"Contrato de Gaveta" e Penhora - o que pode fazer o comprador que teve o imóvel penhorado, conforme a jurisprudência atual.
Como é de conhecimento público, existem por todo o país centenas de milhares de pessoas que compraram imóveis através de "contratos de gaveta".
Os "contratos de gaveta" não podem ser registrados em razão da Lei 8.004/90 exigir a anuência da instituição financeira que financiou originariamente a compra do imóvel para a venda subsequente.
O que pode fazer para tentar manter o imóvel o comprador que tem um "contrato de gaveta" (não registrado, portanto) se o imóvel comprado for penhorado em alguma execução contra o antigo proprietário?
Uma possível solução será mover a ação de embargos de terceiro.
É cabível essa ação para aquele que não registrou seu contrato no registro de imóveis?
A Súmula nº 621 do STF dispõe: "Não enseja embargos de terceiro à penhora a promessa de compra e venda não inscrita no registro de imóveis.". Contudo, existe orientação mais recente que culminou na Súmula nº 84 do STJ: "É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro.".
Como atualmente incumbe ao STJ, nos termos do art. 105, III, a, da Constituição da República, dizer a última palavra sobre a interpretação de lei federal no país, está prevalecendo atualmente o entendimento consolidado na Súmula nº 84. De qualquer modo, nada garante que a jurisprudência não irá voltar a seguir a orientação do STF.
Com efeito, como os embargos de terceiro visam a proteção da posse (e não da propriedade), a orientação do STJ é de melhor técnica, desde que, é claro, o embargante esteja na posse do imóvel. A simples existência do contrato não basta.
Vejamos algumas das decisões judiciais que estão seguindo a orientação do STJ:
"EMBARGOS DE TERCEIRO - Penhora - Imóvel objeto de compromisso de compra e venda não registrado - Oposição pelo promitente comprador - Admissibilidade desde que irrevogável o contrato e devidamente imitido na posse - Imprescindibilidade da transcrição no Registro Imobiliário somente para a oponibilidade em face de terceiros que pretendam sobre o imóvel direito juridicamente incompatível com a pretensão aquisitiva do adquirente - Aplicação do art. 1.046, § 1º, do CPC" (STJ, in RT 665/201)
"COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - Registro inexistente - Irrelevância - Tradição antecipada - Posse própria - Imóvel penhorado - Embargos de terceiro - Acolhimento" (TAPR, in RT 604/189)
"EMBARGOS DE TERCEIRO - Penhora - Imóvel objeto de compromisso de compra e venda, com firmas reconhecidas e registro em Cartório de Títulos e Documentos anterior à propositura da execução. Falta do registro imobiliário que não inibe a eficácia do documento. Súmula nº 84 do Superior Tribunal de Justiça. Embargos procedentes. Sentença mantida." (1º TAC-SP - 6ª Câmara, Ap. 675.157-7-São Paulo, j. 17.09.96, in Bol. AASP nº 2.020, p. 68-e)
PENHORA - Execução hipotecária - Imóvel vinculado ao Sistema Financeiro da Habitação Embargos opostos por terceiro adquirente - Transferência da posse através de cessão de direitos contratuais sem a anuência do credor e registro imobiliário - Irrelevância - Validade da venda entre o cedente e o cessionário com reflexo perante terceiros - Procedência dos embargos mantida - Inteligência e aplicação da Súmula 84 do STJ (1º TACivSP, in RT 708/107)
Vejamos, também, decisões em sentido contrário:
"RECURSO EXTRAORDINÁRIO - Penhora de imóvel - Objeto de promessa de compra e venda não inscrita no Registro de Imóveis, por dívida do promitente vendedor - Não cabimento de embargos de terceiro opostos pelo promitente comprador - Recurso conhecido e provido - Aplicação da Súmula 621 do STF" (STF, RT 683/213).
