1.INTRODUÇÃO
O planejamento sucessório é um tema que infelizmente não recebe a devida atenção.
Pode fazer parte do imaginário nacional não querer lidar com assuntos que estejam ligados à morte, todavia, como é sabido e ensinado: “A morte é a única certeza em vida”.
Por ser “a única certeza” o planejamento sucessório deveria ser tratado como prioridade, para minimizar os custos e principalmente o desgaste emocional no pós morte e evitar rusgas entre parentes.
Desta maneira é sempre recomendável fazer um planejamento familiar e preservar aquilo que foi duramente construído em vida para que o legado seja mantido conforme a vontade daquele que não está mais presente.
A Autora Daniele Teixeira define ‘planejamento sucessório’ da seguinte maneira:
“o instrumento jurídico que permite a adoção de uma estratégia voltada
para a transferência eficaz e eficiente do patrimônio de uma pessoa após a sua morte”[1]
Não há de se pensar apenas no bônus, mas principalmente no ônus também. Um planejamento sucessório feito de maneira assertiva é importante para quitar e planejar as dívidas das despesas decorrentes da transferência dos bens após a morte. Ora, nem sempre aquele que irá receber o imóvel tem as condições financeiras para conseguir quitar todas as despesas de cartório. Desta maneira o imóvel fica “amarrado”, como se diz popularmente sobre um imóvel que tem ainda débitos a quitar e não pode ser registrado formalmente.
Como se vê, esses são pontos importantes que demonstram que planejamento sucessório é o meio mais eficaz, menos burocrático e que chega o mais próximo para atender a vontade daquele que um dia terá sua morte decretada (como todas as pessoas).
2. A POLÊMICA DO ART. 426 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 EM CONFLITO COM O PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO
O artigo 426 do Código Civil de 2002 é um dos mais famosos da literatura jurídica, chegando a ser conhecido até na literatura não especializada.
O artigo 426 traz o seguinte conteúdo:
Art. 426. Não pode ser objeto de contratos a herança de pessoa viva.
A Autora Maria Helena Diniz, em seu Código Civil anotado[2] explana o Código de maneira mais detalhada:
Proibição de Pacto Sucessório. Ter-se-á impossibilidade legal ou jurídica, gerando ineficácia do contrato, se seu objeto estiver vedado pelo direito, como estipulação de pacto sucessório, contrariando a norma de que não pode ser objeto de contrato de herança de pessoa viva, devido à presunção de que possa eventualmente haver votum captandae mortis, salvo, segundo alguns autores, nos casos de doações antenupciais entre os cônjuges, dispondo a respeito da recíproca e futura sucessão (CC,art.1.668,IV, 1.655 e 546), e na hipótese de partilha de bens feita pelo ascendente, por ato inter vivos, aos descendentes (CC, art. 2.018;RF,111:292)
Desta maneira, por mais que o art.426 busque proteger o patrimônio da pessoa viva, para que seus bens não sejam objeto de discussão, por outro lado existem conflitos.
Esses conflitos podem se dar em alguns casos, como a dificuldade na organização Patrimonial, visto que esse artigo impede que os herdeiros destinem antecipadamente a destinação de seus bens, ou que até eles mesmos possam resguardar os bens.
Outro conflito se trata da incerteza e disputa entre os herdeiros. Vale lembrar que o pior momento para discutir sobre bens é justamente imediatamente após a morte do proprietário dos bens. Desta maneira decisões podem ser tomadas não à luz da racionalidade, mas à base da emoção – Ou seja, é um caso clássico de famílias que acabam criando infinitas rusgas após a morte do legador. Isso tudo seria evitado com um planejamento sucessório bem feito.
Aplicando a norma nos casos práticos jurisprudenciais, tem-se entendido pela nulidade de transações que digam a respeito a heranças não recebidas:
“Acórdão recorrido que manteve a nulidade de cessão de direitos hereditários em que os cessionários dispuseram de direitos a serem futuramente herdados, expondo motivadamente as razões pelas quais entendeu que o negócio jurídico em questão não dizia respeito a adiantamento de legítima, e sim de vedada transação envolvendo herança de pessoa viva. (...). Embora se admita a cessão de direitos hereditários, esta pressupõe a condição de herdeiro para que possa ser efetivada. A disposição de herança, seja sob a forma de cessão dos direitos hereditários ou de renúncia, pressupõe a abertura da sucessão, sendo vedada a transação sobre herança de pessoa viva” (STJ, Ag. Int. no REsp 1341825/SC, 4.ª Turma, Rel. Min. Raul Araújo, j. 15.12.2016, DJe 10.02.2017).
Ou seja, o art. 426 é de extrema importante, todavia há de se considerar que em alguns casos ele acaba por limitar em alguns casos práticos questões familiares, que estão inclusive se boa-fé. Por mais que o artigo proteja da má-fé de maneira absolutamente correta, observa-se que a boa fé não foi contemplada, apenas no caos de planejamento sucessório do próprio legador, algo que limita a ferramenta.
3.CAPACIDADE TESTAMENTÁRIA – DIREITO CIVIL COMPARADO – IDADE CIVIL
A capacidade testamentária é um pré-requisito para determinar as condições necessárias para que alguém possa, de acordo com a lei, dispor de seu patrimônio.
