RESUMO: O presente artigo teve por objetivo analisar a legalidade da limitação temporal instituída por meio da Portaria n.º 653 do Comandante do Exército para cadastramento na qualidade de beneficiário indireto do Fundo de Saúde do Exército (FUSEx). Inicialmente, será analisada a legislação que estrutura e organiza o Sistema de Saúde do Exército Brasileiro e, ao final do artigo, partindo-se dos dados apresentados, conclui-se que não há ilegalidade na limitação temporal instituída por meio da Portaria n.º 653, de 30 de agosto de 2005.
Palavras-chave: Fundo de Saúde do Exército (FUSEx). Beneficiários indiretos. Portaria n.º 653. Princípio da legalidade.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO – 2 APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE NA PRODUÇÃO DE ATOS NORMATIVOS PELO PODER EXECUTIVO – 3 CONCLUSÃO – 4 REFERÊNCIAS
1 INTRODUÇÃO
O Sistema de Saúde do Exército Brasileiro encontra previsão legal no Estatuto dos Militares ao conferir o direito à assistência médico-hospitalar para si e seus dependentes, assim entendida como o conjunto de atividades relacionadas com a prevenção, conservação ou recuperação da saúde, abrangendo serviços profissionais médicos, farmacêuticos e odontológicos, bem como o fornecimento, a aplicação de meios e os cuidados e demais atos médicos e paramédicos necessários.
A lei n.º 6.880 permite expressamente a regulamentação específica da matéria, razão pela qual foram editados diversos atos normativos pela Força Terrestre, desmembrando-se a assistência médico-hospitalar em Prestação de Assistência à Saúde Suplementar dos Servidores Civis do Exército Brasileiro - PASS; Sistema de Assistência Médico-Hospitalar aos Militares do Exército, Pensionistas Militares e seus Dependentes – SAMMED e Assistência Médico-Hospitalar a ser prestada aos xx-combatentes, pensionistas e seus dependentes – SAMEx.
Nesse contexto, emerge a Portaria n.º 653 do Comandante do Exército instituindo limitação temporal para cadastramento de dependentes beneficiários indireto do FUSEx, a qual foi alvo de questionamento na via judicial quanto à sua legalidade. Em conclusão, defende-se a legalidade da limitação temporal, fundamentando-se na diferenciação entre os conceitos de assistência médico-hospitalar e Fundo de Saúde do Exército (FUSEx).
2 APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE NA PRODUÇÃO DE ATOS NORMATIVOS PELO PODER EXECUTIVO
O ponto central deste estudo cinge-se a definir se é válida limitação temporal instituída por meio da Portaria n.º 653, de 30 de agosto de 2005, para inscrição no Cadastro de Beneficiários do Fundo de Saúde do Exército (CADBEN/FUSEx) com a finalidade de ser considerado beneficiário indireto do FUSEx, com a seguinte redação:
Art. 6º São considerados beneficiários indiretos do FUSEx, os seguintes dependentes:
I - desde que incluídos legalmente no CADBEN -FUSEx, até a data de publicação destas IG, obedecidas as condicionantes de dependência econômica e outras vigentes à época da inclusão:
(...)
II - os constantes das alíneas b), c), e), f), g) e h) do § 3º, do art. 50, do Estatuto dos Militares (E1), desde que incluídos, legalmente, no CADBEN-FUSEx até 29 de setembro de 1995, obedecidas as condicionantes de dependência econômica e demais vigentes à época da inclusão.
Nesse contexto, dispõe a Constituição Federal, por meio do art. 59, que "o processo legislativo compreende a elaboração de emendas à Constituição, leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções". Estas espécies normativas são consideradas normas cuja validade decorrem diretamente da Constituição Federal.
O ato de Portaria, com o conteúdo ora submetido, insere-se no âmbito de competência do Comandante do Exército, nos termos do artigo 20, inciso XIV, da Estrutura Regimental do Comando do Exército, aprovada pelo Decreto nº 5.571/2006, que assim dispõe:
Art. 20. Ao Comandante do Exército, além das atribuições previstas na legislação em vigor e consoante diretrizes do Ministro de Estado da Defesa, incumbe:
(...)
