PAULO IZÍDIO DA SILVA REZENDE[1]
(orientador)
RESUMO: A presente pesquisa visa explicar sobre o impacto da tecnologia nas relações de trabalho explicitando o quanto ela vem sendo benéfica nas relações de trabalho. Além de tudo, possui o propósito de abordar esta temática tão atual e precisa, pois, devido a influência da internet nas questões do Direito do Trabalho surgiram novas modalidades laborais, tais como o Home Office. A tecnologia continuadamente vem estabelecendo novas oportunidades em uma velocidade nunca vista antes, impulsionando a associação de relações que antes seriam distantes e recuados, pode-se exemplificar o vínculo entre chefe e empregado. Estas circunstâncias trazem benefícios e malefícios para aqueles que estão neste vínculo contratual, pois nem sempre determinada atividade é de fato um emprego, como ser influencer. Deste modo, o presente estudo utiliza do método dedutivo e histórico com o desígnio de esclarecer sobre as mudanças que a Reforma Trabalhista trouxe e as variações que ela irá ocasionar no Direito do Trabalho, incrementando a relação entre empregado e empregador, além de ter a tecnologia como aliada para a desenvoltura de novas oportunidades de trabalho. Desse modo, conclui-se que grandes estão sendo os impactos tecnológicos no Direito do Trabalho, necessitando assim de ser um tema estudado e debatido de modo a garantir a proteção dos direitos trabalhistas.
Palavras chaves: Relações de trabalho. Direito do Trabalho. Tecnologia.
ABSTRACT: This research aims to explain the impact of technology on labor relations, explaining how much it has been beneficial in labor relations. In addition, it has the purpose of addressing this topic, which is so current and precise, because, due to the influence of the internet on issues of Labor Law, new work modalities have emerged, such as the Home Office. Technology is continuously establishing new opportunities at a speed never seen before, boosting the association of relationships that would previously be distant and withdrawn, the bond between boss and employee can be exemplified. These circumstances bring benefits and harm to those who are in this contractual relationship, as a certain activity is not always in fact a job, such as being an influencer. In this way, the present study uses the deductive and historical method with the intention of clarifying the changes that the Labor Reform brought and the variations that it will cause in Labor Law, increasing the relationship between employee and employer, in addition to having the technology as an ally for the development of new job opportunities. Thus, it is concluded that the technological impacts on Labor Law are being great, thus needing to be a subject studied and debated.
Keywords: Labor relations. Labor Law. Technology.
Sumário: 1. Introdução; 2. A evolução dos princípios constitucionais trabalhistas e a relação com as tecnologias no ambiente de trabalho; 3. As mudanças nas relações laborais advindas da Reforma Trabalhista; 3.1. Transformações tecnológicas e as relações trabalhistas; 4. Home office e o teletrabalho; Considerações finais; Referências bibliográficas.
1 INTRODUÇÃO
As primeiras modificações legislativas no panorama trabalhista brasileiro são decorrentes do final escravidão, e, posteriormente, em 1891 com o primeiro dispositivo constitucional de direito e proteção do trabalho, fundamentado na liberdade de associação. Por causa disso ocorreu uma grande evolução acerca da proteção ao trabalhador. Isso sucedeu-se pelo surgimento de novas constituições, em especial a de 1946, que foi elaborada democraticamente de maneira que renovasse as garantias dos trabalhadores surgidas na Constituição outorgada de 1934 quando foram consagrados os direitos de greve, repouso semanal remunerado e a estabilidade.
Sabe-se que as tecnologias, foram criadas para facilitar a vida das pessoas, evitando o desgaste físico, dando forças para aprimorar a saúde, propagando várias formas de entretenimento e utensílios para ajudar a resolução de problemas pessoais, transformando todos em seus reféns. Essa facilitação chegou no meio das atividades laborais e surgiu assim a necessidade da conexão do homem com o seu trabalho. Com esse ambiente de trabalho exige-se que os empregadores e advogados estejam em sintonia com tudo o que surge de novo, com as atualizações, normas, legislações.
