TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SAO PAULO
35a Câmara
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 1161017-0/8
Comarca de SÃO PAULO 18.V.CÍVEL P r o c e s s o 161188/03 - SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTICA REGISTRADO(A) SOB N° *01651693*
AGVTE MULTIPLIK MONTAGENS S/C LTDA.
AGVDO CONTÉM GUARULHOS RECURSOS HUMANOS LTDA
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os desembargadores desta turma julgadora da Seção de Direito Privado do Tribunal de Justiça, de conformidade com o relatório e o voto do relator, que ficam fazendo parte integrante deste julgado, nesta data, deram provimento ao recurso, por votação unânime.
Turma Julgadora da
RELATOR
2o JUIZ
3o JUIZ
Juiz Presidente
35a Câmara
DES. MANOEL JUSTINO BEZERRA FILHO
DES. CLOVIS CASTELO
DES. MELO BUENO
DES. JOSÉ MALERBI
Data do julgamento : 17/03/08
DES. MANO
Relator
BEZERRA FILHO
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 1.161.017-0/8
COMARCA : SÃO PAULO - 18Q VARA CÍVEL DO FORO CENTRAL
AGRAVANTE : MULTIPLIK MONTAGENS S/C LTDA
AGRAVADO : CONTÉM GUARULHOS RECURSOS HUMANOS LTDA
EMENTA: Desconsideração da personalidade jurídica - Sociedade limitada por quotas, "fechada" de fato - Dívidas remanescentes - Possibilidade de desconsideração - Inclusão dos sócios no pólo passivo da execução. - O "fechamento de fato" da sociedade empresária, com a cessação de suas atividades sem a correspondente baixa no registro do comércio, constitui atitude que pode permitir a aplicação da teoria da desconsideração. Age de forma lícita a sociedade empresária que faz a "baixa" regular de sua inscrição na Junta, cessando formalmente suas atividades; alternativamente, se não tiver condições de efetuar tal "baixa" (v.g., por ter dívidas em aberto), deve valer-se do art. 105 da Lei 11.101/05, a Lei de Recuperação e Falências, e requerer sua auto-falência, na qual explicitará as causas de sua derrocada, salvaguardando assim seu patrimônio pessoal ao comprovar a inexistência de atos ilícitos, ao demonstrar que a falência foi apenas resultado do natural risco da atividade empresarial. - Agravo provido, v.u. -
V O T O N° 4775
Trata-se de agravo (fls. 2/9) interposto ante a r. decisão (fls. 91 v, 96 v e 99 v) que, nos autos da ação regressiva de cobrança, em fase de cumprimento de sentença, indeferiu o pedido de desconsideração da personalidade jurídica da empresa executada, ora agravada.
Insurge-se o exeqüente agravante contra tal entendimento, alinhando as razões de seu inconformismo e aguardando o final provimento de seu recurso, para o fim de que a r. decisão seja reformada.
O recurso é tempestivo (fls. 2 e 92) e está corretamente instruído e preparado (fls. 100/102). Foi determinado o processamento no efeito devolutivo e dispensadas as contra-razoes, tendo em vista que a agravada é revel e não possui advogado constituído nos autos. A seguir, os autos vieram à mesa de julgamento.
É o relatório.
A r. decisão agravada (fls. 91 v) indeferiu o pedido de desconsideração da personalidade jurídica, afirmando o MM. Juiz "a quo" a ausência de prova de qualquer das circunstâncias do artigo 50 do Código Civil, autorizadoras de tal medida. A r. decisão também indeferiu a penhora sobre os bens dos sócios, por ilegitimidade passiva, indeferindo a expedição de ofício à Receita Federal por igual motivo.
Observe-se inicialmente que a empresa agravada não foi localizada para fins de citação postal por meio de "AR", havendo informação do Correio de que o destinatário "mudou-se" (fls. 36). Constata-se que a citação foi efetivada na pessoa de sua representante legal, em sua residência (fls. 45 v); todavia, o processo correu à revelia, sendo a ação regressiva de cobrança julgada procedente pela r. sentença de fls. 47. iniciada a fase de cumprimento de sentença, não foram localizados bens passíveis de penhora (fls. 71 e 84 v), o que deu ensejo ao pedido da agravante de penhora "on line" e de expedição de ofício à Receita Federal (fls. 52), com o fito de localizar bens da executada, ora agravada, no que não logrou êxito, tendo em vista que o Banco Pine S/A não forneceu informações sobre a existência de ativos financeiros em nome da agravada (fls. 86 e 90/91).
O que se verifica, pelo exame dos autos, é que a empresa agravada não foi localizada para citação, o único estabelecimento conhecido da sociedade empresária conhecido não foi localizado (fls. 23/25 e 36), devendo ser ressaltado que da ficha cadastral da Junta Comercial do Estado de São Paulo não consta o endereço da empresa agravada (fls. 99). Tais circunstâncias, aliadas ao fato de não terem sido localizados bens passíveis de penhora, são indicativas de que houve fechamento irregular da empresa, razão pela qual a desconsideração da personalidade jurídica deve ser aplicada, devendo a penhora recair sobre bens dos sócios.