"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA NÃO REGISTRADA. A jurisprudência hoje vitoriosa no Alto Pretório e no sentido de que o compromissário comprador, portador de promessa de compra e venda não inscrita no registro competente, não tem qualidade para requerer embargos de terceiro, na condição de possuidor por não ter título oponível "erga omnes". Precedentes do STF. Deu-se provimento ao recurso voluntário condenando os embargantes a honorária de 10% (dez por cento)."(Acórdão do extinto Tribunal Federal de Recursos, Quinta Turma, Apelação Civil nº 87.229-SP, j. em 25.04.84)
"COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - Contrato não registrado - Penhora do imóvel - Embargos opostos pelo terceiro adquirente - Impossibilidade - Falta de inscrição no Registro Imobiliário que impede a oposição "erga omnes" de direito real não constituído - Irrelevância da existência ou não de fraude à execução ou contra credores - Aplicação da Súmula 621 do STF" (1º TACivSP, in RT 652/92)
"COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - Falta de registro - Execução hipotecária - Embargos de terceiro - Descabimento - Voto vencido" (1º TACivSP, in RT 567/95)
De qualquer modo, é necessário mencionar que a atual prevalência do entendimento consolidado na Súmula do STJ ocorre para as hipóteses onde a venda não se processou mediante fraude à execução, vale dizer, quando a assinatura do contrato ou escritura e a transferência da posse do imóvel ocorrerram antes do início da execução contra o antigo proprietário, conforme os seguintes julgados:
"COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA NÃO REGISTRADO - EXECUÇÃO - BEM PENHORADO - EMBARGOS DE TERCEIROS - POSSE NÃO COMPROVADA - INDÍCIOS DE FRAUDE - PRECEDENTES - RECURSO DESACOLHIDO - Conquanto mitigado o rigor do Enunciado nº 621 do STF pela jurisprudência sumulada deste Superior Tribunal de Justiça (verbete nº 84), inadmissível o acolhimento de Embargos de Terceiros ajuizados, com o intuito de desconstituir penhora sobre imóvel objeto de compromisso de compra e venda não registrado, se inexistente comprovação de que o embargante, antes da Execução, detinha a posse do imóvel, e se, ademais detectadas pelas instância ordinárias circunstância evidenciadoras de fraude. Para serem acolhidos os Embargos de Terceiros fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido de registro, necessárias se fazem não só a demonstração de que a celebração do compromisso, com quitação do preço, ocorreu antes de ajuizada a Execução, mas também a comprovação da posse do embargante e a certeza quanto à inexistência de fraude." (STJ - 4ª T.; Rec. Esp. nº 39.144-0-SP; rel. Min. Sálvio de Figueiredo; j. 16.11.1993; v.u.; DJU, Seção I, 07.02.1994, p. 1.187, ementa. In Bol AASP 1838/31-e, de 16.03.1994.)
"EMBARGOS DE TERCEIRO - Penhora - Oposição por adquirente de imóvel - Compromisso de compra e venda não registrado - Admissibilidade se existente prova de desfrute da posse e não configurada fraude à execução - Abrandamento do rigor da Súmula 621 do STF" (STJ, in RT 664/187)
"EMBARGOS DE TERCEIRO - Penhora - Imóvel adquirido antes do ajuizamento da execução - Compromisso de compra e venda não inscrito no Registro Imobiliário - Irrelevância - Oponibilidade do documento" (1º TACivSP, in RT 570/127)
"EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA - Embargos de terceiro - Ilegitimidade "ad causam" -Possuidor - Promissário comprador em compromisso de compra e venda não inscrito no Registro de Imóveis - Penhora que não traduz esbulho ou turbação - Constrição que incide sobre o domínio, e não sobre a posse - Ônus hipotecário conhecido e anterior àquela avença - Transmissão do gravame - Impossibilidade de oferecimento da "exceptio possessionis" do art. 1.046, § 1.º, do CPC" (TARS, in RT 652/153).
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