RESUMO: O estudo trata de temas que visam compreender os fundamentos principiológicos que servem de base ao instituto da adoção. Inicialmente, para o correto desenvolvimento da análise, é necessário debruçar-se sobre o procedimento jurídico imposto a criança, antes que seja cogitada sua retirada no seio familiar biológico, nesta fase, uma série de critérios são observados para que a medida aplicada a criança, conforme tange o art. 101 da Lei n° 8.069/1990, corresponda a ela como o melhor ao seu interesse e bem-estar. Observando a realidade do instituto da adoção, compreende-se um processo moroso e cercado de percalços que se estendem por anos, é nesse contexto que surge a adoção à brasileira, como um meio de fuga do processo legal, mas que por sua vez infringe direitos e garantias constitucionais voltadas à criança e ao adolescente. A partir disso, analise a infração ao princípio da dignidade da pessoa humana e do melhor interesse para a criança, onde o processo judicial que conduz o instituto se afasta do fim último, que concerne na proteção do direito da criança/adolescente à convivência família.
PALAVRAS-CHAVE: Princípios. Adoção. Convivência familiar.
ABSTRACT: The study deals with themes that aim to understand the principled foundations that serve as the basis for the adoption institute. Initially, for the correct development of the analysis, it is necessary to look into the legal procedure imposed on the child, before its removal from the biological family is considered, at this stage, a series of criteria are observed so that the measure applied to the child, as per art. 101 of Law No. 8.069/1990, corresponds to it as best to your interest and well-being. Observing the reality of the adoption institute, it is understood a lengthy process and surrounded by mishaps that extend for years, it is in this context that Brazilian adoption arises, as a means of escape from the legal process, but which in turn infringes rights and constitutional guarantees aimed at children and adolescents. From this, analyze the violation of the principle of human dignity and the best interest for the child, where the judicial process that leads the institute moves away from the ultimate end, which concerns the protection of the child/adolescent's right to family life.
KEYWORDS: Principles. Adoption. Family living.
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo busca a compreensão das bases principiológicas que regem o instituto da adoção e como esses fundamentos são afetados por um processo moroso que apresenta uma série de critérios a serem seguidos, antes que a criança/adolescente seja realocada em uma família substituta. É necessário destacar que, os princípios que regem o instituto da adoção, são resultado de uma série de alteração legislativas e por isso devem ser compreendidos como base para a concretização do objetivo do instrumento jurídico.
Destaca-se que, conforme o desenvolvimento histórico, as leis acerca da adoção, que antes visavam a garantia do pátrio poder e a proteção do instituto familiar, mudaram o paradigma ao observar a criança e ao adolescente como sujeito a ser especialmente protegido. Tal consideração trouxe ao redor das décadas, garantias que sobretudo observassem a proteção daqueles que já foram tão marginalizados pela sociedade e pela instituição familiar.
Por isso, incialmente, visa-se analisar como ocorre o procedimento aplicado a criança quando é verificada a situação de vulnerabilidade com a infração de seus direitos. Destaca-se então acerca das medidas que são impostas a criança, visto que, em razão da adoção ser a última ratio, a criança ao ser acolhida passa por uma série de profissionais especializados que analisarão sua condição física e psicológica, e com o afastamento familiar, como as autoridades competentes se baseiam para determinar se o afastamento será temporário ou definitivo.
Posteriormente, o estudo debruça-se acerca da adoção à brasileira, como um meio de burlar o processo judicial que conduz o instituto da adoção. Verifica-se que, a maioria dos casos de adoção a brasileira, ocorre em razão do fortalecimento de um estereótipo social imposto às crianças e adolescentes que se encontram em lares de acolhimento. Ao ser cadastrado no sistema nacional de adoção e acolhimento, o adotante ao impor filtros que corresponde a minoria das crianças acolhidas, ao passar anos na fila de espera por uma criança que se enquadre aos critérios, ao encontrar, fora dos meios legais a criança pretendida, em ato de registrá-la como seu filho biológico, burlando todo um sistema judicial, comete adoção a brasileira e infringe o direito da criança de conhecer sua origem, podendo responder criminalmente pelo ato praticado.
Em seguida, destaca-se que, todos os profissionais que atuam no processo de adoção, devem sobretudo, ter observância ao princípio da dignidade da pessoa humana e do melhor interesse para a criança. Tudo isso deve servir de base para que a criança que se encontra em situação de vulnerabilidade, com o direito de convivência familiar sendo infringido, tenha seu sofrimento reduzido, e seja assegurada a ela, condições de vida digna, para o seu correto desenvolvimento.
