EMENTA: CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. DOCUMENTO NOVO JUNTADO EM SEDE RECURSAL. INADMISSIBILIDADE. INOVAÇÃO DE PEDIDO. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ. INOBSERVÂNCIA. CONTRATO DE SEGURO. RESTABELECIMENTO DO ESTADO ANTERIOR. RECURSO IMPROVIDO. 1. O conhecimento de documento novo, em sede recursal, é medida excepcional, só podendo ser admitida em face da impossibilidade de aquisição do mesmo em momento anterior à audiência de instrução e julgamento ou na presença de caso fortuito ou força maior. Precedentes. 2. É inadmissível a inovação de pedido na sede recursal, sob pena de supressão de instância. Precedentes. 3. O Código Civil, em seu art. 422, impõe às partes o dever de observar o princípio da boa-fé ao contratarem o qual deve ser estritamente observado enquanto vigir o contrato. 4. Igualmente esse princípio deve nortear os Contratos de Seguro (Art. 765 - CC), e conquanto frustradas as expectativas da Segurada/Recorrida de ver o contrato firmado vigorando pelo tempo estabelecido, por culpa exclusiva da recorrente, impõe, em homenagem ao princípio da boa-fé, o restabelecimento do estado no qual se encontrava antes de firmar a avença, fazendo-se necessária a devolução do que despendeu. 5. Recurso conhecido e improvido.
ACÓRDÃO
Acordam os Senhores Juízes da 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, NILSONI DE FREITAS CUSTÓDIO - Relatora, JESUÍNO APARECIDO RISSATO - Vogal, TEÓFILO RODRIGUES CAETANO NETO - Vogal, sob a presidência da Juíza NILSONI DE FREITAS CUSTÓDIO, em CONHECER. IMPROVER O RECURSO. UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília (DF), 15 de março de 2005.
NILSONI DE FREITAS CUSTÓDIO
Presidente – Relatora
RELATÓRIO
Trata-se de ação de conhecimento proposta por ADERITA ROSA GUALBERTO NOVAIS em desfavor de FAC – COOPERATIVA DO TRANSPORTE PÚBLICO ALTERNATIVO DO DISTRITO FEDERAL.
Alega a autora que firmou com a requerida contrato de seguro de veículo automotor, tendo realizado o pagamento de 03 (três) prestações de R$ 250,00 (duzentos e cinqüenta reais) totalizando R$ 750,00 (setecentos e cinqüenta reais). Assevera que a empresa ré encerrou o contrato por falta de lucro, contudo, se recusa a devolver o valor já pago. Requer o decreto de rescisão de contrato entabulado entre as partes com condenação da ré a pagar à autora a quantia de R$ 750,00 (setecentos e cinqüenta reais).
O MM. Juiz proferiu sentença (fls. 19/21), julgando procedente o pedido deduzido na inicial, para condenar a ré ao pagamento da importância de R$ 750,00 (setecentos e cinqüenta reais), corrigida monetariamente desde os respectivos vencimentos (fls. 12/14) e acrescida de juros moratórios a partir da citação.
Inconformada, a ré recorreu (fls. 23/27) alegando que a recorrida deixou de anexar aos autos o manual de condições gerais do acordo firmado, que dispõe em seu inciso 3.1 que o contrato de Assistência COOPERTRAN, poderá ser rescindido por iniciativa de qualquer uma das partes contratantes, em qualquer tempo, sendo que em ambas às hipóteses a COOPERTRAN reterá o custo do prêmio. Aduz que a recorrida tinha plena ciência dessa cláusula não podendo agora pretender direitos inexistentes, ademais o contrato vigorou por três meses, tendo a recorrida, nesse período, garantia do seguro. Assevera que a recorrida manifestou sua vontade em aderir ao Fundo de Assistência ao Cooperado com as condições ali estabelecidas e que o Fundo não vingou em face dos acidentes indenizados resultando em prejuízo. Por fim afirma que com a extinção da FAC cessaram as obrigações das partes, bem como os deveres, segundo cláusula estipulada. Requer reforma do julgado para isentar a recorrente do pagamento das parcelas do contrato firmado.
Devidamente intimado, a recorrida apresentou suas contra-razões as fls. 36/41.
É o relatório.
VOTOS
A Senhora Juíza NILSONI DE FREITAS CUSTÓDIO – Relatora
Conheço do recurso eis que presentes os pressupostos de sua admissibilidade.
