RESUMO: O objetivo deste trabalho é evidenciar que os efeitos do controle difuso e concentrado de constitucionalidade se tornaram bem próximos no sistema jurídico brasileiro, diante da sua evolução. Para tanto, será explorado o desenvolvimento histórico do controle de constitucionalidade. Ganhando relevo a tese desenvolvida pelo Ministro Gilmar Mendes, acompanhada por Eros Grau, atinente a abstrativização do controle difuso de constitucionalidade, no sentido de reconhecer efeitos erga omnes e vinculantes às decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle difuso de constitucionalidade, sendo desnecessária a remessa ao Senado Federal (art. 52, X, CF), que foi fortemente debatida na Reclamação 4335, mas somente acolhida quando do julgamento das ADI 3406 e 3470, veiculado no informativo 886 do STF. Nesse sentido, em suma, será demonstrado ambas espécies de controle, cujos efeitos se tornaram adjacentes.
Palavras-chave: Controle concreto, controle difuso, efeitos, resolução do Senado, abstrativização do controle difuso, overruling.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por finalidade trazer a aproximação dos efeitos das decisões proferidas em controle concentrado e difuso de constitucionalidade. Para isso, será explorado os modelos de controle de constitucionalidade de outros países, como o inglês: onde inexistia efetivo controle, haja vista a Constituição ser flexível; o americano: onde nasceu o modelo difuso e incidental de inconstitucionalidade; o francês: onde o nasceu o controle político preventivo de constitucionalidade; e, por fim, o modelo austríaco: em que trouxe o controle concentrado e abstrato, dotado de efeitos ex nunc.
Após explorar o Direito Comparado, será explorado o controle de constitucionalidade no Brasil, explicando questões relevantes, como: a natureza do órgão que exerce o controle, o momento em que o mesmo é exercido. Ou seja, que o controle pode ter natureza judicial ou política, preventivo ou repressivo. Enfatizando-se o órgão judicial, atinente a natureza difusa ou concentrada, pela via incidental ou direta, respectivamente. Sem deixar de trazer à baila os antecedentes históricos, fundamentais para o controle atual do Brasil.
Imprescindível uma análise mais aprofundada do controle pela via incidental, sobrevindo no Brasil com a Constituição de 1891, influenciado pelo modelo inglês, efetuado, em regra, de modo difuso. Isto é, cabendo a todos os órgãos judiciais, indistintamente, tanto de primeiro e segundo grau, inclusive os Tribunais Superiores. Os efeitos deste controle, como será visto, é inter partes, somente, em tese, podendo ampliá-lo diante da resolução do Senado Federal prevista no art. 52, X, da CF. No entanto, esse dispositivo foi alvo de mutação constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento das ADIs 3406 e 3470. De modo a trazer uma aproximação aos efeitos da decisão proferida em controle concentrado (erga omnes e vinculante).
A reclamação 4.335/AC será bastante explorada, em especial os votos dos Ministros, notadamente do Ministro Gilmar Mendes, em que defendeu a tese da abstrativização do controle difuso, reduzindo o papel do Senado Federal, no sentido de atribuir a este a incumbência de publicar a decisão prolatada pelo Supremo Tribunal Federal, no entanto a tese não foi acolhida. Ao passo que somente no julgamento das ADI 3406 e 3470 que houve sua receptividade.
Nesse sentido, tem-se que será discorrido a evolução do modelo de controle de constitucionalidade brasileiro, para que, finalmente, se evidencie o amparo da tese da abstrativização do controle difuso, independentemente da atuação do Senado Federal
É sabido que o Estado Moderno, derivado do rompimento com a fragmentação própria da forma estatal medieval, nasceu sem Constituição, haja vista que a primeira versão do Estado foi absolutista. Sendo certo que este modo absolutista de governo ensejou o surgimento das formas de controle de poder, através de mecanismos para conter o poder do príncipe. Assim ocorreu com a Inglaterra no decorrer do século XVII, com a França revolucionária em fins do século XVIII e com a Declaração de Independência das colônias americanas, que culmina com a Constituição de 1787.
Havendo, desse modo, um movimento constitucionalizador, como bem defende Canotilho, que gerará aquilo que ficou conhecido como “a Constituição de um país”, impondo limites ao poder. Mais do que isso, limitando o poder em benefício de direitos, os quais, conforme a evolução histórica, vão se construindo no engate das lutas políticas.
À vista disso, será explorado, sinteticamente, os quatro modelos de controle de constitucionalidade: francês, inglês, americano e o austríaco.
1.1 MODELO INGLÊS
Aludido modelo não consagrou a supremacia da Constituição, mas sim a do Parlamento. Não se aceitava qualquer sistema de controle de constitucionalidade, na medida em que o Parlamento expressava a vontade majoritária do povo, inexistindo motivos para desconfiar de seus atos.
No Direito inglês, ab initio, a common law tinha prevalência sobre a lei escrita, sendo que aquela jamais poderia ser contrariada por esta. Considerando essa tradição desenvolveu-se a doutrina de Edward Coke, no sentido de defender a atuação dos juízes como guardiões da supremacia common law sobre a autoridade do Parlamento e do próprio soberano[1].
Nesse sentido, tem-se que os juízes poderiam declarar nula a lei do Parlamento que contrariasse ao commom right and reason. Porém, com a Revolução Gloriosa de 1688 referido pensamento careceu de força na Inglaterra, consagrando, destarte, a supremacia do Parlamento.
Dito de outro modo, com a Revolução Gloriosa retirou-se do rei a posição de senhor soberano, entabulando, assim, a soberania parlamentar, em especial com a promulgação pelo Parlamento da Declaração de Direitos de 1689, excluindo o poder do monarca absoluto e atribuindo àquele.
Como explica Blackstone acerca do poder do Parlamento inglês:
Sua autoridade soberana é sem freio; pode fazer, confirmar, estender, restringir, ab-rogar, revogar, renovar, e interpretar as leis, sobre as matérias de toda denominação, eclesiásticas ou temporais, civis, militares, marítimas ou criminais. É ao parlamento que a constituição desses reinos confiou este poder despótico e absoluto, que em todo governo deve residir em alguma parte. Todos os males, as desgraças, os remédios a trazer, as determinações fora do curso ordinário das leis, tudo é atingido por este tribunal extraordinário. Pode regular ou mudar a sucessão ao trono, como fez sob os reinados de Henrique VIII e Guilherme III; pode alterar a religião nacional estabelecida, como fez em diversas circunstâncias sob o reinados de Henrique VIII e seus três filhos; pode mudar e criar de novo a constituição de um reino e do próprio parlamento, como fez pelo Ato de União da Inglaterra e Escócia, e por diversos estatutos para as eleições trienais e setenais. Em uma palavra, pode fazer tudo o que não é naturalmente impossível. Por isso, não se teve escrúpulo em chamar o seu poder, por uma figura muito audaz: ‘O “todo poderoso parlamento’.[2]
Portanto, é correto dizer que o poder soberano na Inglaterra obteve a aptidão de modificar qualquer lei, mesmo as materialmente constitucionais, justificando, assim, a constituição inglesa vista de modo não escrita, histórica e flexível. Logo, inexistindo mecanismos formais de controle.
1.2 MODELO AMERICANO
Não obstante as ideias de Edward Coke ter perdido força na Inglaterra, tal ganhou força nos Estados Unidos, com a supremacia da common law, principalmente pela forma de colonização das colônias.
É cediço que as colônias britânicas na América do Norte poderiam aprovar suas próprias leis, porém, as mesmas não poderiam contrariar as da Inglaterra, onde vigia a supremacia do Parlamento. Ocorre que as colônias se voltaram contra a metrópole, em busca da independência, alcançando-a em 1779, proclamando, cada uma a sua independência nascendo os treze novos Estados independentes.
A Constituição Americana, promulgada em 1787, foi resultado da emancipação das trezes colônias. Em um determinado momento respectivas colônias se uniram, vedando o direito de secessão, característica do federalismo, formando um novo país: os Estados Unidos da América.
A Constituição Americana previa em seu art. 6º a cláusula de supremacia, estabelecendo que os juízes de todos os Estados serão sujeitos a ela, ficando sem efeito qualquer disposição em contrário na Constituição ou nas leis de qualquer dos Estados.
Marshall, juiz da Suprema Corte Americana, consagrava a superioridade da Constituição, fruto da vontade popular através de representantes do povo, em face das leis. No entanto, malgrado o Texto Constitucional vislumbrava respectiva superioridade, não havia disposição sobre a consequência da violação, o que foi solucionado com o famoso caso Marbury vs Madison, como explica Ronaldo Polletti:
Em 1803, Adams era o Presidente dos Estados Unidos, perdendo a sucessão presidencial para Thomas Jefferson. Antes de deixar o mandato presidencial, Adams nomeou partidários para vários cargos públicos. Marshall foi um desses nomeados, sendo regularmente empossado como Presidente da Suprema Corte. Alguns nomeados, entretanto, diferente de Marshall, não conseguiram ser empossados antes da posse do novo Presidente. Adams deixou os atos de nomeação preparados, faltando apenas a efetiva posse. Marbury foi um dos nomeados que não conseguiram tomar posse, tendo sido designado para o cargo de Juiz de Paz.
O novo Presidente, Jefferson, tomou posse, nomeando James Madison como seu Secretário de Estado. Madison, sob ordens de Jefferson, não entregou o ato de nomeação a Marbury, sob alegação de que esse ato estaria incompleto. Irresignado por não assumir o cargo, Marbury, ingressa com ação perante a Suprema Corte. Marshall, Presidente da Suprema Corte, decide que Marbury tem direito a assumir o cargo, mas não concede esse direito, pois a ação foi impetrada diretamente na Suprema Corte, como regia a legislação da época, contudo, a competência da Corte estava listada taxativamente na Constituição, e nessa não se encontrava a competência para esse tipo de julgamento. Deste modo, Marshall decide pela inconstitucionalidade do artigo da lei que concedia essa competência à Suprema Corte, pois tal norma era contrária à Constituição. Nasce, assim, o primeiro caso de controle de constitucionalidade[3].
Ao decidir pela inconstitucionalidade da lei pronunciou-se sobre o princípio da nulidade – Lei contrária a Constituição deve ser declarada nula. Isto é, com eficácia retroativa, ex tunc.
Com efeito, foi desenvolvido o controle difuso e incidental, consoante esclarece Cappelleti:
No método de controle ‘difuso’ de constitucionalidade – no denominado método ‘americano’, em suma – todos os órgãos judiciários, inferiores ou superiores, federais ou estaduais, têm, como foi dito, o poder e o dever de não aplicar as leis inconstitucionais aos casos concretos submetidos a seu julgamento. Experimentemos então imaginar, como hipótese de trabalho – uma hipótese que, de resto, foi tornada realidade, como já se referiu, em alguns Países, ou seja, na Noruega, Dinamarca, Suécia e foi posta em prática, por poucos anos, também na Alemanha e na Itália – a introdução deste método “difuso” de controle nos sistemas jurídicos da Europa continental e, mais em geral, nos sistemas denominados de civil law, ou seja, de derivação romanística, em que não existe o princípio, típico dos sistemas de common law, do “staredecisis”. Pois bem, a introdução, nos sistemas de civil law, do método “americano” de controle, levaria à consequência de que uma mesma lei ou disposição de lei poderia não ser aplicada, porque julgada inconstitucional, por alguns juízes, enquanto poderia, ao invés, ser aplicada, porque não julgada em contraste com a Constituição, por outros. Demais, poderia acontecer que o mesmo órgão judiciário que, ontem, não tinha aplicado uma determinada lei, ao contrário, a aplique hoje, tendo mudado de opinião sobre o problema de sua legitimidade constitucional[4].
Portanto, nos Estados nasceu o controle difuso e incidental de constitucionalidade, o qual, influenciou demasiadamente o Brasil, conforme será melhor explorado a seguir.
1.3 MODELO FRANCÊS
Como se deduz do que foi dito, na Inglaterra os barões, o povo e os juízes eram contrários a monarquia absolutista. Nos Estados Unidos havia desconfiança em relação ao Parlamento Inglês, diante da pressão da metrópole. Por sua vez, na França, houve revolta contra a monarquia, prevalecendo o Parlamento, sendo que o juiz também era visto com desconfiança, porque este foi contaminado pela nobreza, não tendo participado da Revolução Francesa na década XVIII.
Nesse diapasão, o controle de constitucionalidade era realizado por órgão próprio: o Conselho Constitucional, criado em 1958, que não se confunde com o Conselho de Estado (Justiça Administrativa), nem com a Corte de Cassação (Jurisdição Cível/Comum).
Diante da desconfiança do juiz, a este não cabia o exercício do controle de constitucionalidade das leis, já que era desprovido de poder de interpretação. Uma vez aprovada e promulgada a lei, não era mais possível fiscalizá-la em face da Constituição.
O controle era político e preventivo, somente restando ao juiz a aplicação da lei – o juiz é boca da lei. O controle preventivo de constitucionalidade, por consistir numa atividade de fiscalização de leis aprovadas pelo parlamento, mas ainda não promulgadas, insere-se no próprio processo legislativo, apresentando-se como uma fase ou iter do processo de formação das leis na França[5].
Em 2008, foi ampliada a competência do Conselho Constitucional, de modo a permitir o controle repressivo de constitucionalidade das leis promulgadas e em vigor, sempre que for suscitada, em qualquer processo judicial ou administrativo, a questão prioritária de constitucionalidade (um incidente).
Em suma, é correto dizer que na França nasceu o controle político preventivo de constitucionalidade.
1.4 MODELO AUSTRÍACO
Este modelo sofreu forte influência de Hans Kelsen, tratando de um sistema diferenciado do mundo, fundando-se na competência exclusiva das Cortes Constitucionais para efetivação do controle de constitucionalidade. Vislumbrando-se, assim, um controle concentrado.
Como bem explica Canotilho, a concepção kelseniana diverge substancialmente da judicial review americana: o controle constitucional não é propriamente uma fiscalização judicial, mas uma função constitucional autônoma que tendencialmente se pode caracterizar como função de legislação negativa[6].
No sistema concentrado, a inconstitucionalidade, a qual resulta na invalidade da lei, não pode ser julgada por qualquer juiz. Do revés, os juízes comuns são incompetentes para tanto, ainda que incidenter tantum. Ao sistema concentrado associam-se o controle por via principal e o controle abstrato. As questões são levantadas a título principal, mediante processo constitucional autônomo, e a impugnação da constitucionalidade de uma lei é feita independentemente de qualquer litígio concreto[7].
García de Enterría demonstra uma razão histórica para a posição restritiva da atuação do Judiciário: Kelsen queria com isso evitar um governo de juízes, numa época em que havia certa revolta dos juízes contra a lei. Explica, ainda, que o mundo germânico vivia a influência de algumas posições românticas, como as da Escola livre do Direito e da Jurisprudência livre. Proibindo os juízes de deixar de aplicar as leis, procurava submeter a jurisdição à legislação e à primazia do Parlamento[8].
Ainda, diferente do modelo americano, no austríaco os efeitos da pronuncia de inconstitucionalidade é ligado ao princípio da anulabilidade. Isto é, ex nunc. Em que pese o Brasil tenha adotado também o sistema austríaco, tem-se que a lei inconstitucional é nula de pleno direito e que a decisão de inconstitucionalidade tem eficácia retroativa, restando inválidos todos os atos praticados com base na lei impugnada, com a ressalva do art. 27 da Lei 9.868/99[9].
Destarte, trata-se de um modelo concentrado, abstrato e dotado de eficácia ex nunc.
2. SISTEMA BRASILEIRO DE CONTROLE
O Brasil abarcou todos os modelos dispostos acima, por essa razão é chamado de hibrido, eclético ou misto.
2.1 QUANTO À NATUREZA DO ÓRGÃO DE CONTROLE
Nesse aspecto o controle pode ser político ou judicial, a depender do órgão que o realiza, sendo este efetuado pelo Poder Judiciário, enquanto aquele por órgãos de natureza política, quais sejam, Poder Legislativo e Executivo.
O Poder Legislativo exerce respectivo controle quando, por exemplo, rejeita um projeto de lei inconstitucional, através da Constituição de Comissão e Justiça, bem como quanto susta atos do Executivo que exorbita o poder regulamentar, consoante art. 49, V da CF[10], e quando não aprovam uma medida provisória por entendê-la inconstitucional. O Poder Executivo, por sua vez, exerce o controle quando o seu Chefe veta determinado projeto de lei por sopesá-lo inconstitucional, nos termos do art. 66, § 1º da CF[11], bem como quando determina aos seus subordinados a não aplicação de lei cominada de vício da inconstitucionalidade.
Importante salientar que no controle político não há declaração de inconstitucionalidade da lei, por ser matéria reservada a jurisdição, havendo, assim, uma mera apreciação da norma.
O controle exercido pelo Judiciário já tem o condão de declarar a (in)constitucionalidade da norma, conforme explica Roberto Barroso: “no Brasil, onde o controle de constitucionalidade é eminentemente de natureza judicial — isto é, cabe aos órgãos do Poder Judiciário a palavra final acerca da constitucionalidade ou não de uma norma[12].
2.2 QUANTO AO MOMENTO DO EXERCÍCIO DO CONTROLE
Em relação ao momento do exercício do controle, ele pode ser preventivo (a priori ou anterior) ou repressivo (a posteriori ou sucessivo). Isto é, se o juízo é realizado antes da edição da norma é preventivo, se posterior é repressivo.
Luís Roberto Barroso ensina que o controle prévio ou preventivo é aquele que se realiza anteriormente à conversão de um projeto de lei em lei e visa a impedir que um ato inconstitucional entre em vigor, citando os seguintes exemplos[13]:
(i) pelo Poder Legislativo, no âmbito das comissões de constituição e justiça, existentes nas casas legislativas em geral, que se manifestam, usualmente, no início do procedimento legislativo, acerca da constitucionalidade da espécie normativa em tramitação;
(ii) pelo Poder Executivo, que poderá apor seu veto ao projeto aprovado pela casa legislativa, tendo por fundamento a inconstitucionalidade do ato objeto de deliberação, impedindo, assim, sua conversão em lei (como regra, uma lei nasce com a sanção, isto é, com a anuência do Chefe do Executivo ao projeto aprovado pelo Legislativo
Não somente o Poder Legislativo e Executivo quem exercem o controle preventivo, mas também o Judiciário, vez que o Supremo Tribunal Federal tem conhecido mandados de segurança impetrado contra processamento de propostas de emenda à constituição que violem as cláusulas pétreas do art. 60, § 4º da Constituição Federal:
O STF admite a legitimidade do parlamentar – e somente do parlamentar – para impetrar mandado de segurança com a finalidade de coibir atos praticados no processo de aprovação de lei ou emenda constitucional incompatíveis com disposições constitucionais que disciplinam o processo legislativo. Precedentes do STF: MS 20.257/DF, min. Moreira Alves (leading case) (RTJ 99/1031); MS 20.452/DF, min. Aldir Passarinho (RTJ 116/47); MS 21.642/DF, min. Celso de Mello (RDA 191/200); MS 24.645/DF, min. Celso de Mello, DJ de 15-9-2003; MS 24.593/DF, min. Maurício Corrêa, DJ de 8-8-2003; MS 24.576/DF, min. Ellen Gracie, DJ de 12-9-2003; MS 24.356/DF, min. Carlos Velloso, DJ de 12-9-2003. [MS 24.667 AgR, rel. min. Carlos Velloso, j. 4-12-2003, P, DJ de 23-4-2004.] = MS 32.033, rel. p/ o ac. min. Teori Zavascki, j. 20-6-2013, P, DJE de 18-2-2014[14]
Em suma, os três Poderes têm atribuição para efetuar o controle preventivo de constitucionalidade.
Quanto ao repressivo, após a edição da norma, o mesmo é destinado a paralisar a sua eficácia. Em regra, é exercido pelo Poder Judiciário, na qualidade de legislador negativo. Excepcionando-se a atuação do Legislativo quando susta atos do Executivo que exorbitam a delegação concedida, bem como do Executivo quando se recusa a aplicar diretamente uma norma inconstitucional.
2.3 QUANTO AO ÓRGÃO JUDICIAL QUE EXERCE O CONTROLE
Trata-se de um aspecto subjetivo, podendo ser difuso ou concentrado. Este é de atribuição exclusiva e originária de um único órgão do Judiciário, enquanto aquele qualquer juiz ou tribunal – no âmbito de sua competência – pode realizá-lo.
O controle difuso, como já explicado alhures, desenvolveu-se na Suprema Corte Americana no caso Marbury vs Madson, com a ruptura da tradição inglesa da supremacia do Parlamento[15].