O direito do trabalho deve sempre se atualizar às novas tecnologias sem em hipótese alguma deixar de lado as garantias fundamentais da pessoa humana e do empregado, pois ambas sempre irão existir. No entanto, dados aos fatos a tecnologia, invariavelmente, sempre terá mutações e mudanças de uma forma mais veloz que o direito. Cabe assim, aos legisladores, amparar o trabalhador e equilibrar o direito em conjunto com as alterações digitais, em conformidade com a doutrina “O tema do direito à desconexão resolve-se, pois no âmbito do direito fundamental à preservação da saúde do trabalhador, garantido como direito social fundamental no art. 6° e expresso em vários incisos do art. 7° da Constituição.” (SEVERO, 2011, p. 210).
Com o advento da reforma trabalhista houve grandes mudanças laborais sendo a mais conhecida a do Home Office, que foi a primeira a ter regulamentação própria. Assim com o desenvolvimento tecnológico e as novas formas de organização do trabalho é certo que outras mudanças também irão acontecer, sendo assim, este trabalho de suma importância para equilibrar os interesses tecnológicos, comerciais e individuais.
2 A EVOLUÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS TRABALHISTAS E A RELAÇÃO COM AS TECNOLOGIAS NO AMBIENTE DE TRABALHO
A Constituição é a lei fundamental de um país, estabelecendo os princípios e normas que regem a organização e o funcionamento do Estado. No contexto do direito do trabalho, as constituições brasileiras ao longo da história desempenharam um papel fundamental na garantia dos direitos dos trabalhadores.
A Constituição de 1891, primeira constituição republicana do Brasil, trouxe algumas garantias para os trabalhadores, como a liberdade de associação sindical e o reconhecimento do direito de greve. Entretanto, essas garantias eram limitadas e voltadas principalmente aos trabalhadores urbanos e organizados, excluindo grande parte dos trabalhadores rurais e informais. (GARCIA, 2022, ed.11, p.17).
Segundo Delgado (2020, p.81) existiu uma tendência de constitucionalização iniciada em 1934 que estabeleceu a maior parte das garantias trabalhistas:
No Brasil, a (...) tendência de constitucionalização verificou-se: começada em 1934, foi mantida em todas Constituições posteriores, mesmo as de natureza autocrática (1937, 1967, 1969). Entretanto, tal tendência adquiriu novo status apenas com a Constituição de 1988. É que esta, em inúmeros de seus preceitos e, até mesmo, na disposição topográfica de suas normas (que se iniciam pela pessoa humana, em vez de pelo Estado), firmou princípios basilares para a ordem jurídica, o Estado e a sociedade — grande parte desses princípios elevando ao ápice o trabalho e o emprego, tal como a matriz do pós-guerra europeu.
Com a Constituição de 1967, em pleno regime militar, houve uma redução nas garantias trabalhistas, com a flexibilização das normas e a restrição do poder dos sindicatos. De acordo com os estudos de José Pastore[2], a relação com as tecnologias no ambiente de trabalho passou a ser mais relevante através da crescente adoção de tecnologias industriais e a informatização de alguns setores da economia brasileira. Entretanto, a proteção aos trabalhadores ainda estava aquém das necessidades geradas pelas mudanças tecnológicas no ambiente de trabalho. A automação e a informatização exigiam uma reflexão sobre os impactos dessas tecnologias nas relações de trabalho e na proteção dos direitos dos trabalhadores, o que não era plenamente abordado na constituição.
Com a Constituição de 1988, conhecida como Constituição Cidadã, houve uma retomada das garantias trabalhistas e uma maior preocupação em relação aos avanços tecnológicos. A constituição garantiu a valorização do trabalho humano, a proteção contra a automação e a tecnologia discriminatória, o direito à participação nos lucros, além de assegurar a proteção aos trabalhadores rurais e domésticos, antes excluídos das normas trabalhistas. Essa constituição também estabeleceu a necessidade de negociação coletiva para regulamentação de jornada de trabalho, o que permitiria a adaptação às mudanças tecnológicas. (JOSÉ FILHO, 2012, p. 81).