Cuida-se de ação de conhecimento proposta por ADERITA ROSA GUALBERTO NOVAIS em desfavor da FAC – COOPERTRAN, visando decreto de rescisão de contrato entabulado entre as partes com condenação do réu a pagar à requerente a quantia de R$ 750,00 (setecentos e cinqüenta reais), cujo pedido foi julgado procedente para condenar a ré ao da importância de R$ 750,00 (setecentos e cinqüenta reais),corrigida monetariamente desde os respectivos vencimentos (fls. 12/14) e acrescida de juros moratórios a partir da citação.
Inconformada, a ré recorreu, alegando, em síntese que a recorrida deixou de anexar aos autos o manual de condições gerais do acordo firmado, tendo ela plena ciência da cláusula 3.1 que afirma que o contrato poderá ser rescindido por iniciativa de qualquer uma das partes contratantes, em qualquer tempo, com retenção do prêmio pela seguradora, e ainda, que o contrato vigorou por três meses, tendo a recorrida nesse período, garantia de seguro, além do que o Fundo não vingou em face dos acidentes indenizados e que com a extinção da FAC cessaram as obrigações das partes, bem como os deveres, segundo cláusula estipulada.
Anoto, a princípio, que o art. 33 da Lei dos Juizados Especiais fixa, peremptoriamente, a audiência de instrução e julgamento como sendo o momento processual adequado para produção de provas. Assim, a juntada de novo documento, em sede recursal, é medida excepcional, devendo ficar plenamente demonstrada a aquisição do documento, somente, após a audiência de instrução e julgamento ou a ocorrência de caso fortuito ou força maior que impedisse a recorrente ou o recorrido de promovê-la no momento processual pertinente, sob pena de afronta aos princípios da celeridade e da economia processual, insertos no art. 2º, da Lei nº 9.099/95.
Veja-se, a propósito, as seguintes ementas:
“PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. DOCUMENTO JUNTADO APÓS A SENTENÇA. REPERCUSSÃO. 1. A produção de prova após a sentença, sem que haja a devida justificativa, escorada em motivo de caso fortuito ou de força maior, não pode ser admitida, sob pena de subverter-se o procedimento e premiar-se quem não obedeceu às suas regras com a possibilidade de surpreender o adversário, não lhe permitindo o contraditório. 2. Cumpre ao juízo ad quem se limitar ao que possuía o julgador a quo à época da decisão hostilizada. O elemento novo merece ser desconsiderado, porquanto inviável proceder-se a uma instrução em sede recursal. Apelo improvido. Maioria.”
“SEGURO DE RENDA MENSAL TEMPORÁRIA POR INVALIDEZ. SEGURADO QUE VOLTAR À ATIVIDADE LABORAL PERDERÁ O DIREITO À RENDA MENSAL. JUNTADA DE DOCUMENTO NOVO EM GRAU DE RECURSO, NO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. POSSIBILIDADE. I – omissis. II - De acordo com o art. 33 da Lei n.º 9.099, de 26.09.1995, todas as provas serão produzidas na audiência de instrução e julgamento. A audiência destina-se, sobretudo, à coleta de prova oral, mas nada obsta que as partes tragam consigo documentos a fim de serem juntados aos autos neste ato. É evidente que o autor poderá oferecer a prova documental juntamente com a petição inicial. III - O documento novo, em sede de Juizado Especial Cível, somente será admitido em grau de recurso se obtido após a realização da audiência de instrução e julgamento. Se existente anteriormente e não juntado aos autos na fase instrutória do processo, somente vindo a aparecer na fase de recurso, dele a Turma Recursal não se conhecerá. Todavia, o documento novo será conhecido com o recurso se a parte comprovar que não o juntou até a audiência de instrução e julgamento por motivo de caso fortuito ou de força maior, desde que ouvida a parte contrária.”
Adotando o mesmo entendimento: ACJ 2004.03.1.003841-3/DF, DJU de 04.08.2.004, pág. 60; ACJ 2003.07.1.011958-4/DF, DJU de 04.08.2.004, pág. 59; ACJ 2004.03.1.001260-4/DF, DJU de 04.08.2.004, pág. 56 e ACJ 2003.01.1.085017-7, DJU de 14.06.2.004, pág. 105, todos apreciados por essa douta Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais.
Pois bem, segundo afirmado pela recorrente o Manual de Condições Gerais preexistia ao contrato não existindo qualquer dos fatos alinhavados acima que impedisse a recorrente de trazê-los à audiência. Logo, restrinjo a análise do recurso, somente, aos documentos colacionados perante o juiz a quo e que já passaram pelo crivo do contraditório.
A respeito da alegação de que a autora tinha ciência das cláusulas contratuais, em especial a 13.1 não pode ser, sequer, analisada nessa sede revisora, por ser inovação de causa de pedir, sob pena de supressão de instância.