Portanto, o trabalho elenca os princípios mais importantes que tangem o processo adotivo e como a flexibilização deles, proporcionam condições infratoras aos direitos da criança e do adolescente, apontando a necessidade e obrigação de cumprimento das garantias elencadas na constituição não só pela família, mas também pelo estado e pela sociedade como um todo.
2 O PROCEDIMENTO APLICADO A CRIANÇA OU ADOLESCENTE NO ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL ATÉ A DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR
Conforme anteriormente elucidado, o processo adotivo encontra-se como uma medida legal a ser recorrida para aqueles que querem expandir seu núcleo familiar. Mas, antes de chegar ao patamar de calmaria e conforto e vislumbrar pretendentes e crianças completamente aptos para participar do processo adotivo, a criança que fora retirada de uma situação de vulnerabilidade vivenciou uma série de contextos que pudessem efetivar a sua retirada da família biológica.
O Estatuto da Criança e do Adolescente regimenta o instituto da adoção amparado em uma série de procedimentos a serem seguidos desde o acolhimento da criança que possui seu direito transgredido até o tratamento de causas que podem a vir a efetivar a perca do poder familiar. A medida judicial retro mencionada reflete como uma forma do indivíduo por consequência de seus atos, entregar seus filhos ao Estado a fim de que tutele a segurança da criança ou adolescente. (LYRA, 2019, p. 14).
Tendo como amparo o texto legal do Estatuto da Criança e do Adolescente o artigo 45 é claro ao mencionar que a adoção deverá ser precedida de autorização dos pais biológicos da criança, trazendo como ressalva o caso de serem desconhecidos ou tenham sido destituídos do poder familiar, conforme previsão do artigo 1.638 do Código Civil.
A lei traz uma série de previsões que permitem a autoridade judicial intervir no núcleo familiar a fim de preservar o melhor interesse para a criança ou adolescente que, de acordo com o caso concreto, possui direitos sendo transgredidos pela família sanguínea.
Para Dias (2021, p. 315), o Estado atua na instituição familiar de forma fiscalizadora, e sendo identificada a infração prevista em lei, terá cabimento para intervir, suspendendo ou extinguindo o poder familiar.
A lei é clara ao expor no artigo 1.638 e incisos que, castigar de forma imoderada, abandonar, atuar com atos contrários a moral e aos bons costumes, ou ainda, abusar de sua autoridade, não agindo de acordo com as responsabilidades impostas perante os filhos, poderão os pais, perder o poder familiar, visto que é dever do Estado, garantir o bem estar dos incapazes.
Um exemplo de vetor para utilização das medidas de proteção trazidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente é o da infração dos direitos em razão da falta, omissão ou abuso dos pais, conforme artigo 98 do mencionado aparato legal. Analisado tal ponto, mais adiante, o art. 101 aponta quais as medidas a serem utilizadas visto que o direito da criança ou adolescente foi infringido.
É preciso salientar que, a lei a todo momento ressalta que a intenção não é de imediato a destituição do poder familiar, mas sim, uma reintegração segura da criança no seio familiar biológico, visto que o instituto da adoção só é recorrido como última medida, conforme inciso IX do art. 101. Vejamos: Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas: [...] IX - colocação em família substituta (BRASIL, 1990).
Quando a criança é encontrada em uma situação de perigo aos seus direitos e garantias, o ato de encaminhamento do indivíduo até uma instituição de acolhimento, não pode ser efetuado de forma autônoma pelo membro do conselho tutelar, devendo a situação ser informada a autoridade judicial a fim de que determinada expedição de guia de acolhimento para que a criança ou adolescente seja amparada no ambiente adequado, conforme dispõe o §3°, art. 101 do ECA, após a análise e cumprimento de uma série de exigências a serem seguidas. Sendo necessário requerer pela suspensão ou destituição do poder familiar, o Ministério Público ou outro interessado inicia o procedimento apresentando petição nos moldes do art. 156 do ECA a competente autoridade judiciária.
Recebida a petição, havendo fundada motivação de cunho grave, a autoridade poderá decretar liminarmente ou incidentalmente a suspensão do poder familiar, nos termos do art. 157 do ECA. Não havendo grave motivação, será determinada a citação e posterior estudo do caso concreto, com analise dos profissionais competentes, a fim de identificar se o caso realmente se enquadra como causa de suspensão ou extinção do poder familiar.