Cappelletti afirma que naquela decisão considerou-se competência própria do Judiciário dizer o Direito, estabelecendo o sentido das leis. Sendo a Constituição uma lei, e uma lei dotada de supremacia, cabe a todos os juízes interpretá-la, inclusive negando aplicação às normas infraconstitucionais que com ela conflitem. Assim, na modalidade de controle difuso, também chamado sistema americano, todos os órgãos judiciários, inferiores ou superiores, estaduais ou federais, têm o poder e o dever de não aplicar as leis inconstitucionais nos casos levados a seu julgamento[16].
Nos dias atuais, como sustenta Cunha Júnior: “Pressupõe a existência de um conflito de interesses, no bojo de uma ação judicial, na qual uma das partes alega a inconstitucionalidade de uma lei ou ato que a outra pretende ver aplicada ao caso.”[17]
O concentrado, como também já dito anteriormente, nasceu na Áustria, e tem como pressuposto a existência de apenas um órgão para o exercício do controle. No Brasil este é de incumbência do Supremo Tribunal Federal quando se tratar de lei ou ato normativo federal ou estadual, sendo do Tribunal de Justiça atinente a lei ou ato normativo do seu respectivo estado e seus municípios. Sustenta Luís Roberto Barroso o seguinte:
No sistema concentrado, o controle de constitucionalidade é exercido por um único órgão ou por um número limitado de órgãos criados especificamente para esse fim ou tendo nessa atividade sua função principal. É o modelo dos tribunais constitucionais europeus, também denominado sistema austríaco. Foi adotado pela primeira vez na Constituição da Áustria, de 1920, e aperfeiçoado por via de emenda, em 1929[18].
Conforme afirma Cunha Júnior: “À vista desse modelo, instaura-se no Supremo Tribunal Federal uma fiscalização abstrata das leis ou atos normativos do poder público em confronto com a Constituição. Tal se dá em face do ajuizamento de uma ação direta, cujo pedido principal é a própria declaração de inconstitucionalidade ou constitucionalidade”.[19]
2.4 QUANTO AO MODO DO CONTROLE JUDICIAL
Guarda relação com o aspecto formal ou processual, podendo ser pela via incidental (incidenter tantum/exceção/defesa) ou principal (ação/direta).
Diz-se o controle incidental quando a matéria constitucional não é a principal. A questão constitucional é prejudicial – é a causa de pedir, não o pedido principal. Explica Seabra Fagundes que a declaração incidental de inconstitucionalidade é feita no exercício normal da função jurisdicional, que é a de aplicar a lei contenciosamente[20].
Gilmar Mendes descreve que o controle de constitucionalidade concreto ou incidental, tal como desenvolvido no Direito Brasileiro, é exercido por qualquer órgão judicial, no curso de processo de sua competência. A decisão, “que não é feita sobre o objeto principal da lide, mas sim sobre questão prévia, indispensável ao julgamento do mérito”, tem o condão, apenas, de afastar a incidência da norma viciada. Daí recorre-se à suspensão de execução pelo Senado de leis ou decretos declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal (CF 1967/69, art. 42, VII)[21].
Outrossim, salienta-se a doutrina de Luís Roberto Barroso:
O controle incidental é por vezes referido, também, como controle por via de exceção ou defesa, porque normalmente a inconstitucionalidade era invocada pela parte demandada, para escusar-se do cumprimento da norma que reputava inválida. Todavia, a inconstitucionalidade pode ser suscitada não apenas como tese de defesa, mas também como fundamento da pretensão do autor, o que se tornou mais frequente com a ampliação das ações de natureza constitucional, inclusive e notadamente pelo emprego do mandado de segurança, tanto individual como coletivo. Não se confundem, conceitualmente, o controle por via incidental — realizado na apreciação de um caso concreto — e o controle difuso — desempenhado por qualquer juiz ou tribunal no exercício regular da jurisdição. No Brasil, no entanto, como regra, eles se superpõem, sendo que desde o início da República o controle incidental é exercido de modo difuso. Somente com a arguição de descumprimento de preceito fundamental, criada pela Lei n. 9.982, de 3 de dezembro de 1999, cujas potencialidades ainda não foram integralmente exploradas, passou-se a admitir uma hipótese de controle incidental concentrado[22].
No controle pela via de ação direta, tem-se que a matéria constitucional é a questão principal (trata-se de um controle abstrato), veiculada a partir de um processo objetivo, em que inexiste lide. Conforme as lições de Paulo Bonavides:
O sistema de controle por via de ação permite o controle da norma in abstracto por meio de uma ação de inconstitucionalidade prevista formalmente no texto constitucional. Trata-se, como se vê, ao contrário da via de exceção, de um controle direto. Nesse caso, impugna-se perante determinado tribunal uma lei, que poderá perder sua validade constitucional e conseqüentemente ser anulada erga omnes (com relação a todos)[23].
Nesse diapasão, conclui-se que a via principal guarda relação com o controle abstrato, na medida em que não há um caso concreto para apreciação. No entanto, isso não é absoluto, visto como é possível o controle concentrado em um caso concreto, quando, por exemplo, o parlamentar impetra um mandado de segurança contra ato de sua respectiva Mesa que deu processamento a um projeto de emenda constitucional tendente a abolir cláusula pétrea. Nesta hipótese, há um caso concreto e o Supremo Tribunal Federal é o competente exclusivo para contemplar a questão, nos termos do art. 102, I, alínea “d” da Constituição Federal[24].
2.5 ANTECEDENTES DO MODELO EM VIGOR
A primeira Constituição do Brasil, outorgada em março de 1824 – Brasil Império, não regulou o controle de constitucionalidade a ser exercido pelo Poder Judiciário, visto como seu art. 15 atribuía ao Poder Legislativo a incumbência de zelar pela guarda da Constituição. Ao comentar sobre essa ausência de controle judicial, Celso Antônio Bandeira de Melo explica que no Brasil se ignorava essa prerrogativa, ou mesmo conhecendo-a os governantes, não se afeiçoaram a ele[25].
Nesse diapasão, não se pode negar a semelhança com o modelo francês de constitucionalidade.
Em 1891, na segunda Constituição brasileira – Brasil República, houve forte influência do modelo americano. À vista disso que foi nomeada de Constituição da República do Estados Unidos do Brasil.
Destarte, é correto dizer que a partir de 1891 passou-se a adotar o controle jurisdicional difuso no ordenamento jurídico.
Nas palavras de Gilmar Mendes, Inocêncio Coelho e Paulo Branco:
Iniciada a República, desde a sua primeira Constituição (1891), o Brasil passou a adotar o modelo difuso de controle da constitucionalidade, buscando fundamentos no modelo norte-americano, reconhecendo a competência do Supremo Tribunal Federal para rever as sentenças das Justiças dos Estados, em última instância, quando se questionasse a validade ou a aplicação de tratados e leis federais e a decisão do Tribunal fosse contra ela, ou quando se contestasse a validade de leis ou de atos dos governos locais, em face da Constituição ou das leis federais, e a decisão do Tribunal considerasse válidos esses atos ou leis impugnadas (art. 59, §1º, a e b)[26].
Rui Barbosa definiu como seria utilizado o mecanismo:
O único lance da Constituição americana, onde se estriba ilativamente o juízo, que lhe atribui essa intenção, é o do art. III, seç. 2ª, cujo teor reza assim: 'O poder judiciário estender-se-á a todas as causas, de direito e eqüidade, que nasceram desta Constituição, ou das leis dos Estados Unidos'.
Não se diz aí que os tribunais sentenciarão sobre a validade, ou invalidade, das leis. Apenas se estatui que conhecerão das causas regidas pela Constituição, como conformes ou contrárias a ela.
Muito mais concludente é a Constituição brasileira. Nela não só se prescreve que ‘Compete aos juízes ou tribunais federais processar e julgar as causas, em que alguma das partes fundar a ação, ou a defesa, em disposição da Constituição Federal’ (art. 60, a); como, ainda, que ‘Das sentenças das justiças dos Estados em última instância haverá recurso para o Supremo Tribunal Federal, quando se questionar sobre a validade de tratados e leis federais, e a decisão do tribunal do Estado for contrária (art. 59, § 1o, a)’.
A redação é claríssima. Nela se reconhece, não só a competência das justiças da União, como a das justiças dos Estados, para conhecer da legitimidade das leis perante a Constituição. Somente se estabelece, a favor das leis federais, a garantia de que, sendo contrária à subsistência delas a decisão do tribunal do Estado, o feito pode passar, por via de recurso, para o Supremo Tribunal Federal. Este ou revogará a sentença, por não procederem as razões de nulidade, ou a confirmará pelo motivo oposto. Mas, numa ou noutra hipótese, o princípio fundamental é a autoridade reconhecida expressamente no texto constitucional, a todos os tribunais, federais, ou locais, de discutir a constitucionalidade das leis da União, e aplicá-las, ou desaplicá-las, segundo esse critério.
É o que se dá, por efeito do espírito do sistema, nos Estados Unidos, onde a letra constitucional, diversamente do que ocorre entre nós, é muda a este propósito[27].
Conclui-se, assim, que foi reconhecido ao Supremo Tribunal Federal a competência para efetuar o controle de constitucionalidade, ainda que em casos concretos. Em outros termos, existiu um alargamento da competência para a interpretação constitucional.
Em relação a Constituição de 1934, esta trouxe fortes impactos no sistema de controle de constitucionalidade, ao passo que previu expressamente a cláusula de reserva de plenário, previu a suspensão pelo Senado Federal da lei ou ato declarado inconstitucional, a criação da representação interventiva.
Consoante explicação de Luís Roberto Barroso.
Com a Constituição de 1934 foi introduzido um caso específico de controle por via principal e concentrado, de competência do Supremo Tribunal Federal: a denominada representação interventiva. A lei que decretasse a intervenção federal por violação de um dos princípios constitucionais de observância obrigatória pelos Estados-membros (os denominados princípios constitucionais sensíveis, constantes do art. 7º da Carta) precisava ser previamente submetida à mais alta corte, mediante provocação do Procurador-Geral da República, para que fosse declarada sua constitucionalidade. No tocante ao controle incidental e difuso, a Constituição de 1934 passou a exigir o voto da maioria absoluta dos membros dos tribunais e previu a suspensão pelo Senado Federal da lei ou ato declarado inconstitucional[28].
Não há dúvidas de que a Constituição de 1934 evidenciou a progressão do País em relação ao controle de constitucionalidade, tanto que as previsões ali inauguradas, hoje são insertas na Constituição Federal de 1988.
A Constituição Federal de 1937, conhecida como “polaca”, outorgada durante Estado Novo, com caráter ditatorial, dispôs em seu art. 96 que somente por maioria absoluta de votos da totalidade dos juízes, poderiam os Tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato emanado pelo Presidente da República, no entanto respectivo parágrafo único continha o seguinte:
No caso de ser declarada a inconstitucionalidade de uma lei que, a juízo do Presidente da República, seja necessária ao bem-estar do povo, à promoção ou defesa do interesse nacional de alta monta, poderá o Presidente da República submetê-la novamente ao exame do Parlamento: se este a confirmar por dois terços de votos em cada uma das Câmaras, ficará sem efeito a decisão do Tribunal.”
Ou seja, não obstante a declaração de inconstitucionalidade pelo Poder Judiciário, o Presidente da República submetia novamente o exame, do mesmo ato, ao Parlamento, o qual poderia tornar sem efeito a atuação do Judiciário. Uma verdadeira ditadura.
Com a Constituição Federal de 1946 houve a ruptura com o Estado Novo, diante da redemocratização do País. É salutar destacar a novidade da Emenda Constitucional 16/65, a qual alargou a competência do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar a representação contra a inconstitucionalidade de lei ou ato de natureza normativa federal ou estadual, encaminhada pelo Procurador-Geral da República.
Em termos práticos, passou a permitir no Brasil um modelo semelhante ao austríaco de Kelsen, qual seja, concentrado e abstrato. Porém, com a legitimidade exclusiva o Procurador-Geral da República.
De acordo com Luís Roberto Barroso:
Passava o Supremo Tribunal Federal a ter competência para declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato federal, mediante representação que lhe fosse encaminhada pelo Procurador-Geral da República. Introduzia-se, assim, no direito brasileiro mecanismo análogo ao das cortes constitucionais europeias: um controle por via principal, mediante ação direta, em fiscalização abstrata e concentrada no Supremo Tribunal Federal. O controle incidental e difuso, por sua vez, não foi afetado pela inovação, passando ambos a conviver entre si[29].
Já Veloso expõe que o objetivo da adoção do modelo não era o de estabelecer um verdadeiro controle concentrado de constitucionalidade, pois a manifestação do STF, atendendo a representação do Procurador-Geral da República, não operava erga omnes, e tinha o escopo de constatar a violação de princípio constitucional sensível, para legitimar a decretação da intervenção da União no ente federativo. Mas que a solução da Constituição de 1946 significou um novo e vigoroso passo para a instituição do controle concentrado[30].
Por sua vez, a Constituição de 1967, com a redação da EC 01/69 não trouxe modificações importantes ao sistema, havendo a manutenção do controle difuso e concentrado. No entanto, insta salientar a previsão da ação direta em âmbito estadual, mas limitada a hipótese de intervenção do Estado em Município.
Outrossim, é salutar destacar a Emenda Constitucional 7 de 13 de abril de 1977 a qual pôs termo a controvérsia atinente ao cabimento de liminar em representação de inconstitucionalidade, já que passou a reconhecer expressamente. Ainda, pelo mesmo intermédio foi instituída a “representação para interpretação de lei ou ato normativo federal ou estadual”, por via da qual o Supremo Tribunal Federal, mediante representação do Procurador-Geral da República, poderia fixar, em tese e com caráter vinculante, o sentido de uma norma.
Por fim, a Constituição Federal de 1988, manteve o sistema eclético híbrido ou misto, harmonizando o controle pela via incidental e difuso (americano), com o controle pela via principal e concentrado (austríaco). Ainda, trouxe um conjunto amplo de inovações, as quais se destacam, consoante obra de Luís Roberto Barroso: “a) a ampliação da legitimação ativa para propositura de ação direta de inconstitucionalidade (art. 103); b) a introdução de mecanismos de controle da inconstitucionalidade por omissão, como a ação direta com esse objeto (art. 103, § 2º) e o mandado de injunção (art. 5º, LXXI); c) a recriação da ação direta de inconstitucionalidade em âmbito estadual, referida como representação de inconstitucionalidade (art. 125, § 2º); d) a previsão de um mecanismo de arguição de descumprimento de preceito fundamental (art. 102, § 1º); e) a limitação do recurso extraordinário às questões constitucionais (art. 102, III)”[31].
A Emenda Constitucional 03 de 1993 acrescentou a ação declaratória de constitucionalidade. Posteriormente, a Emenda Constitucional 45 de 2004 trouxe a possibilidade de efeito vinculante das decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade (art. 102, § 2º), assim como de aprovação pelo Supremo Tribunal Federal de súmula vinculante no controle difuso de constitucionalidade (art. 103-A), o estabelecimento de um novo requisito para admissão do recurso extraordinário – repercussão geral (art. 102, § 3º).
Em relação a EC 03/93 comenta Luís Roberto Barroso:
O quadro desenhado pelo constituinte originário passou a ser sistematicamente remodelado a partir da criação da ação declaratória de constitucionalidade, resultante da Emenda Constitucional n. 3, de 18 de março de 1993. A nova ação, de competência do Supremo Tribunal Federal e proponível pelos mesmos legitimados da ADIn (por força da Emenda Constitucional n. 45/2004)162, foi amplamente contestada por parte da doutrina, que questionava sua constitucionalidade. O Supremo Tribunal Federal, no entanto, por ampla maioria, considerou legítima sua acolhida no já complexo sistema brasileiro de controle de constitucionalidade[32].
A lei que regula o processo e julgamento das ações objetivas perante o STF, tanto na via de ação direta de inconstitucionalidade como da ação declaratória de constitucionalidade, é a Lei 9.868/99. Enquanto a Lei 9.882/99 regula o processo e julgamento da arguição de descumprimento de preceito fundamental.
Por derradeiro, foi mantida a ação direta interventiva, como mecanismos de fiscalização concreta. Havendo hoje no Brasil a ação direta de inconstitucionalidade (genérica) (art. 102, I, a); ação direta de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, § 2º); ação declaratória de constitucionalidade (art. 102, I, a); ação direta interventiva (art. 36, III); arguição de descumprimento de preceito fundamental (art. 102, § 1º).
3. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE POR VIA INCIDENTAL
Em que pese tenha se verificado acima algumas explanações sobre esse sistema de controle, neste capítulo o tema será abordado de maneira mais exauriente.
3.1 BREVES CONSIDERAÇÕES
Cumpre relembrar que se trata do modelo americano, integrado no Brasil com a Constituição de 1891. Com o advento do Novo Código de Processo Civil foi instituído o incidente de arguição de inconstitucionalidade nos tribunais (art. 949 e seguintes, CPC/15).
De acordo com Cleve[33], o controle de constitucionalidade difuso também denominado concreto, aberto, incidental, via de defesa e via de exceção é admitido para atacar indiretamente a lei ou um ato normativo considerado inconstitucional, que tenha lesionado direito das partes envolvidas, cuja declaração de inconstitucionalidade poderá ser prolatada por qualquer órgão do Judiciário.
Gilmar Mendes revela que o controle difuso possui como fundamento principal o seu desenvolvimento no curso de um processo, em que a controvérsia constitucional é “antecedente lógico e necessário à declaração judicial que há de versar sobre a existência de relação jurídica”[34].
Como o próprio diz, é um controle incidental – um incidente dentro do processo, em que o pedido principal não é a declaração de inconstitucionalidade da lei ou ato normativo, mas sim um pedido que pressupõe a análise prévia da validade destes frente à Constituição Federal. Dito de outro modo, é a causa de pedir.
Luís Roberto Barroso dá os seguintes exemplos:
Suponha-se que um Município haja instituído um tributo sem observância do princípio da legalidade, e que um contribuinte se tenha recusado a pagá-lo. A autoridade municipal irá, então, autuá-lo, inscrever a dívida e instaurar um processo de execução de seu crédito tributário. O contribuinte, em sua defesa, poderá oferecer embargos de devedor, argumentando que a cobrança é fundada em lei inconstitucional. O objeto dessa ação de embargos é determinar se o tributo é devido ou não. Todavia, para formar sua convicção, o julgador terá de decidir, previamente, se a lei que criou o tributo é ou não constitucional. Esta é a questão prejudicial que subordina o raciocínio que ele precisa desenvolver. Estabelecida a premissa lógica da decisão, ele julgará o mérito, condenando o contribuinte ao pagamento ou exonerando-o de fazê-lo, consoante tenha considerado a lei válida ou inválida.
Outro exemplo, envolvendo uma relação de locação. Imagine-se que uma lei venha a modificar o critério de cálculo dos aluguéis, tendo previsto sua incidência imediata, inclusive sobre os contratos em curso. Um locatário, prejudicado pela mudança, recusa-se a pagar a majoração, afirmando que a nova lei afeta o ato jurídico perfeito. O proprietário do imóvel ingressa em juízo, formulando pedido de condenação do locatário ao pagamento do valor integral do aluguel, tal como decorrente da lei. Para julgar a causa, o juiz precisará pronunciar-se, incidentalmente, acerca da constitucionalidade ou não da lei que interferiu com o valor do aluguel a ser pago. Só então poderá decidir o objeto da ação, que consiste em determinar se é ou não devida a diferença de aluguel[35].
Note-se, em ambos os exemplos o que a parte requereu no processo não foi a declaração de inconstitucionalidade da norma, esta foi utilizada como questão prejudicial.
3.1.1 Legitimidade
O rol é bastante amplo, tendo em vista que qualquer das partes pode suscitar. O autor pode suscitar a inconstitucionalidade tanto em seu pedido inicial como em momento posterior, para que não tenha de se sujeitar aos seus efeitos. O réu, por sua vez, também é legitimado, por isso também é denominado de via de defesa. Nesse sentido, explica Lúcio Bittencourt que a arguição incidental de inconstitucionalidade é também denominada via de defesa ou de exceção porque, originalmente, era reconhecida como argumento a ser deduzido pelo réu, como fundamento para desobrigar-se do cumprimento de uma norma inconstitucional. A parte, em lugar de atacar o ato diretamente, aguardava que a autoridade postulasse judicialmente sua aplicação, pedindo então ao juiz que não aplicasse a lei reputada inconstitucional[36].
Até mesmo o Ministério Público, quando seja parte ou oficie como custos legis, bem como terceiros que tenham intervindo legitimamente (assistente, litisconsorte, opoente). E, por derradeiro, o juiz ou o Tribunal de ofício. Entretanto, há de se ressaltar que em sede de recurso extraordinário não tendo havido o prequestionamento da matéria constitucional não será possível o conhecimento do recurso, ainda que seja perceptível ictu oculi a inconstitucionalidade de determinada norma[37].
