NATÁLIA ELLEN LOURENÇO FERREIRA
(coautora)
FERNANDA PRATA MOREIRA RIBEIRO
(orientador)
Resumo: O presente trabalho visa demonstrar a possibilidade de imputar ao genitor que pratica a alienação parental, a obrigação de indenizar o prejudicado decorrente dessa conduta, no caso o genitor alienado, uma vez que esse sofre danos morais e até mesmo materiais. O dano ocorre em virtude da alienação parental acabar com a convivência familiar do genitor alienado e a criança e consequentemente, acabar coma relação afetiva sadia entre eles, sendo assim lesionados vários direitos de dignidade da pessoa humana e personalidade da vítima. Para chegar a uma conclusão, o trabalho baseou-se no conceito de família, sua história, nos direitos que versam sobre a guarda compartilhada, na identificação e prática da alienação parental e por fim no dano moral. A partir daí, criou-se base, para defender a hipótese de responsabilizar o genitor alienante a indenizar o genitor alienado, como forma de combater tal comportamento.
Palavras-chave: Alienação Parental. Dane. Dano Moral. Família. Responsabilidade Civil.
ABSTRACT: The present work aims to demonstrate the possibility of imputing to the parent who practices the parental alienation, the obligation to indemnify the injured person resulting from this conduct, in this case the alienated parent, since he suffers moral and even material damages. The damage occurs due to parental alienation ending the family life of the alienated parent and the child and, consequently, ending the healthy affective relationship between them, thus harming several human dignity rights and the victim's personality. To reach a conclusion, the work was based on the concept of family, its history, on the rights related to shared custody, on the identification and practice of parental alienation and, finally, on moral damage. From there, a basis was created to defend the hypothesis of making the alienating parent responsible for indemnifying the alienated parent, as a way to combat such conduct.
Keywords: Parental Alienation. Damn. Moral damage. Family. Civil responsability.
O presente trabalho surgiu do interesse de se aprofundar sobre o tema “alienação parental” trazendo seu conceito, identificação e suas consequências na vida do alienado, alienador e genitor prejudicado. Além disso, serão analisadas as características e quais são as formas de sua ocorrência, bem como as consequências trágicas ocasionadas às crianças e aos adolescentes da entidade familiar respectiva, relacionando os fatos com a Lei nº 12.318 de 26 agosto de 2010, que busca extinguir a existência de tal prática.
Vale ressaltar que o tema da alienação parental se manifesta de várias formas, sendo algumas delas por pais, avós, pessoas com filhos, jovens sob seu poder, tutela ou supervisão. O tema está cada vez mais frequente e ao longo dos anos vem sendo discutido por juristas. Somente no ano de 2010 se tornou lei na intenção de coibir tal prática, sendo já tratado na área da saúde, bem como pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069 de 13 de julho de 1990). Aliado à prática percebe-se que cabe dano moral ao sujeito passivo da relação de alienação parental.
Dentre as inúmeras discussões sobre os interesses familiares, destaca-se o dano moral, devido à incerteza e imprecisão na aplicação dos conceitos relacionados ao assunto.
Este artigo tem como objetivo analisar o dano moral nas relações familiares, em especial o dano moral relacionado ao fenômeno da alienação parental.
A responsabilidade civil por violação de vínculo familiar é polêmica na teoria e na jurisprudência, além de ser de difícil obtenção. Portanto, o dano mental inerente a essa relação está relacionado à violação da dignidade da pessoa que é sujeito do ente familiar.
2 CONCEITO E HISTÓRIA DE FAMÍLIA
De acordo com o dicionário Aurélio, família é o conjunto de pessoas que possuem parentesco próximo, grupo de pessoas que têm a mesma procedência, grupo de pessoas que vivem na mesma casa e outros inúmeros conceitos. Para o Direito, Maria Helena Diniz (2007, p. 9) fala sobre a família em sentido amplo, sendo pessoas ligadas por consanguinidade, afinidade, e inclui estranhos (no caso da adoção). Já no sentido restrito, fala sobre pessoas ligadas por laços matrimoniais (através do casamento) e por filiação, ou seja, por prole ou por cônjuges.
