JÉSSICA CAVALCANTI BARROS RIBEIRO[1]
GUILHERME SABINO NASCIMENTO SIDRÔNIO DE SANTANA[2]
(coautores)
RESUMO: O objetivo deste artigo é conectar a obra literária “Torto Arado”, de autoria de Itamar Rangel Vieira Júnior com a ciência do Direito. A principal relação dessa obra literária com a ciência jurídica são os pontos da narrativa que refletem os Direitos Humanos e Direitos Trabalhistas, uma vez que as atividades laborais exercidas pelos personagens principais da trama eram completamente análogas a escravidão. Com efeito, este trabalho consiste em uma Pesquisa Descritiva e Bibliográfica, realizada precipuamente na área dos Direitos Humanos e do Direito do Trabalho. Esse artigo surge a partir de estudos direcionados ao Projeto de extensão “Direito & Literatura” da FACAPE – Faculdade de Petrolina. Ao final, conclui-se que a nossa legislação garante muitos direitos ao trabalhador rural, equiparando-os aos trabalhadores urbanos. A necessidade por trabalho para sustento é grande, fazendo com que muitas pessoas acabem procurando qualquer meio para se sustentar. De maneira histórica, o Brasil vem enfrentando casos similares ao abordado no livro, conforme os dados apresentados na pesquisa.
Palavras-Chave: Direitos Humanos. Trabalhador Rural. Direitos Trabalhistas.
Analysis of the literary work Torto Arado: the sertão and the rights of rural workers
ABSTRACT: The purpose of this article is to connect the literary work “Torto Arado”, by Itamar Rangel Vieira Júnior, with the science of Law. The main relationship of this literary work with legal science is the narrative points that reflect Human Rights and Labor Rights, since the work activities carried out by the main characters of the plot were completely analogous to slavery. Indeed, this work consists of a Descriptive and Bibliographic Research, carried out mainly in the area of Human Rights and Labor Law. This work arises from studies directed to the extension project “Law & Literature” of FACAPE – Faculdade de Petrolina. In the end, it is concluded that our legislation guarantees many rights to rural workers, equating them with urban workers. The need for work to support themselves is great, causing many people to end up looking for any means to support themselves. Historically, Brazil has been facing similar cases to the one discussed in the book, according to the data presented in the research.
Keywords: Human Rights. Rural worker. Labor rights.
1. INTRODUÇÃO
O Projeto de extensão Direito & Literatura se destina ao estudo e difusão da interdisciplinariedade entre Direito, Literatura, Arte e Cinema. Demonstra-se que com o desenvolvimento de propostas para reflexão acerca do Direito e dos contextos sociais relevantes, expostos através da Literatura e da Arte, os juristas possuem papel de revolução social. Assim, a interdisciplinaridade e interligação de fontes de conhecimento, possibilitam uma compreensão mais eficaz do fenômeno jurídico no seio social.
A aproximação entre Direito, Literatura, Arte e Cinema motivam a reflexão e os seus impactos se dão sobre o âmbito jurídico, de forma que há ênfase nas novas formas de pensar acerca do Direito. Tal persecução deve ter amplitude de preocupação, pois, apesar da formação do jurista se basear no conhecimento técnico-legal, não se pode ignorar o contexto cultural. Busca-se, em suma, uma análise dinâmica, holística e sensível do Direito.
2.JUSTIFICATIVA
O Direito & Literatura possibilita a abertura de um novo campo para a realização de estudos e pesquisas jurídicas e difunde, mediante o diálogo entre as comunidades acadêmicas, a reflexão acerca da capacidade da narrativa literária auxiliar os juristas na árdua tarefa de compreender/interpretar/aplicar o Direito, relacionando a ficção com a realidade social e jurídica.
A importância da atividade se materializa na expansão dos horizontes culturais e na ampliação da capacidade interpretativa, bem como da habilidade da escrita (elaboração de textos) de todos os que participarem dos eventos. Também, possibilita, uma comunicação entre diferentes disciplinas, sob diferentes olhares, a partir do diálogo entre docentes e discentes da FACAPE – Faculdade de Petrolina, e de outras instituições e interessados em geral.