Neste sentido, a evolução dos princípios constitucionais tem se mostrado essencial para acompanhar as mudanças do mundo laboral desde a primeira Carta Maior promulgada em 1981, até a Constituição Federal de 1988 nas quais já foram consideradas novas concepções de trabalho, voltada especialmente para a valorização do ser humano, da dignidade, dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. No entanto, as tecnologias têm provocado uma reconfiguração do mundo do trabalho - com a automação, a inteligência artificial e a digitalização dos processos produtivos - o que exige uma revisão e observância das normas e princípios que regem as relações laborais.
No ponto, é possível destacar o princípio da dignidade da pessoa humana como um dos mais impactados pelas tecnologias no ambiente de trabalho. Em que pese não esteja expressamente previsto em um único artigo, é considerado um valor e um fundamento que permeia toda a Constituição.
Outro princípio constitucional relevante é o da igualdade. As tecnologias podem contribuir para a ampliação das desigualdades no ambiente de trabalho, uma vez que a adoção de determinadas tecnologias pode beneficiar apenas parte dos trabalhadores, deixando outros em situação de vulnerabilidade. Por exemplo, a utilização de algoritmos de seleção de currículos pode estar sujeita a vieses discriminatórios, como o viés de gênero ou racial, prejudicando candidatos pertencentes a grupos minoritários (JUNQUEIRA, 2020).
Além disso, as tecnologias também têm impactado o princípio da liberdade no ambiente de trabalho. Com a crescente adoção do trabalho remoto, por exemplo, é necessário repensar as relações de subordinação e controle no trabalho a distância. A utilização de ferramentas de monitoramento de produtividade, como softwares de rastreamento de atividades, pode violar a privacidade e a liberdade dos trabalhadores, o que requer uma análise cuidadosa para garantir o equilíbrio entre a utilização dessas tecnologias e a proteção dos direitos dos trabalhadores, como a privacidade, a intimidade e a autonomia no ambiente de trabalho. (PINTO, 2018, p. 50-55)
Outro princípio constitucional de grande símbolo é o da proteção social do trabalhador. Com as mudanças tecnológicas, novas formas de trabalho têm surgido, como o labor por plataformas e o trabalho intermitente que merecem atenção sobre a devida aplicação das normas de proteção social, o que se destacará adiante.
3 AS MUDANÇAS NAS RELAÇÕES LABORAIS ADVINDAS DA REFORMA TRABALHISTA
A reforma trabalhista promovida pela lei 13.467/2017 trouxe uma série de mudanças significativas na legislação laboral. Dentre as principais alterações, destacam-se a flexibilização das normas de contratação, com a criação do contrato de trabalho intermitente e a possibilidade de acordos individuais prevalecerem sobre a legislação em alguns casos; a ampliação da jornada de trabalho, permitindo a jornada de doze horas de trabalho seguidas por trinta e seis horas de descanso, mediante acordo coletivo; a limitação do valor de indenização por danos morais relacionados ao trabalho; a retirada da obrigatoriedade da contribuição sindical; e a possibilidade de terceirização irrestrita em todas as atividades da empresa.
Sobre as alterações vinculadas a especialmente a evolução tecnológica abordada neste trabalho, está a criação do contrato de trabalho intermitente, previsto nos artigos 443 e 452-A da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho)[3]. O artigo 443 estabelece que o contrato de trabalho pode ser por prazo indeterminado ou determinado, este último dividido em contrato por prazo determinado e contrato de trabalho intermitente.
Já o artigo 452-A da CLT define as regras específicas para o trabalho intermitente, como a forma de convocação do empregado, o prazo para resposta do trabalhador, a forma de pagamento e a possibilidade de recusa do chamado pelo empregado, entre outras questões.
Considerando que possibilita a contratação de funcionários para trabalhar em períodos alternados, de acordo com a demanda do empregador, essa modalidade de contrato tem sido facilitada pela tecnologia, uma vez que as plataformas digitais podem ser utilizadas para a inscrição e agendamento das atividades laborais. A tecnologia também tem fornecido maior flexibilidade às empresas, permitindo a contratação de trabalhador de forma mais econômica e adaptável às flutuações de demanda. Porém, essa modalidade de contrato tem gerado preocupações em relação à garantia de direitos trabalhistas, como remuneração adequada e proteção social. Sobre o ponto, Garcia (2022, ed. 17, p. 114) dispõe:
No trabalho intermitente a jornada de trabalho é normalmente móvel e mais flexível, permitindo que o empregado receba apenas pelo tempo de labor efetivamente prestado, deixando ao empregador a definição do período que será laborado em cada dia e época.