A lei brasileira determina em seu art. 1860 do Código Civil:
“além dos incapazes, não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não tiverem pleno discernimento.
Parágrafo único. Podem testar os maiores de dezesseis anos”.
Desta maneira o código é expresso na possibilidade dos maiores capazes poderem testamentar, sendo incapazes os menores de 16 anos.
Ainda que a respectiva sucessão só se abra após a morte, passando o a idade de 16 anos, o testamento é nulo caso não observe o artigo 1860.
Observa-se ainda uma exceção a regra: Menor emancipado – “cuja capacidade plena foi atingida mediante a emancipação e dessa forma há de ser considerada a regra do art. 1.860 do Código Civil, segundo a qual as pessoas capazes podem testar”.
Como explica o professor Carlos Alberto Dabus Maluf[3]:
Em alguns países, como a Itália, a Holanda e a Argentina, a capacidade testamentária ativa começa aos 18 anos de idade; em outros países, como a Espanha, esta é de 14 anos.
4. TESTAMENTO VITAL
O testamento vital difere-se do testamento civil, posto que as deliberações contidas no testamento só passarão a valer após a morte do outorgante. O testamento vital tem outra finalidade e outro entendimento: Este tipo de testamento dipõe sobre a vontade do paciente nos momentos finais da vida – quais os tratamentos médicos que deseja e não deseja receber.
É de uma sensibilidade e humanidade plena a existência desse tipo de testamento, apesar de não tão difundido. Como explica o professor Carlos Alberto Albus Maluf[4]:
“Pode ainda conter: aceitação ou não da administração de certos medicamentos, aceitação ou não de certos procedimentos como entubamento ou reanimação, ou ainda nomear procurador para administrar seus bens enquanto estiver incapaz; pode dispor sobre o seu funeral, se vier a óbito; sobre a administração de cuidados paliativos, quando advier a terminalidade.
É válido ressaltar que é possível a responsabilização civil pelo descumprimento das disposições contidas no testamento vital”.
Embora não exista forma rígida, entende-se que o testamento vital deve seguir os preceitos do art. 1.876 do C.C.
O testamento vital foi muito difundido nos Estados Unidos, no sentido de elevar a autonomia da decisão daquele está pensando em sua morte, fazendo que sua vontade perdure.
Há de se observar que os Estados Unidos da América são a vanguarda neste tipo de testamento muito provavelmente não por uma escolha humanista e sensível sobre a vida, mas uma imposição do capital. Sabe-se que o sistema de saúde americano não é gratuito, como por exemplo o SUS brasileiro. Desta maneira, é grande o contingente de pessoas que muitas vezes, no final da vida prefere dispor de sua vida do que dilapidar seu patrimônio em caríssimos tratamentos médicos. Ou seja, cabe aqui uma forte reflexão sobre como testamento vital pode ser lido em diferentes países e como ele está intimamente ligado ao sistema público de saúde.
No cenário internacional, o testamento vital encontra regulamentação legal nos Estados Unidos, na Espanha, em Portugal, na Alemanha, na França, na Argentina, no Uruguai e no Japão.[5]
REFERÊNCIAS
DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado/ Maria Helena Diniz – 8. Ed. Atual de acordo com o novo código civil. (Lei n. 19.406, de 10-01-2002) – São Paulo: Saraiva, 2002
DADALTO, Luciana. Testamento vital. 4. ed. São Paulo: Editora Foco, 2018
MALUF, Carlos Alberto Dabus – Curso de Direito das Sucessões – 3 ed – São Paulo – Saraiva
TEIXEIRA, Daniele. Noções prévias do direito das sucessões: sociedade, funcionalização e planejamento sucessório. In: TEIXEIRA, Daniele Chaves (Coord.). Arquitetura do planejamento sucessório. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 35
https://www.migalhas.com.br/depeso/406733/o-que-e-um-planejamento-sucessorio-e-por-que-voce-deve-ter-um - Acesso em 05 de junho de 2024
https://koetz.digital/vantagens-da-sucessao-familiar-no-brasil-comparativo-com-a-argentina/ - Acesso em 05 de junho de 2024
[1] TEIXEIRA, Daniele. Noções prévias do direito das sucessões: sociedade, funcionalização e planejamento sucessório. In: TEIXEIRA, Daniele Chaves (Coord.). Arquitetura do planejamento sucessório. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 35
[2] DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado/ Maria Helena Diniz – 8. Ed. Atual de acordo com o novo código civil. (Lei n. 19.406, de 10-01-2002) – São Paulo: Saraiva, 2002. p.426
[3] MALUF, Carlos Alberto Dabus – Curso de Direito das Sucessões – 3 ed – São Paulo – Saraiva P.267
[4] MALUF, Carlos Alberto Dabus – Curso de Direito das Sucessões – 3 ed – São Paulo – Saraiva P.325
MESTRADO - ADVOGADO
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PACO, EDUARDO MEDEIROS DO. A importância do planejamento sucessório para a proteção do patrimônio familiar Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 maio 2025, 04:55. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/68472/a-importncia-do-planejamento-sucessrio-para-a-proteo-do-patrimnio-familiar. Acesso em: 02 maio 2025.
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