Assim entende-se que, família é uma unidade social, unida por laços de ancestralidade em comum, ou unidas por laços afetivos construídos pelas pessoas envolvidas na relação.
Para se compreender a família no contexto da história do Brasil, é necessária uma visão ampla concernente à questão socioeconômica e subjetiva que atravessam a mesma ao longo da história. Deve-se considerar os aspectos culturais, políticos e sociais, relevando a heterogeneidade da família, já que esta é composta de sentimentos e valores.
Neste sentido, aponta-se a história da família através de Airés (1978), que em sua obra denominada História Social da Criança e da Família analisa a iconografia, concluindo que o sentimento da família era desconhecido da Idade Média e nasceu no século XV-XVI. No século XVI as representações das imagens descrevem o senhor da terra, sua mulher e seus filhos, participam do trabalho e vivem sob a proteção financeira, social e política do pai.
Outrora, a família tinha um papel exclusivamente econômico. Com muitos integrantes, principalmente filhos, a família se preocupava com o patrimônio, os filhos geravam riquezas sob o comando de um patriarca além da grande influência exercida pela Igreja.
Na segunda metade do século XX chega com diversas mudanças no contexto social e econômico e novidades tecnológicas no Brasil e no mundo. Essas mudanças provocam impactos diretamente no núcleo familiar, fazendo emergir novos arranjos familiares.
Com o passar dos anos os preceitos altamente rigorosos no que se refere a família se esfriaram dando lugar a novos conceitos e modos de se constituir a entidade familiar. As mulheres assumiram papel ativo na sociedade, a partir de revoluções e conquistas de direitos, virando assim, provedoras do lar equiparando-se aos seus parceiros, deixando o papel secundário de submissão e criação da prole exclusivamente.
Deste modo, surgiram os diversos moldes familiares existentes na atualidade. Depois da Constituição Federal de 1988, foram admitidos outros modelos de família, os quais, com devida proteção legal, passaram a ter seus direitos resguardados pela lei. Nos dias atuais, além da família matrimonial, existem a família informal, a família mono parental, a pluriparental, anaparental, a família formada apenas por irmãos, a família simultânea, a eudemonista, a família homo afetiva, a homo parental e diversos outros modelos.
A família contemporânea, tem como fundamentos a solidariedade, a comunhão dos interesses de vida e a cooperação, sistema no qual todos os elementos são interdependes e interligados. Isso quer dizer que, tudo que acontece com um membro do núcleo familiar afeta os demais (MADALENO; MADALENO, 2014, p. 18).
3 DIREITO A CERCA DA GUARDA COMPARTILHADA- LEI 13.058/ 2014
Com a criação de novos modelos familiares, tem-se também a mudança em relação à criação da prole. Quando se dá o rompimento familiar por parte dos pais (divórcio), as funções paternas e maternas deixam de ser exercidas em conjunto e passam a ser exercidas separadamente. Nos dias atuais vive-se em moldes variados de família e para ambos os genitores terem o direito de criar seus filhos foi criado o dispositivo da guarda compartilhada, disposto do artigo 1.584, inciso II, parágrafo 2º, do Código Civil de 2002, que diz o seguinte:
Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser:
II – decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe.
§ 2º Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada.
Dessa forma, o poder familiar pode ser exercido por ambos os genitores de acordo com a premissa da guarda compartilhada sob a unilateral. O intuito desse dispositivo é o bem-estar da criança e do adolescente, uma vez que ele já sofre com a separação dos pais. O dispositivo legal permite a aproximação das crianças para ambos os pais.
O consenso é sempre desejável em caso de guarda compartilhada, uma vez que a separação acontece por causa do afastamento do casal. Como o próprio nome diz, a guarda compartilhada é uma forma de ambos os genitores decidirem sobre a vida da criança ou adolescente de forma igual, não sendo levado em consideração o tempo que o filho menor passa com cada genitor. Dessa forma, mesmo com o fim da sociedade conjugal, os genitores em conjunto, podem tomar decisões em relação à vida do menor.
Na guarda compartilhada, ambos os genitores podem se envolver não só nas decisões, mas no desenvolvimento e crescimento dos filhos, dividindo responsabilidades. Não quer dizer que se divide a posse física do menor, mas as responsabilidades sobre eles. Se dispensa nesse dispositivo a fixação de horários de visita, mas para organizar melhor a vida do menor, os genitores estipulam horários e períodos para cada um deles. Mesmo que na ausência de consenso quanto à guarda compartilhada, o juiz poderá fixá-la de modo que visa proteger o bem-estar físico e psicológico da prole.