Entretanto, trata-se de sistemática que pode gerar certa insegurança ao trabalhador, não permitindo saber se será convocado para prestar serviços, ou por quanto tempo, o que resulta no desconhecimento de qual será o valor do salário a ser recebido e no desconhecimento do verdadeiro nível remuneratório mensal.
Além do contrato intermitente, outra alteração relevante foi a permissão para que acordos individuais prevalecessem sobre a legislação em alguns casos. Isso também possibilitou maior flexibilidade nas relações entre trabalhador e empregador, incluindo a definição de jornadas de trabalho e benefícios além de maior autonomia aos trabalhadores para negociar suas condições de trabalho, porém, deve-se destacar a existência de eventual assimetria de poder entre as partes e à possibilidade de redução de direitos trabalhistas.
Sobre o tema, dispõe Delgado, Delgado (2017, p.45):
Ao invés de ser um instrumento de harmonização, agregação e, em certas situações, de adequação em face do patamar civilizatório mínimo fixado no Direito Individual do Trabalho, o Direito Coletivo do Trabalho passaria a se direcionar, nos termos da nova lei, para o caminho de se tornar mais um meio de redução do patamar civilizatório mínimo trabalhista garantido pela ordem jurídica especializada da República brasileira.
Nesse contexto, a permissão de acordos individuais pode ser vista como uma oportunidade para que empregados e empregadores possam negociar condições de trabalho mais adaptadas à realidade atual, considerando as mudanças tecnológicas. Por outro lado, também pode ser vista como uma ameaça aos direitos trabalhistas, uma vez que os acordos individuais podem ser desequilibrados em termos de poder de barganha entre as partes, especialmente em situações de vulnerabilidade dos trabalhadores.
Como se vê, a Reforma Trabalhista promovida pela Lei 13.467/2017 trouxe mudanças nas relações laborais no Brasil com repercussões na forma como a tecnologia é utilizada no ambiente de trabalho, especialmente no contrato de trabalho intermitente e na possibilidade de acordos individuais prevalecerem sobre a legislação.
Além disso, necessário apontar como grande reforma o Capítulo II-A da CLT, incluído pela mencionada legislação e que normatiza o teletrabalho, ponto que será detalhadamente abordado no item 4 deste trabalho.
3.1 TRANSFORMAÇÕES TECNOLÓGICAS E AS RELAÇÕES TRABALHISTAS
Como já destacado neste trabalho, as transformações tecnológicas têm impactado significativamente as relações trabalhistas ensejando inclusive em mudanças legais. A respeito da Reforma Trabalhista, imperioso apontar que tal evolução é inerente ao Direito do Trabalho e deve garantir a adaptação as novas formas de trabalho, a dinâmica dos ambientes de trabalho e as expectativas dos trabalhadores e empregadores.
Delgado (2020, p.54) dispõe:
O Direito do Trabalho não escapa a essa configuração a que se sub- mete todo fenômeno jurídico. Na verdade, o ramo juslaboral destaca-se exatamente por levar a certo clímax esse caráter teleológico que caracteriza o fenômeno do Direito. De fato, o ramo justrabalhista incorpora, no conjunto de seus princípios, regras e institutos, um valor finalístico essencial, que marca a direção de todo o sistema jurídico que compõe. Este valor — e a consequente direção teleológica imprimida a este ramo jurídico especializado — consiste na melhoria das condições de pactuação da força de trabalho na ordem socioeconômica. Sem tal valor e direção finalística, o Direito do Trabalho sequer se compreenderia, historicamente, e sequer justificar-se-ia, socialmente, deixando, pois, de cumprir sua função principal na sociedade contemporânea.
