EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. NULIDADE. A irregularidade do instrumento de procuração pode ser suprida por ratificação do mandato, comparecendo representante e representado à audiência. A validade do negócio jurídico pressupõe agente capaz, objeto lícito e forma não vedada em lei.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0647.09.093121-1/001 - COMARCA DE SÃO SEBASTIÃO DO PARAÍSO - APELANTE(S): PAULO CESAR DE SOUZA - APELADO(A)(S): MAICON CESAR ANANIAS DO NASCIMENTO E OUTRO(A)(S) - RELATOR: EXMO. SR. DES. JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 12ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador SALDANHA DA FONSECA , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM REJEITAR PRELIMINAR E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO
Belo Horizonte, 02 de fevereiro de 2011.
DES. JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA:
VOTO
Conheço do recurso de apelação porque presentes os requisitos de admissibilidade.
Trata-se de ação ordinária visando à anulação do "Instrumento particular de cessão de direitos com força de compromisso de compra e venda" de f. 13/17, celebrado pelos promitentes cedentes vendedores Fernanda Ferreira Caetano, Fabrícia Aparecida Ananias, Maicon César Ananias do Nascimento, Natália Ferreira e Kellen Ferreira, e o promitente cessionário comprador Paulo César de Souza.
Preliminar - Falta de representação processual
O apelante aponta falta de representação processual de Fernanda Ferreira Caetano, pois não outorgou procuração a advogado para representá-la na demanda, o que a impede de integrar o pólo ativo da ação.
Do contexto dos autos, importante destacar que os autores da ação são irmãos e, na condição de herdeiros do imóvel objeto do contrato que pretendem anular, assinaram o instrumento de cessão de direito com força de compromisso de compra e venda em exame. Assim, presente o interesse de agir de todos eles.
A ação foi ajuizada inicialmente por dois dos irmãos, Maicon e Fabrícia (f. 07 e 10), vindo a integrar o pólo ativo as irmãs Kellen e Natália e, finalmente, após ser localizada (f. 46), a irmã Fernanda.
Em audiência (f. 91/92), Fernanda prestou depoimento pessoal (f. 93), tendo comparecido acompanhada por seus irmãos e pela advogada Dra. Henriette Brigagão Alcântara Lemos dos Santos Fernandes (OAB/MG 115472) e estagiário Henry Matheus Novais Brigagão Pinheiro de Alcântara (OAB 24935-E).
No rigor técnico dos institutos jurídicos, a procuração é instrumento de contrato de mandato (CC, art. 653) através do qual a parte, por não ter capacidade postulatória, contrata advogado para exercer em seu nome atos processuais (CPC, arts. 36 e 37).
Todavia, "atos praticados por quem não tenha mandato, ou o tenha sem poderes suficientes, são ineficazes em relação àquele em cujo nome foram praticados, salvo se este os ratificar." (CC, art. 662, grifamos). Além disso, "a ratificação há de ser expressa, ou resultar de ato inequívoco, e retroagirá à data do ato" (CC, art. 662, parág. único).
Ora, tendo a parte comparecido à audiência acompanhada pela advogada, conclui-se que a apelada quis outorgar à advogada poderes de representação judicial, operando-se a ratificação dos atos praticados.
De se atentar para o fato de que "nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem" (CC, art. 112).
A propósito:
"Confere mandado verbal ao advogado a parte que comparece acompanhada dele em audiência" (RJTJESP 82/205).
Não há falta de representação processual a ensejar a extinção do processo sem resolução de mérito, devendo ser prestigiados os princípios do acesso à jurisdição (CR, art. 5º, XXXV) e da instrumentalidade das formas processuais (CC, art. 244).
Rejeito a preliminar.
Mérito
A validade dos negócios jurídicos pressupõe a existência concomitante de capacidade do agente, licitude do objeto e forma prescrita ou não vedada por lei (CC, art. 104).
Considera-se nulo o negócio jurídico se for celebrado por pessoa absolutamente incapaz (CC, art. 166).