4 A PRÁTICA DA ALIENAÇÃO PARENTAL NA VIDA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
A síndrome da alienação parental (SAP)[1] foi designada por Richard Gardner como a situação em que um dos genitores induz a criança a romper os laços afetivos com o outro genitor, fato que geralmente é desencadeado após uma separação gerando danos profundos no filho comprometendo seu desenvolvimento sadio. Richard Gardner, fala como tal prática é devastadora na vida do menor alienado, baseado em seu estudo sobre psiquiatria infantil, feito na Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, em 1985, que informa:
A alienação é um transtorno pelo qual um progenitor transforma a consciência dos seus filhos mediante várias estratégias com o objetivo de impedir, ocultar e destruir os vínculos existentes com o outro progenitor, que surgi principalmente na disputa na guarda da criança. Processo patológico que Gardner dá o nome de síndrome de alienação parental [...]
Segundo Calçada (2014, p. 12), a alienação parental no Brasil surgiu no período patriarcal, a partir do modelo europeu trazido pelos portugueses, colonizadores, na forma de escravização de um sexo (no caso, o sexo feminino) sobre o outro. Assim vê-se o porquê da desigualdade entre sexos. A monogamia demonstra as desigualdades acentuadas e também as diferenças de posses de riquezas. Pode-se presenciar tal cenário na redação do art. 2º da Lei nº 12.318 de 2010, que impõe:
Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:
I- Realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;
II- Dificultar o exercício da autoridade parental;
III- Dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
IV- Dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;
V- Omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
VI- Apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;
VII- mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.
Define Gardner (2002):
A síndrome da alienação parental (SAP) é um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custódia de criança. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação. Resulta da combinação das instruções de um genitor o que faz a lavagem cerebral, programação, doutrinação e contribuições da própria criança para caluniar o genitor- alvo. Quando o abuso ou a negligência parental verdadeiras estão presentes, a animosidade da criança pode ser justificada, e assima explicação de Síndrome de Alienação Parental para a hostilidade da criança não é aplicável.[2]
Como esclarece o autor, do ponto de vista psicológico, que esta síndrome é uma forma de abuso emocional cometida por um dos pais contra a criança e, ainda, Gardner (2002) chama a atenção para:
Os profissionais de saúde mental, os advogados do direito de família e os juízes geralmente concordam em que temos visto, nos últimos anos, um transtorno no qual um genitor aliena a criança contra o outro genitor. Esse problema é especialmente comum no contexto de disputas de custódia de crianças, onde tal programação permite o genitor alienante a ganhar força no tribunal para alavancar seu pleito. Há uma controvérsia significativa, entretanto, a respeito do termo a ser utilizado para esse fenômeno. Em 1985 introduzi o termo Síndrome de Alienação Parental para descrever esse fenômeno.[3]
Segundo o entendimento de Gardner (2002):
A SAP é uma das mais puras síndromes em psiquiatria, em especial de moderada grave, caso em que maior parte, senão de todos os sintomas se manifestam. Embora a SAP pode ser uma síndrome, é muito cedo para aplicar o rótulo, que só deve ser utilizado após a aceitação generalizada. Tais críticos não estão sendo familiarizado com a sequência utilizada em psiquiatria e medicina em geral sobre o termo síndrome.[4]
A Síndrome da Alienação Parental é considerada a síndrome como uma condição mental em que a criança, cujos pais estão envolvidos em conflito de divórcio, tornando- se fortemente ligada a um dos pais, e rejeita uma relação com o outro progenitor, sem justificativa legítima. Em seu livro editado em 2010 ele embasa a recomendação para a inclusão da Síndrome de Alienação Parental no DSM-V e CID 11, manual e código de classificação de doenças mentais.
O fenômeno que consiste na caracterização em que um genitor usa seu filho contra o outro genitor, em grande parte dos casos refere-se à mãe detentora da guarda do filho menor. Trata-se de uma verdadeira tortura psicológica para a criança, uma vez que se vê impedida de manter o relacionamento com quem tanto ama. Com o passar do tempo, a situação é agravada através da programação lenta e reiterada do alienante, de modo que o outro genitor tende a se afastar.
