EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MATERIAIS E MORAIS. QUEDA DE FIO DE ENERGIA ELÉTRICA. QUEIMA DO CANAVIAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DOS DANOS MORAIS. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE. À UNANIMIDADE.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível da Comarca de Maceió/AL, em que figuram CEAL - Companhia Energética de Alagoas como apelante(s), e Lucas Barbosa da Silva como apelado(s).
ACORDAM os Desembargadores integrantes da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas, em conformidade com o voto do Relator, à unanimidade, em tomar conhecimento do presente recurso para, no mérito, dar-lhe parcial provimento, unicamente para afastar a condenação por danos morais imposta à apelante.
Participaram do julgamento os eminentes Desembargadores Estácio Luiz Gama de Lima (Presidente/Relator), Pedro Augusto Mendonça de Araújo (Revisor) e Alcides Gusmão da Silva.
Maceió, 17 de junho de 2010
Des. ESTÁCIO LUIZ GAMA DE LIMA
Presidente/Relator
APELAÇÃO CÍVEL Nº 2010.002189-2
Apelante : CEAL - Companhia Energética de Alagoas
Advogados : José Agostinho dos Santos Neto (6584/AL) e outros
Apelado : Lucas Barbosa da Silva
Advogado : Laélcio Gomes de Oliveira (5973/AL)
RELATÓRIO
Lucas Barbosa da Silva propôs uma Ação de Indenização por Danos Morais e Materiais em face da Companhia de Energia Elétrica de Alagoas – CEAL, sustentando que a queda de um dos cabos da concessionária de energia ocasionou a queima do canavial localizado em sua propriedade.
Instruíram a inicial os documentos constantes às fls. 8/29. Devidamente citada, a ré apresentou contestação às fls. 36/54, arguindo, preliminarmente, a imprestabilidade do laudo oferecido. No mérito, defendeu a ausência de qualquer responsabilidade de sua parte, assim como que a culpa do evento seria de exclusividade do autor.
Réplica oferecida às fls. 57/58. Audiência realizada às fls. 65/68. Sobreveio sentença às fls. 87/90, onde o magistrado julgou procedentes os pedidos do autor, no sentido de condenar a ré ao pagamento de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a título de danos morais, e R$ 84.260,25 (oitenta e quatro mil, duzentos e sessenta reais e vinte e cinco centavos), a título de danos materiais.
Inconformada, a ré opôs Embargos de Declaração às fls. 93/96, os quais foram decididos à fl. 103v. Ainda irresignada, a concessionária de energia elétrica interpôs Apelação às fls. 107/116, oportunidade na qual reiterou os argumentos lançados anteriormente.
Contrarrazões apresentadas às fls. 121/131, pugnando pela manutenção da decisão prolatada.
É, em suma, o Relatório.
Passo a expor meu voto.
VOTO
O presente recurso aforado preenche os requisitos genéricos, objetivos e subjetivos de admissibilidade, assim como os específicos, razão pela qual dele tomo conhecimento e passo a analisá-lo.
A controvérsia posta nos autos reside, portanto, na pretensão indenizatória de Lucas Barbosa da Silva, pelo fato de um cabo de energia elétrica da Ceal ter caído e ocasionado a queima das canas plantadas em sua propriedade.
Como se sabe, a responsabilidade civil se encontra regulamentada pelo Código Civil, mais precisamente no art. 186, ao dispor que "aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito". Já o art. 927 do Código Civil, por sua vez, ao complementar o citado artigo 186, determina que aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem fica obrigado a repará-lo.
Por se tratar de sociedade de economia mista estadual, concessionária do serviço público federal de energia elétrica, deve ela responder independentemente de culpa pelos danos causados ao autor, a teor do §6º do artigo 37 da Constituição Federal, cujo teor restou assim redigido, in verbis:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
§6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Como se vê, a responsabilidade da empresa concessionária de energia elétrica é presumida, independentemente da comprovação de culpa, bastando à parte, tão só, a demonstração da conduta, do nexo de causalidade e do dano, o que, sem dúvida alguma, restou demonstrado nos autos, no que diz respeito aos danos materiais suportados pelo apelado, ante as provas que os acompanham, além de que sua atividade se sujeita ao risco administrativo da atividade que desempenha.
Isso porque, em que pese a tentativa do apelante em desconstituir o valor probante do laudo emitido pela Associação dos Plantadores de Cana de Alagoas – ASPLANA, ela se revelou infrutífera, pois nele há a indicação da perda sofrida pelo apelado, notadamente porque a queima, em virtude do ocorrido, ocasionou o seu corte de forma precipitada, quando a cana ainda não se revelava apta para o fim a que se prestava.
Além disso, há relato nos autos que atribuem à queda do fio de energia elétrica a causa do incêndio no canavial de propriedade do apelado, conforme se vê às fls. 66/68, assim como existe a prova de que após o incidente a apelante foi notificada para restabelecer a ligação da energia elétrica.