Em relação à capacidade do agente, o menor de dezesseis anos é considerado absolutamente incapaz para exercer pessoalmente os atos da vida Civil (CC, art. 3º, I).
Da lição de Maria Helena Diniz extrai-se que:
"Como todo ato negocial pressupõe uma declaração de vontade, a capacidade do agente é indispensável à sua participação válida na seara jurídica. Tal capacidade poderá ser: a) geral, ou seja, a de exercer direitos (Geschäftsfäigkeit) por si, logo o ato praticado pelo absolutamente incapaz sem a devida representação será nulo (CC, art. 166, I, RT, 626:143) e o realizado pelo relativamente incapaz sem assistência será anulável (CC, art. 171, I); b) especial, ou legitimação, requerida para a validade de certos negócios em dadas circunstâncias (...)". (in Código Civil Anotado, 11ª ed., SP:Saraiva, 2005, p. 144).
Para que se repute válido o ato praticado pelo menor de dezesseis anos, é necessário que esteja representado por seus pais, curadores ou tutores.
Na espécie, verifica-se que o instrumento particular de cessão de direitos com força de compromisso de compra e venda foi assinado em 17/10/2003 (f. 17), época em que Natália Ferreira contava quinze anos e nove meses de idade (f. 52), não estando representada.
Importante esclarecer que a alegação de menoridade não deve ser dirigida a Maicon César Ananias do Nascimento, que à época contava 19 anos.
O objeto do contrato é o imóvel deixado aos filhos por morte de Irene Ferreira Aparecida Caetano (f. 14 e 19).
Examinando os documentos juntados pelos apelados, vê-se que o nome da mãe deles aparece ora grafado como Irene Aparecida Ferreira (f. 09 e 52), ora como Irene Aparecida Ferreira Caetano (f. 49).
Além disso, o documento de identidade do apelado Maicon revela que nasceu aos 15/08/1984 em Ribeirão Preto-SP e o documento de Kellen Ferreira revela que seu nascimento em 06/08/1984 ocorreu em São Sebastião do Paraíso.
Embora tais circunstâncias de fato não tenham sido discutidas nos autos, a venda do imóvel pressupõe a legitimidade dos herdeiros e a regularidade na transmissão de bens e direitos pertencentes ao espólio de Irene Ferreira Aparecida.
Finalmente, não se sabe se houve declaração de ausência (CC, art. 22) dos herdeiros não localizados Valquíria Ferreira Caetano e Valtércio Ferreira Caetano (f. 93), ou se suprida sua vontade e consentimento por determinação judicial (CPC, art. 1159 ss).
Além de assinado por menor de idade e de não rubricadas todas as páginas pelos contratantes, a incerteza quanto à titularidade do imóvel também constitui causa para a anulação do negócio.
Assim, o instrumento de cessão de direitos e compromisso de compra e venda de f. 13/17 não pode ser considerado válido, devendo ser mantida a declaração judicial de sua nulidade e o retorno das partes ao status quo ante.
Nelson Nery e Rosa Maria de Andrade Nery destacam:
"O negócio nulo não pode produzir nenhum efeito jurídico. Caso tenha produzido efeitos no mundo fático, o reconhecimento judicial dessa nulidade retira esses efeitos, pois esse reconhecimento tem eficácia ex tunc, isto é, retroativa, retroagindo à data da celebração do negócio nulo. Pronunciada a nulidade as coisas voltam ao estado anterior, como se não tivesse sido celebrado o negócio ou ato nulo" (in Código Civil Anotado e legislação extravagante, 2ª ed., SP:RT, 2003, p. 228).
DIANTE DO EXPOSTO, com base no art. 93, inciso IX da Constituição Federal e art. 131 do Código de Processo Civil, REJEITO A PRELIMINAR e NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO, suspensa a exigibilidade nos termos do art. 12 da Lei nº 1.060/50.
Custas pelo apelante.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): NILO LACERDA e ALVIMAR DE ÁVILA.
SÚMULA : REJEITARAM PRELIMINAR E NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO
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Por: TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Por: TRF3 - Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Por: TJSC - Tribunal de Justiça de Santa Catarina Brasil
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