Acórdão: Apelação Cível n. 2006.015791-2, de Lages.
Relator: Des. Sérgio Izidoro Heil.
Data da decisão: 27.07.2006.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - DÉBITO RELATIVO A CARTÃO DE CRÉDITO - FINANCIAMENTO PERANTE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA - PAGAMENTO DE PARCELA JUNTO AO CREDOR ORIGINAL - CIÊNCIA ACERCA DA NECESSIDADE DE QUITAÇÃO JUNTO À REDE BANCÁRIA - RESTRIÇÃO JUNTO A ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO - DANOS MORAIS INEXISTENTES - AUSÊNCIA DE CONDUTA CULPOSA DO RECORRIDO - INTELIGÊNCIA DO ART. 308 DO CÓDIGO CIVIL - RECURSO DESPROVIDO.
"(...) se o pagamento não for efetuado ao credor ou seu representante, será ineficaz. (...) O pagamento, porém, pode ser feito a pessoa não intitulada e mesmo assim valer, se houver ratificação do credor ou do representante. É a regra do mesmo art. 308 (antigo, art. 934)" (Sílvio de Salvo Venosa).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2006.015791-2, da comarca de Lages (2ª Vara Cível), em que é apelante Olair Spindola de Oliveira e apelado Banco Simples S/A.:
ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
Custas na forma da lei.
I - RELATÓRIO:
Trata-se de recurso de apelação interposto por Olair Spindola de Oliveira contra decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da comarca de Lages que, nos autos da ação de indenização por danos morais n. 039.05.011641-8, movida contra Banco Simples S/A, julgou parcialmente procedente os pedidos formulados na exordial, tão-somente para excluir o nome do autor dos cadastros restritivos ao crédito e condenando-o ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 15% (quinze por cento) do valor da causa.
Irresignado com a decisão a quo, apelou o demandante, sustentando, em síntese, que: ao tentar pagar um débito, foi informado de que seu nome constava no cadastro do SERASA; a inscrição do seu nome junto ao órgão de proteção ao crédito ocorreu a pedido do Banco Simples S/A, por um débito de R$ 117,90 (cento e dezessete reais e dezenove centavos) relativo à última parcela do cartão de crédito do Clube Angeloni Visa; não se encontrava em débito com o apelado, eis que efetuou o pagamento da referida parcela no dia 13/02/04, no guichê 09 do Supermercado Angeloni - loja 12; a indevida inscrição SERASA foi totalmente arbitrária e ilegítima, trazendo danos morais, materiais e de crédito. Pugnou pela reforma do decisum, condenando o "apelante" (sic) a pagar indenização a título de danos morais, bem como a condenação do apelado ao pagamento de verba honorária no valor de 20% (vinte por cento) sobre o valor final da condenação, além das custas processuais (fls. 92/100).
Às fls. 101/113, o apelado ofereceu contra-razões, alegando, em suma, que: mantinha com o apelado contrato de utilização de cartão de crédito, o qual devido à falta de pagamento, acumulou um saldo devedor, que fora parcelado, em 04 (quatro) parcelas de R$ 117,90 (cento dezessete reais e noventa centavos); encaminhou 04 (quatro) boletos bancários, os quais deveriam obrigatoriamente ser pagos na rede bancária; não agiu de forma negligente, imprudente ou com imperícia, muito menos dolosamente, pois a inscrição se deu por culpa única e exclusiva do apelante, que efetuou o pagamento da quarta parcela de forma equivocada; não há prova da repercussão capaz de ensejar o dano moral e material. Por fim, requereu a manutenção da decisão a quo, a fim de negar provimento ao recurso (fls. 108/123).
É o relatório.
II - VOTO:
Olair Spindola de Oliveira, ora apelante, propôs ação de indenização por dano moral e de crédito c/c pedido de antecipação parcial dos efeitos da tutela em face de Banco Simples S/A., alegando ter seus dados inseridos indevidamente em cadastro junto aos órgãos de restrição ao crédito, advindo, portanto, o dever de indenizar.
Do contexto probatório, verifica-se que o apelante era titular do cartão de crédito Visa do Clube Angeloni, o qual acumulou um saldo devedor e, visando liquidar a dívida, assumiu financiamento, que fora parcelado em quatro vezes de R$ 117,90 (cento dezessete reais e noventa centavos), junto ao Banco Simples S/A.
