O que a nova Lei Complementar nº 214 de 16 de janeiro de 2025 pode impactar nas ferramentas de planejamento patrimonial.
Em 16.01.2025, foi publicada a Lei Complementar nº 214[1] (Lei Complementar) que faz parte da primeira fase da nova reforma tributária e instituiu: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Seletivo (IS). A transição do sistema tributário ocorrerá em duas etapas distintas, sendo que, inicialmente será implementado um período transitório de dois anos, durante o qual haverá uma diminuição da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), sem gerar impactos para estados e municípios, e a aplicação de uma alíquota de 1% referente ao Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Posteriormente, a cada ano, as alíquotas serão progressivamente reduzidas em 1/8, até sua completa extinção, enquanto a alíquota do IBS será elevada de forma a compensar a arrecadação anteriormente obtida[2].
Conforme informação extraída de páginas do próprio Governo Federal[3], o IBS e CBS incidirão sobre todas as operações onerosas que tenham por objeto bens e serviços, tendo sido incluído na lei, especificamente em seu artigo 252, o seguinte rol exemplificativo das hipóteses as quais ficam sujeitas à incidência:
a) alienação, inclusive compra e venda, troca ou permuta e dação em pagamento;
b) locação;
c) licenciamento, concessão, cessão;
d) empréstimo;
e) doação onerosa;
f) instituição onerosa de direitos reais;
g) arrendamento, inclusive mercantil; e
h) prestação de serviços.
Ainda, a Lei Complementar alterou de forma expressiva cenário de otimização fiscal, trazendo novas regras por meio do seu artigo 487, que disciplina a tributação das receitas provenientes de aluguéis auferidas por pessoas jurídicas, com foco específico nas empresas holdings.
Ou seja, a nova Lei Complementar impacta diretamente na gestão patrimonial através de holdings, uma vez que esta é utilizada como ferramenta de planejamento tributário para otimização fiscal dos rendimentos provenientes de aluguéis, especialmente diante da possibilidade de redução significativa da carga tributária em comparação à tributação aplicável às pessoas físicas.
Nesse contexto, passa-se a demonstrar as principais diferenças da tributação de holdings antes e após a Lei Complementar, principalmente no que tange aos rendimentos oriundos de aluguéis.
1.Cenário Anterior à Lei Complementar nº 214/2025
Antes da vigência da Lei Complementar, as pessoas físicas estavam sujeitas à tributação progressiva do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) sobre os rendimentos oriundos de aluguéis, com alíquotas variando entre 7,5% e 27,5%, dependendo do valor total recebido e das deduções aplicáveis.
A legislação vigente para pessoas físicas não permitia a dedução de diversas despesas operacionais diretamente relacionadas à obtenção dessa renda, como manutenção e reformas de imóveis locados, o que tornava esse regime especialmente oneroso.
Nesse contexto, o uso de holdings oferecia uma alternativa mais vantajosa, uma vez que empresas que operavam sobre o regime de Lucro Presumido tinham seus rendimentos de aluguéis tributados com base em uma presunção de 32% da receita bruta.
Sobre essa base de cálculo aplicavam-se as alíquotas de 15% de Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e 9% de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), além de 3% de PIS e 0,65% de COFINS, totalizando uma carga tributária efetiva entre 11,33% e 14,53%.
Essa estrutura possibilitava uma economia expressiva em comparação à tributação progressiva das pessoas físicas, motivo pelo qual tal ferramenta atraiu tantos brasileiros ao planejamento patrimonial.
2.O Impacto da Lei Complementar nº 214/2025 sobre a fruição dos aluguéis
Com a publicação da Lei Complementar, especialmente por meio do artigo 487, houve uma redefinição das bases de tributação das receitas provenientes de aluguéis pelas pessoas jurídicas, com previsões específicas que diferenciam as situações a depender da destinação do imóvel, isto é, se residencial ou não residencial.
A tributação sobre a receita bruta passará a variar entre 8% e 15%, mesmo que seja possível a apropriação de créditos. A Lei Complementar prevê a implementação de um regime especial de transição[4] relacionado à primeira fase da reforma tributária sobre o consumo, abrangendo o período de 2026 a 2033. Esse regime estabelece uma alíquota total de 3,65% de IBS e CBS, apresentando-se como uma opção mais favorável sob o ponto de vista fiscal para os locadores, quanto para locatários.
Todavia, para que ocorra o devido enquadramento dos contratos de locação nos termos da mencionada lei, o artigo 487 dispõe que os contratos relacionados à exploração de atividade locatícia devem ter sido firmados por prazo determinado e estar em vigor antes da publicação da nova legislação.
Além disso, também é exigido que os contratos tenham firma reconhecida ou assinatura eletrônica até 31.12.2028, no caso de imóveis residenciais, e no caso de imóveis comerciais, até 31.12.2025, sendo que em ambos os casos há a necessidade de comprovação do pagamento realizado até o último dia do mês seguinte ao primeiro mês do contrato.
Destaca-se que ainda é possível a celebração de novos contratos ou a alteração dos antigos, de forma a possibilitar a adequação fiscal desses instrumentos, assim como a adaptação contábil ao regime especial, devendo tais medidas estratégicas serem adotadas antes de 2026.