Entende-se que tendo em vista o casuísmo das situações que levam a identificação da síndrome de alienação parental, a melhor forma de reconhecê-las encontra-se no padrão de conduta do genitor alienante, o qual se mostra caracterizado quando este, demonstra algumas atitudes como exemplo: denegre a imagem da pessoa do ouro genitor, não comunica ao outro genitor fatos importantes relacionados a vida dos filhos (rendimento escolar, agendamento de consultas médicas, ocorrência de doença), toma decisões importantes sobre a vida dos filhos, sem prévia consulta ao outro cônjuge, viaja e deixa os filhos com terceiros sem comunicar o outro genitor, apresenta um (a) novo (a) companheiro (a) à criança como sendo novo pai ou mãe, critica a competência profissional e a situação financeira do ex-cônjuge, obriga a criança a optar entre mãe ou pai, ameaçando-a das consequências, caso a escolha recaia sobre o outro genitor, dentre outras situações.
Como já visto, a alienação parental é crime descrito na Lei 12.318/2010, e fere os direitos da Criança e do Adolescente elencados no ECA- Lei Federal nº8.069, de junho de 1990. No artigo 3º desse diploma legal diz que:
Art. 3º A criança e ao adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. (ECA,1990, p. 12)
Nota-se que a prática da alienação parental causa um retardo na vida da criança e do adolescente, atraso no desenvolvimento psíquico, além, de consequências desastrosas, como medo, insegurança, depressão, prejudicando o seu futuro no âmbito pessoal, profissional e emocional, sem mencionar a infração dos direitos elencados no artigo 4º do Eca. Tal prática viola os direitos da dignidade e da personalidade das pessoas elencadas no artigo 227 da Constituição Federal e no artigo 4º da Lei 8069/90.
A responsabilidade civil se dá quando há um descumprimento obrigacional, pelo não cumprimento de uma regra ou determinação legal, ou por desobedecer a um preceito legal que norteia a sociedade e a vida. Para direcionar esse princípio, tem-se a responsabilidade civil contratual ou extracontratual. No âmbito do Direito de Família, há de se falar em responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana, mas a aplicação é extremamente intrínseca.
Para ocorrer a responsabilização civil, deve se passar por um crivo. Para saber se há ou não responsabilidade deve-se observar três elementos básicos, são eles: o ato ilícito, o dano e o nexo de causalidade. O ato ilícito é quando, por ação ou omissão, negligência ou imprudência que viola direito de outrem, tal como descreve o artigo 186 do Código Civil Brasileiro[5]. O dano é uma lesão causada ao bem jurídico protegido por lei ou preceitos legais que causem prejuízo para o detentor do direito. O nexo de causalidade é o que vincula o dano e o ato ilícito.
A responsabilidade referente a danos imateriais é uma nova tipificação no ordenamento jurídico, ganhando forma legal no artigo 5º, incisos V e X da Constituição Federal de 1988[6]. Flávio Tartuce conceitua danos morais como “lesão a direitos de personalidade, sendo essa a visão que prevalece na doutrina brasileira” (TARTUCE, 2015, p.396).
O dano moral é aquilo que atinge a pessoa do ofendido, sem lesar seu patrimônio. “É lesão de bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, a intimidade, a imagem, o bom nome etc., como se infere nos arts. 1º, III, e 5º, V e X, da Constituição Federal, e que acarreta ao lesado dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação” (GONÇALVES, 2011, p. 377).
Como se trata de danos morais, não se pode mensurar, nem ao menos fazer um montante monetário para tentar repará-los, mas entende-se que, o valor pecuniário serve para reparar eventuais danos que venham surgir a partir da prática do ato ilícito. Sendo assim, a reparação vem como forma de indenização, a fim de tentar amenizar e ajudar a pessoa prejudicada a suportar o dano sofrido. Pode-se dizer, que a conversão do dano moral em valor monetário não é uma reparação ao ofendido, mas sim uma punição para o ofensor, não podendo ultrapassar um valor que prejudique a sua subsistência, ou seja, afete de forma significativa sua forma de vida. Serve para que tal ato ilícito não seja repetido por outras pessoas, nem que sua prática seja habitual.