XIV - formular a legislação específica e aprovar as normas próprias do Comando do Exército;
Com status inferior, a Portaria é conceituada, por meio do Manual da Presidência da República, como "instrumento pelo qual Ministros ou outras autoridades expedem instruções sobre a organização e funcionamento de serviço e praticam outros atos de sua competência".
Sob a perspectiva material, busca-se avaliar a compatibilidade do conteúdo da Portaria frente às normas veiculadas por meio de leis em sentido estrito, especialmente a Lei n.º 6.880, que dispõe sobre o Estatuto dos Militares, evitando-se, com efeito, qualquer discrepância entre o conteúdo do ato normativo infra legal e a legislação que lhe dá suporte.
Trata-se de exercício análogo ao poder regulamentar, definido por Hely Lopes[1] da seguinte forma:
O poder regulamentar é a faculdade de que dispõem os Chefes de Executivo (Presidente da República, Governadores e Prefeitos) de explicar a lei para sua correta execução
(...)
No poder de chefiar a Administração está implícito o de regulamentar a lei e suprir, com normas próprias, as omissões do Legislativo que estiverem na alçada do Executivo. Os vazios da lei e a imprevisibilidade de certos fatos e circunstâncias que surgem, a reclamar providências imediatas da Administração, impõem se reconheça ao Chefe do Executivo o poder de regulamentar, através de decreto, as normas legislativas incompletas, ou de prover situações não previstas pelo legislador, mas ocorrentes na prática administrativa. O essencial é que o Executivo, ao expedir regulamento - autônomo ou de execução da lei -, não invada as chamadas "reservas da lei", ou seja, aquelas matérias só disciplináveis por lei, e tais são, em princípio, as que afetam as garantias e os direitos individuais assegurados pela Constituição (art. 5.º).
A faculdade normativa, embora caiba predominantemente ao Legislativo, nele não se exaure, remanescendo boa parte para o Executivo, que expede regulamentos e outros atos de caráter geral e efeitos externos (24). Assim, o regulamento é um complemento da lei naquilo que não é privativo da lei. Entretanto, não se pode confundir lei e regulamento.
(...)
Regulamento é ato administrativo geral e normativo, expedido privativamente pelo Chefe do Executivo (federal, estadual ou municipal), através de decreto, com o fim de explicar o modo e forma de execução da lei (regulamento de execução) ou prover situações não disciplinadas em lei (regulamento autônomo ou independente). (Destacou-se).
A prestação da assistência médico-hospitalar encontra previsão legal no art. 50, IV, "e", da Lei n.º 6.880, da seguinte forma:
Art. 50. São direitos dos militares:
IV - nas condições ou nas limitações impostas na legislação e regulamentação específicas:
e) a assistência médico-hospitalar para si e seus dependentes, assim entendida como o conjunto de atividades relacionadas com a prevenção, conservação ou recuperação da saúde, abrangendo serviços profissionais médicos, farmacêuticos e odontológicos, bem como o fornecimento, a aplicação de meios e os cuidados e demais atos médicos e paramédicos necessários; (destacou-se)
Frise-se que a Lei permite que sejam elencadas condições ou limitações por meio de regulamentação específica.
Nessa vertente, o rol de dependentes é definido por meio do art. 50, §§2º e 3º, do Estatuto dos Militares, in verbis:
§ 2° São considerados dependentes do militar:
I - a esposa;
II - o filho menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou interdito;
III - a filha solteira, desde que não receba remuneração;
IV - o filho estudante, menor de 24 (vinte e quatro) anos, desde que não receba remuneração;
V - a mãe viúva, desde que não receba remuneração;
VI - o enteado, o filho adotivo e o tutelado, nas mesmas condições dos itens II, III e IV;
VII - a viúva do militar, enquanto permanecer neste estado, e os demais dependentes mencionados nos itens II, III, IV, V e VI deste parágrafo, desde que vivam sob a responsabilidade da viúva;
VIII - a ex-esposa com direito à pensão alimentícia estabelecida por sentença transitada em julgado, enquanto não contrair novo matrimônio.