Em linhas gerais, a despeito do aumento da carga tributária, a opção por essa forma de tributação para pessoas jurídicas continuará sendo vantajosa, já que as alíquotas combinadas de 19% (sendo 8% de IBS e CBS e 10,88% de IR e CSLL) permanecerão inferiores à incidência de 27,5% do Imposto de Renda aplicável às pessoas físicas.
Com essas alterações, a nova legislação traz consequências práticas importantes, uma vez que traduz para as pessoas jurídicas um aumento da carga tributária efetiva em locações residenciais e a elevação do coeficiente de presunção para locações, tornando necessária uma reavaliação das estratégias de planejamento tributário.
Para as pessoas físicas, a tributação progressiva do IRPF permanece inalterada, com alíquotas de até 27,5%, o que continua a gerar um impacto relevante sobre os rendimentos de aluguéis. Contudo, a princípio houve uma redução significativa das vantagens tributárias sobre a utilização de holdings para otimização tributária, quando falamos dos recolhimentos sobre as locações.
Com isso, verifica-se uma diminuição na diferença de tratamento entre as modalidades de tributação, equilibrando, em certa medida, as opções disponíveis.
3.Conclusão
Empresas, incluindo holdings patrimoniais que realizam a locação, cessão ou arrendamento de imóveis, poderão optar por um regime de transição instituído pela reforma tributária, o qual oferece uma alíquota total de 3,65%, aplicável ao IBS e à CBS. Todavia, essa vantagem tributária está condicionada ao cumprimento de critérios definidos pela Lei Complementar, sem prejuízo ao planejamento relacionado à segunda fase da reforma tributária, que trata da tributação sobre a renda.
Essa alternativa pode representar um benefício fiscal significativo, uma vez que, conforme já mencionado, sem a adoção desse regime especial, a carga tributária para os contribuintes sujeitos ao IBS e CBS poderá ser bem mais elevada, mesmo considerando a possibilidade de utilização de créditos tributários.
Para aderir ao regime de transição, os contratos de locação, cessão onerosa ou arrendamento deverão atender às exigências já mencionadas, cabendo reiterar que é indispensável que os contratos estejam em vigor antes da publicação da Lei Complementar, bem como devem possuir prazo determinado e estar formalizados com firma reconhecida ou assinados eletronicamente.
Em relação aos contratos não residenciais, o regime especial será aplicável durante o prazo original do contrato, desde que ele seja registrado em cartório ou disponibilizado à Receita Federal até 31.12.2025. Já para contratos residenciais, o benefício será válido até o término do prazo original do contrato ou até 31 de dezembro de 2028, prevalecendo o que ocorrer primeiro.
Em ambos os casos, será necessário comprovar o pagamento do aluguel até o último dia do mês subsequente ao início da vigência do contrato para que a adesão ao regime especial seja efetivada, o que permite concluir que a Lei Complementar, ao introduzir o artigo 487, redefiniu as bases do planejamento tributário no Brasil para rendimentos de aluguéis.
Diante desse novo cenário, é imprescindível que investidores e gestores analisem suas estruturas patrimoniais e avaliem cuidadosamente as implicações das novas regras, uma vez que a holding ainda é uma ferramenta viável não só para otimização tributária, mas também de manutenção geracional do patrimônio familiar, além das inúmeras vantagens que analisada sob a ótica do planejamento sucessório.
Embora as holdings continuem sendo uma ferramenta relevante em determinadas situações, sua utilização demanda análise criteriosa para assegurar a viabilidade econômica e fiscal das operações, devendo os proprietários de tais empresas buscarem orientação de advogados especializados tanto na esfera tributária, como societária.
[1] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp214.htm
[2] https://www.camara.leg.br/internet/agencia/infograficos-html5/ReformaTributaria/index.html
[3]https://www.gov.br/fazenda/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/reforma-tributaria/regulamentacao-da-reforma-tributaria/lei-geral-do-ibs-da-cbs-e-do-imposto-seletivo/resumos-tecnicos/plp-68-2024_resumo-ibs-e-cbs-sobre-operacoes.pdf
[4] https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2024/12/16/novos-tributos-comecam-a-ser-testados-em-2026-e-transicao-vai-ate-2033#:~:text=O%20novo%20modelo%20de%20tributa%C3%A7%C3%A3o,do%20tempo%2C%20ao%20lado)%20Epa!%20Vimos%20que%20voc%C3%AA%20copiou%20o%20texto.%20Sem%20problemas,%20desde%20que%20cite%20o%20link:%20https://www.migalhas.com.br/depeso/423119/holdings-aumento-da-carga-tributaria
Advogado. Graduado em Direito e pós-graduando em Processo Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Membro na comissão de compliance da OAB Santo Amaro .
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ZERRENNER, Murilo. O Que Mudou No Planejamento Patrimonial Em 2025 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 fev 2025, 04:50. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigo/67852/o-que-mudou-no-planejamento-patrimonial-em-2025. Acesso em: 21 fev 2025.
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