3. OBJETIVOS
3.1. OBJETIVO GERAL
Este relatório tem o objetivo principal de comunicar as atividades desenvolvidas pelos alunos integrantes do Projeto de Extensão à Coordenadora.
3.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS
I. Realizar reuniões para a manutenção do projeto e o aprofundamento nos temas tratados, através da discussão de textos, livros e materiais ofertados;
II. Auxiliar na formação crítica e interpretativa dos alunos;
III. Promover a integração dos estudantes de Direito com a comunidade acadêmica da região.
IV. Produção de artigos, capítulos de livro, e outros trabalhos acadêmicos.
V. Participação em Congressos e eventos diversos.
4. METOLOGIA OPERACIONAL
Leitura de material bibliográfico pertinente, identificação de instituições públicas de ensino superior que concordem em viabilizar visitas para promover encontros com seus discentes e atividades voltadas para o incentivo à leitura. As reuniões também podem acontecer de forma remota, conforme necessidade.
A forma de avaliação será a presença nas reuniões, o estudo dos temas levantados para formação humanística relativa ao tema e a participação nos encontros nas instituições públicas (ensino superior).
5. AÇÕES REALIZADAS PELO DISCENTE CARLOS EDUARDO DOS SANTOS SILVA NO PROJETO DE EXTENSÃO
Participei de reuniões periódicas, com o fito de traçar estratégias para persecução dos nossos objetivos. Participei também de capacitação da equipe para a realização de oficinas e palestras junto à comunidade acadêmica. Além disso, participei da reunião para debater o filme ‘’Animais Noturnos’’, em que alguns integrantes contruibuiram com o debate, opinando, exemplificando e trazendo para o universo acadêmico o filme. Uma das reuniões mais interessante, pois, pode-se observar como cada pessoa entendeu a mensagem do filme de forma diferente.
6. RESUMO DA OBRA LITERÁRIA ESCOLHIDA
A obra escolhida trata-se de Torto Arado, de autoria de Itamar Rangel Vieira Júnior. Duas irmãs, Bibibana e Belonísia, vivem em uma fazenda no interior da Bahia, sofrem um acidente com uma faca que a avó escondia em uma mala, uma faca cuja importância na construção do suspense da obra é enorme. A narrativa das mulheres encontra na voz, mesmo no silêncio, o protagonismo feminino-negro dentro de uma sociedade patriarcal, onde nem mesmo o machismo e o racismo diminuem suas lutas, pelo contrário, dão-lhes a força para superar a realidade difícil.
Bibibana e Belonísia fazem parte de uma família que assim como outras vivem e trabalham na fazenda Água Negra. Todos os trabalhadores são descendentes de pessoas escravizadas que chegaram naquela região há muito tempo.
Os proprietários da fazenda são donos de terras que lucram com a produção e que sequer vivem lá, apenas aproveitam os lucros que a produção dos alimentos gera. Nos elementos que contam a história tem-se a descrição da rotina intensa de trabalho na terra e as tradições da religião que eles seguem, o Jarê, uma religião de matriz africana.
7. CONHECENDO O AUTOR DA OBRA
Itamar Rangel Vieira Júnior, conhecido como Itamar Vieira Júnior, nasceu em Salvador, em 1979, é Graduado e Mestre em Geografia pela Universidade Federal da Bahia, funcionário público do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). Itamar teve sua estreia na literatura em 2012, com o livro de contos Dias, vencedor do XI Prêmio Projeto de Arte e Cultura na Bahia. Em 2017, lança o premiado A oração do carrasco, que chegou a ser finalista do Prêmio Jabuti em 2018, na categoria conto. Por fim, seu impactante romance Torto arado (2018) conquistou em Portugal o Prêmio LeYa, concedido por unanimidade pelo modo como representava de forma sólida e realista o universo rural brasileiro.