§ 3º São, ainda, considerados dependentes do militar, desde que vivam sob sua dependência econômica, sob o mesmo teto, e quando expressamente declarados na organização militar competente:
a) a filha, a enteada e a tutelada, nas condições de viúvas, separadas judicialmente ou divorciadas, desde que não recebam remuneração;
b) a mãe solteira, a madrasta viúva, a sogra viúva ou solteira, bem como separadas judicialmente ou divorciadas, desde que, em qualquer dessas situações, não recebam remuneração;
c) os avós e os pais, quando inválidos ou interditos, e respectivos cônjuges, estes desde que não recebam remuneração;
d) o pai maior de 60 (sessenta) anos e seu respectivo cônjuge, desde que ambos não recebam remuneração;
e) o irmão, o cunhado e o sobrinho, quando menores ou inválidos ou interditos, sem outro arrimo;
f) a irmã, a cunhada e a sobrinha, solteiras, viúvas, separadas judicialmente ou divorciadas, desde que não recebam remuneração;
g) o neto, órfão, menor inválido ou interdito;
h) a pessoa que viva, no mínimo há 5 (cinco) anos, sob a sua exclusiva dependência econômica, comprovada mediante justificação judicial;
i) a companheira, desde que viva em sua companhia há mais de 5 (cinco) anos, comprovada por justificação judicial; e
j) o menor que esteja sob sua guarda, sustento e responsabilidade, mediante autorização judicial.
A prestação de serviço de saúde aos militares, apesar de ser regido por regime jurídico específico, não perde sua característica de benefício análogo à seguridade social insculpida por meio do título VIII, capítulo II, da Constituição Federal. Dessa forma, a criação, majoração ou extensão de benefícios poderá ocorrer somente se houver a correspondente fonte de custeio total, em consonância com o princípio da prévia fonte de custeio positivado no art. 195, §5º, da Constituição Federal, razão pela qual, em concomitância com o princípio da legalidade, defende-se que este rol é taxativamente definido no Estatuto dos Militares.
Não obstante a Lei n.º 6.880 permita em seu próprio corpo a instituição de condicionantes para a prestação do serviço de assistência médico-hospitalar, o rol de dependentes já é legalmente definido, sem que se possa ampliá-lo ou restringi-lo por meio de ato infra legal, sob pena de afronta ao princípio da legalidade.
Estabelecida esta premissa, passa-se a analisar a estruturação e prestação da assistência médico-hospitalar aos militares e seus dependentes.
De acordo com o art. 50, IV, "e", do Estatuto dos Militares, "nas condições ou nas limitações impostas na legislação e regulamentação específicas são direitos dos militares a assistência médico-hospitalar para si e seus dependentes". Regulamentando este dispositivo normativo, foi editado o Decreto n.º 92.512, de 2 de abril de 1986, dispondo que "a assistência médico-hospitalar, a ser prestada ao militar e seus dependentes, será proporcionada através das seguintes organizações de saúde: I - dos Ministérios Militares; II - Hospital das Forças Armadas; III - de Assistência Social dos Ministérios Militares, quando existentes; IV - do meio civil, especializadas ou não, oficiais ou particulares, mediante convênio ou contrato; V - do exterior, especializadas ou não".
Por meio deste Decreto, criou-se o Fundo de Saúde do Exército (FUSEx), como um subsistema da assistência médico-hospitalar aos militares e seus dependentes. Definiu-se que FUSEx compreende:
recurso extra-orçamentário oriundo de contribuições obrigatórias dos militares, da ativa e na inatividade, e dos pensionistas dos militares, destinado a cobrir parte das despesas com a assistência médico-hospitalar dos beneficiários do Fundo, segundo regulamentação específica de cada Força Singular
Esclarece-se, desde já, que o FUSEx não se confunde com assistência médico-hospitalar. Com efeito, o FUSEx sequer é mencionado no Estatuto dos Militares, que se limitou a dispor acerca da assistência médico-hospitalar como direito dos militares e seus dependentes, deferindo às Forças Armadas a regulamentação específica de como esse serviço deverá ser prestado.