Considerando as transformações e incorporações das novas tecnologias da comunicação e informação, observa-se o embarcado de novas realidades de trabalho: a automação na qual, por um lado, substitui tarefas que anteriormente eram realizadas por um trabalhador e por outro lado tem gerado novos empregos em áreas como programação e manutenção de máquinas; e o trabalho remoto ou o trabalho por aplicativo.
Sobre a automação de processos produtivos, é certo máquinas e sistemas automatizados tem substituído tarefas manuais e repetitivas. Isso tem impactado empregos em diversos setores, como manufatura, logística, atendimento ao cliente, entre outros. À medida que as empresas buscam aumentar a eficiência e reduzir custos, a automação pode resultar na substituição de trabalho por máquinas, o que pode gerar desemprego e exigir a ressignificação das habilidades dos trabalhadores. (SOUSA, 2022).
Outra transformação tecnológica relevante é a digitalização e a inteligência artificial. A digitalização de processos e o uso de algoritmos têm proporcionado maior eficiência na tomada de decisões, na coleta e análise de dados e na gestão do trabalho. A inteligência artificial tem sido aplicada em diversas áreas, como seleção de candidatos, atendimento ao cliente, análise de mercado e previsão de demanda. No entanto, essa transformação também pode gerar preocupações em relação à privacidade dos dados, à ética e à transparência na tomada de decisões, além de levantar questões sobre a substituição de empregos por sistemas automatizados. (SOUSA, 2022).
A possibilidade de trabalhar remotamente, por meio de dispositivos eletrônicos e conectividade, tem proporcionado melhorias nas relações de trabalho. Isso permitiu a adoção de novos modelos de trabalho, como o trabalho em tempo parcial, freelancing, trabalho temporário, colaboração em tempo real e a coordenação de equipes distribuídas. No entanto, essa flexibilidade também pode ensejar em desafios relacionados à jornada de trabalho e aos direitos trabalhistas, uma vez que o trabalhador pode estar sujeito a uma maior carga de trabalho e a uma menor proteção legal, além de resultar em sobrecarga de trabalho – em razão do tempo disponível, estresse e problemas de saúde relacionados ao trabalho.
Plataformas digitais têm surgido como intermediários entre trabalhadores e empregadores, criando novas formas de trabalho, como o trabalho de motoristas de aplicativos, entregadores de comida, benefícios de serviços online, entre outros. Essas plataformas são fornecidas com maior flexibilidade na escolha de horários e locais de trabalho, permitindo que os trabalhadores tornem seus próprios chefes. No entanto, essa forma de trabalho também tem gerado incertezas em relação aos direitos trabalhistas, à proteção social e à segurança no trabalho, uma vez que os trabalhadores muitas vezes não são considerados como funcionários formais e podem enfrentar condições de trabalho precárias. (KALIL, 2020, p. 20-23)
O que se percebe é que as empresas tem realizado vultosos investimentos tecnológicos que acabam por ensejar em uma modificação nas condições e formas de trabalho, relações estas que sequer foram positivadas e que podem ficar aquém das normas trabalhistas.
Nesse contexto de novas formas de trabalho, destaca-se o teletrabalho e home office, até o momento as únicas das novas formas de trabalho positivadas no ordenamento, considerando que ainda não há regulamentação trabalhista específica vinculada ao trabalho por aplicativo ou mesmo em relação a novas tecnologias de inteligência artificial.
4 HOME OFFICE E O TELETRABALHO
O home office e o teletrabalho são modalidades de labor que vem ganhando cada vez mais destaque nos últimos anos, impulsionados principalmente pelo avanço da tecnologia e pelas mudanças no mercado de trabalho. Ambos têm como característica comum o fato de possibilitarem que os trabalhadores realizem suas atividades fora do ambiente físico tradicional do escritório[4], o que traz benefícios tanto para os funcionários quanto para as empresas.