3.1.2 Quanto ao processo
Na mesma medida em que há amplitude dos legitimados, também há abrangência quanto a natureza do processo a ser suscitado o incidente, seja de conhecimento ou de execução. A exigência é meramente que haja um conflito de interesses, uma pretensão resistida, um ato concreto de autoridade ou a ameaça de que venha a ser praticada. Isto é, uma pretensão subjetiva.
Ainda, considerando a obrigatoriedade de uma pretensão resistida, não se pode olvidar a viabilidade de arguição em ação de rito comum e especial, até mesmo nas ações constitucionais, a exemplo da ação popular e ação civil pública.
No mais, é oportuno avultar que quando a apreciação da norma tida por inconstitucional couber ao Tribunal há obrigatoriedade da observação da cláusula de reserva de plenário, nos termos do art. 97 da CF, cujo rito encontra-se inserto no 948 e seguintes do CPC/15.
3.1.3 Quanto ao momento
A inconstitucionalidade de uma norma é matéria de ordem pública. Por essa razão pode ser conhecida de ofício em qualquer tempo e grau de jurisdição, mesmo quando já preclusas as vias impugnativas e formada a coisa julgada. Porém, como já explicado acima, a restrição é quanto aos recursos nas instâncias extraordinárias, tendo em vista a exigência do prequestionamento.
3.1.4 Objeto e parâmetro
O objeto trata-se da norma impugnada, enquanto o parâmetro é a Constituição Federal ou Estadual.
Sobressai explicar que a lei orgânica não é parâmetro de controle, a não ser quando se trata da lei orgânica do Distrito Federal, vez que este possui competência legislativa hibrida, pois são atribuídas a ele as competências legislativas reservadas aos Estado e Municípios. Isto é, organiza e estrutura o Distrito Federal, sendo, mutatis mutandi, uma Constituição Estadual.
A norma a ser impugnada – objeto, pode ser tanto uma lei federal frente a Constituição Federal, como uma lei estadual frente a Constituição Estadual. Com efeito, não há viabilidade de controle entre lei federal face Constituição Estadual.
3.2 CONTROLE DIFUSO
O controle incidental de constitucionalidade é efetuado, em regra, de modo difuso. Isto é, cabe a todos os órgãos judiciais, indistintamente, tanto de primeiro e segundo grau, inclusive os Tribunais Superiores, como já apontado acima.
O juízo singular tem mais plenitude de atuação se comparado aos Tribunais, pois estes sujeitam-se a regra da reserva de plenário (art. 97, CF) — sendo vedada aos órgãos fracionários, como câmaras ou turmas, a declaração de inconstitucionalidade de uma norma.
Lenio Streck argumenta haver uma diferença entre o controle difuso exercido pelo juiz singular e o exercido pelos tribunais. Segundo sustenta, ao contrário dos tribunais, o juiz não declara a inconstitucionalidade de um texto normativo, mas apenas deixa de aplicá-lo[38]. Em contrapartida, Clève e Ronaldo Poletti entendem que a declaração de inconstitucionalidade, quer pelo juiz singular, pelos tribunais, ou pelo Supremo Tribunal Federal, tem a mesma natureza e decorre de idêntica fundamentação[39].
O Supremo Tribunal Federal entendeu que retirar do juiz de primeiro grau a possibilidade de declarar uma norma inconstitucional no caso concreto levaria a extinção do controle difuso e incidental:
O art. 97 da CF/1988 e a Súmula Vinculante 10 são aplicáveis ao controle de constitucionalidade difuso realizado por órgãos colegiados. Por óbvio, o requisito é inaplicável aos juízos singulares, que não dispõem de “órgãos especiais”. Ademais, o controle de constitucionalidade incidental, realizado pelos juízes singulares, independe de prévia declaração de inconstitucionalidade por tribunal. A tese exposta na inicial equivaleria à extinção do controle de constitucionalidade difuso e incidental, pois caberia aos juízes singulares tão somente aplicar decisões previamente tomadas por tribunais no controle concentrado e abstrato de constitucionalidade. [Rcl 14.889 MC, rel. min. Joaquim Barbosa, dec. monocrática, j. 13-11-2012, DJE 226 de 19-11-2012.]
Veja-se, assim, que o objetivo da Súmula Vinculante 10 é dar eficácia à cláusula constitucional da reserva de plenário, cuja obediência é imposta aos tribunais componentes da estrutura judiciária do Estado brasileiro. Ocorre que a decisão, ora reclamada, foi proferida por juiz singular, o que torna o objeto da presente ação incompatível com o paradigma de confronto constante da Súmula Vinculante 10. Isso porque é inviável a aplicação da súmula ou da cláusula de reserva de plenário, dirigida a órgãos judicantes colegiados, a juízo de caráter singular, por absoluta impropriedade, quando da realização de controle difuso de constitucionalidade. [Rcl 13.158, rel. min. Dias Toffoli, dec. monocrática, j. 8-8-2012, DJE 160 de 15-8-2012.]
De todo o modo, com a devida devia, o efeito prático da decisão do juiz singular que repute uma lei inconstitucional, declarando-a ou deixando de aplicá-la, é o mesmo: o afastamento da norma no caso concreto.
3.2.1 Cláusula de reserva do plenário
A cláusula de reserva do plenário está inserida no art. 97 da Constituição Federal, dispondo que somente pelo voto da maioria absoluta dos seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público. Isto é, impede-se que os órgãos fracionários dos tribunais declarem a inconstitucionalidade de uma norma mesmo em sede de controle incidental. Ensina Guilherme Sandoval Góes que a cláusula de reserva de plenário também é conhecida como princípio do colegiado ou cláusula do full bench, e que tal princípio deriva da presunção de constitucionalidade das leis e da separação de poderes[40].
Houve a edição da súmula vinculante 10 do Supremo Tribunal Federal[41], expressando que viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte. Ao comentar esse enunciado, Sarlet, Marinoni e Mitidiero dizem o seguinte:
A Súmula Vinculante 10 evita o escamoteamento da declaração de inconstitucionalidade, ou melhor, o afastamento ou a mera não aplicação de lei sem que essa seja dita, expressamente, inconstitucional. Deseja-se inibir o órgão fracionário, ainda que consciente da sua falta de competência para decidir a questão constitucional, de imediatamente julgar o recurso, sem sobrestá-lo e enviar a questão constitucional à decisão do Plenário ou Órgão Especial. Assim, impede-se a violação da norma constitucional (art.97 da CF), que exige, para a declaração de inconstitucionalidade, o voto da maioria absoluta de seus membros do tribunal ou de seu Órgão Especial[42].
Convém observar que quando o órgão fracionário se depara com a questão prejudicial de inconstitucionalidade de determinada norma ocorre um deslocamento da competência para o julgamento da referida questão para o pleno ou órgão especial. Há a denominada: cisão funcional de competência em plano horizontal[43], cujo procedimento encontra-se previsto expressamente nos art. 948 e seguintes do CPC. Vale dizer, a câmara ou a turma não pode decidir imediatamente a lide, deve-se submeter a questão prejudicial ao pleno ou ao órgão especial do tribunal.
Não é todo o objeto do recurso, ou da ação originária que é enviada ao pleno ou órgão especial, mas tão somente a que discute a (in)constitucionalidade da norma. Por isso, chama-se de cisão – a matéria é cindida. Uma vez decidida a questão prejudicial de inconstitucionalidade, esta é devolvida à câmara ou turma para que julgue definitivamente o recurso ou a ação originária, conforme o caso. À vista disso é o enunciado da súmula 513 do STF[44].
É importante esclarecer que a cláusula de reserva do plenário se aplica tanto no controle difuso ou concentrado. No entanto, a cisão funcional somente ocorre no controle difuso, vez ser neste em que há o incidente, tendo em vista não ser a matéria tratada como principal, mas sim, repita-se a exaustão, como questão prejudicial.
Por outro lado, tem-se que a cláusula de reserva de plenário não é obrigatória quando já houver precedente do tribunal a respeito da matéria, conforme previsão do art. 949, parágrafo único, do CPC[45]. O Supremo Tribunal Federal, antes mesmo da entrada do Novo Código de Processo Civil perfilhava entendimento nesse sentido:
É desnecessária a submissão à regra da reserva de plenário quando a decisão judicial estiver fundada em jurisprudência do Plenário ou em Súmula deste Supremo Tribunal Federal; (...). [Tese definida no ARE 914.045 RG, rel. min. Edson Fachin, P, j. 15-10-2015, DJE 232 de 19-11-2015, Tema 856.]
A jurisprudência pacífica desta Corte, agora reafirmada em sede de repercussão geral, entende que é desnecessária a submissão de demanda judicial à regra da reserva de plenário na hipótese em que a decisão judicial estiver fundada em jurisprudência do Plenário do Supremo Tribunal Federal ou em Súmula deste Tribunal, nos termos dos arts. 97 da Constituição Federal e 481, parágrafo único, do CPC/1973. [ARE 914.045 RG, rel. min. Edson Fachin, P, j. 15-10-2015, DJE 232 de 19-11-2015, Tema 856.]
Outrossim, também há dispensa da observância da cláusula de reserva de plenário quando o órgão fracionário entende pela constitucionalidade da norma, por isso pode rejeitar a arguição, com o prosseguimento do julgamento, nos termos do art. 949, I, CPC[46]. Segundo a doutrina de Barbosa Moreira:
A cláusula constitucional de reserva de plenário, insculpida no art. 97 da CF, fundada na presunção de constitucionalidade das leis, não impede que os órgãos fracionários ou os membros julgadores dos tribunais, quando atuem monocraticamente, rejeitem a arguição de invalidade dos atos normativos, conforme consagrada lição da doutrina[47].
Isso se dá em virtude do princípio da presunção de constitucionalidade das normas, no sentido de que o intérprete deve tentar extrair validade das leis e dos atos normativos do Poder Público sempre que possível, só declarando sua inconstitucionalidade quando esta for flagrante e incontestável. A declaração de inconstitucionalidade sempre é medida excepcionalmente adotada, porque implica restrição ao exercício de atividade legítima de outro Poder.
Igualmente, o Supremo Tribunal Federal quando do julgamento de um recurso extraordinário não se sujeita a regra do art. 97 da CF e da súmula 10 do STF, considerando a sua própria norma regimental.
O STF exerce, por excelência, o controle difuso de constitucionalidade quando do julgamento do recurso extraordinário, tendo os seus colegiados fracionários competência regimental para fazê-lo sem ofensa ao art. 97 da CF. [RE 361.829 ED, rel. min. Ellen Gracie, j. 2-3-2010, 2ª T, DJE de 19-3-2010.]
Todavia, nada obsta a remessa ao plenário quando entender que a matéria é relevante.
Ainda, é afastada a regra em juízo de recepção de norma anterior a Constituição Federal, por não envolver juízo de inconstitucionalidade:
(...) a discussão em torno da incidência, ou não, do postulado da recepção – precisamente por não envolver qualquer juízo de inconstitucionalidade (mas, sim, quando for o caso, o de simples revogação de diploma pré-constitucional) – dispensa, por tal motivo, a aplicação do princípio da reserva de plenário (CF, art. 97), legitimando, por isso mesmo, a possibilidade de reconhecimento, por órgão fracionário do Tribunal, de que determinado ato estatal não foi recebido pela nova ordem constitucional (RTJ 191/329-330), além de inviabilizar, porque incabível, a instauração do processo de fiscalização normativa abstrata (RTJ 95/980 – RTJ 95/993 – RTJ 99/544 – RTJ 143/355 – RTJ 145/339, v.g.). [AI 582.280 AgR, voto do rel. min. Celso de Mello, j. 12-9-2006, 2ª T, DJ de 6-11-2006.] = Rcl 10.114 AgR, rel. min. Ricardo Lewandowski, j. 18-12-2013, P, DJE de 19-2-2014 = AI 669.872 AgR, rel. min. Luiz Fux, j. 11-12-2012, 1ª T, DJE de 14-2-2013
A partir do momento em que há violação a cláusula da reserva do plenário nas hipóteses obrigatórias há cabimento do recurso extraordinário, diante da transgressão direta do art. 97 da Constituição Federal.
3.2.2 Efeitos da decisão e o papel do Senado Federal
Tratando-se de controle difuso, em que o processo é subjetivo, as decisões finais de mérito não transcendem as respectivas lides, possuindo, destarte, efeito inter partes.
Nas explanações de Luís Roberto Barroso além de defender a eficácia subjetiva, reconhece a ausência de coisa julgada:
Transitada em julgado a decisão, isto é, não sendo mais impugnável por via de recurso, reveste-se ela da autoridade da coisa julgada. Sua eficácia subjetiva, no entanto, é limitada às partes do processo, sem afetar terceiros (CPC, art. 472). Por outro lado, o objeto da causa é demarcado pelo pedido formulado, não podendo o pronunciamento judicial estender-se além dele. Portanto, a eficácia objetiva da coisa julgada é limitada ao que foi pedido e decidido, sendo certo que é a parte dispositiva da sentença (CPC, art. 458), na qual se contém a resolução das questões postas, que recebe a autoridade da coisa julgada[48].
Ainda, segue com o seguinte exemplo:
A decisão que declare que um tributo não é devido porque a lei que o instituiu viola o princípio da anterioridade, ou a que considere a majoração legal do valor do aluguel, no curso do contrato, prejudicial ao ato jurídico perfeito, produzem efeitos apenas entre as partes do processo: contribuinte e Fazenda Pública, no primeiro caso; locador e locatário, no segundo. Em ambas as hipóteses, o juiz reconheceu incidentalmente a inconstitucionalidade da lei aplicável, e os efeitos desse reconhecimento repercutem apenas inter partes. Porém, há mais a observar: a declaração de inconstitucionalidade não era o objeto de nenhum dos dois pedidos, mas apenas a razão de decidir. Na verdade, como já visto, era uma questão prejudicial, que precisava ser resolvida como premissa lógica necessária para a solução do litígio. Ora bem: por dicção legal expressa, nem os fundamentos da decisão nem a questão prejudicial integram os limites objetivos da coisa julgada, de modo que não há falar em auctoritas rei iudicata em relação à questão constitucional
Porém, insta esclarecer que Novo Código de Processo Civil em seu art. 503 possibilita o reconhecimento da coisa julgada na presença dos requisitos do seu parágrafo primeiro[49].
Quanto à eficácia no tempo, a regra é de que os efeitos são retroativos, pois uma normal nula é nula ab initio. Todavia, o Supremo Tribunal Federal já consagrou ser possível a modulação de efeitos no controle difuso, em recurso extraordinário, nas hipóteses de excepcional interesse social ou segurança jurídica, atendido o quórum qualificado de 2/3 de seus membros (oito ministros), consoante art. 27 da lei 9868/99[50].
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MUNICÍPIOS. CÂMARA DE VEREADORES. COMPOSIÇÃO. AUTONOMIA MUNICIPAL. LIMITES CONSTITUCIONAIS. NÚMERO DE VEREADORES PROPORCIONAL À POPULAÇÃO. CF, ARTIGO 29, IV. APLICAÇÃO DE CRITÉRIO ARITMÉTICO RÍGIDO. INVOCAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA RAZOABILIDADE. INCOMPATIBILIDADE ENTRE A POPULAÇÃO E O NÚMERO DE VEREADORES. INCONSTITUCIONALIDADE, INCIDENTER TANTUM, DA NORMA MUNICIPAL. EFEITOS PARA O FUTURO. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL.
1. O artigo 29, inciso IV da Constituição Federal, exige que o número de Vereadores seja proporcional à população dos Municípios, observados os limites mínimos e máximos fixados pelas alíneas a, b e c.2. Deixar a critério do legislador municipal o estabelecimento da composição das Câmaras Municipais, com observância apenas dos limites máximos e mínimos do preceito (CF, artigo 29é tornar sem sentido a previsão constitucional expressa da proporcionalidade.3. Situação real e contemporânea em que Municípios menos populosos têm mais Vereadores do que outros com um número de habitantes várias vezes maior. Casos em que a falta de um parâmetro matemático rígido que delimite a ação dos legislativos Municipais implica evidente afronta ao postulado da isonomia.4. Princípio da razoabilidade. Restrição legislativa. A aprovação de norma municipal que estabelece a composição da Câmara de Vereadores sem observância da relação cogente de proporção com a respectiva população configura excesso do poder de legislar, não encontrando eco no sistema constitucional vigente.
5. Parâmetro aritmético que atende ao comando expresso na Constituição Federal, sem que a proporcionalidade reclamada traduza qualquer afronta aos demais princípios constitucionais e nem resulte formas estranhas e distantes da realidade dos Municípios brasileiros. Atendimento aos postulados da moralidade, impessoalidade e economicidade dos atos administrativos (CF,Art.37).6. Fronteiras da autonomia municipal impostas pela própria Carta da Republica, que admite a proporcionalidade da representação política em face do número de habitantes. Orientação que se confirma e se reitera segundo o modelo de composição da Câmara dos Deputados e das Assembléias Legislativas (CF, artigos 27 e 45, §1). 7. Inconstitucionalidade, incidenter tantun, da lei local que fixou em 11 (onze) o número de Vereadores, dado que sua população de pouco mais de 2600 habitantes somente comporta 09 representantes. 8. Efeitos. Princípio da segurança jurídica. Situação excepcional em que a declaração de nulidade, com seus normais efeitos ex tunc, resultaria grave ameaça a todo o sistema legislativo vigente. Prevalência do interesse público para assegurar, em caráter de exceção, efeitos pro futuro à declaração incidental de inconstitucionalidade. Recurso extraordinário conhecido e em parte provido. (RE 197.917/SP) grifei
É relevantíssimo trazer à baila a atuação do Senado Federal nas questões envolvendo o controle difuso, uma vez que o mesmo pode suspender a execução no todo ou em parte de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 52, X da CF[51], cuja finalidade é atribuir eficácia geral, em face de todos, erga omnes, à decisão proferida no caso concreto, cujos efeitos se irradiam, ordinariamente, apenas em relação às partes do processo.
É como se o exercício dessa competência pelo poder legislativo implicasse na extensão dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade da lei para todas as pessoas. Isso porque, a partir do momento em que o Senado Federal publica a referida resolução, todos deixam de estar obrigados ao cumprimento da lei cuja eficácia ficou suspensa. Nesse sentido, a norma sai do mundo jurídico[52].
Já foi debate de muita polemica referido papel desempenhado pelo Senado Federal, Luís Roberto Barroso bem sintetiza como foram resolvidas as controvérsias:
a) a atuação do Senado não tem caráter vinculado, mas discricionário, sujeitando-se ao juízo de conveniência e oportunidade da casa legislativa. Trata-se de ato político, não sujeito a prazo, podendo o Senado suspender o ato normativo, no todo ou em parte, ou simplesmente não suspendê-lo, negando, assim, a extensão erga omnes da decisão do Supremo;
b) a competência do Senado somente é exercitável nas hipóteses de declaração incidental de inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, e não quando a inconstitucionalidade venha a ser pronunciada em sede de ação direta de inconstitucionalidade;
c) a despeito da dicção restritiva do art. 52, X, que se refere apenas à lei declarada inconstitucional, a interpretação dada ao dispositivo tem sido extensiva, para incluir todos os atos normativos de quaisquer dos três níveis de poder, vale dizer, o Senado também suspende atos estaduais e municipais;
d) embora a matéria ainda suscite ampla controvérsia doutrinária, afigura-se fundada em melhor lógica e em melhores argumentos a atribuição de efeitos ex tunc à suspensão do ato normativo pelo Senado[53].
