O Juiz do trabalho e professor Rodolfo Pamplona Filho, em seu canal Pamplona no Youtube, perpetra diversas críticas em relação a tais novidades legislativas, reitera que antes da reforma havia uma presunção da extensão do dano da exposição a mulher gestante ou lactante a ambientes insalubres e após a reforma, essa presunção já não existe mais, ensejando a obrigação da mulher gestante ou lactante empregada provar que merece ser afastada por questões de proteção pessoal e também da saúde do filho.
De uma visão positiva à alteração pode-se extrair a “liberdade” conferida à empregada para optar de permanecer ou não no trabalho, ainda que em ambiente insalubre, essa tese evidencia a opção da mulher empregada na sua manutenção no mercado do trabalho, o que praticamente não é defendida por juristas brasileiros.
Entretanto, no dia 30 de abril de 2019, o Ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal, deferiu uma liminar da ADIn 5938, ordenando a total suspensão dos incisos II e III do art. 394-A da CLT, que autoriza o exercício das mulheres gestantes e lactantes a laborar em locais insalubres em grau mínimo e médio, condicionando o afastamento à apresentação de um atestado médico de sua confiança.
A partir de tal decisão passa a ser obrigatória o afastamento compulsório da empregada gestante ou lactante que trabalha em ambiente insalubre, independentemente de apresentação de atestado, ou de graus.
A liminar proferida pelo Ministro Alexandre de Moraes na ADIn 5938, foi alvo de uma crítica sobre um prisma constitucional compartilhada pelo Advogado Leandro Pinto de Castro em seu artigo no site Migalhas, como pode ser visto a seguir:
Num cenário em que, como já dito, possivelmente o agente insalubre (mínimo ou médio) não necessariamente é danoso à saúde, possivelmente menos do que o contato com produtos de afazeres domésticos, perde-se a oportunidade de se avaliar a necessidade do afastamento em cada caso concreto, lembrando que esse pode se dar (ou melhor, poderia se dar) mediante mera e simples indicação do profissional médico de confiança da mulher… Também oportuno lembrar que até 2016 sequer havia previsão legal de afastamento das atividades da gestante, novidade introduzida apenas pela lei 13.287/16, antiga redação do artigo 394-A.
Enfatizamos o que dissemos no início: a proteção da saúde da trabalhadora gestante é inafastável. Nossa provocação é propor uma reflexão maior acerca de todo o cenário, identificando-se até que ponto a legislação, tal como prevista, efetivamente ofende a Constituição Federal ou se constitui a melhor forma de compor o maior número de interesses da própria mulher.
Ainda sobre o julgamento da liminar da ADIN 5938 no STF, a Ministra Rosa Weber corroborou com o relator, conforme observado em seguida:
Feitas essas considerações, que procurei sumariar, senhor presidente, concluo dizendo que a alteração promovida pela Lei nº 13.467/2017 na redação do art. 394-A da CLT implica inegável retrocesso social, porquanto a revogar anterior norma proibitória do trabalho da empregada gestante e lactante introduzida no sistema normativo trabalhista em 2016, além de menoscabo ao direito fundamental à saúde da mãe trabalhadora, no que transfere ao próprio sujeito tutelado a responsabilidade pela conveniência de atestado no sentido da necessidade de afastamento do trabalho. Acompanho o eminente relator, renovando meus cumprimentos a Sua Excelência.
Em suma, o julgamento encerrou-se com o placar de 10 votos contra 1, vencido o Ministro Marco Aurélio de Melo. Julgada procedente a ADIN 5938, ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos, no dia 29 de maio de 2019. Em síntese, o STF decidiu pela proibição de que trabalhadoras grávidas e lactantes exerçam atividades insalubres, o que foi permitido pela reforma trabalhista.
Pela legislação, as gestantes poderiam trabalhar em atividades insalubres em grau mínimo e médio, já as lactantes podiam atuar em atividades insalubres de qualquer grau. A exceção seria para casos de pedidos de afastamento da função por meio de atestado médico.
Em abril do mesmo ano, o ministro relator Alexandre de Moraes já havia impedido a norma por meio de decisão liminar. Segundo Moraes, a proteção da mulher grávida ou da lactante em relação ao trabalho insalubre caracteriza-se como direito social protetivo tanto da mulher como da criança, abrangendo o alcance da norma trabalhista.
CONCLUSÃO
No decorrer deste trabalho buscou-se elucidar as principais alterações legislativas em relação às normas de proteção à saúde da mulher.
Diante da presença de normas asseguradoras dos direitos femininos, um que se destaca fortemente é princípio constitucional da isonomia, visando a diminuição da desigualdade de condições de trabalho e salarial, como também o posicionamento da mulher empregada como sujeito de direito no mercado de trabalho e na sociedade. É notório o quanto já se avançou nesses quesitos, no entanto, as modificações legislativas constantes podem ferir direitos e trazer retrocessos como foi apontada a reforma trabalhista, elucidando o cenário de precarização de garantias constitucionais.
Tal discussão é bastante propícia no campo do direito do trabalho, pois apesar da aprovação da reforma trabalhista, as polêmicas e contradições continuam existindo, inclusive no momento de sua interpretação, como aplicadores do direito é nosso dever debater sobre tal conteúdo e sobre vícios de legalidade e inconstitucionalidades eivados na reforma. E consequentemente debater sobre o empenho do judiciário para amparar, discutir e resolver tais controvérsias, na obrigatoriedade de observância à égide dos princípios, valores e normas constitucionais.
REFERÊNCIAS
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BRASIL. Medida Provisória nº 808, de 14 de novembro de 2017. Altera a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5452, de 1º de maio de 1943. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/Mpv/mpv808.htm Acesso em: 15 de junho 2021.
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[1] Professor Especialista, orientador do Trabalho de Curso em Direto do Centro Universitário Luterano de Manaus – CEULM/ULBRA/Manaus. E-mail: [email protected]
Graduada em Direito pelo Centro Universitário Luterano de Manaus – CEULM/ULBRA. Pós graduação em Direito Civil e Processo Civil - UNINORTE.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUSA, Michele Bruce de. Reforma trabalhista e o direito da mulher: o impacto da flexibilização das leis trabalhistas sobre as condições de trabalho da mulher Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 ago 2021, 04:53. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57101/reforma-trabalhista-e-o-direito-da-mulher-o-impacto-da-flexibilizao-das-leis-trabalhistas-sobre-as-condies-de-trabalho-da-mulher. Acesso em: 26 dez 2024.
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