Nessa toada, o Sistema de Saúde do Exército foi dividido em Prestação de Assistência à Saúde Suplementar dos Servidores Civis do Exército Brasileiro - PASS (Portaria n.º 422-DGP, de 19/06/08 e Portaria n.º 117, de 19/05/08); Sistema de Assistência Médico-Hospitalar aos Militares do Exército, Pensionistas Militares e seus Dependentes – SAMMED (Decreto n.º 92.512, de 02/04/86 e demais atos normativos relacionados neste artigo jurídico) e Assistência Médico-Hospitalar a ser prestada aos Ex-combatentes, pensionistas e seus dependentes - SAMEx (Nota Informativa n.º 01 - DSau, de 13 de outubro de 2011).
O Sistema de Assistência Médico-Hospitalar aos Militares do Exército, Pensionistas Militares e seus Dependentes – SAMMED, subdivide-se em Fundo de Saúde do Exército (FUSEx) e prestação de assistência médico-hospitalar aos demais militares e dependentes que não se enquadrem no FUSEx, cujo custeio se dará com base no fator de custo e/ou pagamento integral das indenizações devidas pela assistência prestada, conforme art. 26, I c/c art. 31, ambos da Portaria n.º 878. Neste Parecer, tratar-se-á apenas acerca do SAMMED e suas ramificações.
Em paralelo, pode-se afirmar que há um SAMMED em amplo sentido, subdividido em FUSEx e SAMMED em sentido estrito. Para fins de esclarecimento, transcrevem-se os conceitos definidos pelo Decreto n.º 92.512 (que regulamentou a assistência médico-hospitalar):
Art. 3º Para os efeitos deste decreto, serão adotadas as seguintes conceituações:
III - Assistência Médico-Hospitalar - é o conjunto de atividades relacionadas com a prevenção de doenças, com a conservação ou recuperação da saúde e com a reabilitação dos pacientes, abrangendo os serviços profissionais médicos, odontológicos e farmacêuticos, o fornecimento e a aplicação de meios, os cuidados e os demais atos médicos e paramédicos necessários;
V - Beneficiários da Assistência Médico-Hospitalar - são os militares da ativa ou na inatividade, bem como seus respectivos dependentes definidos no Estatuto dos Militares;
VI - Beneficiários dos Fundos de Saúde - são os beneficiários da assistência médico-hospitalar que contribuem para os Fundos de Saúde e os dependentes dos militares que, a critério de cada Força, sejam enquadrados nos regulamentos dos respectivos Fundos
Frise- que o conceito de Fundo de Saúde, nos termos atuais, foi uma criação do Decreto referido, considerando que a Lei n.º 6.880 dispõe apenas acerca da assistência médico-hospitalar e lista o rol de dependentes dos militares. Dessa forma, Beneficiários da Assistência Médico-Hospitalar são os militares e seus respectivos dependentes definidos no Estatuto dos Militares, visto que o Decreto, por ser ato regulamentar, não poderia violar a Lei n.º 6.880, restringindo dependentes definidos legalmente.
Entretanto, no que concerne ao Fundo de Saúde, fundamentada apenas no Decreto n.º 92.512, os beneficiários são grupos definidos por ato infra legal. Neste sentido, o próprio Decreto já delimitou que Beneficiários dos Fundos de Saúde são os militares que contribuem para o Fundo de Saúde e dependentes que, a critério de cada Força, sejam enquadrados nos regulamentos dos respectivos Fundos.
Perceba-se que todos os dependentes listados por meio da Lei n.º 6.880 terão direito à assistência médico-hospitalar, contudo, somente os dependentes listados em atos regulamentares das respectivas forças armadas serão beneficiários do FUSEx, subdivisão do conceito genérico de "assistência médico-hospitalar". Dessa forma, aos militares e seus dependentes é garantida a assistência médica através dos Ministérios Militares; Hospital das Forças Armadas; de Assistência Social dos Ministérios Militares, quando existentes; do meio civil, especializadas ou não, oficiais ou particulares, mediante convênio ou contrato; do exterior, especializadas ou não.