Sublinha-se que a discricionariedade atribuída ao Senado Federal é atinente a suspensão, não quanto à extensão da suspensão. Dito de outro modo, uma vez decidida pela suspensão da norma declarada inconstitucional pelo STF em controle incidental, esta deve-se dar na mesma extensão da decisão da Corte, como veiculado no informativo 477 do STF:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA CAUTELAR CONCEDIDA. REFERENDO. RESOLUÇÃO Nº 7, DE 21.06.2007, DO SENADO FEDERAL. SUSPENSÃO ERGA OMNES DA EFICÁCIA DE TODO O TEXTO DE LEIS RELATIVAS À COBRANÇA DO ICMS NO ESTADO DE SÃO PAULO. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE ANTERIORMENTE ESTENDIDA, NO EXERCÍCIO DO CONTROLE DIFUSO, APENAS AOS DISPOSITIVOS QUE HAVIAM PRORROGADO A MAJORAÇÃO DE ALÍQUOTA E A SUA VINCULAÇÃO A UMA FINALIDADE ESPECÍFICA. PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DA ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 52, X, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PERIGO NA DEMORA IGUALMENTE DEMONSTRADO. 1. O ato normativo impugnado, ao conferir eficácia erga omnes a um julgado singular, revela sua feição geral e obrigatória, sendo, portanto, dotado de generalidade, abstração e impessoalidade. Precedentes. 2. O exame minucioso das decisões plenárias proferidas nos autos dos Recursos Extraordinários 183.906, 188.443 e 213.739 demonstra que a declaração de inconstitucionalidade dos atos normativos que sucederam à Lei Estadual Paulista 6.556/89 alcançaram, tão-somente, os dispositivos que tratavam, exclusivamente, da majoração da alíquota do ICMS e sobre a vinculação desse acréscimo percentual ao fundo criado para o desenvolvimento de determinado programa habitacional. 3. O Senado Federal, em grande parte orientado por comunicações provenientes da Suprema Corte, acabou por retirar do mundo jurídico dispositivos das Leis Paulistas 7.003/90 e 7.646/91, que, embora formalmente abarcados pela proclamação da inconstitucionalidade do próprio Diploma em que inseridos, em nenhum momento tiveram sua compatibilidade com a Constituição Federal efetivamente examinada por este Supremo Tribunal. Plausibilidade da tese de violação ao art. 52, X, da Carta Magna. 4. Deferimento de medida cautelar referendado pelo Plenário. (ADI 3929 MC, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 29/08/2007, DJe-121 DIVULG 10-10-2007 PUBLIC 11-10-2007 DJ 11-10-2007 PP-00038 EMENT VOL-02293-01 PP-00055 RTJ VOL-00213-01 PP-00423 RDDT n. 145, 2007, p. 214-217 LEXSTF v. 29, n. 346, 2007, p. 160-178 RT v. 97, n. 868, 2008, p. 143-152)
Não se olvida a tendência da abstrativização do controle difuso. Porém, isso será melhor explorado no último capítulo, evidenciando a aproximação dos efeitos entre os controles concreto e abstrato.
4. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE POR VIA DE AÇÃO DIRETA
Neste capítulo será analisada as características gerais dessa espécie de controle, em especial seus respectivos efeitos.
4.1 BREVES CONSIDERAÇÕES
Diferentemente do que ocorria no controle pela via incidental, no presente, tem-se que a discussão acerca da constitucionalidade da norma configura questão principal. Ou seja, o juízo de constitucionalidade é o próprio objeto da ação, cumprindo ao tribunal manifestar-se acerca da validade da norma.
O Poder Judiciário, nesse caso, atua como um legislador negativo quando reconhece a invalidade da norma, a extirpando do ordenamento jurídico. Sob esse prisma, é importante salientar que juízes não são eleitos pelo povo, exercendo papel contra majoritário, que muitas das vezes não agradam a população.
4.2 CONTROLE CONCENTRADO
O mesmo também é denominado de principal, abstrato, direto, objetivo, sendo realizado pelo Supremo Tribunal Federal, quando o objeto a ser impugnado for uma lei ou ato normativo federal ou estadual, tendo como paradigma a Constituição Federal, nos termos do art. 102, I, alínea “a” desta. É realizado pelo Tribunal de Justiça quando o objeto for leis ou atos normativos estaduais ou municipais, cujo parâmetro seja a Constituição do Estado, conforme art. 125, § 2º da CF.
Relembre-se que o controle concentrado tem origem no sistema austríaco, em contraposição ao judicial review americano. O modelo da Áustria foi criado de modo a justificar a criação de uma Corte Constitucional como único órgão competente para anular atos normativos inconstitucionais. Kelsen esclarece o seguinte:
A Constituição conferiu a essa corte o poder de anular a lei que considerasse inconstitucional. Nem sempre era necessário anular a lei inteira; caso a disposição inconstitucional pudesse ser separada do restante da lei, a corte podia anular apenas essa disposição. A decisão da corte invalidava a lei ou sua disposição particular não apenas no caso concreto, mas de modo geral, para todos os casos futuros. Tão logo a decisão entrasse em vigor, a lei anulada deixava de existir. A decisão anulatória da corte, em princípio, era efetiva apenas ex nunc[54]. (
Em que pese a adoção do modelo austríaco, é importante esclarecer que não foi albergado no Brasil a teoria da anulabilidade. Isto é, uma norma declarada inconstitucional é desde a sua origem.
Incluem-se nessa modalidade de controle repressivo judicial concentrado, as seguintes ações constitucionais: a) ação direta de inconstitucionalidade (ADI); b) ação declaratória de constitucionalidade (ADC); c) arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF); d) ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO).
Porém, apenas será delineado no presente capítulo a ação genérica de inconstitucionalidade – ADI, tendo em vista que o tema central do atual trabalho é evidenciar a aproximação dos efeitos.
4.3 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Trata-se de uma das ações que pertencem ao controle concentrado, introduzida pelo sistema brasileiro através da Emenda Constitucional nº 16/1965, à Constituição de 1946, que a ela se referia como representação.
É uma ação em que não há pretensão individual, desprovida de direitos subjetivos. Sendo certo que somente pelo aspecto formal é possível referir-se à existência de partes.
4.3.1 Competência
Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição Federal. Nesse sentido, desempenha ele de modo concentrado e privativo o controle de constitucionalidade das normas federais e estaduais em face da Constituição Federal, conforme art. 102, I, alínea “a” da CF.
Considerando o sistema federativo vigente no ordenamento jurídico brasileiro, também é estendido aos estados o exercício do controle de constitucionalidade das normas estaduais e municipais face a Constituição Estadual, que o realiza através do Tribunal de Justiça, consoante art. 125, § 2º da CF. Não se admitindo a competência deste para apreciar em controle abstrato a constitucionalidade de lei federal.
Em relação a lei municipal em face da Constituição Federal, o Supremo Tribunal Federal tinha entendimento no seguinte sentido:
“É pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, antes e depois de 1988, no sentido de que não cabe a Tribunais de Justiça estaduais exercer o controle de constitucionalidade de leis e atos normativos municipais em face da Constituição Federal.”- ADIN 347-0.
Ocorre que recentemente isso foi alterado quando do julgamento do RE 650898, em que foi firmada a seguinte tese:
“Tribunais de Justiça podem exercer controle abstrato de constitucionalidade de leis municipais utilizando como parâmetro normas da Constituição Federal, desde que se trate de normas de reprodução obrigatória pelos Estados”.
Com efeito, compete ao STF exercer o controle de constitucionalidade abstrato de leis e atos normativos federais e estaduais, enquanto aos Tribunais de Justiça o controle de lei e ato normativo estadual e municipal.
4.3.2 Legitimidade
Antes de a Constituição Federal de 1988 somente o Procurador Geral da República tinha legitimidade ativa para ajuizar a ação direta de constitucionalidade, somente a partir desta que o rol foi ampliado, como se observa do art. 103 da Constituição Federal:
Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade:
I - o Presidente da República;
II - a Mesa do Senado Federal;
III - a Mesa da Câmara dos Deputados;
IV - a Mesa de Assembléia Legislativa;
IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;
V - o Governador de Estado;
V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
VI - o Procurador-Geral da República;
VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;
IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.
Consigna Luís Roberto Barroso que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal consolidou uma distinção entre duas categorias de legitimados:
(i) os universais, que são aqueles cujo papel institucional autoriza a defesa da Constituição em qualquer hipótese; e (ii) os especiais, que são os órgãos e entidades cuja atuação é restrita às questões que repercutem diretamente sobre sua esfera jurídica ou de seus filiados e em relação às quais possam atuar com representatividade adequada.
São legitimados universais: o Presidente da República, as Mesas do Senado e da Câmara, o Procurador-Geral da República, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e partido político com representação no Congresso Nacional. Os legitimados especiais compreendem o Governador de Estado, a Mesa de Assembleia Legislativa, confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional[55].
Note-se, em que pese, a Constituição Federal de 1988 tenha alargado o rol de legitimados, isso não permitiu o controle popular de constitucionalidade no controle abstrato.
Muito embora a ampliação constitucional do rol de legitimados para deflagrar o controle abstrato tenha sido importante e significativa, é importante destacar que o legislador democrático não consagrou a figura jurídica da “ação popular de inconstitucionalidade”, que permitiria que todo e qualquer cidadão pudesse acionar o processo objetivo de controle de normas. (...) Em termos de reconstrução neoconstitucionalista do direito, é correto afirmar que a ampliação do rol de legitimados projeta melhor a imagem da “comunidade aberta de intérpretes da Constituição”, tal qual vislumbrada por Peter Häberle, uma vez que promove o alargamento do círculo dos intérpretes da Constituição e, na sua esteira, a consolidação de um processo aberto e público, elemento fundante da Constituição Aberta häberleana[56]. (GÓES & MELLO, 2016, p. 217-218)
Em outros termos, os autores citados acima efetuam uma crítica ante a ausência da “ação popular de inconstitucionalidade”. No entanto, com a devida vênia, em termos práticos isso sobrecarregaria o Supremo Tribunal Federal, tendo em vista que este órgão precisou criar limitações até mesmo para os próprios legitimados consagrados no texto constitucional. No mais, a população não está impedida de efetuar o controle de constitucionalidade, porquanto é plenamente viável a propositura de ação popular, cuja causa de pedir seja a inconstitucionalidade de alguma norma, como já entendeu a Corte Suprema:
Ademais, é possível a declaração incidental de inconstitucionalidade em Ação Popular, “desde que a controvérsia constitucional não figure como pedido, mas sim como causa de pedir, fundamento ou simples questão prejudicial, indispensável à resolução do litígio principal, em torno da tutela do interesse público”. (REsp 437.277/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ 13/12/2004)
Em relação aos estados, o art. 125, § 2º da Constituição Federal impôs que cabe aos Estados a instituição de representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual, vedada a atribuição da legitimação para agir a um único órgão.
4.3.3 Objeto e parâmetro
O objeto da ADI, isto é, os atos impugnáveis, são a lei e o ato normativo federal ou estadual, tendo por parâmetro a Constituição Federal.
No âmbito dos estados o controle de constitucionalidade abstrato tem por objeto ato normativo estadual ou municipal, enquanto o parâmetro é a Constituição do Estado.
Marcelo Novelino esclarece que as normas a serem impugnadas pressupõe vigência e eficácia, que são atributos indispensáveis para a admissibilidade da lei ou do ato normativo como objeto da ação direta ou da ação declaratória. Sendo que tal exigência decorre da própria natureza do controle normativo abstrato, voltado a assegurar a supremacia da Constituição. Leis e atos normativos revogados ou ineficazes embora relevantes no âmbito das relações jurídicas individuais, não representam, ameaça iminente a ordem constitucional objetiva[57].
Nesse sentido, na hipótese de o objeto impugnado ter sido revogado antes do julgamento da ação objetiva, haverá, em regra, perda superveniente do objeto da ADI[58]. No entanto, subsiste algumas exceções quanto ao aludido entendimento: a) não haverá perda do objeto e a ADI deverá ser conhecida e julgada caso fique demonstrado que houve "fraude processual", ou seja, que a norma foi revogada de forma proposital a fim de evitar que o STF a declarasse inconstitucional e anulasse os efeitos por ela produzidos (STF ADI 3306); b) não haverá perda do objeto se ficar demonstrado que o conteúdo do ato impugnado foi repetido, em sua essência, em outro diploma normativo. Neste caso, como não houve desatualização significativa no conteúdo do instituto, não há obstáculo para o conhecimento da ação (ADI 2418/DF); c) caso o STF tenha julgado o mérito da ação sem ter sido comunicado previamente que houve a revogação da norma atacada. Nesta hipótese, não será possível reconhecer, após o julgamento, a prejudicialidade da ADI já apreciada. STF. Plenário. ADI 2418/DF, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 4/5/2016 (Info 824). STF. Plenário. ADI 951 ED/SC, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 27/10/2016 (Info 845).
Atinente ao parâmetro, tem-se que o mesmo deve ser o vigente na época de quando a norma foi editada. Se antes do julgamento houve a sua alteração a ADI fica prejudicada, não sendo possível alterar o parâmetro para salvar a norma impugnada, considerando a inexistência de constitucionalidade superveniente[59].
4.3.4 Processo e julgamento
O procedimento está delineado na Lei 9.868/99, estando os legitimados previstos no seu art. 2º, que são os mesmos elencados na Constituição Federal.
Luís Roberto Barroso bem define a sequência do procedimento:
A petição inicial deverá indicar o dispositivo impugnado, os fundamentos jurídicos do pedido em relação a cada uma das impugnações e o pedido, com suas especificações. Deverá conter cópia do ato impugnado e procuração, quando a ação seja subscrita por advogado (art. 3º e parágrafo único).
A jurisprudência da Corte tem exigido que a procuração indique de forma específica o ato a ser impugnado, admitindo-se que o relator solicite que a exigência seja suprida, sob pena de a ação não ser conhecida.
Se a petição inicial for inepta, não fundamentada ou manifestamente improcedente, será liminarmente indeferida pelo relator, cabendo agravo dessa decisão (art. 4º e parágrafo único). Nos termos da jurisprudência do STF, será manifestamente improcedente a ação direta que verse sobre norma cuja constitucionalidade já haja sido reconhecida pelo tribunal, ainda que em sede de recurso extraordinário. Ressalvou-se, porém, a possibilidade de que a ação venha a ser conhecida quando mudanças relevantes na ordem jurídica ou na realidade social permitam cogitar de uma mudança na jurisprudência.
O relator pedirá informações aos órgãos ou às autoridades das quais emanou a lei ou o ato normativo impugnado, que deverão prestá-las em trinta dias (art. 6º e parágrafo único). Decorrido o prazo das informações, serão ouvidos, sucessivamente, o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República, cada qual devendo manifestar-se no prazo de quinze dias (art. 8º). Vencidos esses prazos, o relator lançará o relatório, com cópia a todos os Ministros, e pedirá dia para julgamento (art. 9º, caput). A ação direta de inconstitucionalidade não admite desistência (art. 5º), arguição de suspeição ou impedimento — ressalvada a possibilidade de os próprios Ministros afastarem-se de determinado julgamento por razões de foro íntimo —, nem tampouco intervenção de terceiros (art. 7º). A Lei n. 9.868/99, todavia, contemplou a participação no processo, através da apresentação de petição ou memorial, de quem não seja parte, mas tenha legítimo interesse no resultado da ação. Assim, o relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá, por despacho irrecorrível, admitir a manifestação de outros órgãos ou entidades (art. 7º, § 2º).
Após alguma hesitação, a jurisprudência do STF firmou o entendimento de que o pedido de ingresso poderá ser feito até a remessa dos autos à Mesa, para julgamento. Cuida-se aqui da introdução formal, no ordenamento brasileiro, da figura do amicus curiae, originária do direito norte-americano. A inovação fez carreira rápida, reconhecida como fator de legitimação das decisões do Supremo Tribunal Federal, em sua atuação como tribunal constitucional. A participação como amicus curiae, é certo, não constitui direito subjetivo, ficando a critério do relator, mas uma vez admitida inclui, também, o direito de sustentação oral.
O art. 9º da Lei n. 9.868/99, em seus §§ 1º e 2º, contém inovações que merecem referência destacada. No § 1º prevê-se que, em caso de necessidade de esclarecimento de matéria ou circunstância de fato ou de notória insuficiência das informações existentes nos autos, poderá o relator requisitar informações adicionais, designar perito ou comissão de peritos para que emita parecer sobre a questão, ou fixar data para, em audiência pública, ouvir depoimento de pessoas com experiência e autoridade na matéria. Supera-se, dessa forma, e em boa hora, a crença dominante de que a ação direta não comportaria fase probatória, devido a seu caráter estritamente objetivo.
Na moderna dogmática jurídica, os fatos, a natureza dos problemas e as consequências práticas das soluções preconizadas desempenham papel de crescente importância na interpretação constitucional. Já não corresponde mais às demandas atuais uma interpretação asséptica e distanciada da vida real, fundada apenas no relato da norma. O § 2º prevê que o relator poderá solicitar informações aos Tribunais Superiores, bem como aos Tribunais federais e estaduais, acerca da aplicação da norma impugnada no âmbito de sua jurisdição. Também a jurisprudência vem ganhando crescente importância na interpretação jurídica no Brasil, superando a visão mais convencional dos sistemas ligados à tradição romano-germânica. De todo modo, por não envolver direitos subjetivos, iniciativa da parte e contraditório, a instância probatória na ação direta é limitada, devendo as informações, perícias e audiências ser produzidas ou realizadas no prazo de trinta dias (§ 3º). Pelo mesmo motivo — tratar-se de processo objetivo, sem envolvimento de interesses subjetivos do Estado — é inaplicável à ação direta de inconstitucionalidade o prazo em dobro dos representantes da Fazenda Pública para recorrer (art. 188 do CPC)[60].
Ainda, é cabível medida cautelar, nos termos do art. 10 da Lei, tratando-se de providência excepcional, à vista de presunção de validade das normas.
Em regra, a liminar será analisada pelo Plenário da Corte, através da maioria absoluta de seus membros (seis ministros). Contudo, há duas exceções em que a medida acauteladora poderá ser concedida monocraticamente, ad referendum do pleno: durante o recesso ou nos casos de urgência.
O relator, não é obrigado a ouvir o AGU e o PGR, somente se julgar indispensável, sendo os mesmos ouvidos no prazo de três dias. Em caso de excepcional urgência, o Tribunal poderá deferir a medida cautelar sem a audiência dos órgãos ou das autoridades das quais emanou a lei ou o ato normativo impugnado. A sustentação oral será facultada.
Concedida a medida cautelar, o Supremo Tribunal Federal fará publicar em seção especial do Diário Oficial da União e do Diário da Justiça da União a parte dispositiva da decisão, no prazo de dez dias, devendo solicitar as informações à autoridade da qual tiver emanado o ato.
Os efeitos da medida cautelar são contra todos, ex nunc, salvo se o Tribunal entender que deva conceder-lhe eficácia retroativa. Essa decisão torna aplicável a legislação anterior acaso existente, salvo expressa manifestação em sentido contrário – efeito.
Por fim, a decisão final:
A Lei n. 9.868/99 trata conjuntamente da decisão a ser proferida na ação direta de inconstitucionalidade e na ação declaratória de constitucionalidade. Na verdade, o texto cuida de ambas como uma unidade conceitual — fruto do exercício da jurisdição constitucional por via de ação e em abstrato —, com variação apenas do pedido: em um caso a proclamação da constitucionalidade e no outro a da inconstitucionalidade da disposição ou da norma impugnada. Em ambas as hipóteses exige-se a manifestação de seis Ministros, configurando a maioria absoluta do Tribunal (art. 23). Coerente com a premissa de que ambas as ações integram uma unidade conceitual, estabelece a lei que, proclamada a constitucionalidade, julgar-se-á improcedente a ação direta ou procedente a eventual ação declaratória; e, proclamada a inconstitucionalidade, julgar-se-á procedente a ação direta ou improcedente eventual ação declaratória (art. 24). Julgada a ação, faz-se a comunicação à autoridade ou ao órgão responsável pela expedição do ato (art. 25) e, dentro de dez dias após o trânsito em julgado, publica-se a parte dispositiva do acórdão (art. 28). A decisão que declara a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo em ação direta ou em ação declaratória é irrecorrível, ressalvada a interposição de embargos de declaração (art. 26), que somente poderão ser oferecidos pelo requerente ou pelo requerido, e não por terceiros, nem mesmo pelo Advogado-Geral da União. Mas cabe reclamação para preservação da competência do Supremo Tribunal Federal e garantia da autoridade de suas decisões (CF, art. 102, I, l). A Lei n. 9.868/99 endossa, também, a jurisprudência pacífica da Corte segundo a qual no controle por via principal e abstrata não cabe ação rescisória (art. 26). A decisão na ação direta gera efeito retroativo, salvo expressa deliberação em sentido contrário (art. 27). Na redação textual da lei, tem igualmente “eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal” (art. 27, parágrafo único). A partir da Emenda Constitucional n. 45, de 2004, o reconhecimento de efeito vinculante nas ações diretas de inconstitucionalidade passou a figurar também no texto constitucional, com a nova redação dada ao art. 102, § 2º.
Quanto aos efeitos, tais serão vistos a seguir.
4.3.5 Efeitos da decisão final
Nos termos do art. 102, § 2º da CF e art. 28 da Lei 9.868/99, a declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal.
Na ótica subjetiva, a eficácia erga omnes é corolário do processo objetivo, já que não existem partes formais. O efeito vinculante, por sua vez, alcança diretamente apenas alguns órgãos dos poderes públicos: No Judiciário, excetua-se da vinculação o próprio STF; no Legislativo, essa vinculação são se estende a sua função típica, razão pela qual, em tese, poderá ser elaborada nova lei com conteúdo idêntico ao de ato já declarado inconstitucional; no Executivo, a vinculação só não abrange as relacionadas ao processo legislativo.