Dias (2021, p. 316) apresenta a suspensão como uma sanção mais leve a ser aplicada em face dos pais, não como forma de punir, mas sim de preservar os interesses da criança ou adolescente. Por sua vez, a autora trata de destituição do poder familiar através de dois termos: a perda, que se da através de uma sentença judicial, e através da morte, com a extinção do sujeito passivo.
Conforme previsão legal do art. 158 do ECA, o requerido será citado para que se manifeste no prazo de 10 (dez) dias, indicando as devidas provas que pretende produzir, documentação e rol de testemunhas. Não havendo contestação e findado o estudo social ou perícia o processo é encaminhado ao Membro do Parquet para vistas no prazo de 5 (cinco), exceto se ele for o requerente. Quando o processo volta para a autoridade judiciária, ele terá mais 5 (cinco) dias para proferir decisão.
Havendo contestação o processo segue, sendo designada data para realização de audiência de instrução e julgamento. Serão ouvidas as testemunhas que possam comprovar a situação de risco vivenciada pela criança ou adolescente, será colhido o parecer técnico, logo após, tem a palavra o requerente, o requerido e o Ministério Público, quando este não for o requerente, como prevê o §2° do art. 162 do ECA. Destaca-se também que os pais eles serão ouvidos, sempre que seja possível identifica-los, conforme art. 161, §4° do ECA. Vejamos:
Art. 161. Se não for contestado o pedido e tiver sido concluído o estudo social ou a perícia realizada por equipe interprofissional ou multidisciplinar, a autoridade judiciária dará vista dos autos ao Ministério Público, por 5 (cinco) dias, salvo quando este for o requerente, e decidirá em igual prazo. [...] § 4º É obrigatória a oitiva dos pais sempre que eles forem identificados e estiverem em local conhecido, ressalvados os casos de não comparecimento perante a Justiça quando devidamente citados (BRASIL, 1990).
A decisão poderá ser proferida em audiência ou no prazo de 5 (cinco) dias e essa sentença será averbada no registro de nascimento da criança ou do adolescente, conforme §3° do art. 162 e art. 163, parágrafo único.Em sendo pedido de colocação em família substituta, o pedido deverá atender os requisitos legais previstos no artigo 165 do ECA. Há hipóteses há serem consideradas, elencadas no art. 166 do mesmo Estatuto, onde é exposto que, se os pais forem falecidos, tiverem sido destituídos do poder familiar, ou tiverem concordado com a colocação em família substituta, o pedido poderá ser feito diretamente no cartório, salientando-se que tal ato, extingue o poder familiar. Os pais deveram expressar consentimento que deverá ser ratificado na audiência, conforme §4° do art. 166 do ECA. Vejamos:
Art. 166. Se os pais forem falecidos, tiverem sido destituídos ou suspensos do poder familiar, ou houverem aderido expressamente ao pedido de colocação em família substituta, este poderá ser formulado diretamente em cartório, em petição assinada pelos próprios requerentes, dispensada a assistência de advogado. [...] § 4° O consentimento prestado por escrito não terá validade se não for ratificado na audiência a que se refere o § 1 o deste artigo (BRASIL, 1990).
Os devidos profissionais repassam todas as informações necessárias as partes, para que todos seus direitos e deveres daquele dia em diante fiquem claros perante a criança ou adolescente que está sendo realocado de sua família. O processo seguirá os mesmos tramites legais anteriormente mencionados, quais sejam, analise de estudo social, perícia por equipe interprofissional e acompanhamento do Ministério Público, tudo isso a fim de identificar se essa medida de fato corresponderá como o melhor para os interesses da criança ou adolescente e por fim a autoridade judiciária proferirá decisão e a criança se destituída do poder familiar, será cadastrada no Sistema Nacional de Adoção e acolhimento.
3.ADOÇÃO À BRASILEIRA COMO RESULTADO DO PROCEDIMENTO UTILIZADO PELO JUDICIÁRIO BRASILEIRO
Como anteriormente elucidado, a pratica da adoção foi difundida por pelo decorrer dos séculos. Apesar de ser um ato antigo, a questão normativa desse instituto no Brasil é consideravelmente recente, tendo em vista as atuais reformas legislativas que permeiam o instituto.