A diferença residirá apenas na coparticipação do beneficiário, caso contribua para o FUSEx, será de vinte por cento do total do atendimento, se cobertas pelo sistema, e a cem por cento, no caso de despesas não cobertas, mas financiadas pelo FUSEx; caso não se enquadre no FUSEx, haverá pagamento integral das indenizações devidas pela assistência médico-hospitalar que lhes for prestada em OMS ou, por meio de convênios ou contratos. Sublinhe-se que, em virtude do custeio parcial pelo Poder Público, a tabela de valores de ressarcimento é inferior à média do preço pago no mercado por consultas, procedimentos etc, resultando em vantagem financeira aos beneficiários do SAMMED, não incluídos no subgrupo do FUSEx. Outrossim, nenhum beneficiário ficará desamparado e alijado do sistema de assistência médico-hospitalar.
Complementando o Decreto n.º 92.512, foi editada a Portaria n.º 653, de 30 de agosto de 2005 pelo Comandante do Exército, disciplinando o funcionamento do FUSEx, por força do art. 46 deste Decreto e art. 50, IV, da Lei n.º 6.880. Por meio desta Portaria, aprimorou-se conceitos legais, definindo-se que:
Art. 3º - Omissis
II - beneficiários do FUSEx – são os(as) militares do Exército, na ativa ou na inatividade,as(os) pensionistas, que são contribuintes do FUSEx, bem como os seus dependentes instituídos, de acordo com os arts. 4º, 5º e 6º destas IG, como também os incluídos legalmente com base em IG anteriores;
V - cadastro de beneficiários (CADBEN/FUSEx) é a relação informatizada de todos os beneficiários do FUSEx;
IX - FUSEx - é o fundo constituído de recursos financeiros oriundos de contribuições obrigatórias e indenizações de atendimento médico-hospitalar dos militares, na ativa e na inatividade, e de pensionistas de militares, destinado a complementar o custeio da assistência médico-hospitalar para si e para os seus beneficiários;
Veja que a Portaria supramencionada definiu os beneficiários do FUSEx, cuja previsão se limita ao Decreto n.º 92.512, com fundamento no art. 3º, VI, deste Decreto. Não vislumbra-se a possibilidade de conflito de legalidade neste ponto, tendo em vista que a Lei n.º 6.880 garantiu apenas o direito à assistência médico-hospitalar aos beneficiários e seus dependentes, permitindo a regulamentação específica por cada Força, sem que houvesse qualquer menção ao FUSEx.
O Presidente da República, com fundamento no exercício de seu poder regulamentar, disciplinou a matéria criando um subgrupo dentro da assistência prestada, mormente o FUSEx, o qual coexiste com a prestação de assistência médico-hospitalar aos demais militares e dependentes não incluídos no referido fundo. Considerando que o FUSEx, no cenário legislativo atual, é criação do Decreto n.º 92.512, no máximo, poderia-se cogitar em conflito entre o Decreto e a Portaria n.º 653, o que também não ocorreu, visto que este Decreto, ao instituir o FUSEx, definiu que seus beneficiários são aqueles que contribuem para os Fundos de Saúde e os dependentes dos militares que, a critério de cada Força, sejam enquadrados nos regulamentos dos respectivos Fundos.
Os militares e dependentes que não sejam incluídos no FUSEx, em virtude de critério de conveniência e oportunidade de cada Força, ingressam no regramento geral do Sistema de Assistência Médico-Hospitalar aos Militares do Exército, Pensionistas Militares e seus Dependentes – SAMMED. Perceba-se que a escolha dos beneficiários do subgrupo denominado FUSEx se encontra dentro da discricionariedade administrativa que analisará critérios de oportunidade e conveniência, balizando-se na ciência atuarial.