Na ótica objetiva, é a parte dispositiva que produz os efeitos, porque é nesta em que há a declaração de inconstitucionalidade. Esclarecendo-se que o Supremo Tribunal Federal vem rejeitando a tese da transcendência dos motivos determinantes.
AGRAVO REGIMENTAL NA RECLAMAÇÃO - CABIMENTO DA AÇÃO CONSTITUCIONAL - AUSÊNCIA DE IDENTIDADE DE TEMAS ENTRE O ATO RECLAMADO E O PARADIGMA DESTA CORTE - TRANSCENDÊNCIA DE MOTIVOS - TESE NÃO ADOTADA PELA CORTE - AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. É necessária a existência de aderência estrita do objeto do ato reclamado ao conteúdo das decisões paradigmáticas do STF para que seja admitido o manejo da reclamatória constitucional. 2. Embora haja similitude quanto à temática de fundo, o uso da reclamação, no caso dos autos, não se amolda ao mecanismo da transcendência dos motivos determinantes, de modo que não se promove a cassação de decisões eventualmente confrontantes com o entendimento do STF por esta via processual. Precedente. 3. Agravo regimental não provido. (STF - Tribunal Pleno, Rcl 3.294 AgR/RN, rel. Min. DIAS TOFFOLI, j. 03/11/2011).
RECLAMAÇÃO. A reclamação pressupõe a usurpação da competência do Supremo ou o desrespeito a decisão proferida. Descabe emprestar-lhe contornos próprios ao incidente de uniformização, o que ocorreria caso admitida a teoria da transcendência dos motivos determinantes. Precedentes: Reclamação nº 3.014/SP, Pleno, relator ministro Ayres Britto, acórdão publicado no Diário da Justiça eletrônico de 21 de maio de 2010. (STF - 1ª Turma, Rcl 11477 AgR/CE, rel. Min. MARCO AURÉLIO, j. 29/05/2012)
Nem sempre foi esse o posicionamento da Corte Suprema, como se observa na Reclamação 1987-0, de relatoria do Ex-Ministro Maurício Corrêa:
EMENTA: RECLAMAÇÃO. CABIMENTO. AFRONTA À DECISÃO PROFERIDA NA ADI 1662-SP. SEQÜESTRO DE VERBAS PÚBLICAS. PRECATÓRIO. VENCIMENTO DO PRAZO PARA PAGAMENTO. EMENDA CONSTITUCIONAL 30/00. PARÁGRAFO 2º DO ARTIGO 100 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. Preliminar. Cabimento. Admissibilidade da reclamação contra qualquer ato, administrativo ou judicial, que desafie a exegese constitucional consagrada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado de constitucionalidade, ainda que a ofensa se dê de forma oblíqua. 2. Ordem de seqüestro deferida em razão do vencimento do prazo para pagamento de precatório alimentar, com base nas modificações introduzidas pela Emenda Constitucional 30/2000. Decisão tida por violada - ADI 1662-SP, Maurício Corrêa, DJ de 19/09/2003: Prejudicialidade da ação rejeitada, tendo em vista que a superveniência da EC 30/00 não provocou alteração substancial na regra prevista no § 2º do artigo 100 da Constituição Federal. 3. Entendimento de que a única situação suficiente para motivar o seqüestro de verbas públicas destinadas à satisfação de dívidas judiciais alimentares é a relacionada à ocorrência de preterição da ordem de precedência, a essa não se equiparando o vencimento do prazo de pagamento ou a não-inclusão orçamentária. 4. Ausente a existência de preterição, que autorize o seqüestro, revela-se evidente a violação ao conteúdo essencial do acórdão proferido na mencionada ação direta, que possui eficácia erga omnes e efeito vinculante. A decisão do Tribunal, em substância, teve sua autoridade desrespeitada de forma a legitimar o uso do instituto da reclamação. Hipótese a justificar a transcendência sobre a parte dispositiva dos motivos que embasaram a decisão e dos princípios por ela consagrados, uma vez que os fundamentos resultantes da interpretação da Constituição devem ser observados por todos os tribunais e autoridades, contexto que contribui para a preservação e desenvolvimento da ordem constitucional. 5. Mérito. Vencimento do prazo para pagamento de precatório. Circunstância insuficiente para legitimar a determinação de seqüestro. Contrariedade à autoridade da decisão proferida na ADI 1662. Reclamação admitida e julgada procedente. (STF - Tribunal Pleno, Rcl 1987/DF, rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, j. 01/10/2003).
Malgrado a Suprema Corte venha rejeitando aludida teoria, subsiste jurisprudência baseando-se em razões contidas na fundamentação de outros acórdãos:
RECLAMAÇÃO. MEDIDA LIMINAR. CENSURA PRÉVIA A VEICULO DE IMPRENSA. INADMISSIBILIDADE. 1. Na ADPF 130, Rel. Min. Ayres Britto, o Supremo Tribunal Federal proibiu "qualquer tipo de censura prévia" aos órgãos de imprensa, como determina a Constituição. 2. Ao proibir jornalistas, radialistas e integrantes dos meios de comunicação de entrevistar, mencionar, elogiar ou mesmo criticar candidatos inscritos na disputa eleitoral de 2014, a decisão reclamada aparentemente violou a autoridade da decisão do Plenário do STF. 3. Liminar deferida parcialmente. STF - Rei 18.687 MC/DF, Rei. Min. Roberto Barroso, decisão monocrática (27.09.2014)
Quanto aos efeitos temporais, a decisão final no controle abstrato é ex tunc (retroativos), haja vista a adoção da teoria das nulidades[61]. Em contrapartida, isso não impede a modulação temporal, por razões de segurança jurídica ou de interesse social a justificar o afastamento do princípio da nulidade; e quórum de dois terços dos membros do Tribunal, consoante art. 27 da Lei 9.868/99.
De todo modo, considerando a regra dos efeitos retroativos, tem-se que a legislação anteriormente revogada, se compatível com a Constituição Federal, tem sua vigência restaurada – efeito repristinatório tácito. Se indesejado, faz-se necessária a formulação de pedidos sucessivos de declaração de inconstitucionalidade do diploma ab-rogatório e das normas por ele revogadas, sob pena de não conhecimento da ação direta.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSIDERAÇÕES SOBRE O VALOR DO ATO INCONSTITUCIONAL. FORMULAÇÕES TEÓRICAS. O STATUS QUAESTIONIS NA JURISPRUDÊNCIA DO STF. CONTROLE NORMATIVO ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE E EFEITO REPRISTINATÓRIO. A QUESTÃO DO EFEITO REPRISTINATÓRIO INDESEJADO. NECESSIDADE, EM TAL HIPÓTESE, DE FORMULAÇÃO DE PEDIDOS SUCESSIVOS DE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE TANTO DO DIPLOMA AB-ROGATÓRIO QUANTO DAS NORMAS POR ELE REVOGADAS, DESDE QUE TAMBÉM EIVADAS DO VICIO DA ILEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO, NO CASO, DO DIPLOMA LEGISLATIVO CUJA EFICÁCIA RESTAURAR-SE-IA EM FUNÇÃO DO EFEITO REPRISTINATÓRIO. HIPÓTESE DE INCOGNOSCIBILIDADE DA AÇÃO DIRETA. PRECEDENTES. AÇÃO DIRETA NÃO CONHECIDA. (STF -ADI 2.215/PE, Rei. Min. Celso de Mello)
Portanto, os efeitos finais da decisão em controle abstrato são erga omnes, vinculante, retroativo e repristinatório em regra.
5. APROXIMAÇÃO DOS EFEITOS
Foi explorado acima que os efeitos da decisão em controle concentrado é erga omnes e vinculante, enquanto no controle difuso é inter partes, obrigando apenas as partes litigantes do processo. Possibilitando-se a ampliação deste efeito com a edição, em tese, da resolução do Senado Federal, constante no art. 52, X da Constituição Federal, dispositivo recentemente alvo de mutação constitucional.
5.1 RECLAMAÇÃO 4.335/AC
A principal discussão sobre a participação do Senado no controle difuso se deu a partir da Reclamação Constitucional 4.335-5/AC, ajuizada perante o STF no ano de 2006, julgada em março de 2014.
O que ensejou o ajuizamento da referida reclamação foi o julgamento do HC 82.959/SP, em que o STF declarou incidenter tantum a inconstitucionalidade do art. 2º, § 1º da Lei 8.072/90, que vedava a progressão de regime aos condenados pela prática de crimes hediondos ou equiparados. A partir do julgamento deste HC a Defensoria Pública requereu ao Juízo de Execuções Penais de Rio Branco/AC que fosse o mesmo benefício concedido aos seus assistidos, qual seja, a progressão de regime, já que o óbice da Lei 8.072/90 havia sido declarado inconstitucional pelo plenário do STF. Porém, a Justiça do Acre negou, sob o argumento da ausência de resolução do Senado suspendendo o dispositivo impugnado, nos termos do art. 52, X da CF.
Ou seja, a reclamação teve como pedido a extensão dos efeitos do HC 82.959/SP, não obstante a ausência da resolução do Senado suspendendo os efeitos do art. 2º, § 1º da Lei 8.072/90. A partir dessa Reclamação e, especialmente, após o voto do Ministro Relator Gilmar Mendes, se iniciou um extenso debate na Suprema Corte sobre a real eficácia da participação do Legislativo no controle de constitucionalidade difuso.
O Ministro Gilmar Mendes do Supremo Tribunal Federal revelou-se um forte crítico quando a disposição do art. 52, X da CF, defendendo a abstrativização do controle difuso. Para o Ministro, a função do Senado Federal de suspender a execução da decisão do STF tem por finalidade apenas tornar pública tal decisão, levando-a ao conhecimento de todos os cidadãos[62]. Acompanha esse entendimento Lúcio Bittencourt, entendendo que “suspender a execução de lei inconstitucional” constitui uma “impropriedade técnica”, uma vez que sendo o ato inconstitucional um ato “nulo”, “inexistente” ou “ineficaz”, não é possível suspender-se sua execução. Assim, a atribuição constitucional ao Senado Federal não teria outra finalidade que não a de dar publicidade à decisão do Supremo Tribunal Federal[63].
Em seu voto na reclamação, o Ministro Relator defendeu a mutação constitucional do art. 52, X da CF, in verbis os fundamentos utilizados:
Todas essas reflexões e práticas parecem recomendar uma releitura do papel do Senado no processo de controle de constitucionalidade. Quando o instituto foi concebido no Brasil, em 1934, dominava uma determinada concepção da divisão de poderes, há muito superada. Em verdade, quando da promulgação do texto de 1934, outros países já atribuíam eficácia geral às decisões proferidas em sede de controle abstrato de normas, tais como o previsto na Constituição de Weimar de 1919 e no modelo austríaco de 1920.
A exigência de que a eficácia geral da declaração de inconstitucionalidade proferida pelo Supremo Tribunal Federal fique a depender de uma decisão do Senado Federal, introduzida entre nós com a Constituição de 1934 e preservada na Constituição de 1988, perdeu grande parte do seu significado com a introdução do controle abstrato de normas. Se a intensa discussão sobre o monopólio da ação por parte do Procurador-Geral da República não levou a uma mudança na jurisprudência consolidada sobre o assunto, é fácil constatar que ela foi decisiva para a alteração introduzida pelo constituinte de 1988, com a significativa ampliação do direito de propositura da ação direta.
O constituinte assegurou o direito do Procurador-Geral da República de propor a ação de inconstitucionalidade. Esse é, todavia, apenas um dentre os diversos órgãos ou entes legitimados a propor a ação direta de inconstitucionalidade. Nos termos do art. 103 da Constituição de 1988, dispõem de legitimidade para propor a ação de inconstitucionalidade: o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara dos Deputados, a Mesa de uma Assembléia Legislativa, o Governador do Estado, o Procurador-Geral da República, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, os partidos políticos com representação no Congresso Nacional e as confederações sindicais ou entidades de classe de âmbito nacional.
Com isso satisfez o constituinte apenas parcialmente a exigência daqueles que solicitavam fosse assegurado o direito de propositura da ação a um grupo de, v. g., dez mil cidadãos ou que defendiam até mesmo a introdução de uma ação popular de inconstitucionalidade. Tal fato fortalece a impressão de que, com a introdução desse sistema de controle abstrato de normas, com ampla legitimação e, particularmente, a outorga do direito de propositura a diferentes órgãos da sociedade, pretendeu o constituinte reforçar o controle abstrato de normas no ordenamento jurídico brasileiro como peculiar instrumento de correção do sistema geral incidente. Não é menos certo, por outro lado, que a ampla legitimação conferida ao controle abstrato, com a inevitável possibilidade de se submeter qualquer questão constitucional ao Supremo Tribunal Federal, operou uma mudança substancial - ainda que não desejada - no modelo de controle de constitucionalidade até então vigente no Brasil.
O monopólio de ação outorgado ao Procurador-Geral da República no sistema de 1967/69 não provocou uma alteração profunda no modelo incidente ou difuso. Esse continuou predominante, integrando-se a representação de inconstitucionalidade a ele como um elemento ancilar, que contribuía muito pouco para diferencia-lo dos demais sistemas "difusos" ou "incidentes" de controle de constitucionalidade.
A Constituição de 1988 reduziu o significado do controle de constitucionalidade incidental ou difuso ao ampliar, de forma marcante, a legitimação para propositura da ação direta de inconstitucionalidade (CF, art. 103), permitindo que, praticamente, todas as controvérsias constitucionais relevantes sejam submetidas ao Supremo Tribunal Federal mediante processo de controle abstrato de normas. Convém assinalar que, tal como já observado por Anschütz36 ainda no regime de Weimar, toda vez que se outorga a um Tribunal especial atribuição para decidir questões constitucionais, limita-se, explícita ou implicitamente, a competência da jurisdição ordinária para apreciar tais controvérsias. Portanto, parece quase intuitivo que, ao ampliar, de forma significativa, o círculo de entes e órgãos legitimados a provocar o Supremo Tribunal Federal, no processo de controle abstrato de normas, acabou o constituinte por restringir, de maneira radical, a amplitude do controle difuso de constitucionalidade. Assim, se se cogitava, no período anterior a 1988, de um modelo misto de controle de constitucionalidade, é certo que o forte acento residia, ainda, no amplo e dominante sistema difuso de controle. O controle direto continuava a ser algo acidental e episódico dentro do sistema difuso. A Constituição de 1988 alterou, de maneira radical, essa situação, conferindo ênfase não mais ao sistema difuso ou incidental, mas ao modelo concentrado, uma vez que as questões constitucionais passaram a ser veiculadas, fundamentalmente, mediante ação direta de inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal. Ressalte-se que essa alteração não se operou de forma ainda profunda porque o Supremo Tribunal manteve a orientação anterior, que considerava inadmissível o ajuizamento de ação direta contra direito pré-constitucional em face da nova Constituição. A ampla legitimação, a presteza e a celeridade desse modelo processual, dotado inclusive da possibilidade de se suspender imediatamente a eficácia do ato normativo questionado, mediante pedido de cautelar, fazem com que as grandes questões constitucionais sejam solvidas, na sua maioria, mediante a utilização da ação direta, típico instrumento do controle concentrado. Assim, se continuamos a ter um modelo misto de controle de constitucionalidade, a ênfase passou a residir não mais no sistema difuso, mas no de perfil concentrado. Essa peculiaridade foi destacada por Sepúlveda Pertence no voto que proferiu na ADC 1, verbis
(...)
Assinale-se, outrossim, que a interpretação que se deu à suspensão de execução da lei pela doutrina majoritária e pela própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal contribuiu decisivamente para que a afirmação sobre a teoria da nulidade da lei inconstitucional restasse sem concretização entre nós. Nesse sentido, constatou Lúcio Bittencourt que os constitucionalistas brasileiros não lograram fundamentar nem a eficácia erga omnes, nem a chamada retroatividade ex tunc da declaração de inconstitucionalidade proferida pelo Supremo Tribunal Federal. É o que se lê na seguinte passagem de seu magno trabalho:
(...)
Em verdade, ainda que não pertencente ao universo específico da judicial review, o instituto do stare decisis desonerava os constitucionalistas americanos, pelo menos em parte, de um dever mais aprofundado de fundamentação na espécie. Como esse mecanismo assegura efeito vinculante às decisões das Cortes Superiores, em caso de declaração de inconstitucionalidade pela Suprema Corte, tinha-se a segurança de que, em princípio, nenhum tribunal haveria de conferir eficácia à norma objeto de censura. Assim, a ausência de mecanismo processual assemelhado à "força de lei" (Gesetzeskraft) do direito alemão não impediu que os autores americanos sustentassem a nulidade da lei inconstitucional.39 Sem dispor de um mecanismo que emprestasse força de lei ou que, pelo menos, conferisse caráter vinculante às decisões do Supremo Tribunal Federal para os demais Tribunais tal como o stare decisis americano40, contentava-se a doutrina brasileira em ressaltar a evidência da nulidade da lei inconstitucional41 e a obrigação dos órgãos estatais de se absterem de aplicar disposição que teve a sua inconstitucionalidade declarada pelo Supremo Tribunal Federal42. A suspensão da execução pelo Senado não se mostrou apta a superar essa incongruência, especialmente porque se emprestou a ela um sentido substantivo que talvez não devesse ter. Segundo entendimento amplamente aceito43, esse ato do Senado Federal conferia eficácia erga omnes à declaração de inconstitucionalidade proferida no caso concreto.44 Ainda que se aceite, em princípio, que a suspensão da execução da lei pelo Senado retira a lei do ordenamento jurídico com eficácia ex tunc, esse instituto, tal como foi interpretado e praticado, entre nós, configura antes a negação do que a afirmação da teoria da nulidade da lei inconstitucional. A não-aplicação geral da lei depende exclusivamente da vontade de um órgão eminentemente político e não dos órgãos judiciais incumbidos da aplicação cotidiana do direito. Tal fato reforça a idéia de que, embora tecêssemos loas à teoria da nulidade da lei inconstitucional, consolidavamos institutos que iam de encontro à sua implementação. Assinale-se que se a doutrina e a jurisprudência entendiam que lei inconstitucional era ipso jure nula, deveriam ter defendido, de forma coerente, que o ato de suspensão a ser praticado pelo Senado destinava-se exclusivamente a conferir publicidade à decisão do STF. Essa foi a posição sustentada, isoladamente, por Lúcio Bittencourt:
(...)
Tal concepção afigurava-se absolutamente coerente com o fundamento da nulidade da lei inconstitucional. Uma orientação dogmática minimamente consistente haveria de encaminhar-se nesse sentido, até porque a atribuição de funções substantivas ao Senado Federal era a própria negação da idéia de nulidade da lei devidamente declarada pelo órgão máximo do Poder Judiciário.
Não foi o que se viu inicialmente. Como apontado, a jurisprudência e a doutrina acabaram por conferir significado substancial à decisão do Senado, entendendo que somente o ato de suspensão do Senado mostrava-se apto a conferir efeitos gerais à declaração de inconstitucionalidade proferida pelo Supremo Tribunal Federal, cuja eficácia estaria limitada às partes envolvidas no processo. De qualquer sorte, a ampliação do controle abstrato de normas, inicialmente realizada nos termos do art. 103 e, posteriormente, com o advento da ADC, alterou significativamente a relação entre o modelo difuso e o modelo concentrado. Assim, passou a dominar a eficácia geral das decisões proferidas em sede de controle abstrato (ADI e ADC). A disciplina processual conferida à Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF, que constitui instrumento subsidiário para solver questões não contempladas pelo modelo concentrado - ADI e ADC -, revela, igualmente, a inconsistência do atual modelo. A decisão do caso concreto proferida em ADPF, por se tratar de processo objetivo, será dotada de eficácia erga omnes; a mesma questão resolvida no processo de controle incidental terá eficácia inter partes. No que se refere aos recursos especial e extraordinário, a Lei n. 8.038, de 1990, havia concedido ao relator a faculdade de negar seguimento a recurso manifestamente intempestivo, incabível, improcedente ou prejudicado, ou ainda, que contrariasse Súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça. O Código de Processo Civil, por sua vez, em caráter ampliativo, incorporou disposição que autoriza o relator a dar provimento ao recurso se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com a jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior (art. 557, § 1°-A, acrescentado pela Lei n. 9.756, de 1998).