Maria Helena Diniz entende que:
[...] a reparação do dano moral não tem apenas a natureza penal, visto que envolve uma satisfação à vítima, representando uma compensação ante a impossibilidade de se estabelecer perfeita equivalência entre dano e o ressarcimento. A reparação pecuniária do dano moral é um misto de pena e de satisfação compensatória. Não se pode negar sua função: a) penal, constituindo uma sanção imposta ao ofensor, visando a diminuição de seu patrimônio, pela indenização paga ao ofendido, visto que o bem jurídico da pessoa – integridade física, moral e intelectual – não poderá ser violado impunemente, subtraindo-se o seu ofensor às consequências de seu ato por não serem reparáveis; e b) satisfatória ou compensatória, pois como dano moral constitui um menoscabo a interesses jurídicos extrapatrimoniais, provocando sentimentos que não têm preço, a reparação pecuniária visa proporcionar ao prejudicado uma satisfação que atenua a ofensa causada. (Diniz, 2011, p.125)
Ante ao exposto, deve-se observar que o pagamento do dano moral em dinheiro é caracterizado como compensação, ou até mesmo uma satisfação, uma vez que, o pagamento em pecúnia serve para amenizar os danos sofridos pelo ofendido, diminuindo a dor e amargura que outrora lhe fora causado.
Deve-se esclarecer que, para a configuração do dano moral deve-se provar a existência de prejuízo, seja ele material ou imaterial, como entende o Superior Tribunal Federal. Nesse caso, basta provar que houve a violação de direito, que viole a dignidade da pessoa humana lhe causando prejuízo, além de dor e sofrimento ou que viole direito fundamental.
5.1 Do Dano Moral na Alienação Parental
Para entender melhor o cabimento de dano moral na alienação parental deve-se salientar sobre a responsabilidade civil nas relações de família. Este conceito surgiu quando a separação era prevista no Código Civil Brasileiro, onde se elencavam os deveres de cada cônjuge e, uma vez descumpridos, geravam dano a outra parte, resultando na separação. Logo, como forma de reparação se pensava em danos morais, mas logo foi retirada do ordenamento jurídico pela Emenda Constitucional 66.
O dispositivo foi extinto, sendo válido apenas o divórcio, sem a necessidade da apresentação dos motivos para o casal requerê-lo. Assim, uma pequena parte da doutrina acredita que se deve atribuir responsabilidade civil extracontratual nas relações de família como em todas as outras áreas do Direito, ou seja, a possibilidade de indenização por danos morais.
Tal premissa vem ganhando força nos últimos anos, defendendo que, é certamente aplicável o instituto da responsabilidade civil geral na seara do Direito de Família, dizendo que a obrigação de indenizar descrita no artigo 186[7] culminado com o artigo 927[8], ambos do Código Civil Brasileiro, deve ser aplicada sempre que seus pressupostos forem comprovados e existentes, por ter caráter genérico.
Dessa forma, se um membro da família causar dano ao outro, onde exista o nexo de causalidade e comprovados os pressupostos, será encontrado o ato ilícito descrito no artigo 186 do CC/02 e aplicada a responsabilidade civil subjetiva, como em qualquer outra relação.
Nos últimos anos vem crescendo os processos nos quais se pedem responsabilização civil no que tange a relações familiares, um exemplo claro disso são os diversos litígios referentes ao abandono afetivo. No que diz respeito a alienação parental acredita-se no cabimento do dano moral tanto para o genitor prejudicado, quanto para o menor alienado. A prática da alienação parental viola gravemente um direito fundamental, a dignidade da pessoa humana, visto que cabe sim o dano moral ao genitor alienado. O genitor alienador não tem o menor pudor ou sentimento de culpa quando, agindo de má-fé, calunia a imagem do genitor não guardião afim de extravasar sua raiva e angústia.
A lei nº 12.318/10 diz que nesses casos deve-se preservar a criança, a retirando do convívio com o alienador, mas nada diz referente ao genitor alienado que teve sua imagem maculada ante seu filho (a). Como já mencionado, os artigos 186 e 927 do CC/ 02 salientam que, quem causa dano a outrem tem o dever de indenizá-lo.