Neste sentido, dispõe o art. 32, §1º, do Decreto n.º 92.512 que "os beneficiários dos Fundos de Saúde de cada Força estarão sujeitos ao pagamento de 20%.(vinte por cento) das indenizações devidas pela assistência médico-hospitalar que lhes for prestada em organizações de saúde das Forças Armadas, ou através de convênios ou contratos, sendo o restante coberto com os recursos financeiros relacionados no Título III, conforme regulamentação de cada Força". Noutro giro, os beneficiários da Assistência Médico-Hospitalar, não enquadrados como beneficiários dos Fundos de Saúde das respectivas Forças, estarão sujeitos ao pagamento integral das indenizações devidas pela assistência médico-hospitalar que lhes for prestada em organizações de saúde das Forças Armadas ou através de convênios ou contratos.
Com a finalidade de enfatizar essa dualidade entre o SAMMED custeado por fator de custo e/ou indenização integral e SAMMED custeado de acordo com recurso do Fundo de Saúde do Exército (FUSEx), ilustra-se a Portaria nº 049-DGP, de 28 de Fevereiro de 2008, que dispõe, por meio do art. 8º, §§2 e 3º, respectivamente, que "Os militares citados neste artigo, bem como seus dependentes econômicos, legalmente constituídos, deverão ser atendidos pelo Sistema de Assistência Médica aos Militares do Exército, Pensionistas Militares e seus Dependentes (SAMMED), com recursos financeiros do Fator de Custos". No que toca aos "dependentes econômicos destes militares, legalmente declarados, com base nos §§ 2º e 3º do art. 50 do E/1, deverão ser atendidos pelo SAMMED, mediante indenização de 100% das despesas geradas, em conformidade com o previsto nas IG 30-16".
Por sua vez, a Portaria n.º 878, textualiza essa divisão entre a forma de prestação de assistência médico-hospitalar:
Art. 26. Os usuários do SAMMED, ressalvadas as isenções previstas nos arts. 30 e 31 destas IG, estarão sujeitos:
I - ao pagamento integral das indenizações devidas pela assistência médico-hospitalar que lhes for prestada em OMS ou, por meio de convênios ou contratos, em OCS ou PSA; e
II - ao pagamento de vinte por cento das indenizações devidas pela assistência médico-hospitalar que lhes for prestada em OMS ou, por meio de convênios ou contratos, em OCS ou PSA, se contribuintes/beneficiários do FUSEx.
Repise-se que não há ilegalidade na estruturação da assistência médico-hospitalar em subgrupos, tendo em vista que a Lei n.º 6.880 apenas define o conceito de assistência, transferindo as condições ou limitações impostas à legislação e regulamentação específica, de acordo com o art. 50, IV, do Estatuto dos Militares.
Paralelamente à análise legislativa, deve-se consultar decisões judiciais firmadas a respeito do tema. Neste sentido, o Tribunal Regional da 4ª Região possui entendimento no seguinte sentido:
ADMINISTRATIVO. MILITAR. SOGRA - DEPENDÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA. INCLUSÃO COMO BENEFICIÁRIA NO FUSEX - POSSIBILIDADE. LIMITE TEMPORAL DETERMINADO EM PORTARIA - IMPOSSIBILIDADE.
1. Com a comprovação de que a sogra de militar é sua dependente econômica, faz jus ela à sua inclusão como beneficiária no FUSEX.
2. As Portarias não podem limitar direito concedido em lei que pretende regular.
(APELAÇÃO CÍVEL Nº 2009.70.00.000259-2/PR; RELATOR: Juiz Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO; Órgão Julgador: TRF4 - 3ª Turma).
Não obstante este precedente não discuta a inscrição de pais na qualidade de dependentes, debate-se acerca da limitação temporal que se aplica a outro grupo de dependente em situação análoga. Da leitura da fundamentação do voto, percebe-se claramente que o judiciário não tem amadurecido sua argumentação nos fundamentos ora expostos. Sequer menciona-se a existência do SAMMED e suas subdivisões. Confunde-se claramente o FUSEx com o conceito de assistência médico-hospitalar.