Com o advento dessa nova fórmula, passou-se a admitir não só a negativa de seguimento de recurso extraordinário, nas hipóteses referidas, mas também o provimento do aludido recurso nos casos de manifesto confronto com a jurisprudência do Supremo Tribunal, mediante decisão unipessoal do relator. Também aqui parece evidente que o legislador entendeu possível estender de forma geral os efeitos da decisão adotada pelo Tribunal, tanto nas hipóteses de declaração de inconstitucionalidade incidental de determinada lei federal, estadual ou municipal hipótese que estaria submetida à intervenção do Senado -, quanto nos casos de fixação de uma dada interpretação constitucional pelo Tribunal. Ainda que a questão pudesse comportar outras leituras, é certo que o legislador ordinário, com base na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, considerou legítima a atribuição de efeitos ampliados à decisão proferida pelo Tribunal, até mesmo em sede de controle de constitucionalidade incidental. Observe-se, ainda, que, nas hipóteses de declaração de inconstitucionalidade de leis municipais, o Supremo Tribunal Federal tem adotado uma postura significativamente ousada, conferindo efeito vinculante não só à parte dispositiva da decisão de inconstitucionalidade, mas também aos próprios fundamentos determinantes. É que são numericamente expressivos os casos em que o Supremo Tribunal tem estendido, com base no art. 557, caput e § 1º-A, do Código de Processo Civil, a decisão do plenário que declara a inconstitucionalidade de norma municipal a outras situações idênticas, oriundas de municípios diversos. Em suma, tem-se considerado dispensável, no caso de modelos legais idênticos, a submissão da questão ao Plenário.
Nesse sentido, Maurício Corrêa, ao julgar o RE 228.844/SP46, no qual se discutia a ilegitimidade do IPTU progressivo cobrado pelo Município de São José do Rio Preto, no Estado de São Paulo, valeu-se de fundamento fixado pelo Plenário deste Tribunal, em precedente oriundo do Estado de Minas Gerais, no sentido da inconstitucionalidade de lei do Município de Belo Horizonte, que instituiu alíquota progressiva do IPTU. Também Nelson Jobim, no exame da mesma matéria (progressividade do IPTU), em recurso extraordinário interposto contra lei do Município de São Bernardo do Campo, aplicou tese fixada em julgamentos que apreciaram a inconstitucionalidade de lei do Município de São Paulo.47 Ellen Gracie utilizou-se de precedente oriundo do Município de Niterói, Estado do Rio de Janeiro, para dar provimento a recurso extraordinário no qual se discutia a ilegitimidade de taxa de iluminação pública instituída pelo Município de Cabo Verde, no Estado de Minas Gerais.48 Carlos Velloso aplicou jurisprudência de recurso proveniente do Estado de São Paulo para fundamentar sua decisão no AI 423.25249, onde se discutia a inconstitucionalidade de taxa de coleta e limpeza pública do Município do Rio de Janeiro, convertendo-o em recurso extraordinário (art. 544, §§ 3° e 4°, do CPC) e dando-lhe provimento. Sepúlveda Pertence lançou mão de precedentes originários do Estado de São Paulo para dar provimento ao RE 345.04850, no qual se argüia a inconstitucionalidade de taxa de limpeza pública do Município de Belo Horizonte. Celso de Mello, ao apreciar matéria relativa à progressividade do IPTU do Município de Belo Horizonte, conheceu e deu provimento a recurso extraordinário tendo em conta diversos precedentes oriundos do Estado de São Paulo.51 Tal procedimento evidencia, ainda que de forma tímida, o efeito vinculante dos fundamentos determinantes da decisão exarada pelo Supremo Tribunal Federal no controle de constitucionalidade do direito municipal. Evidentemente, semelhante orientação somente pode vicejar caso se admita que a decisão tomada pelo Plenário seja dotada de eficácia transcendente, sendo, por isso, dispensável a manifestação do Senado Federal. Um outro argumento, igualmente relevante, diz respeito ao controle de constitucionalidade nas ações coletivas. Aqui, somente por força de uma compreensão ampliada ou do uso de uma figura de linguagem, pode-se falar em decisão com eficácia inter partes. Como sustentar que uma decisão proferida numa ação coletiva, numa ação civil pública ou em um mandado de segurança coletivo, que declare a inconstitucionalidade de uma lei determinada, terá eficácia apenas entre as partes? Nesses casos, a suspensão de execução da lei pelo Senado, tal como vinha sendo entendida até aqui, revela-se, para dizer o mínimo, completamente inútil, caso se entenda que ela tem ma outra função que não a de atribuir publicidade à decisão declaratória de ilegitimidade. Recorde-se, a propósito, que o Supremo Tribunal Federal, em decisão unânime de 7 de abril de 2003, julgou prejudicada a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.919 (Relatora Min. Ellen Gracie), proposta contra o Provimento n . 556/97, editado pelo Conselho Superior da Magistratura Paulista. A referida resolução previa a destruição física dos autos transitados em julgado e arquivados há mais de cinco anos em primeira instância. A decisão pela prejudicialidade decorreu do fato de o Superior Tribunal de Justiça, em mandado de segurança coletivo52, impetrado pela Associação dos Advogados de São Paulo (AASP), ter declarado a nulidade daquele ato. Em outros termos, o Supremo Tribunal Federal acabou por reconhecer eficácia erga omnes à declaração de ilegitimidade do ato normativo proferida em mandado de segurança pelo STJ. Quid juris, então, se a declaração de inconstitucionalidade for proferida pelo próprio Supremo Tribunal Federal em sede de ação civil pública? Se a decisão proferida nesses processos tem eficácia erga omnes (Lei n. 7.347, de 24.7.1985 - art. 16), afigura-se difícil justificar a necessidade de comunicação ao Senado Federal. A propósito, convém recordar que, em alguns casos, há uma quase confusão entre o objeto da ação civil pública e o pedido de declaração de inconstitucionalidade. Nessa hipótese, não há como cogitar de uma típica decisão com eficácia inter partes.53 Ressalte-se, ainda, que as decisões do STF, com efeitos limitados, no julgamento do RE 197.971 (caso vereadores54) e no próprio caso da progressão de regime (HC 82.95955) , são casos notórios a demonstrar que a Corte, ao prolatar referidas decisões, já lhes estava atribuindo efeito erga omnes. No caso do RE 197.917, trata-se de caso típico de decisão que, se dotada de efeito retroativo, provocaria enorme instabilidade jurídica, colocando em xeque as decisões tomadas pela Câmara de Vereadores nos períodos anteriores, com consequências não de todo divisáveis no que concerne às leis aprovadas, às decisões de aprovação de contas e outras deliberações da Casa Legislativa. Eis o teor da ementa do referido julgado:
(...)
Essas colocações têm a virtude de demonstrar que a declaração de inconstitucionalidade in concreto também se mostra passível de limitação de efeitos. A base constitucional dessa limitação - necessidade de um outro princípio que justifique a não aplicação do princípio da nulidade - parece sugerir que, se aplicável, a declaração de inconstitucionalidade restrita revela-se abrangente do modelo de controle de constitucionalidade como um todo. E que, nesses casos, o afastamento do princípio da nulidade da lei assenta-se em fundamentos constitucionais e não em razões de conveniência. Se o sistema constitucional legitima a declaração de inconstitucionalidade restrita no controle abstrato, essa decisão poderá afetar, igualmente, os processos do modelo concreto ou incidental de normas. Do contrário, poder-se-ia ter inclusive um esvaziamento ou uma perda de significado da própria declaração de inconstitucionalidade restrita ou limitada.
- Conclusão
Conforme destacado, a ampliação do sistema concentrado, com a multiplicação de decisões dotadas de eficácia geral, acabou por modificar radicalmente a concepção que dominava entre nós sobre a divisão de poderes, tornando comum no sistema a decisão com eficácia geral, que era excepcional sob a Emenda Constitucional n 16/65 e sob a Carta de 1967/69. o sistema constitucional de 1967/69, a ação direta era apenas uma idiossincrasia no contexto de um amplo e dominante modelo difuso. A adoção da ADI, posteriormente, conferiu perfil diverso ao nosso sistema de controle de constitucionalidade, que continuou a ser um modelo misto. A ênfase passou a residir, porém, não mais no modelo difuso, mas nas ações diretas. O advento da Lei 9.882/99 conferiu conformação à ADPF, admitindo a impugnação ou a discussão direta de decisões judiciais das instâncias ordinárias perante o Supremo Tribunal Federal. Tal como estabelecido na referida lei (art. 10, § 3o), a decisão proferida nesse processo há de ser dotada de eficácia erga omnes e de efeito vinculante. Ora, resta evidente que a ADPF estabeleceu uma ponte entre os dois modelos de controle, atribuindo eficácia geral a decisões de perfil incidental. Vê-se, assim, que a Constituição de 1988 modificou de forma ampla o sistema de controle de constitucionalidade, sendo inevitáveis as reinterpretações ou releituras dos institutos vinculados ao controle incidental de inconstitucionalidade, especialmente da exigência da maioria absoluta para declaração de inconstitucionalidade e da suspensão de execução da lei pelo Senado Federal.
O Supremo Tribunal Federal percebeu que não poderia deixar de atribuir significado jurídico à declaração de inconstitucionalidade proferida em sede de controle incidental, ficando o órgão fracionário de outras Cortes exonerado do dever de submeter a declaração de inconstitucionalidade ao plenário ou ao órgão especial, na forma do art. 97 da Constituição. Não há dúvida de que o Tribunal, nessa hipótese, acabou por reconhecer efeito jurídico transcendente à sua decisão. Embora na fundamentação desse entendimento fale-se em quebra da presunção de constitucionalidade, é certo que, em verdade, a orientação do Supremo acabou por conferir à sua decisão algo assemelhado a um efeito vinculante, independentemente da intervenção do Senado. Esse entendimento está hoje consagrado na própria legislação processual civil (CPC, art 481, parágrafo único, parte final, na redação da Lei n. 9756, de 17.12.1998). Essa é a orientação que parece presidir o entendimento que julga dispensável a aplicação do art. 97 da Constituição por parte dos Tribunais ordinários, se o Supremo já tiver declarado a inconstitucionalidade da lei, ainda que no modelo incidental. Na oportunidade, ressaltou o Relator para o acórdão, Ilmar Galvão, no já mencionado RE 190.728, que o novo entendimento estava "em perfeita consonância não apenas com o princípio da economia processual, mas também com o da segurança jurídica, merecendo, por isso, todo encômio, como procedimento que vem ao encontro da tão desejada racionalização orgânica da instituição judiciária brasileira, ressaltando que se cuidava "de norma que não deve ser aplicada com rigor literal, mas, ao revés, tendo-se em mira a finalidade objetivada, o que permite a elasticidade do seu ajustamento às variações da realidade circunstancial".56 E ela também demonstra que, por razões de ordem pragmática, a jurisprudência e a legislação têm consolidado fórmulas que retiram do instituto da "suspensão da execução da lei pelo Senado Federal" significado substancial ou de especial atribuição de efeitos gerais à decisão proferida no caso concreto. Como se vê, as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de controle incidental, acabam por ter eficácia que transcende o âmbito da decisão, o que indica que a própria Corte vem fazendo uma releitura do texto constante do art. 52, X, da Constituição de 1988, que, como já observado, reproduz disposição estabelecida, inicialmente, na Constituição de 1934 (art 91, IV) e repetida nos textos de 1946 (art. 64) e de 1967/69 (art. 42, VIII).
Portanto, é outro o contexto normativo que se coloca para a suspensão da execução pelo Senado Federal no âmbito da Constituição de 1988. Ao se entender que a eficácia ampliada da decisão está ligada ao papel especial da jurisdição constitucional, e, especialmente, se considerarmos que o texto constitucional de 1988 alterou substancialmente o papel desta Corte, que passou a ter uma função preeminente na guarda da Constituição a partir do controle direto exercido na ADI, na ADC e na ADPF, não há como deixar de reconhecer a necessidade de uma nova compreensão do tema. A aceitação das ações coletivas como instrumento de controle de constitucionalidade relativiza enormemente a diferença entre os processos de índole objetiva e os processos de caráter estritamente subjetivo. É que a decisão proferida na ação civil pública, no mandado de segurança coletivo e em outras ações de caráter coletivo não mais poderá ser considerada uma decisão inter partes. De qualquer sorte, a natureza idêntica do controle de constitucionalidade, quanto às suas finalidades e aos procedimentos comuns dominantes para os modelos difuso e concentrado, não mais parece legitimar a distinção quanto aos efeitos das decisões proferidas no controle direto e no controle incidental. Somente essa nova compreensão parece apta a explicar o fato de o Tribunal ter passado a reconhecer efeitos gerais à decisão proferida em sede de controle incidental, independentemente da intervenção do Senado. O mesmo há de se dizer das várias decisões legislativas que reconhecem efeito transcendente às decisões do STF tomadas em sede de controle difuso. Esse conjunto de decisões judiciais e legislativas revela, em verdade, uma nova compreensão do texto constitucional no âmbito da Constituição de 1988. É possível, sem qualquer exagero, falar-se aqui de uma autêntica mutação constitucional em razão da completa reformulação do sistema jurídico e, por conseguinte, da nova compreensão que se conferiu à regra do art. 52, X, da Constituição de 1988. Valendo-nos dos subsídios da doutrina constitucional a propósito da mutação constitucional, poder-se-ia cogitar aqui de uma autêntica reforma da Constituição sem expressa modificação do texto.57 Em verdade, a aplicação que o Supremo Tribunal Federal vem conferindo ao disposto no art. 52, X, da CF indica que o referido instituto mereceu uma significativa reinterpretação a partir da Constituição de 1988. É possível que a configuração emprestada ao controle abstrato pela nova Constituição, com ênfase no modelo abstrato, tenha sido decisiva para a mudança verificada, uma vez que as decisões com eficácia erga omnes passaram a se generalizar. A multiplicação de processos idênticos no sistema difuso - notória após 1988 - deve ter contribuído, igualmente, para que a Corte percebesse a necessidade de atualização do aludido instituto. Nesse contexto, assume relevo a decisão que afirmou a dispensabilidade de se submeter a questão constitucional ao Plenário de qualquer Tribunal se o Supremo Tribunal já se tiver manifestado pela inconstitucionalidade do diploma. Tal como observado, essa decisão acaba por conferir uma eficácia mais ampla - talvez até mesmo um certo efeito vinculante - à decisão do Plenário do Supremo Tribunal no controle incidental. Essa orientação está devidamente incorporada ao direito positivo (CPC, art. 481, parágrafo único, parte final, na redação da Lei n . 9756, de 1998). No mesmo contexto situa-se a decisão que outorgou ao relator a possibilidade de decidir, monocraticamente, os recursos extraordinários vinculados às questões já resolvidas pelo Plenário do Tribunal (CPC, art. 557, § 1° A). De fato, é difícil admitir que a decisão proferida em ADI ou ADC e na ADPF possa ser dotada de eficácia geral e a decisão proferida no âmbito do controle incidental - esta muito mais morosa porque em geral tomada após tramitação da questão por todas as instâncias - continue a ter eficácia restrita entre as partes. Explica-se, assim, o desenvolvimento da nova orientação a propósito da decisão do Senado Federal no processo de controle de constitucionalidade, no contexto normativo da Constituição de 1988. A prática dos últimos anos, especialmente após o advento da Constituição de 1988, parece dar razão, pelo menos agora, a Lúcio Bittencourt, para quem a finalidade da decisão do Senado era, desde sempre, "apenas tornar pública a decisão do tribunal, levando-a ao conhecimento de todos os cidadãos".58 Sem adentrar o debate sobre a correção desse entendimento no passado, não parece haver dúvida de que todas as construções que se vêm fazendo em torno do efeito transcendente das decisões pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Congresso Nacional, com o apoio, em muitos casos, da jurisprudência da Corte59, estão a indicar a necessidade de revisão da orientação dominante antes do advento da Constituição de 1988. Assim, parece legítimo entender que, hodiernamente, a fórmula relativa à suspensão de execução da lei pelo Senado Federal há de ter simples efeito de publicidade. Desta forma, se o Supremo Tribunal Federal, em sede de controle incidental, chegar à conclusão, de modo definitivo, de que a lei é inconstitucional, essa decisão terá efeitos gerais, fazendo-se a comunicação ao Senado Federal para que este publique a decisão no Diário do Congresso. Tal como assente, não é (mais) a decisão do Senado que confere eficácia geral ao julgamento do Supremo. A própria decisão da Corte contém essa força normativa. Parece evidente ser essa a orientação implícita nas diversas decisões judiciais e legislativas acima referidas. Assim, o Senado não terá a faculdade de publicar ou não a decisão, uma vez que não se cuida de uma decisão substantiva, mas de simples dever de publicação, tal como reconhecido a outros órgãos políticos em alguns sistemas constitucionais (Constituição austríaca, art. 140,5 - publicação a cargo do Chanceler Federal, e Lei Orgânica da Corte Constitucional Alemã, art.31, (2), publicação a cargo do Ministro da Justiça). Tais decisões proferidas em processo de controle de normas são publicadas no Diário Oficial e têm força de lei (Gesetzeskraft) [Lei do Bundesverfassungsgericht, § 31, (2)]. Segundo Klaus Vogei, o § 31, II, da Lei Orgânica da Corte Constitucional alemã faz com que a força de lei alcance também as decisões confirmatórias de constitucionalidade. Essa ampliação somente se aplicaria, porém, ao dever de publicação, porque a lei não pode conferir efeito que a Constituição não prevê60.
Portanto, a não-publicação, pelo Senado Federal, de Resolução que, nos termos do art. 52, X da Constituição, suspenderia a execução da lei declarada inconstitucional pelo STF, não terá o condão de impedir que a decisão do Supremo assuma a sua real eficácia jurídica. Esta solução, resolve de forma superior uma das tormentosas questões da nossa jurisdição constitucional. Superam-se, assim, também, as incongruências cada vez mais marcantes entre a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e a orientação dominante na legislação processual, de um lado, e, de outro, a visão doutrinária ortodoxa e - permita-nos dizer - ultrapassada do disposto no art. 52, X, da Constituição de 1988. Ressalte-se ainda o fato de a adoção da súmula vinculante ter reforçado a idéia de superação do referido art. 52, X, da CF na medida em que permite aferir a inconstitucionalidade de determinada orientação pelo próprio Tribunal, sem qualquer interferência do Senado Federal. Por último, observe-se que a adoção da técnica da declaração de inconstitucionalidade com limitação de efeitos61 parece sinalizar que o Tribunal entende estar desvinculado de qualquer ato do Senado Federal, cabendo tão-somente a ele - Tribunal - definir os efeitos da decisão. No caso em apreço, concedi medida liminar em habeas corpus de ofício, em decisão de 21.8.2006, para que, mantido o regime fechado de cumprimento de pena por crime hediondo, fosse afastada a vedação legal de progressão de regime, nos seguintes termos, na parte em que interessa:
(...)
Com efeito, verifica-se que a recusa do Juiz de Direito da Vara de Execuções da Comarca de Rio Branco, no Estado do Acre, em conceder o benefício da progressão de regime, nos casos de crimes hediondos, desrespeita a eficácia erga omnes que deve ser atribuída à decisão deste Supremo Tribunal Federal, no HC 82.959, que declarou a inconstitucionalidade do artigo 2°, § 1°, da Lei n. 8.072/1990.
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a presente reclamação, para cassar decisões proferidas pelo Juiz de Direito da Vara de Execuções Penais da Comarca de Rio Branco, no Estado do Acre, que negaram a possibilidade de progressão de regime relativamente a cada um dos interessados acima mencionados. Nesta extensão da procedência da reclamação, caberá ao juízo reclamado proferir nova decisão para avaliar se, no caso concreto, os interessados (pacientes) atendem ou não os requisitos para gozar do referido benefício, podendo determinar, para esse fim, e desde que de modo fundamentado, a realização de exame criminológico. grifei
Trata-se de um brilhante voto, em que o Ministro, em síntese, conferiu eficácia erga omnes as decisões do Supremo Tribunal Federal ainda que proferidas em controle incidental, independentemente de atuação do Senado Federal, pois como bem pontuou, é o Judiciário quem decide, cabendo ao Senado apenas publicizar, entender de modo contrário estaria a negar a teoria das nulidades.
Ressalte-se a seguinte doutrina citada no voto:
Se o Senado não agir, nem por isso ficará afetada a eficácia da decisão, a qual continuará a produzir todos os seus efeitos regulares que, de fato, independem de qualquer dos poderes. O objetivo do art. 45, IV da Constituição - a referência é ao texto de 1967 - é apenas tornar pública a decisão do tribunal, levando-a ao conhecimento de todos os cidadãos. Dizer que o Senado 'suspende a execução' da lei inconstitucional é, positivamente, impropriedade técnica, uma vez que o ato, sendo 'inexistente' ou 'ineficaz', não pode ter suspensa a sua execução[64].