A fim de viabilizar a aproximar o instituto das partes requerentes foi criado o Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento. Tal sistema serve como núcleo de informações daqueles que pretendem ampliar seu conjunto familiar, nele, são cadastradas as partes que pretendem encontrar um filho, bem como, a criança que está apta a ser adotada, sendo exigido cumprimento de uma série de requisitos anteriormente mencionados (MARCHI; TEIXEIRA, 2018. p. 12).
Com a complexidade do processo judicial, bem como, a maior burocratização em razão da morosidade, muitos pretendentes recorrem a meios ilegais para conseguir o tão sonhado filho, de forma a registrar como seu, filho concebido por outrem, sem que seja observado todos os requisitos legais ou cobrança de qualquer exigência, o que denomina-se de “Adoção à brasileira” (FRANCO, 2020, p. 18).
Percebe-se que, a realidade destoa do que prevê o texto legal uma vez que, o processo adotivo tem uma curta duração, como elencado no §10° do art. 47 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Mas o que ocorre de fato é que, em razão da falta de atualização cadastral, a desistência de pretendentes sem comunicação e devida alimentação do sistema, resulta no congestionamento dos processos, fazendo com que aquele que realmente tenha o interesse de adotar e seguir os tramites legais passe anos a fim de conseguir um filho.
Como consequência dos muitos filtros exigidos junto ao sistema nacional de adoção e acolhimento, vem a ocorrer a mora processual, onde muitos indivíduos recorrem a adoção à brasileira. Vale salientar que, o Código Penal tipifica tal ato como crime contra o estado de filiação, trazendo disposição no art. 242, visto que o ato vai de encontro com direito do jovem de conhecer sua origem (DIAS, 2021, p. 233).
As consequências desencadeadas desse ato são de níveis extremos, uma vez que, o registro de nascimento da criança pode vir a ser anulado, a adoção é colocada numa situação de vulnerabilidade, uma vez que o vínculo foi estabelecido, além da detenção dos sujeitos ativos do fato típico (FRANCO, 2020, p. 19).
Um ponto importante a ser destacado trata-se da questão da irrevogabilidade, prevista no §1° do art. 39 do ECA. Quando tratar-se de um caso de adoção à brasileira, devem ser considerados uma série de pontos, antes de elencar questionamentos acerca da revogação do ato. A adoção a brasileira é identificada, por exemplo, através do indivíduo que durante a relação, registrou como seu o filho concebido por outrem, mas que com o termino do relacionamento, deseja eximir-se da responsabilidade, neste caso, não seria cabível ato anulatório, uma vez que não houve erro e a paternidade foi exercida de forma espontânea (DIAS, 2021, p. 220).
O instituto da adoção é tratado como irrevogável prezando pela dignidade da criança que compõe o vínculo jurídico. Ao dar atenção apenas a forma irregular de estabelecimento do vínculo sem considerar que ali fora construída uma relação com efeitos sociais, jurídicos e psicológicos, cogitar a revogação do instituto seria uma infração mais gravosa ao direito da criança (SANTOS, 2010, p.11).
Outro ponto que favorece a adoção a brasileira seria os critérios apresentados no sistema nacional de adoção de acolhimento, uma vez que as características exigidas frente a criança pela maioria dos pretendentes proporcionam a mora processual.
A conservação de estereótipos da criança perfeita afunila cada vez mais a esperança daqueles que vivem em lares de acolhimento. Observa-se por exemplo que, 72,7% dos pretendentes a adotar uma criança, tem preferência pelo filho de cor branca, mas o que conclui-se é que, os indivíduos buscam crianças que se assemelhem as características dos membros do núcleo familiar, apresentando preferencias sobre a cor, idade ou até se a criança porta doença, fazendo com que o leque de possibilidade de crianças aptas fique cada vez mais restrito (AMIM; MENANDRO, 2007, p. 248).
Dessa forma, quando o pretendente encontra uma criança que se enquadre nos moldes de sua preferência, sem seguir os tramites legais, burlar o sistema reconhecendo como seu filho gerado por outra pessoa, torna-se muito mais fácil do que seguir os requisitos legais e aguardar por anos em uma fila de espera por um filho que se enquadre nas descrições especificadas junto ao sistema nacional de adoção e acolhimento.
Por fim, compreende-se que o ato de adotar sem seguir os tramites legais, reconhecendo como filho biológico, aquele que fora concebido por outrem e assim o registrar, além de ser considerado como ato criminoso e lesar o processo adotivo, é também um ato ocasionado pela implantação de ferramenta que traz possibilidade de delimitação de crianças aptas, fazendo com que o pretendente conserve um estereótipo de criança pretendida e torne o processo moroso.