Percebe-se que a discussão tem se restringido ao FUSEx; art. 50, IV, da Lei n.º 6.880; princípio da legalidade e poder regulamentar da administração pública. Não se vislumbra discussão acerca do funcionamento e estruturação do sistema de saúde do Exército e suas ramificações em PASS, SAMMED e SAMEx, bem como subdivisão do SAMMED em FUSEx e prestação da assistência com base no fator de custo e/ou coparticipação/indenização integral. Não se discute no precedente se o dependente mantém esta qualidade, contudo, deverá ser inscrito no SAMMED, sem que faça parte do subgrupo dos beneficiários do FUSEx.
Frise-se também que as conclusões expostas neste artigo jurídico acerca da limitação temporal não versa sobre a (im)possibilidade de reinclusão do dependente após a publicação da Portaria n.º 653, o que, ao que me parece, tem sido admitido administrativamente.
3 CONCLUSÃO
O presente estudo permite concluir que o rol de dependentes é legalmente definido, sem que se possa ampliá-lo ou restringi-lo por meio de ato infra legal, sob pena de afronta ao princípio da legalidade. Contudo, o FUSEx não se confunde com assistência médico-hospitalar, não havendo menção no Estatuto dos Militares, que se limitou a dispor acerca da assistência médico-hospitalar como direito dos militares e seus dependentes, deferindo às Forças Armadas a regulamentação específica de como esse serviço deverá ser prestado.
O conceito de Fundo de Saúde, nos moldes atuais, foi uma criação do Decreto n.º 92.512 considerando que a Lei n.º 6.880 dispõe apenas acerca da assistência médico-hospitalar e lista o rol de dependentes dos militares. Dessa forma, todos os dependentes listados por meio da Lei n.º 6.880 terão direito à assistência médico-hospitalar, contudo, somente os dependentes listados em atos regulamentares das respectivas forças armadas serão beneficiários do FUSEx, subdivisão do conceito genérico de "assistência médico-hospitalar.
A Portaria n.º 653 do Comandante do Exército definiu os beneficiários do FUSEx, cuja previsão se limita ao Decreto n.º 92.512, com fundamento no art. 3º, VI, sem que configure conflito de legalidade neste ponto, tendo em vista que a Lei n.º 6.880 garantiu apenas o direito à assistência médico-hospitalar aos beneficiários e seus dependentes, permitindo a regulamentação específica por cada Força, sem que houvesse qualquer menção ao FUSEx.
Outrossim, tendo em vista que o FUSEx é criação do Decreto n.º 92.512, no máximo, poderia-se cogitar em conflito entre o Decreto e a Portaria n.º 653, o que também não ocorreu, visto que este Decreto, ao instituir o FUSEx, definiu que seus beneficiários são aqueles que contribuem para os Fundos de Saúde e os dependentes dos militares que, a critério de cada Força, sejam enquadrados nos regulamentos dos respectivos Fundos.
Os militares e dependentes que não sejam incluídos no FUSEx ingressam no regramento geral do Sistema de Assistência Médico-Hospitalar aos Militares do Exército, Pensionistas Militares e seus Dependentes – SAMMED, de sorte que não há ilegalidade na limitação temporal instituída por meio da Portaria n.º 653 do Comandante do Exército.
4 REFERÊNCIAS
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 23ª ed.. Malheiros: São Paulo, 1998.
BRASIL. Tribunal Regional da 4 ª Região. Apelação Cível. AC n.º 2009.70.00.000259-2/PR . Relator: João Pedro Gebran Neto. Julgado em 23 de novembro de 2010. Disponível em: < https://trf-4.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/18508989/apelacao-civel-ac-259-pr-20097000000259-2-trf4>. Acesso em: 06/12/2017.
NOTAS:
[1] MEIRELLES, Hely Lopes, Direito Administrativo Brasileiro, 23ª ed., Malheiros: São Paulo, 1998, p. 112.
Advogado da União. Graduado em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal da Paraíba.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PEREIRA, Danillo Vilar. Fundo de Saúde do Exército e cadastramento de dependentes: legalidade da limitação temporal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 dez 2017, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/51128/fundo-de-saude-do-exercito-e-cadastramento-de-dependentes-legalidade-da-limitacao-temporal. Acesso em: 22 dez 2024.
Por: Gabriel Bacchieri Duarte Falcão
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Por: Sócrates da Silva Pires
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