O segundo Ministro a votar na Reclamação foi Eros Grau, quem acompanhou o voto do Ministro Gilmar Mendes. No entanto, este foi vencido, inaugurando a divergência o Ex-Ministro Sepúlveda Pertence, o qual sopesou entendimento pela manutenção da competência privativa do Senado Federal nos exatos termos do art. 52, X da Constituição, extrai-se o seguinte excerto do voto:
A Emenda Constitucional 45 dotou o Supremo Tribunal de um poder que, praticamente, sem reduzir o Senado a um órgão de mera publicidade de nossas decisões, dispensa essa intervenção. Refiro-me, é claro, ao instituto da súmula vinculante, que a Emenda Constitucional 45, de 2005, veio a adotar depois de mais de uma década de tormentosa discussão. De tal modo que reproduzirei no meu voto, para efeitos didáticos, o dispositivo do vigente art. 102, § 3o, que vincula, ele sim, a súmula vinculante, editada na conformidade da Lei de 2006, que a disciplinou. Vincula, nos termos da Constituição, sim, não apenas os tribunais, no que o eminente Ministro Gilmar Mendes, cada vez mais religioso, chama de efeitos transcendentes, mas este restrito aos tribunais que tenham de enfrentar a mesma questão de inconstitucionalidade. E tenho dúvidas se até ai seria vinculante, porque a dispensa da remessa ao Plenário da argüição de inconstitucionalidade não impede o tribunal inferior de alterá-la enquanto não dotada a jurisprudência do Supremo Tribunal do efeito vinculante, que, ou decorre, no nosso sistema, de decisões nos processos objetivos de controle direto, ou decorrerá da adoção solene, pelo Tribunal, da súmula vinculante. Esta, sim, vinculante de todos os demais órgãos do Poder Judiciário, salvo o próprio Supremo Tribunal, e dos órgãos da Administração Pública Federal, Estadual e Municipal. Homenageio o brilho incomum de ambos os votos que me precederam, mas peço vênia aos Ministros Gilmar Mendes e Eros Grau para julgar improcedente a reclamação que, a meu ver, é o grande risco tsunâmico - eu diria - do Supremo Tribunal de hoje, porque, sem alargamentos, ela já tende a ser brevemente a via mais frequente de acesso ao Tribunal. Não vejo necessidade de rompê-la a custo desta delicada decisão institucional de converter essa prerrogativa a que o Congresso sempre se reservou, nas sucessivas Constituições, em uma função subalterna de dar publicidade a decisões do Supremo Tribunal em processos subjetivos. E como temos feito, e eu tenho feito numerosas vezes, dado que permaneço fiel à Súmula n° 691? Como tenho feito, no caso, julgando improcedente a reclamação, eu concedo habeas corpus de ofício, para que o juiz da execução examine os demais pressupostos da progressão de regime postulada pelo reclamante. Grife
Alertou o voto divergente o perigo da proposta do Ministro Gilmar Mendes, vez que daria ao Tribunal amplos poderes. Solucionando a questão da reclamação na própria Constituição Federal, solidificando que a EC 45/04 dotou o STF de poderes, mas que isso não reduziu o papel do Senado a um órgão de mera publicidade das decisões da Corte, de modo a dispensar a intervenção de respectiva Casa Legislativa para fins de efeitos vinculantes. O que seria plenamente possível por meio da edição de Súmula Vinculante (art.102, § 3º da CRFB/88), já que dotada de eficácia erga omnes e efeitos vinculantes. Ainda esclareceu que o fato de a jurisprudência do STF admitir a dispensa da cláusula da reserva do plenário quando já houvesse decisão sobre a inconstitucionalidade de determinada norma, isso não justifica a redução do papel do Senado no controle difuso de constitucionalidade.
Traço outras considerações no sentido da decisão que, então, se tomou e que, depois, se consolidaria no Tribunal a partir do acórdão do Ministro Ilmar Galvão de dispensar a reserva de Plenário nos demais tribunais, se já houvesse decisão incidente do Supremo declaratória da inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo de que de cuidasse. Mas, partir daí, a reduzir-se a nada o papel do Senado – que todos os textos constitucionais subsequentes a 1934, com exceção do Estado Novo, mantiveram – parecem-me ir, com todas as vênias, além da marca.
Em seguida, votou o Ministro Joaquim Barbosa, que, de igual modo, não conheceu a reclamação, asseverando que a suspensão da execução da lei pelo Senado não evidencia óbice à ampla efetividade das decisões do Supremo Tribunal Federal, mas que se trata, na verdade, de um complemento. Destarte, indispensável a manutenção da tradicional leitura do art. 52, X da CF, excluindo a ocorrência da mutação constitucional deste dispositivo, diante da carência de dois fatores: (i) o decurso de um espaço de tempo maior para a verificação da mutação; e (ii) consequente e definitivo desuso do dispositivo.
Após cinco anos dos votos dos Ministros Sepúlveda Pertence e Joaquim Barbosa, o Ministro Lewandowski apresentou seu voto na sessão plenária do dia 16 de maio de 2013, acompanhando a divergência, afirmando que se trata de uma prerrogativa dada ao Senado desde a Constituição de 1934, não cabendo ao STF “fazer pouco” de uma previsão expressa na Constituição. Observando, ainda, que entre 7 de fevereiro de 2007 e 16 de junho de 2010, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado pautou, para deliberação dos senadores, 53 ofícios encaminhados pelo Supremo Tribunal Federal solicitando a promulgação de Projeto de Resolução para suspender a execução de dispositivos declarados inconstitucionais em sede de controle difuso:
Após bem refletir sobre tal proposição, ouso divergir de Sua Excelência [Min. Gilmar Mendes] quanto à ocorrência da aludida mutação constitucional, por não entender tratar-se o instituto de mera reminiscência histórica. É que, primeiro, constato que a Câmara Alta, não tem descuidado do cumprimento dessa relevante competência que os constituintes brasileiros lhe têm atribuído, de forma reiterada, desde o advento da Carta de 1934. Nesse sentido, assinalo que, entre 7 de fevereiro de 2007 e 16 de junho de 2010, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal pautou, para deliberação dos Senadores, nada menos que 53 ofícios encaminhados por esta Corte, solicitando a promulgação de projeto de resolução para suspender a execução de dispositivos declarados inconstitucionais em sede de controle difuso.
Em seguida, o falecido Ex-Ministro Teoria Zavascki pediu vista dos autos, sendo o julgamento retomado em 20 de março de 2014, votando pelo conhecimento e procedência da reclamação, todavia, não aderiu a tese do Ministro Gilmar Mendes. Esclarecendo que o debate acerca do art. 52, X da CF não é fator determinante para o não conhecimento ou improcedência da reclamação, que, ainda que se reconhecesse que a resolução do Senado tenha aptidão para conferir eficácia erga omnes às decisões do STF, isso não significaria que a expansão das decisões só ocorreria quando e se houvesse a intervenção da referida Casa Legislativa.
Mas a Resolução do Senado não é a única forma de ampliação da eficácia subjetiva das decisões do Supremo Tribunal Federal, até porque ela diz respeito a uma área extremamente limitada da jurisdição constitucional (apenas a das decisões do Supremo que declaram a inconstitucionalidade de preceito normativo). Significativas modificações de nosso sistema constitucional, supervenientes à Constituição de 1934, conferiram a outras sentenças do Supremo Tribunal Federal – relacionadas, ou não, a controle de constitucionalidade de normas, afirmativas, ou não, da inconstitucionalidade –, eficácia subjetiva universal, expandindo-a para outros lindes do vasto domínio da jurisdição constitucional – que, como se sabe, vai muito além da fiscalização da legitimidade das normas – e para além das partes vinculadas ao processo de sua formação.
(...)
Considerando, assim, a força expansiva dessas tantas outras decisões do Supremo Tribunal Federal, além daquelas de que trata o art. 52, X da Constituição, resta saber se todas elas, em caso de descumprimento, dão ensejo ao imediato ajuizamento de reclamação perante a Corte Suprema. A resposta afirmativa a essa questão, bem se percebe, transforma o Supremo Tribunal Federal em órgão de controle dos atos executivos que decorrem, não apenas das decisões que toma em sua competência originária – como as ações de controle concentrado de constitucionalidade e as ações de descumprimento de preceito fundamental –, como também de todas as demais decisões por ele tomadas, quando revestidas, em alguma medida, de eficácia expansiva. Não há dúvida de que o descumprimento de qualquer dessas decisões importará, em maior ou menor intensidade, ofensa à autoridade das decisões da Suprema Corte, o que, numa interpretação literal e radical do art. 102, I, l da Constituição, permitiria a qualquer prejudicado, a intentar perante a Corte a ação de reclamação para “garantia da autoridade de suas decisões”. Todavia, tudo recomenda que se confira interpretação estrita a essa competência, a exemplo do que já decidiu o Supremo Tribunal Federal em relação àquela prevista na letra f do mesmo dispositivo. (...) Assim, sem negar a força expansiva de uma significativa gama de decisões do Supremo Tribunal Federal, é de ser mantida a sua jurisprudência, segundo a qual, em princípio, a reclamação somente é admitida quando ajuizada por quem tenha sido parte na relação processual em que foi proferida a decisão cuja eficácia se busca preservar. A legitimação ativa mais ampla somente será cabível nas hipóteses expressamente previstas na Constituição ou em lei ou de atribuição de efeitos vinculantes erga omnes – notadamente contra atos ofensivos a decisões tomadas em ações de controle concentrado de constitucionalidade e a súmulas vinculantes, em que se admite legitimação ativa mais ampla (CF, art. 102, § 2º, e art. 103-A, caput e § 3º; Lei 9.882/99, art. 13, e Lei 11.419/06, art. 7º)46
Em suma, foi considerado nesse voto, a priori, que a reclamação não seria cabível, vez que visto que a reclamante (Defensoria Pública da União) não fez parte da relação processual no HC 82.959/SP, o que, por conseguinte, inviabilizaria o seu conhecimento. Entretanto, consignou o Ministro que “no curso do seu julgamento, foi editada a Súmula Vinculante nº 26[65].
Assim, tem-se que a justificativa para o conhecimento e provimento da referida ação foi o advento do enunciado nº 26 de Súmula Vinculante.
Da exegese do voto do falecido Ex-Ministro Teori, denota-se um posicionamento favorável a expansão dos precedentes judiciais, diante da aproximação de uma cultura do stare decisis, típico do sistema common law. No entanto, não houve uma defesa ao fim do mecanismo previsto no art. 52, X da CF.
O informativo 739 do STF bem sedimentou o julgamento, concluído pelos votos dos Ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Celso de Mello, que acompanharam o entendimento do falecido Ex-Ministro Teori Zavascki.
Portanto, a reclamação 4.335-5/AC foi julgada procedente, mas por causa da superveniência da Súmula Vinculante nº 26. Não tendo, assim, a tese sobre a mutação constitucional do art. 52, X da CF prevalecido, restando o debate voltado ao reconhecimento da eficácia ultra partes dos precedentes do STF que não dependeriam da atuação do Senado Federal.
5.2 MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL DO ART. 52, X DA CF - OVERRULING
Finalmente, em 2018 - quando já alterada a composição dos Ministros da Suprema Corte, no julgamento das ADI 3406 e 3470 houve o acolhimento da tese do Ministro Gilmar Mendes em relação a função do Senado Federal, veiculada através do informativo 886 com o seguinte teor[66]:
O Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria, julgou improcedentes pedidos formulados em ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas contra a Lei nº 3.579/2001 do Estado do Rio de Janeiro. O referido diploma legal proíbe a extração do asbesto/amianto em todo território daquela unidade da Federação e prevê a substituição progressiva da produção e da comercialização de produtos que o contenham.
A Corte declarou, também por maioria e incidentalmente, a inconstitucionalidade do art. 2º(1) da Lei federal nº 9.055/1995, com efeito vinculante e “erga omnes”. O dispositivo já havia sido declarado inconstitucional, incidentalmente, no julgamento da ADI 3.937/SP (rel. orig. min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. min. Dias Toffoli, julgamento em 24.8.2017).
A partir da manifestação do ministro Gilmar Mendes, o Colegiado entendeu ser necessário, a fim de evitar anomias e fragmentação da unidade, equalizar a decisão que se toma tanto em sede de controle abstrato quanto em sede de controle incidental. O ministro Gilmar Mendes observou que o art. 535 (2) do Código de Processo Civil reforça esse entendimento. Asseverou se estar fazendo uma releitura do disposto no art. 52, X (3), da CF, no sentido de que a Corte comunica ao Senado a decisão de declaração de inconstitucionalidade, para que ele faça a publicação, intensifique a publicidade.
O ministro Celso de Mello considerou se estar diante de verdadeira mutação constitucional que expande os poderes do STF em tema de jurisdição constitucional. Para ele, o que se propõe é uma interpretação que confira ao Senado Federal a possibilidade de simplesmente, mediante publicação, divulgar a decisão do STF. Mas a eficácia vinculante resulta da decisão da Corte. Daí se estaria a reconhecer a inconstitucionalidade da própria matéria que foi objeto deste processo de controle abstrato, prevalecendo o entendimento de que a utilização do amianto, tipo crisotila e outro, ofende postulados constitucionais e, por isso, não pode ser objeto de normas autorizativas. A ministra Cármen Lúcia, na mesma linha, afirmou que a Corte está caminhando para uma inovação da jurisprudência no sentido de não ser mais declarado inconstitucional cada ato normativo, mas a própria matéria que nele se contém. O ministro Edson Fachin concluiu que a declaração de inconstitucionalidade, ainda que incidental, opera uma preclusão consumativa da matéria. Isso evita que se caia numa dimensão semicircular progressiva e sem fim. E essa afirmação não incide em contradição no sentido de reconhecer a constitucionalidade da lei estadual que também é proibitiva, o que significa, por uma simetria, que todas as legislações que são permissivas — dada a preclusão consumativa da matéria, reconhecida a inconstitucionalidade do art. 2º da lei federal — são também inconstitucionais.
Em divergência, o ministro Marco Aurélio afirmou que o fenômeno previsto no inciso X do art. 52 da CF — regra que atende a independência e harmonia entre os poderes — é constitutivo e não simplesmente declaratório, visto que diz respeito à suspensão da execução da lei no território nacional.
Quanto à improcedência dos pedidos, prevaleceu o voto da ministra Rosa Weber (Relatora).
A ministra Rosa Weber entendeu que a competência legislativa dos Estados não é plena, e sim suplementar. Por isso, a norma estadual não pode confrontar a norma federal, de modo a provocar o seu afastamento. No caso, a Lei nº 3.579/2001, ao regular aspectos da exploração do amianto relacionados a produção e consumo, proteção do meio ambiente e controle da poluição e proteção e defesa da saúde, não excede dos limites da competência suplementar dos Estados, no tocante a essas matérias.
Reputou que a lei atacada não possui conteúdo normativo que leve ao afastamento da norma geral consubstanciada na Lei nº 9.055/1995. A lei federal é norma geral editada pela União no exercício da limitada competência de conformação normativa conferida pelo art. 24, § 1º, da Constituição da República.
No ponto, asseverou que os artigos 3º, 4º e 5º da Lei nº 3.579/2001, que proíbem a utilização, a pulverização (spray) e a venda a granel de qualquer tipo de asbesto contemplam enunciados normativos em tudo congruentes com o art. 1º, I, II e III, da Lei nº 9.055/1995. Por sua vez, os artigos 2º e 6º do diploma estadual impugnado, que vedam no território do Estado do Rio de Janeiro, a extração, a fabricação e a comercialização de produtos que contenham asbesto de qualquer tipo, traduzem o devido exercício, pelo legislador fluminense, da competência concorrente suplementar, a teor do art. 24, V, VI e XII, e § 2º, da Constituição da República.
Para a ministra Rosa Weber, a Lei nº 9.055/1995, como norma geral que é, adota uma postura teleológica, frente à exploração econômica do amianto, e reconhece seus riscos e a necessidade de controle. Define as condições mínimas a serem observadas para que a exploração do asbesto da variedade crisotila seja tolerada como lícita. A simples tolerância não vincula a atividade legislativa de Estados e Municípios. De modo algum ostenta eficácia preemptiva de atividade legislativa estadual que, no exercício legítimo da competência concorrente, venha a impor controles mais rígidos ou proibitivos. Portanto, a Lei nº 9.055/1995 e a Lei nº 3.579/2001 estão orientadas na mesma direção, tendo a legislação estadual complementar, no caso, apenas avançado onde o legislador federal preferiu se conter. Ao impor um nível de proteção mínima a ser observado em todos os Estados da Federação, a Lei nº 9.055/1995 não pode ser interpretada como obstáculo à maximização dessa proteção, conforme escolha dos Estados, individualmente considerados. A proibição progressiva encartada na legislação estadual em apreço está alinhada à diretriz norteadora e à teleologia do regime previsto na Lei nº 9.055/1995.
A mesma conclusão de ausência de inconstitucionalidade formal conduz ao entendimento de que inconstitucional, e em consequência nulo e ineficaz, o art. 2º da Lei nº 9.055/1995, a atrair, por si só, a incidência do art. 24, § 3º, da Lei Maior, segundo o qual “inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena”. Por isso, infundada a alegada afronta ao art. 24, V, VI e XII, e §§ 1º a 4º, da Constituição Federal.
Também rejeitou a alegada inconstitucionalidade formal, seja ao fundamento da usurpação da competência privativa da União, seja ao fundamento de vício de iniciativa. Observou que o art. 7º do diploma fluminense estabelece limites de tolerância à exposição a fibras de amianto no ambiente de trabalho. Não expressa norma trabalhista em sentido estrito, mas de proteção do meio ambiente. Já os arts. 8º e 9º da lei fluminense disciplinam a rotulagem de produto quando no território do Estado, o que não representa legislar sobre comércio interestadual.
Esclareceu que os arts. 7º, XII, XIII e XVII, e 10 da lei estadual, de iniciativa parlamentar, de fato incorriam em vício de iniciativa, a teor do art. 84, II e VI, “a”, da Lei Maior, na esteira da jurisprudência do STF, enquanto definiam procedimentos a serem observados pela Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro e assinalavam atribuições a servidores do Poder Executivo. Todavia, reconhecida a constitucionalidade do seu art. 2º, e considerado o prazo de quatro anos, contados da sua publicação, para a fabricação e a comercialização de produtos contendo amianto crisotila em sua composição, já exauridos os efeitos dos seus arts. 7º, 8º, 9º e 10, pelo que não mais sujeitos ao controle de constitucionalidade em sede abstrata.
Por fim, afastou a apontada inconstitucionalidade material da lei impugnada, por ofensa aos artigos 1º, IV, 5º, “caput”, II, XXII e LIV, e 170, caput, II, IV e parágrafo único, da CF. Explicou que, informada pelo consenso técnico e científico hoje estabelecido, no tocante às premissas fáticas de que (i) todos os tipos de amianto provocam câncer, não tendo sido identificado nenhum limite para o risco carcinogênico do crisotila, e (ii) a sua substituição se mostra absolutamente viável sob o aspecto econômico, a lógica da inconstitucionalidade da proteção insuficiente ampara a conclusão de que não desarrazoadas as iniciativas legislativas relativas à sua regulação, em qualquer nível federativo, ainda que resultem no banimento de todo e qualquer uso do amianto.
Vencidos o ministro Marco Aurélio, que votou pela procedência do pedido, reportando-se ao voto por ele proferido na ADI 3.937/SP e, em parte, o ministro Alexandre de Moraes, que, por considerar que o art. 2º da Lei nº 9.055/1995, norma geral, é constitucional e não foi extirpado do ordenamento jurídico, julgou parcialmente procedente os pedidos para dar interpretação conforme ao art. 2º e ao art. 3º, ambos da Lei 3.579/2001 do Estado do Rio de Janeiro, respectivamente, no sentido de que fica proibida, em todo o território do Estado do Rio de Janeiro, a extração de asbesto, excluída a variedade crisotila, e de que fica proibida a utilização de asbesto, excluída a variedade crisotila.
(1) Lei nº 9.055/1995: “Art. 2º O asbesto/amianto da variedade crisotila (asbesto branco), do grupo dos minerais das serpentinas, e as demais fibras, naturais e artificiais de qualquer origem, utilizadas para o mesmo fim, serão extraídas, industrializadas, utilizadas e comercializadas em consonância com as disposições desta Lei”.
(2) CPC: “Art. 535 (...)§ 5º Para efeito do disposto no inciso III do caput deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso”.
(3) CF: “Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: (...)X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal”.
