O cerne da controvérsia versa acerca da transmissão automática ou não de cláusula arbitral, prevista em contrato de transporte marítimo, às seguradoras sub-rogadas, em caso de ação regressiva de ressarcimento.
A sub-rogação prevista no art. 786 do Código Civil (CC) - que estabelece que, "paga a indenização, o segurador sub-roga-se, nos limites do valor respectivo, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano" - possui natureza jurídica de sub-rogação legal, pois independe de previsão contratual, à luz do disposto no art. 346, III, do CC. A quase totalidade dos contratos de seguro de dano repete a referida disposição legal, o que, por si só, não transforma a natureza jurídica da sub-rogação legal em convencional.
Com efeito, a sub-rogação legal não implica titularização da posição contratual do segurado pelo segurador, pois, apesar de relacionados, o contrato de seguro e o contrato segurado são independentes, autônomos e, mais, referem-se a obrigações distintas, ainda que equivalentes no montante indenizatório. No contrato objeto de seguro garantia há a obrigação principal inadimplida e demais pactos acessórios decorrentes da avença, no contrato de seguro há tão somente um interesse protegido: o risco de descumprimento do contrato assegurado, que o segurador assume em troca dos prêmios pagos e do poder de buscar o ressarcimento pela apólice indenizada.
Deve ser afastada a submissão à cláusula arbitral como efeito direto e automático da sub-rogação legal, haja vista ser possível a existência de sub-rogação convencional ou, ao menos, a consideração da referida cláusula no risco a ser garantido nos casos de seguro garantia, ainda que de forma implícita. A diferenciação proposta mostra-se essencial em razão da necessidade de a submissão de determinado conflito à jurisdição arbitral ser fruto da autonomia das partes, nos termos do art. 3° da Lei n. 9.307/96, bem como da ineficácia de "qualquer ato do segurado que diminua ou extinga, em prejuízo do segurador, os direitos a que se refere este artigo".
Entendimento diverso possibilitaria obrigar a seguradora a se submeter ao compromisso arbitral decorrente de cláusula compromissória celebrada posteriormente à contratação da apólice securitária, não considerada no cálculo do risco predeterminado (arts. 757, caput, 759, 765 e 766 do Código Civil).
Por outro lado, notadamente nos casos de seguro garantia não há como se afastar o conhecimento prévio da seguradora da existência de cláusula compromissória no contrato de transporte marítimo de cargas objeto da apólice securitária. Como consequência da sub-rogação legal, há transferência de "todos os direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo, em relação à dívida, contra o devedor principal e os fiadores", a teor do disposto no art. 349 do CC.
Trata-se, portanto, de instituto de natureza mista, material e processual, dado que são transferidas também "as ações que competiriam ao segurado". Desse modo, tendo sido submetido o contrato previamente à seguradora, a fim de que analisasse os riscos provenientes do contrato garantido, entre os quais foi ou deveria ter sido considerada a cláusula compromissória, inafastável o entendimento de que tal cláusula deve ser considerara como um dos elementos essenciais do interesse a ser garantido e do risco predeterminado (arts. 757, caput, e 759 do CC).
A previsão do art. 786, § 2°, do CC, de que "é ineficaz qualquer ato do segurado que diminua ou extinga, em prejuízo do segurador, os direitos a que se refere este artigo", refere-se aos atos praticados posteriormente à celebração do contrato de seguro e/ou sem o conhecimento da seguradora, justamente em virtude da exigência legal de ciência prévia para se estipular os riscos predeterminados garantidos. Não há como incidir a mencionada regra quando a disposição contratual integra a unidade do risco objeto da própria apólice securitária, dado que elemento objetivo a ser considerado nos cálculos atuariais efetuados pela seguradora e objeto da autonomia das partes.
Nessa senda, em razão da presunção de paridade e simetria entre as partes contratantes, bem como à luz do princípio da intervenção mínima e da excepcionalidade da revisão contratual, nos termos dos arts. 421, caput e parágrafo único, e 421-A, aquiescendo a seguradora em garantir o contrato de transporte marítimo internacional, com previsão originária de cláusula compromissória, igualmente não há que se falar em violação à voluntariedade prevista na Lei de Arbitragem.
Afastar a sub-rogação na cláusula arbitral, previamente exposta à aprovação da seguradora e de conhecimento de todos, implicaria submeter as partes do contrato de transporte marítimo ao arbítrio da contraparte na livre escolha da jurisdição aplicável à avença, pois dependente única e exclusivamente da seguradora escolhida pelo consignatário da carga.
Dessa forma, a despeito de a sub-rogação legal em favor da seguradora não importar transmissão automática de cláusula compromissória, a ciência prévia da seguradora a respeito de sua existência no contrato objeto de seguro garantia resulta na submissão à jurisdição arbitral.
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