O home office, também conhecido como trabalho em casa, é uma forma de trabalho remoto em que os funcionários inspiraram suas atividades profissionais a partir de suas próprias residências. O trabalhador tem a flexibilidade de definir o local de trabalho dentro de sua própria casa, podendo utilizar seu próprio equipamento e organizar sua jornada de trabalho de acordo com sua conveniência. O home office pode ser realizado de forma regular ou esporádica, dependendo do acordo estabelecido entre o empregador e o empregador. (ANDRADE, 2020)
Já o teletrabalho, também chamado de trabalho remoto, é uma modalidade de trabalho em que o empregado realiza suas atividades profissionais em local diferente do escritório central da empresa, utilizando-se de tecnologias de informação e comunicação para se conectar e se comunicar com a equipe e com o empregador. (ANDRADE, 2020). O teletrabalho pode ser realizado em qualquer lugar, desde que haja acesso à internet e aos recursos necessários para a realização das atividades profissionais. (GARCIA, 2022, ed.11, p. 245)
No Brasil, a regulamentação do home office e do teletrabalho é feita pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), advinda especialmente da Reforma Trabalhista, quando houve a inserção do Capítulo II-A para tratar do teletrabalho. A CLT estabelece que o home office pode ser acordado entre o empregado e o empregador, desde que sejam observado o cumprimento da jornada de trabalho estabelecida[5].
Além disso, a CLT também estabelece que o teletrabalho pode ser adotado mediante acordo individual ou coletivo entre o empregado e o empregador, desde que sejam respeitadas as condições estipuladas pela legislação. É importante destacar que a lei determina que o teletrabalho deve ser formalizado por escrito, especificando as atividades a serem realizadas, as responsabilidades dos relacionados, bem como as condições de trabalho, incluindo a infraestrutura necessária e a responsabilidade pelo fornecimento, manutenção e custeio dos equipamentos.[6]
A evolução das tecnologias de informação e comunicação, como a internet de alta velocidade, o acesso a dispositivos móveis e as ferramentas de colaboração online, tornou possível a realização de atividades profissionais de forma remota, viabilizando o trabalho em casa e em locais diferentes do escritório.
Essas modalidades de trabalho têm se tornado uma tendência crescente nas organizações, trazendo benefícios tanto para os empregados quanto para os empregadores. Para os trabalhadores, o home office e o teletrabalho podem oferecer maior flexibilidade na gestão do tempo e na conciliação entre a vida pessoal e profissional, eliminando o deslocamento diário ao escritório, o que pode resultar em economia de tempo e redução do estresse relacionado ao trânsito. Além disso, o home office e o teletrabalho podem permitir que os trabalhadores tenham um melhor equilíbrio entre suas responsabilidades familiares e profissionais, especialmente para aqueles que têm filhos pequenos ou outras demandas.
Por outro lado, para as empresas, o home office e o teletrabalho também podem trazer benefícios. Por meio dessas modalidades de trabalho, as empresas podem ampliar suas possibilidades de recrutamento de talentos, uma vez que não estão restritas a contratar apenas funcionários que residam próximos aos escritórios físicos. Além disso, o home office e o teletrabalho podem resultar em redução de custos operacionais, como gastos com infraestrutura física e energia, bem como em aumento da produtividade, uma vez que os trabalhadores podem ter maior autonomia para organizar suas atividades.
No entanto, é importante ressaltar que a regulamentação do home office e do teletrabalho ainda é um tema em constante evolução. É fundamental garantir que os trabalhadores tenham condições adequadas de trabalho em suas residências ou locais de teletrabalho, incluindo ergonomia, saúde e segurança ocupacional. (ANDRADE, 2020).
Em resumo, o home office e o teletrabalho são modalidades de trabalho flexíveis que ganharam cada vez mais espaço no contexto atual, impulsionadas pela tecnologia e pelas mudanças no mercado de trabalho. A regulamentação dessas modalidades é feita pela CLT e seu desenvolvimento tem proporcionado benefícios tanto para os trabalhadores quanto para as empresas, permitindo maior flexibilidade, conciliação entre vida pessoal e profissional, e aumento da produtividade. No entanto, é essencial garantir que sejam observadas as normas de saúde, segurança e regulamentações vigentes para garantir um ambiente de trabalho saudável e adequado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante todo o exposto, considerando as constantes mudanças tecnológicas e no Direito do Trabalho, é fundamental estabelecer a adoção da tecnologia no ambiente de trabalho seja concomitante a uma regulamentação adequada, que assegure a proteção dos direitos trabalhistas e o equilíbrio nas relações laborais, considerando os impactos sociais, psicológicos e psicológicos dessa transformação.