Embora o artigo 50 do Código Civil tenha limitado a desconsideração da personalidade jurídica aos casos de abuso da personalidade por meio de desvio de finalidade ou confusão patrimonial, a jurisprudência tem caminhado, nesta nova senda, no sentido de entender que esta teoria pode ser aplicada se houver prática de ato irregular, por parte dos sócios. Por outro lado, embora o Código Civil, em seu artigo 1052, na esteira do secular entendimento consagrado a partir do surgimento da limitada em fins do Século XIX, continue afirmando que cada sócio tem responsabilidade restrita ao valor de suas quotas, ainda assim dispõe no artigo 1080 que as deliberações infringentes da lei tornam ilimitada a responsabilidade dos que expressamente as aprovaram.
Como é sabido, a criação da sociedade por quotas significou grande avanço do direito empresarial, permitindo que o empreendedor destacasse de seu patrimônio pessoal, o valor que se dispunha a arriscar na atividade comercial, de tal forma que mesmo que viesse a falir (uma das possibilidades de quem se arrisca na vida empresarial), ainda assim pudesse conservar bens suficientes para a manutenção própria e da família. No entanto, no transcurso do tempo, sócios começaram a aproveitar-se desta divisão do patrimônio para enriquecimento pessoal e miserabilização da sociedade empresária, em prejuízo dos credores sociais. Em decorrência, aos poucos foi se instalando, primeiro no exterior e agora, com bastante vigor, no direito pátrio, o instituto da desconsideração, para o caso de atos ilícitos infringentes da lei e, até da boa fé e correção que se exigem na atividade empresarial.
Dentro deste tipo de raciocínio, o "fechamento de fato" da sociedade empresária, com a cessação de suas atividades sem a correspondente baixa no registro do comércio, constitui atitude que pode permitir a aplicação da teoria da desconsideração. O entendimento correto é no sentido de que a sociedade empresária deve fazer a "baixa" regular de sua inscrição na Junta, cessando formalmente suas atividades; alternativamente, se não tiver condições de efetuar tal "baixa" (v.g., por ter dívidas em aberto), deve valer-se do art. 105 da Lei 11.101/05, a Lei de Recuperação e Falências, e requerer sua auto-falência, na qual explicitará as causas de sua derrocada, salvaguardando assim seu patrimônio pessoal ao comprovar a inexistência de atos ilícitos, ao demonstrar que a falência foi apenas resultado do natural risco da atividade empresarial.
Tendo porém optado por "fechar" de fato a sociedade empresária, deve ser aplicada a teoria da desconsideração, para que, citado para a execução ou tendo bens penhorados em cumprimento de sentença, tenha então o sócio oportunidade para demonstrar a correção do "fechamento".
A propósito, este tem sido o entendimento deste E. Tribunal:
Execução - Desconsideração da personalidade jurídica - Cabimento, eis que a sociedade empresária encerrou irregularmente suas atividades, fechou seu estabelecimento conhecido, não foram encontrados bens à
penhora e não houve depósito garantidor da execução. - Elementos que, examinados em seu conjunto, justificam a aplicação do princípio da desconsideração. - Desconsiderada a personalidade jurídica, os sócios serão incluídos no pólo passivo da execução, para que sejam formalmente citados, prosseguindo-se então na execução, abrindo-se possibilidade de defesa aos sócios, que poderão, querendo, discutir a própria desconsideração. - Agravo provido, v. u. (Ag. Inst. 7.119.203-9 -19" Câmara de Direito Privado do TJSP'- julgado em 23.1.07).
Desconsideração da personalidade jurídica - Empresa que encerra suas atividades e deixa o estabelecimento conhecido, durante o transcurso do feito - Bens não encontrados para garantir a execução - Mantido o despacho que manda desconsiderar a personalidade jurídica – Aplicação do art. 28 do Código de Defesa do Consumidor - Se a sociedade empresária é condenada a pagar indenização e, durante o andamento do feito, abandona o estabelecimento conhecido e não é encontrada no momento da citação para o princípio da execução, não sendo também encontrados bens para garantir a execução, deve o juiz desconsiderar a personalidade jurídica, para que a execução prossiga sobre bens pessoais dos sócios.
Agravo improvido. (Ag. Inst. N° 1.322.979-1 - 6aCâmara "B" do extinto Io
TACivil-SP-julgado em 16.11.04).
Enfim, tendo havido regular citação da agravada, constatando-se a situação de "fechamento de fato" da empresa com débitos em aberto, não tendo sido requerida sua auto-falência ou apresentada qualquer explicação nos autos sobre sua situação, impõe-se a aplicação da teoria da despersonalização da sociedade empresária, para que se prossiga contra os sócios, na tentativa de satisfação do credor. Anota-se que os sócios deverão ser incluídos no pólo passivo da execução, providenciando-se suas regulares citações.
Dá-se provimento ao recurso.
São Paulo (SP), 17 de março de 2008
BEZERRA FILHO
Relator
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Praça da Sé, s/nº - Cep 01018-010 São Paulo - Capital PABX: (11) 3117-2200
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PAULO, TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São. TJSP - Civil. Desconsideração da personalidade jurídica. Art. 50 do CC/2002. Sociedade limitada por quotas, "fechada" de fato. Dívidas remanescentes Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 nov 2010, 19:09. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Jurisprudências/22104/tjsp-civil-desconsiderao-da-personalidade-jurdica-art-50-do-cc-2002-sociedade-limitada-por-quotas-quot-fechada-quot-de-fato-dvidas-remanescentes. Acesso em: 23 nov 2024.
Por: TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Por: TRF3 - Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Por: TJSC - Tribunal de Justiça de Santa Catarina Brasil
Precisa estar logado para fazer comentários.