8. RELAÇÃO DA OBRA LITERÁRIA ESCOLHIDA COM O DIREITO
A Obra Literária Torto Arado relaciona-se com o Direito, na medida em que pode-se observar que o autor trata da temática do sertão e dos direitos dos trabalhadores rurais. Com uma escrita agradável e fluente, Torto Arado se insere em um movimento recente da literatura brasileira no qual autoras e autores pretos oferecem sua interpretação do Brasil.
Como ponto inicial do enredo, tem-se o acidente que marcará para sempre a vidas das irmãs Bibiana e Belonísia, que numa curiosidade infantil, tentam descobrir o segredo guardado pela avó Donana. Nessa busca, dentro de uma mala, encontram uma faca reluzente, com um cabo de marfim, e que dada a luminosidade do metal, atiça o fascínio e até o desejo de provar o seu gosto. Porém, com a chegada repentina da matriarca da família, em meio ao susto e à falta de destreza com o objeto cortante, acabam decepando a língua de Belonísia, o que lhe acarreta uma vida de silêncio, dependendo da irmã, até um certo ponto da narrativa. Por meio dessas vozes que é apresentado, de maneira envolvente, a fome, a seca, a exploração, as relações de poder, as ameaças e a violências experimentadas pelos filhos e filhas (VIEIRA JUNIOR, 2019, p. 261):
Da gente forte que atravessou um oceano, que foi separada de sua terra, que deixou para trás sonhos e forjou no desterro uma vida nova e iluminada. Gente que atravessou tudo, suportando a crueldade que lhes foi imposta.
É a Bibiana quem narra as restrições impostas aos que vivem nesse povoado no interior, sem escola, sem perspectivas e sem nenhum tipo de assistência, o que faz com que as crianças não ultrapassarem a primeira infância (VIEIRA JUNIOR, 2019, p. 69):
As crianças eram as que mais padeciam: paravam de crescer, ficavam frágeis e por qualquer coisa caíam doentes. Perdi as contas de quantas não resistiram à má alimentação e seguiram sem vida, em cortejo, para o cemitério da Viração. As velas que meu pai acendia para cada criança pareciam não querer permanecer acesas: mesmo sem ventos ou golpes de ar, se apagavam.
Mesmo impedida de falar, Belonísia dá voz aos que, vivem uma vida marcada pelas restrições. Ela nos conta das casas de barro, “sem o tal de banheiro que ninguém tinha mesmo” (VIEIRA JUNIOR, 2019, p. 95), com as imposições dos donos das fazendas que não suportavam a ideia de que os trabalhadores tivessem uma moradia feita com tijolos, pois, a mesma levaria a entender uma permanência do trabalhador na terra. Itamar Vieira Junior leva o leitor a um Brasil que, após mais de 100 anos da assinatura da Lei Áurea, insiste em não acertar as contas com o passado escravocrata.
Olhando para fora das páginas, o número de pessoas que foram resgatadas de trabalhos em situações análogas á escravidão no Brasil, foi de 19.064 trabalhadores, entre 2010 a 2020. Os dados são da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), órgão do Ministério da Economia.
As atividades rurais realizadas no Brasil incluem, a pecuária, a lavoura, produtos florestais, extrativismo e pesca artesanal. Atualmente, o trabalhador rural tem direito a vários direitos trabalhistas e aos benefícios da Previdência Social, uma vez que isso só foi possível por conta de regras inseridas na Constituição Federal de 1988.
As atividades exercidas pelos personagens eram completamente análogas a escravidão. Os trabalhadores rurais devem ter direito a:
a) Salário-mínimo ou conforme acordo com o empregador ou, ainda, acordo coletivo do sindicato;
b) décimo terceiro salário;
c) adicional noturno;
d) horas extras;
e) adicional de insalubres ou periculosidade;
f) repouso semanal remunerado;
g) jornada de trabalho de 8 horas diárias e 44 horas semanais;
h) jornada de 6 horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento;
i) Intervalos intrajornada e interjornada; FGTS;
j) férias anuais remuneradas com 1/3 de férias;
k) licença-maternidade; licença-paternidade;
l) aviso-prévio;
m) seguro-desemprego;
n) benefícios previdenciários, incluindo auxílio-doença, aposentadoria e outros;
o) convenções e acordos coletivos de trabalho.