Ademais, a relação entre os princípios constitucionais com as tecnologias no ambiente de trabalho deve ser garantida e de modo a envolver a promoção da inclusão digital, considerando que a rápida evolução tecnológica pode criar uma divisão entre os trabalhadores que possuem acesso às novas tecnologias e os que não possuem, ampliando as desigualdades no mercado de trabalho.
Nesse contexto, é fundamental que a inclusão digital seja interpretada de forma a garantir o acesso equitativo às tecnologias, promovendo a igualdade de oportunidades no ambiente de trabalho.
Neste paradigma, retomando os princípios constitucionais trabalhistas presentes na Constituição Federal de 1988, verifica-se que estes devem ter a devida aplicação no contexto do home office, assegurando a remuneração do trabalhador, a proteção contra os riscos do trabalho, a igualdade de direitos, a valorização do trabalho humano e a proteção contra a precarização laboral. É fundamental que o empregador respeite esses princípios e garanta que o home office e as demais modalidades de trabalho advindas da tecnologia estejam de acordo com direitos trabalhistas já estabelecidos, proporcionando condições de trabalho dignas aos empregados, sejam eles remotos, intermitentes, vinculados a aplicativos, etc. Isso contribui para uma relação de trabalho equilibrada, justa e em conformidade com os princípios constitucionais que regem o ordenamento jurídico brasileiro.
Por fim, imperioso apontar que é necessário promover um diálogo constante entre trabalhadores, empregadores, governo e sociedade civil, visando a construção de um ambiente de trabalho justo e adequado às novas realidades tecnológicas.
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[1] Professor Orientador da Universidade de Gurupi – UnirG.
[2] http://www.josepastore.com.br/artigos/rt/rt_246.htm. Acesso em 28 de março de 2023.
[3] Art. 443. O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou para prestação de trabalho intermitente.
Art. 452-A. O contrato de trabalho intermitente deve ser celebrado por escrito e deve conter especificamente o valor da hora de trabalho, que não pode ser inferior ao valor horário do salário mínimo ou àquele devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função em contrato intermitente ou não.
[4] Art. 6º Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego. (Redação dada pela Lei nº 12.551, de 2011)
[5] Art. 75-C. A prestação de serviços na modalidade de teletrabalho deverá constar expressamente do instrumento de contrato individual de trabalho. (Redação dada pela Lei nº 14.442, de 2022)
§ 1º Poderá ser realizada a alteração entre regime presencial e de teletrabalho desde que haja mútuo acordo entre as partes, registrado em aditivo contratual. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
§ 2º Poderá ser realizada a alteração do regime de teletrabalho para o presencial por determinação do empregador, garantido prazo de transição mínimo de quinze dias, com correspondente registro em aditivo contratual. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
[6] § 5º O tempo de uso de equipamentos tecnológicos e de infraestrutura necessária, bem como de softwares, de ferramentas digitais ou de aplicações de internet utilizados para o teletrabalho, fora da jornada de trabalho normal do empregado não constitui tempo à disposição ou regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou em acordo ou convenção coletiva de trabalho. (Incluído pela Lei nº 14.442, de 2022)
§ 7º Aos empregados em regime de teletrabalho aplicam-se as disposições previstas na legislação local e nas convenções e nos acordos coletivos de trabalho relativas à base territorial do estabelecimento de lotação do empregado. (Incluído pela Lei nº 14.442, de 2022)
Graduanda em Direito pela Universidade de Gurupi - UnirG
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AGUIAR, Dayana Monteiro. O impacto da tecnologia no direito do trabalho Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 abr 2023, 04:25. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/61362/o-impacto-da-tecnologia-no-direito-do-trabalho. Acesso em: 24 nov 2024.
Por: PATRICIA GONZAGA DE SIQUEIRA
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Por: Heitor José Fidelis Almeida de Souza
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