O Ministro Gilmar Mendes foi acompanhado pela maioria, os quais reconheceram que o papel do Senado Federal é de mera publicidade, sendo o Supremo Tribunal Federal quem decide. Deveras, houve uma mutação constitucional,
É importante esclarecer que houve declaração incidental de inconstitucionalidade nas ADI 3406 e 3470. Nestas ADIs houve pedido de declaração incidental de inconstitucionalidade do art. 2º da Lei Federal 9.055/95[67], ocorre que este dispositivo já havida sido alvo da ADI 4.066, cujo julgamento não acarretou na extirpação da norma do ordenamento jurídico, haja vista o não alcance do quórum da maioria absoluta, diante do impedimento dos Ministros Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli e ausência de Gilmar Mendes.
Nada obstante, na mesma sessão de julgamento da ADI 4.066, por ocasião da apreciação da ADIn 3.937, declarou-se incidentalmente a inconstitucionalidade do artigo 2º da lei Federal 9.055/95, muito embora sem efeito vinculante ou eficácia erga omnes.
À vista disso, da ausência de efeito vinculante e erga omnes, a matéria foi suscitada novamente nas ADI 3406 e 3470 de modo incidental, fulminando efeitos vinculante e erga omnes, nos moldes de um controle concentrado, devido ao acolhimento da tese do Ministro Gilmar Mendes de que o art. 52, X da CF é atinente a dar mera publicidade à decisão da Suprema Corte.
5.3 ABSTRATIVIZAÇÃO DO CONTROLE DIFUSO
Por fim, considerando que a Suprema Corte acolheu a tese do Ministro Gilmar Mendes, atinente a mutação constitucional do art. 52, X, da CF, de ser dispensável a atuação do Senado Federal para conferir eficácia ergma omnes as decisões do STF, ainda que proferidas em controle difuso, é correto dizer que passa-se a admitir a abstrativização do controle difuso.
Não se pode olvidar que, mesmo antes da solidificação da tese do art. 52, X da CF, já havia uma tendência da perda do caráter subjetivo de determinadas decisões do STF para um papel objetivo. A EC 45/04 introduziu os institutos da súmula vinculante (art. 103-A, CF) e o recurso extraordinário (art. 102, § 3º, CF). Em relação a súmula vinculante denota-se a atribuição de um efeito típico de controle abstrato, extraído de reiteradas decisões em processos subjetivos. Por sua vez, a repercussão geral em questões constitucionalmente discutidas no recurso extraordinário, como requisito de sua admissão. Destaca-se a força dos precedentes do novo Código de Processo Civil, em especial com previsão nos arts. 927, 332 e 932, IV e V.
Com efeito, há eficácia vinculante das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal em controle incidental, seja de modo difuso ou concentrado, independentemente da atuação do Senado Federal, ante a superação de entendimento – overruling.
Como já pontuava Ingo Sarlet, Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidier mesmo antes do julgamento emblemático:
Ora, se as decisões proferidas pelo STF, em controle incidental, têm eficácia vinculante, é completamente desnecessário reservar ao Senado Federal o poder para atribuir efeitos gerais às decisões de inconstitucionalidade. Como é evidente, ainda que o Senado tenha este poder, o fato de esta Casa Legislativa não atuar não pode conduzir à conclusão de que a decisão do STF não produziu – ou deixou de produzir – eficácia vinculante. A omissão do Senado não pode se contrapor à eficácia vinculante da decisão do STF[68].
Ademais, careceria de qualquer lógica a imposição de eficácia erga omnes somente as decisões proferidas em controle concentrado, até porque há identidade de esforço mental à conclusão da inconstitucionalidade da norma impugnada.
Conclui os mesmos autores o seguinte:
Portanto, negar eficácia vinculante aos precedentes constitucionais em virtude de o Senado Federal ter poder para suspender os efeitos de lei declarada inconstitucional, além de lamentável e curiosamente impedir que as decisões do STF gozem da devida autoridade, constitui equívoco fácil de ser apanhado[69].
Isso já era defendido pelo Ministro Luís Roberto Barroso:
Uma decisão do Pleno do Supremo Tribunal Federal, seja em controle incidental ou em ação direta, deve ter o mesmo alcance e produzir os mesmos efeitos”. Respeitada a razão histórica da previsão constitucional, quando de sua instituição em 1934, já não há lógica razoável em sua manutenção. Seria uma demasia, uma violação ao princípio da economia processual, obrigar um dos legitimados do art. 103 a propor ação direta para produzir uma decisão que já se sabe qual é![70]
Inclusive, pelo falecido Ex-Ministro Teori, o qual já consignava a aproximação dos efeitos das decisões prolatadas em ação direta como em via recursal:
Sob esse enfoque, há idêntica força de autoridade nas decisões do STF em ação direta quanto nas proferidas em via recursal. Merece aplausos essa aproximação, cada vez mais evidente, do sistema de controle difuso de constitucionalidade ao do concentrado, que se generaliza também em outros países. No atual estágio de nossa legislação, de que são exemplos esclarecedores os dispositivos acima transcritos, é inevitável que se passe a atribuir simples efeito de publicidade às resoluções do Senado previstas no art. 52, X, da Constituição. É o que defende, em doutrina, o Ministro Gilmar Ferreira Mendes, para quem “não parece haver dúvida de que todas as construções que se vêm fazendo em torno do efeito transcendente das decisões tomadas pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Congresso Nacional, com o apoio, em muitos casos, da jurisprudência da Corte, estão a indicar a necessidade de revisão da orientação dominante antes do advento da Constituição de 1988[71].
Deveras, não faz qualquer sentido afastar os efeitos gerais de uma questão prejudicial atinente a matéria inconstitucional, pois isso, como bem pontuou o Ministro Gilmar Mendes, é negar a teoria das nulidades. Norma inconstitucional assim reconhecida pela Corte Máxima de Jurisdição do país - a qual tem a palavra final, deve ser considerada nula em qualquer lugar dentro do país.
Por outro lado, há doutrinadores que rechaçam a teoria da abstrativização do controle difuso, como por exemplo, Bernardo Fernandes Gonçalves:
A nossa posição, fundamentada de acordo com a teoria discursiva da Constituição e da democracia de Jürgen Hebermas. É a de que a tese da abstrativização do controle difuso-concreto reforça o controle concentrado e a objetivização que é adstrita ao mesmo, centralizando as decisões cada vez mais no STF, sob os auspúcios de uma desmedida instrumentalidade e economia processuais, que acabam por deslegitimar o sistema de controle de constitucionalidade na via difusa de cunho democrático-discursivo, que se desenvolve por meio da crítica pública das decisões, podendo minar, com isso, a base do próprio sistema de direitos fundamentais atrelada ao Estado Democrático de Direito[72].
Flávio Martins Alves Nunes traz críticas também a teoria, sopesando que a lei 9.868/99 traz o controle concentrado de constitucionalidade dando efeito erga omnes à essa decisão[73].
Com a devida vênia aos autores citados por último, felizmente o STF admitiu a teoria. Se o Supremo Tribunal Federal confirmou a inconstitucionalidade de uma norma, ainda que através de recurso – controle difuso, não pode haver quebra da isonomia entre os jurisdicionados que se encontram em uma mesma posição jurídica. É inviável estes terem de aguardar a iniciativa de algum legitimado para propositura de uma ação objetiva contra a norma inconstitucional.
Ademais, é imprescindível destacar que o art. 535, § 5º do CPC veio a evitar a cisão da unidade, reforçando-se o dever de atribuir a decisão proferida em sede de controle difuso a mesma eficácia da decisão proferida em controle abstrato
Art. 535. A Fazenda Pública será intimada na pessoa de seu representante judicial, por carga, remessa ou meio eletrônico, para, querendo, no prazo de 30 (trinta) dias e nos próprios autos, impugnar a execução, podendo arguir:
III - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação;
§ 5o Para efeito do disposto no inciso III do caput deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso. Grifei
Portanto, veja que ficou superada a visão clássica de apenas conferir efeitos erga omnes as decisões proferidas em controle concentrado. Houve, de fato, um overruling, que ficou bastante evidenciado quando dos julgamentos das ADIs 3406 e 3470, veiculado no informativo 886 do STF, transmudando a jurisprudência para uma nova interpretação do art. 52, X, da CF, em que o papel do Senado se limita a mera publicação da decisão do órgão julgador.
6. CONCLUSÃO
Não se pode negar a evolução no Brasil do tema controle constitucionalidade. Na primeira Constituição Brasileira o tema não foi regulado, incumbindo tal exercido ao Poder Legislativo. Com a Constituição de 1891 houve a adoção do modelo inglês, trazendo ao Brasil o controle difuso e incidental, enquanto o controle concentrado e abstrato - modelo austríaco, foi albergado com a Emenda Constitucional 16/65, porém com adoção da teoria das nulidade e efeitos ex tunc.
Ressaltando-se que com a Constituição de 1934 é que foi inaugurado no Brasil a suspensão pelo Senado Federal da lei ou ato declarado inconstitucional, através de resolução. Ou seja, isso foi trazido quando sequer existia controle concentrado no País. Justamente por isso, dentre outros fundamentos, que foi desenvolvida a tese do Ministro Gilmar Mendes, no sentido de reconhecer a mutação constitucional do art. 52, X da Constituição Federal, atribuindo ao Senado Federal a incumbência de apenas publicar a decisão da Corte.
Esta tese foi amplamente debatida da reclamação 4.335 no Supremo Tribunal, a qual tinha como pedido a extensão dos efeitos do HC 82.959/SP (em que se declarou incidentalmente a inconstitucionalidade da vedação a progressão de regime prisional em crimes hediondos), não obstante a ausência da resolução do Senado suspendendo os efeitos do art. 2º, § 1º da Lei 8.072/90. A partir dessa reclamação e, especialmente, após o voto do Ministro Relator Gilmar Mendes, se iniciou um extenso debate na Suprema Corte sobre a real eficácia da participação do Legislativo no controle de constitucionalidade difuso, defendendo este a sua tese mencionada acima, sendo a tese de Gilmar Mendes somente acompanhada pelo Ex-Ministro Eros Grau.
Infelizmente, naquele momento, não houve o acolhimento da tese, na medida em que prevaleceu o voto do falecido Ex-Ministro Teori Zavascki, no sentido da superveniência da súmula vinculante nº 26, esta sim, sem controvérsia, dotada de efeitos vinculantes e erga omnes, levando, destarte, a procedência da reclamação.
Anos mais tarde, após uma alteração substancial dos membros da Corte, no julgamento das ADI 3406 e 3470 houve o acolhimento da tese do Ministro Gilmar Mendes em relação a função do Senado Federal, veiculada através do informativo 886, em que foi acompanhado pela maioria, reconhecendo a mutação constitucional do dispositivo.
Nesse diapasão, tendo em vista a superação de entendimento – overruling, reconhecendo a dispensa da atuação do Senado Federal para conferir eficácia ergma omnes as decisões do STF, ainda que proferidas em controle difuso, é correto dizer que passou-se a admitir a abstrativização do controle difuso. Ficando superada a visão clássica de apenas conferir efeitos erga omnes as decisões proferidas em controle concentrado, transmudando a jurisprudência para uma nova interpretação do art. 52, X, da CF, em que o papel do Senado se limita a mera publicação da decisão do órgão julgador.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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[1] SALDANHA, Nelson. Formação da teoria constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 43.
[2] MELLO, Celso Antônio Bandeira de; ARANHA, Oswald. A teoria das constituições rígidas. São Paulo: Bushatsky. 1980. p. 52.
[3] POLLETTI, Ronaldo. Controle da constitucionalidade das leis. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p.43.
[4] CAPPELETTI, Mauro. O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito comparado. Porto Alegre: S. A. Fabris, 1999. p. 125.
[5] Ibidem. p. 29.
[6] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1992. p. 980.
[7] Ibidem. p. 981-982
[8] ENTERRÍA, Eduardo Garcia. La constitución como norma y el tribunal constitucional. Editorial Civitas. 1991. p. 57.
[9] Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado
[10] Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: V - sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa;
[11] Art. 66. A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará. § 1º Se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto.
[12] BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 49.
[13] Ibidem, p. 50.
[15] MARTINS, Ives Gandra da Silva; MENDES, Gilmar Ferreira; e NASCIMENTO, Carlos Valder do (Coordenares). Tratado de direito constitucional. v. 1. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 225.
[16] CAPPELLETTI, Mauro. O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito comparado. Porto Alegre: Fabris. 1984. p. 77.
[17] CUNHA JR, Dirley da; NOVELINO, Marcelo. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 para concursos. Bahia: JusPodivm. 2010. p. 305.
[18] BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 52.
[19] CUNHA JR, Dirley da; NOVELINO, Marcelo. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 para concursos. Bahia: JusPodivm. 2010. p. 327.
[20] FAGUNDES, M. Seabra. O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1967, p. 23
[21] MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 1282.
[22] BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 54.
[23] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 12. ed. São Paulo: Malheiros. 2002. p. 277.
[24] Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: d) o habeas corpus, sendo paciente qualquer das pessoas referidas nas alíneas anteriores; o mandado de segurança e o habeas data contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal
[25] BANDEIRA DE MELO. Celso Antônio; ARANHA, Oswaldo. A teoria das constituições rígidas. 2. ed. São Paulo: José Bushatsky, 1997. p. 148.
[26] MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocência Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. P. 1035.
[27] MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 1.035 apud BARBOSA, Rui. Os atos inconstitucionais do Congresso e do Executivo. Rio de Janeiro: Casa de Rui Barbosa, 1962. p. 54-55
[28] BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 61.
[29] Ibidem, p. 62.
[30] VELOSO, Zeno. Controle Jurisdicional de Constitucionalidade. 3. ed. rev., atual. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 33.
[31] BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 62.
[32] Ibidem, p. 63.
[33] CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização Abstrata da Constitucionalidade no Direito Brasileiro. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2000. p. 101.
[34] MENDES, Gilmar Ferreira. Arguição de descumprimento de preceito fundamental: comentários à lei n. 9882, de 3.12.1999. São Paulo: Saraiva. 2007. p. 1006.
[35] BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Saraiva. 2016, p. 84.
[36] BITTENCOURT. Carlos Alberto Lúcio. O controle jurisdicional da constitucionalidade das leis. Rio de Janeiro: Forense. 1997. p. 97.
[37] RE 117.805-PR, rel. Min. Sepúlveda Pertence: “Na instância extraordinária, é de ser recebida com temperamentos a máxima de que, no sistema de controle incidente, o juiz de qualquer grau deve declarar de ofício a inconstitucionalidade de lei aplicável ao caso. À falta de prequestionamento na instância ordinária e de arguição pelo recorrente de inconstitucionalidade do diploma local que assim dispunha, o tema não pode ser enfrentado em recurso extraordinário”
[38] STRECK, Lenio. Jurisdição constitucional e hermenêutica. Uma Nova Crítica do Direito. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense. 2003. p. 362.
[39] CLÈVE, Merlin Clèmerson. A fiscalização abstrata de constitucionalidade no direito brasileiro. 2000, p. 104.
[40] GÓES, Guilherme Sandoval. Direito Constitucional Avançado. Rio de Janeiro: Seses. 2018. p. 60.
[41] Súmula Vinculante 10: Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.
[42] SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito constitucional. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2014, p.966.
[43] Não há necessidade de pedido das partes para que haja o deslocamento do incidente de inconstitucionalidade para o pleno do tribunal. Isso porque é dever de ofício do órgão fracionário esse envio, uma vez que não pode declarar expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, nem afastar sua incidência, no todo ou em parte. [Rcl 12.275 AgR, rel. min. Ricardo Lewandowski, j. 22-5-2014, P, DJE de 18-6-2014.]
[44] Súmula 513 STF: A decisão que enseja a interposição de recurso ordinário ou extraordinário não é a do plenário, que resolve o incidente de inconstitucionalidade, mas a do órgão (câmaras, grupos ou turmas) que completa o julgamento do feito.
[45] Parágrafo único. Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário ou ao órgão especial a arguição de inconstitucionalidade quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão.
[46] Art. 949. Se a arguição for: I - rejeitada, prosseguirá o julgamento;
[47] MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. vol. V – Arts. 476 a 565. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 40.
[48] BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 103.
[49] Art. 503. A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida.
§ 1º O disposto no caput aplica-se à resolução de questão prejudicial, decidida expressa e incidentemente no processo, se:
I - dessa resolução depender o julgamento do mérito;
II - a seu respeito tiver havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia;
III - o juízo tiver competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal.
[50] Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.
[51] Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal.
[52] GÓES, Guilherme Sandoval. Direito Constitucional Avançado. Rio de Janeiro: Seses. 2018. p. 58.
[53] BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 106.
[54] KELSEN, Hans. Jurisdição constitucional. Tradução de Alexandre Krug, Eduardo Brandão e Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes. 2003. p. 304-305.
[55] BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 125.
[56] GÓES, Guilherme Sandoval; MELLO, Cleyson de Moraes. Controle de constitucionalidade. Rio de Janeiro: Freitas Bastos. 2016. p. 217-218.
[57] NOVELINO, Marcelo. Curso de direito constitucional. 11. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. JusPodivm. 2016. p. 191
[58] STF ADI 1203
[59] CONSTITUCIONALIDADE SUPERVENIENTE - ARTIGO 3º, § 1º, DA LEI Nº 9.718, DE 27 DE NOVEMBRO DE 1998 - EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20, DE 15 DE DEZEMBRO DE 1998. O sistema jurídico brasileiro não contempla a figura da constitucionalidade superveniente. TRIBUTÁRIO - INSTITUTOS - EXPRESSÕES E VOCÁBULOS - SENTIDO. A norma pedagógica do artigo 110 do Código Tributário Nacional ressalta a impossibilidade de a lei tributária alterar a definição, o conteúdo e o alcance de consagrados institutos, conceitos e formas de direito privado utilizados expressa ou implicitamente. Sobrepõe-se ao aspecto formal o princípio da realidade, considerados os elementos tributários. CONTRIBUIÇAO SOCIAL - PIS - RECEITA BRUTA - NOÇAO - INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ARTIGO 3º DA LEI Nº 9.718/98. A jurisprudência do Supremo, ante a redação do artigo 195 da Carta Federal anterior à Emenda Constitucional nº 20/98, consolidou-se no sentido de tomar as expressões receita bruta e faturamento como sinônimas, jungindo-as à venda de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços. É inconstitucional o § 1º do artigo 3º da Lei nº 9.718/98, no que ampliou o conceito de receita bruta para envolver a totalidade das receitas auferidas por pessoas jurídicas, independentemente da atividade por elas desenvolvida e da classificação contábil adotada. (STF - RE 346084/PR).
[60] BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Saraiva. 2016. p. 135-136.
[61] STF - ADI 875; ADI 1.987; ADI 2.727: "O princípio da nulidade continua a ser a regra também no direito brasileiro”.
[62] MENDES, Gilmar. Comentário à Constituição do Brasil. 2 ed. São Paulo: Saraiva. 2018. p. 2023.
[63] BITTENCOURT. Carlos Alberto Lúcio. O controle jurisdicional da constitucionalidade das leis. Rio de Janeiro: Forense. 1997. p. 145-146.
[64] Idem.
[65] Súmula Vinculante 26: Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 8.072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico
[66]http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo886.htm#ADI:%20amianto%20e%20efeito%20vinculante%20de%20declara%C3%A7%C3%A3o%20incidental%20de%20inconstitucionalidade
[67] (...) o asbesto/amianto da variedade crisotila (asbesto branco), do grupo dos minerais das serpentinas, e as demais fibras, naturais e artificiais de qualquer origem, utilizadas para o mesmo fim, serão extraídas, industrializadas, utilizadas e comercializadas em consonância com as disposições desta Lei.
[68] MARINONI, Luiz Guilherme; SARLET, Ingo Wolfgang; MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. 12. ed. 2017. p. 201.
[69] Idem.
[70] BARROSO, Luis Roberto. O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro. 7. ed. São Paulo: 2016. P. 107.
[71] ZAVASKI, Teori Albino. Eficácia das sentenças na jurisdição constitucionais. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2017. p. 147.
[72] GONÇALVES, Bernardo. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. Salvador: Juspodivim. 2017. p. 63.
[73] NUNES JUNIOR, Flávio Martins Alves. Curso de Direito Constitucional. 5. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2017. p. 39.
Advogada. Graduada em Direito pela Universidade Tuiuti do Paraná (colação em março 2016); Pós-Graduação em Direito Público pela UNICESUMAR (2017); Pós-Graduação em Direito Constitucional pela Academia Brasileira de Direito Constitucional – ABDConst (2018).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CAVALARI, Yasmmin Andressa Simioni. Aproximação dos efeitos no controle difuso e concentrado de constitucionalidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 jun 2023, 04:58. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/61632/aproximao-dos-efeitos-no-controle-difuso-e-concentrado-de-constitucionalidade. Acesso em: 22 nov 2024.
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