A propósito do tema, o egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios assim se manifestou, in verbis:
“PROCESSO CIVIL. INOVAÇÃO DO PEDIDO EM SEDE RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO. Não se conhece do recurso que busca a concessão de pedido que sequer foi feito em primeiro grau de jurisdição, sob pena de supressão de instância” .
“COMERCIAL, CIVIL E PROCESSO CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. PERÍCIA CONTÁBIL. NÃO REALIZAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. CÉDULA DE CRÉDITO COMERCIAL. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA PELA TR. POSSIBILIDADE. PREVISÃO CONTRATUAL E NÃO VEDAÇÃO LEGAL. PEDIDO FORMULADO NO JUÍZO RECURSAL. INCABIMENTO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. 1- omissis. 2- omissis. 3- Ante o disposto no art. 515 do CPC, é vedado à parte inovar em sede de apelação (proibição de modificar a causa de pedir ou o pedido), sob pena de ser suprimido um grau de jurisdição. Apelação não provida. Unânime.”
A seu turno, a assertiva de que o contrato vigorou por três meses, período em que a recorrida teve seu veículo coberto, não pode prosperar, em especial quando se verifica a sábia e escorreita fundamentação exposta pela sentenciante, nestes termos:
“(...) Trata-se de contrato de adesão, que, por sua natureza, fez-se por prazo certo, não tendo as partes previsto as hipóteses de desfazimento unilateral, mora ou inadimplemento por parte do proponente, estipulando-se conseqüências apenas para a mora ou inadimplemento do aderente. Nesse passo, entende-se ilegítima a resilição unilateral da avença, porquanto se trata de contrato com termo inicial e final previamente estipulado. Com efeito, no caso em exame, o desfazimento por manifestação unilateral de vontade, por ter ocorrido no curso do prazo de vigência do contrato, equivale a inadimplemento contratual, pois o contrato estipulava sua vigência pelo período de 12 meses, e, no terceiro, o segurador manifestou sua vontade de não prosseguir na execução da avença. Assim, operam-se as conseqüências da resolução contratual, devendo a parte culpada pelo inadimplemento ressarcir o contratante que tinha expectativa legítima do cumprimento das disposições avençadas, inclusive o período de vigência contratual. (...)”
Outrossim, o Art. 422 do Código Civil impõe às partes o dever de primar pelo princípio da boa-fé ao contratarem o qual deve ser estritamente observado enquanto vigir o contrato.
Acerca da boa-fé objetiva, convém invocar os ensinamentos de Nélson Nery Júnior, que assim leciona “As partes devem guardar a boa-fé, tanto na fase pré-contratual, das tratativas preliminares, como durante a execução do contrato e, ainda, depois de executado o contrato (pós-eficácia das obrigações). Isso decorre da cláusula geral da boa-fé objetiva, adotada expressamente pelo CC 422” .
O Art. 765 do mesmo diploma legal, que dispõe sobre Seguro, igualmente impõe a observância daquele princípio estando assim delineado:
“Art. 765. O segurado e o segurador são obrigados a guarda na conclusão e na execução do contrato a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes.”
Dessa forma, conquanto frustradas as expectativas da Segurada/Recorrida de ver o contrato firmado vigorando pelo tempo estabelecido, por culpa exclusiva da recorrente, impõe, em homenagem ao princípio da boa-fé, o restabelecimento do estado no qual se encontrava antes de firmar a avença, fazendo-se necessária a devolução do que despendeu.
Nesses termos, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo integralmente a r. sentença.
Condeno a recorrente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 20% sobre o valor da condenação.
É como voto.
O Senhor Juiz JESUÍNO APARECIDO RISSATO - Vogal
Com a Relatora.
O Senhor Juiz TEÓFILO RODRIGUES CAETANO NETO - Vogal
Com a Turma.
DECISÃO
Conhecido. Improvido. Unânime.
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Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STJ - Superior Tribunal de Justiça. TJDFT - Processo Civil. Ação de cobrança. Documento novo juntado em sede recursal. Inadmissibilidade. Inovação de pedido. Impossibilidade. Princípio da boa-fé. Inobservância. Contrato de seguro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 jun 2011, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Jurisprudências/24775/tjdft-processo-civil-acao-de-cobranca-documento-novo-juntado-em-sede-recursal-inadmissibilidade-inovacao-de-pedido-impossibilidade-principio-da-boa-fe-inobservancia-contrato-de-seguro. Acesso em: 25 nov 2024.
Por: TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Por: TRF3 - Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Por: TJSC - Tribunal de Justiça de Santa Catarina Brasil
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