Portanto, a nossa legislação garante muitos direitos ao trabalhador rural, equiparendo-os aos trabalhadores urbanos. A necessidade por trabalho para sustento é grande, fazendo com que muitas pessoas acabem procurando qualquer meio para se sustentar. De maneira histórica, o Brasil vem enfrentando casos similares ao abordado no livro, conforme os dados apresentados.
9. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Projeto Direito & Literatura conseguiu disseminar informações sobre a obra Torto Arado, livro este que é dividido em partes: Fio de Corte, Torto Arado e Rio de Sangue. Em cada uma dessas partes uma nova perspectiva é apresentada, mas em todas elas são demonstradas o descaso que os personagens sofrem.
A necessidade por trabalho e sustento é grande, fazendo com que muitas pessoas acabem procurando qualquer meio para se sustentar. De maneira histórica, o Brasil vem enfrentando casos similares ao abordado, conforme os dados apresentados. Uma vez que os personagens são agricultores e viviam em regime de servidão, sonham em se libertar dessa relação de exploração. Tudo o que eles produziam não era deles, tudo era do dono da terra, pouca coisa era para o próprio consumo.
Sabe-se que o trabalhador rural possui vários direitos trabalhistas, como o salário em dia, décimo terceiro, adicional noturno, horas extras, descanso semanal, FGTS, aviso-prévio, seguro-desemprego, benefícios do INSS, dentre outras garantias, que são verdadeiros direitos fundamentais que os personagens não são beneficiados, bem como uma parte da população brasileira que vive ainda sendo explorada.
10. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CANDIA, Luciene; CABRAL, Rayssa D. M. (Orgs.). Torto arado: perspectivas críticas. Catu-BA: Bordô-Grená, 2022. (E-book);
Entrevista Itamar Vieira Júnio no Programa Roda Viva em 15/02/2021. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=Mu9iUc2UHBQ>;
SEIBT, Taís; GORZIZA, Amanda; BUONO, Renata. Servidão que persiste. Carta de Uberlândia. 2021. Disponivel em: < http://abet-trabalho.org.br/servidao-que-persiste/#:~:text=Dos%20cinco%20setores%20recordistas%20em,2019%20para%20140%20em%202020.>;
THOMAZ, Danilo. Qual a razão do sucesso do romance Torto Arado?. Guia do Estudante. 2021. Disponível em: <https://guiadoestudante.abril.com.br/dica-cultural/por-que-gostamos-do-romance-torto-arado/>;
TOLENTINO, Luana. O Brasil profundo em Torto Arado, de Itamar Vieira Júnior. Literafro. 2021. Disponivel em: < http://www.letras.ufmg.br/literafro/resenhas/ficcao/1465-itamar-vieira-junior-torto-arado> ;
VIEIRA JUNIOR, Itamar. Torto arado. 1a Reimpr. São Paulo: Todavia, 2019;
[1] Especialista em Direito Constitucional pela Universidade Cândido Mendes, Especialista em Direito Penal pela Faculdade Damásio, Bacharela em Direito pela Universidade do Estado da Bahia, professora de direito penal e direito constitucional da Faculdade de Petrolina-PE (FACAPE), advogada.
[2] Especialista em Direito Processual Civil pela Faculdade Damásio, Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, advogado. Professor de Direito da Faculdade de Petrolina-PE (FACAPE).
Graduando em Direito na Faculdade de Petrolina-PE (FACAPE). E- mail: [email protected]
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Carlos Eduardo dos Santos. Análise da obra literária Torto Arado: o sertão e os direitos dos trabalhadores rurais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 jan 2023, 04:16. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/60759/anlise-da-obra-literria-torto-arado-o-serto-e-os-direitos-dos-trabalhadores-rurais. Acesso em: 22 nov 2024.
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