É perfeitamente cabível a indenização ao genitor prejudicado, uma vez que sua honra foi desvirtuada perante a sociedade, e principalmente perante o alienado. O filho acaba por trazer consigo uma péssima imagem do genitor não guardião, cultivada diariamente pelo genitor guardião.
Desta forma, o genitor alienado vem anos sofrendo constrangimentos referentes às falsas afirmações feitas pela outra parte, ferindo, assim, sua dignidade. O dano moral em favor do genitor alienado configura-se a partir do momento em que se é percebida a prática da alienação, uma vez que sua relação com o filho (a) fica extremamente abalada e, muitas vezes, as consequências para ambos são irreversíveis. O genitor não guardião se torna alvo de diversas acusações infundadas, tornando o afastamento do filho (a) inevitável e, as vezes, irreversível.
Tanto a maternidade quanto a paternidade são direitos garantidos pela legislação brasileira, como também são um dever. Quando ocorre o impedimento na participação ativa na vida do menor alienado se configura um ato ilícito, sendo passível de indenização. Os danos morais recaem exatamente sobre a falta de convívio com o filho (a), a sensação de ser pouco, de não bastar, de mágoa e tristeza, são sentimentos que devem ser indenizados.
A indenização de danos morais por alienação parental deve ser vista como forma de coibição de tal prática, além de responsabilizar e punir o genitor guardião pelos danos degradantes que ele causou. Não se pode dizer que, serve para reparar os danos da vida do genitor prejudicado, mas tenta amenizar os prejuízos a ele causados, como forma de compensação. As falsas afirmações do alienador funcionam como nexo de causalidade para pleitear a indenização por danos morais.
Ante todo o exposto, de forma descritiva que consta nos capítulos anteriores, pode-se confirmar que, se todos os requisitos da responsabilidade civil forem preenchidos, aquele que pratica a alienação parental em desfavor do genitor alienado deve ser responsabilizado civilmente, sendo assim, obrigado ao pagamento de indenização na forma de danos morais, como forma de coibir tal prática
Ficou demonstrado que, diante da proteção constitucional no que tange ao direito privado, observa-se que o Direito de Família é amplamente abrangido na Carta Magna, tendo o Estado sua tutela expandida no âmbito familiar, com a intenção de proteger a família.
Também foi mostrado que, vários direitos devem ser respeitados e se encaixam em vários âmbitos jurídicos, como a dignidade da pessoa humana, a personalidade, dentro outros que, quando violados mesmo que no que diz respeito a relações de família, devem ser indenizados.
O dano moral além de causar dor, sofrimento e constrangimento ao prejudicado, ainda fere direitos fundamentais, como a dignidade da pessoa humana, sendo ofendida quando a outra parte profere mentiras a seu respeito, prejudicando sua imagem e relacionamento com a sociedade, sendo sua reparação prevista do art. 5º, incisos V e X da Constituição Federal de 1988.
Por não se tratar de dano concreto, o dano moral é difícil de ser provado e mensurado. Conforme a doutrina, caso seja preenchidos todos os requisitos e provada a sua existência, deve a autoridade competente estipular um valor a título de indenização de acordo com o dano sofrido.
Portanto, é notório que o genitor alienado nesse caso, faça jus ao recebimento de indenização pelos danos morais praticados pelo genitor alienante, tendo em vista que tal prática é ato ilícito e se encaixa nos requisitos para a responsabilidade civil, tornando assim um método jurídico e pedagógico para combater a alienação parental.
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[1] SAP – Sigla utilizada para reconhecer a Síndrome de Alienação Parental.
[2] GARDNER, R. A. Parental alienation syndrome vs. parental alienation: Which diagnosis should be used in child-custody litigation? The American Journal of Family Therapy, 30(2):101-123.
[3] GARDNER, op. cit., p. 104.
[4] GARDNER, op. cit., p. 107.
[5] Art.186 do Código Civil de 2002: Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
[6] Art. 5º da CF/88: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
[7] Código Civil Brasileiro de 2002, op. cit.
[8] Art. 927 do Código Civil de 2002: Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Graduanda do Curso de Direito do Centro Universitário UNA.
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