4.PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DO MELHOR INTERESSE PARA A CRIANÇA FRENTE AO DIREITO CONSTITUCIONAL DA CONVIVÊNCIA FAMILIAR À LUZ DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
O princípio da dignidade da pessoa humana pode ser conceituado como um conjunto de direitos básicos que proporcionam o bom convívio em sociedade, protegido constitucionalmente, ele tido como direitos de primeira dimensão. A dignidade do indivíduo comporta uma série de direitos dentre os quais o Estado tem o dever de proteção, sendo eles, elencados no art. 5° da Carta Magna (MELO, 2017, p. 20).
Para Dias (2021, p. 65) o princípio da dignidade da pessoa humana é a ordem máxima a ser observada nos casos concretos, visto que é dele que advém outros direitos constitucionais. Seria com base na atenção a esse principio que o estado regeria sua conduta perante o indivíduo, seja o amparando, ou o controlando.
O processo adotivo surge como forma de suprir a lacuna que existe na vida da criança que esteve em estado de vulnerabilidade, buscando através da adoção a efetivação da garantia constitucional da convivência familiar prevista no art. 227 do Texto Constitucional, bem como no art 4° do Estatuto da Criança e do Adolescente.
É se amparando no instituto da adoção que a dignidade da criança é restabelecida, uma vez que, saindo da situação de vulnerabilidade do núcleo familiar biológico, sua criação é muitas vezes imposta a familiares indiferentes a seu bem estar, não a restando outra saída que não seja o acolhimento institucional para conseguir posteriormente uma familia substituta (BORGES; EBAID, 2020, p. 26).
Conforme anteriormente pontuado, diversos são os fatores considerados que ocasionam a retirada de uma criança ou adolescente de sua família biológica, sempre visando a ideia de que a adoção deve ser a última medida a ser recorrida. O fato é que, por vezes, a criança encontra-se em uma situação de marginalidade em razão da falta de amparo familiar e estatal, devido a superlotação dos lares de acolhimento, sendo a adoção uma forma de suprir a dignidade que lhe foi retirada (CACHAPUZ, 2005, p. 355).
Antes à adoção da teoria da proteção integral da criança, prevalecia o Código de Menores e nele, a ideia de acolhimento era levada como meio que efetivava o desvinculo familiar. Nesse contexto, a criança era tida marginalizada até nos abrigos, tendo em vista, não se enquadrava nos moldes familiares determinados, visto que havia um estereótipo preservado na época (SILVA, 2004, p. 290).
Logo, é possível fazer um comparativo com o que prevalecia entre os anos de 1927 a 1979 com o que é vivenciado pelas crianças que não se enquadram no padrão mais solicitado junto ao Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento nos dias atuais. Independentemente de cor da pele, dos olhos, necessidades especiais, ou faixa etária, a toda criança deveria ser proporcionada a oportunidade de reintegração ao convívio familiar, a fim de que sejam preservados valores e ensinamento que apenas a instituição familiar pode prestar a criança ou adolescente, assegurando a dignidade que foi perdida com a situação de vulnerabilidade.
O processo adotivo em prática fere a dignidade da criança e adolescente que vê seu tempo perdido no lar de acolhimento, por simplesmente não se enquadrar no padrão requisitado pelos pretendentes (BITTENCOURT, 2018, p.14). Isso ocorre em razão do procedimento adotado pelo judiciário no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento, onde é concedida margem para que o adotante crie ainda mais obstáculos para a criança que já se encontra sem o convívio familiar, ferindo sua garantia constitucional.
Portanto compreende-se que a dignidade da pessoa humana voltada ao processo adotivo no dever de convivência familiar, é antes de tudo, o cuidado pelo tempo que a criança passa sem a instituição familiar que lhe é devida. Esse fator pode vir a lhe causar uma série de traumas, frustrações e consequências futuras que o estado teria o dever de prevenir.
Quando refere-se ao processo adotivo, os cuidados processuais devem ser de atenção redobrada, uma vez que o interesse tutelado é voltado ao indivíduos especialmente protegidos pelo estado. Desde o acolhimento da criança, até a destituição do poder familiar, bem como, a inserção da criança em um novo núcleo familiar, um princípio norteia todo o procedimento a fim de garantir a criança a melhor saída para sua condição de vulnerabilidade: o princípio do melhor interesse da criança.