Por outro lado, no que diz respeito aos supostos danos morais suportados pelo autor, ora apelado, entendo que merece prosperar a irresignação da apelante. Em análise dos autos, observo que, embora a concessionária de energia elétrica tenha demonstrado certa desídia na manutenção de suas linhas de transmissão, tal fato, por si só, não implica qualquer perturbação ou violação à sua imagem.
Pelo contrário, vejo que o sinistro ocorrido não passou de um mero aborrecimento, um infortúnio incapaz de causar danos morais. Por mais reprovável que tenha sido a postura da apelante, nos moldes em que realizada, não teve o condão de abalar, com a profundidade necessária, o elemento anímico do apelado a ponto de ocasionar dano passível de reparação pecuniária.
Para a caracterização do dano moral impõe-se que a vítima seja atacada por uma conduta ilícita que ocasione uma situação de dor e sofrimento, sentimentos esses capazes de provocar transtorno psicológico de grau relevante. O vexame, humilhação ou frustração devem interferir de forma intensa no âmago do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar.
Aliás, outro não é o entendimento extraído das lições de Sergio Cavalieri Filho, in verbis:
Dissemos linhas atrás que dano moral, à luz da Constituição vigente, nada mais é do que agressão à dignidade humana. Que conseqüências podem ser extraídas daí? A primeira diz respeito à própria configuração do dano moral. Se dano moral é agressão à dignidade humana, não basta para configurá-lo qualquer contrariedade.
Nessa linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento e humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita de dano moral (...). Outra conclusão que se tira desse novo enfoque constitucional é a de que mero inadimplemento contratual, mora ou prejuízo econômico não configuram, por si sós, dano moral, porque não agridem a dignidade humana. Os aborrecimentos deles decorrentes ficam subsumidos pelo dano material (...).
(Programa de Responsabilidade Civil. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2007, pp. 80-81)
Além disso, destaco que a própria jurisprudência pátria, em reiteradas oportunidades, já assentou entendimento no sentido de que a não demonstração de violação à honra subjetiva da parte é incapaz de ensejar a reparação sob a ótica do dano moral, consoante se depreende da leitura do seguinte aresto, in verbis:
ADMINISTRATIVO – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – INDENIZAÇÃO – DANO MORAL – DECISÃO AGRAVADA NÃO-ATACADA – ENUNCIADO 182 DA SÚMULA/STJ – ABORRECIMENTOS – NÃO-INDENIZÁVEIS – PRETENSÃO DE REEXAME DE PROVAS – ENUNCIADO 7 DA SÚMULA/STJ.
1. Constata-se que a agravante não rebateu os fundamentos da decisão agravada, haja vista a ausência de impugnação quanto à pretensão de reexame de provas, já que o Tribunal de origem, com base no conjunto fático-probatório dos autos, considerou que a ora agravante sofrera apenas aborrecimentos, o que não é passível de indenização. Questão que ensejou o não-provimento do recurso especial.
2. A fortiori, o entendimento firmado desta Corte é no sentido de que meros aborrecimentos não configuram dano reparável. O Tribunal a quo, soberano na análise do contexto fático-probatório do autos, decidiu que "Nada há que demonstra ter sido vilipendiada sua honra subjetiva. O constrangimento que narra não passou de um aborrecimento, não indenizável." 3. Para modificar o entendimento firmado no acórdão recorrido, seria necessário exceder os fundamentos colacionados no acórdão vergastado; portanto, demandaria incursão no contexto fático-probatório dos autos, defeso em sede de recurso especial, nos termos do enunciado 7 da Súmula desta Corte de Justiça. Agravo regimental improvido.
(STJ – 2ª Turma – AgRg no REsp 1066533/RJ – Rel. Min. Humberto Martins – Dje de 7/11/2008)
Com efeito, como o apelado não demonstrou a ocorrência de nenhum transtorno por ele sofrido em decorrência da queima da plantação de cana-de-açúcar, aliado aos entendimentos firmados no repertório jurisprudencial e doutrinário aplicável à espécie, assim como na legislação pertinente, concluo pela necessidade de reforma parcial da decisão vergastada.
Pelo exposto, voto no sentido de tomar conhecimento do presente recurso para, no mérito, dar-lhe parcial provimento, unicamente para afastar a condenação por danos morais imposta à apelante.
É como voto.
Maceió, 17 de junho de 2010
Des. ESTÁCIO LUIZ GAMA DE LIMA
Presidente/Relator
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Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, TJAL - Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas. TJAL - Civil e Administrativo. Responsabilidade civil. Danos materiais e morais. Queda de fio de energia elétrica. Queima do canavial. Responsabilidade objetiva da concessionária de energia. Ausência de comprovação de danos morais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 ago 2011, 11:09. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Jurisprudências/25256/tjal-civil-e-administrativo-responsabilidade-civil-danos-materiais-e-morais-queda-de-fio-de-energia-eletrica-queima-do-canavial-responsabilidade-objetiva-da-concessionaria-de-energia-ausencia-de-comprovacao-de-danos-morais. Acesso em: 23 nov 2024.
Por: TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Por: TRF3 - Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Por: TJSC - Tribunal de Justiça de Santa Catarina Brasil
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