Tal princípio ganhou atenção especial com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente que adotou a teoria da proteção integral, regida pelo princípio do melhor interesse, onde amparado ao auxilio da família, possa assegurar a criança, adolescente ou jovem os direitos previstos no art. 4° do retro mencionado Estatuto (DIAS, 2021, p. 72).
A teoria da proteção integral em conjunto com o princípio do melhor interesse da criança, trouxe a ideia do menor como sujeitos de direitos. Nesse contexto, todas as medidas e atos utilizados seja no acolhimento, ou na destituição do poder familiar, bem como, na adoção, sempre devem visar o melhor interesse aos direitos da criança ou adolescente (BITTENCOURT, 2018, p. 7).
Nesse diapasão, pode-se entender que, quando a criança ou adolescente encontra-se em estado de marginalidade, não lhe sendo assegurado os direitos previstos no artigo 4° do ECA, tanto o Estado, como a família, como a sociedade em geral, deixou a desejar no seu dever perante esse indivíduo. Sobrevindo a essa situação, o instituto da adoção, que surge como meio de reparação dessa falta.
Dessa forma, o texto legal do ECA, dispõe no art. 43, que a adoção deverá ser deferida, quando havendo motivos legítimos, apresentar reais vantagens para o adotando, ficando claro a base principiológica da previsão normativa. Tendo isso em atenção, não deve-se considerar que a destituição da criança do seu âmbito familiar biológico seria uma forma de punição daqueles que a colocaram em estado de vulnerabilidade, mas sim, um meio de efetivar seus direitos e garantias que foram anteriormente violados.
Portanto, é possível compreender que, seja no procedimento de retirada da criança do núcleo familiar sanguíneo, ou perante a situação de adoção à brasileira, as autoridades competentes devem visar a proteção da criança ou adolescente que ali se encontra com seus direitos em risco, de forma que todo o caso concreto deve ser analisado visando a solução mais favorável a esse indivíduo.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao finalizar o estudo, compreende-se, portanto, que os princípios são fontes necessárias e de suma importância, que conduzem as ações de todas as partes envolvidas no instituto da adoção. Por isso, o agir do profissional envolvido no processo adotivo deve ter atenção nas medidas que irão proporcionar a segurança da criança/adolescente, bem como o afastamento da situação de vulnerabilidade, infratora do bem estar e da dignidade do sujeito, alvo da proteção.
Nessa perspectiva, compreende-se a necessária atuação do judiciário no processo adotivo, bem como, o cumprimento de todas suas etapas. Contrariamente ao estipulado, a adoção à brasileira é um crime que além de burlar o controle judicial acerca do instituto, infringe ainda mais os direitos dos sujeitos tutelados, zelados pela Carta Magna e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, norma infraconstitucional, além de trazer mora excessiva ao processo que por si, já encontra obstáculos para finalização.
Aponta-se que, a toda criança/adolescente é assegurado o direito de conhecer sua família biológica, bem como, o de conviver em ambiente familiar que protejam seus interesses. Tendo isso em observância, destaca-se que, o não cumprimento do devido processo legal, bem como, a falta de foco à condição de vulnerabilidade da criança/adolescente, apresentam-se como afastamento/flexibilidade dos princípios da dignidade da pessoa humana e do melhor interesse para a criança.
Neste diapasão, compreende-se que, as ações das partes quando não observados os princípios, fogem no fim ultimo do instituto, que se ampara em proteger as crianças e adolescentes, garantindo o máximo de dignidade na instituição primária, que, via de regra, deveria proteger seus interesses. Portanto, destaca-se a necessidade de cuidado com os direitos dos menores que encontram marginalizados pela sociedade e pela família, tendo atenção especial ao zelo pelos princípios constitucionais que regem o instituto da adoção, para que a criança/adolescente possa ser removido da situação de vulnerabilidade da melhor maneira.
REFERÊNCIAS
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Graduanda no curso de direito pela Associação Vitoriense de Educação, Ciência e Cultura - AVEC Centro Universitário FACOL - UNIFACOL.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Maria Laura de Sousa. Infrações as bases principiológicas que regem o processo adotivo brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 dez 2022, 04:21. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/60495/infraes-as-bases-principiolgicas-que-regem-o-processo-adotivo-brasileiro. Acesso em: 21 nov 2024.
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