Acontece que, em meados de 2005, foi informado de que seu nome encontrava-se com restrições cadastrais junto ao órgão de proteção ao crédito - SERASA -, por um débito de R$ 117,90 (cento dezessete reais e noventa centavos).
Insurge-se, assim, contra a negativação, posto que liquidou integralmente as parcelas relativas ao financiamento, inclusive a parcela que motivou a inclusão - paga no dia 13/02/05, último dia útil para pagamento -, no guichê do Supermercado Angeloni, razão pela qual entende ser indevida a inscrição do seu nome, fazendo jus ao percebimento de indenização por danos morais e de crédito.
Na presente demanda, a discussão cinge-se à ocorrência ou não de dano moral oriundo da conduta do recorrente, principalmente no que se refere à forma como o pagamento foi realizado.
Ocorre que o apelante tinha absoluta ciência de que deveria quitar as faturas na rede bancária, conforme instruções do banco demandado (fls. 22/25) - como procedeu no pagamento das três primeiras parcelas - valendo transcrever:
"(...) o Banco Simples envia-lhe este boleto bancário, conforme acordo efetivado, para pagamento na rede bancária até o vencimento e nas agências da Caixa Econômica Federal até a data indicada no campo instruções".
Porém, na quitação da última parcela (fl. 21), dirigiu-se a uma das filiais do Supermercado Angeloni - credor original daquela pendência -, lá efetuando o pagamento.
Cumpre esclarecer que o Supermercado Angeloni somente estava autorizado a dar quitação das faturas do cartão de crédito, não do débito financiado diretamente com a instituição financeira apelada.
Ponderados os argumentos lançados nos autos, é incontroversa a quitação da parcela que motivou a negativação, tendo o próprio o recorrido reconhecido que a fatura foi paga, no entanto, justificou a sua atitude dado que o pagamento foi feito de forma equivocada.
E razão lhe assiste, porquanto não se lhe pode impor a impraticável obrigação de conferir, junto àqueles com quem contrata, eventual pagamento procedido de forma equivocada.
À vista das circunstâncias apresentadas, descabida é a pretensão indenizatória do recorrente, porquanto ausente qualquer conduta ilícita por parte do apelado.
Dispõe o art. 308 do Código Civil:
"Art. 308. O pagamento deve ser feito ao credor ou a quem de direito o represente, sob pena de só valer depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em seu proveito".
Manifestando-se acerca do dispositivo legal supracitado, Sílvio de Salvo Venosa leciona:
"Portanto, se o pagamento não for efetuado ao credor ou seu representante, será ineficaz. Vale lembrar o brocardo genuíno, disseminado pelo povo, quem paga mal paga duas vezes.
O pagamento, porém, pode ser feito a pessoa não intitulada e mesmo assim valer, se houver ratificação do credor ou do representante. É a regra do mesmo art. 308 (antigo, art. 934)" (Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 5. ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 213).
Como bem salientado pelo ilustre Magistrado a quo:
"(...) o fato é que os valores foram pagos no supermercado, que deu quitação do valor porque, tudo indica, confundiu com a fatura do cartão. Em decorrência disso o pagamento não foi contabilizado e deu-se a inclusão" (fl. 87).
Se conduta culposa houve, partiu da filial do Supermercado Angeloni e do próprio recorrente, os quais procederam a quitação de débito de forma absolutamente imprudente.
Sobre o tema, colhe-se da jurisprudência deste egrégio Tribunal:
"EMBARGOS DO DEVEDOR. CHEQUE. ALEGAÇÃO DE PAGAMENTO. JULGAMENTO ANTECIPADO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. LITISDENUNCIAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO IMPROVIDO. Frente ao sistema do Código, é inteiramente descabida a denunciação da lide nos embargos do devedor. O pagamento para operar a quitação da dívida, deverá ser feito ao próprio credor ou a quem de direito o represente, sob pena de só valer depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em seu proveito. Inteligência do art. 934 do Código Civil. A quitação, assim como os atos jurídicos, deverá revestir a forma legal. O pagamento prova-se com a quitação regular (art. 940 do CC), somente admitindo-se a prova testemunhal para tal propósito, se não sobreexceder o limite do art. 401 do CPC. Não há falar em cerceamento de defesa em caso de julgamento de plano dos embargos, se a prova testemunhal que se pretende produzir em audiência não tem o condão jurídico de provar a quitação, por sobreexceder ao décuplo do salário mínimo, vigente à época". (AC n. 33.096, de Criciúma, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, j. 10/01/1991, pág. 07).
Da jurisprudência pátria, vale acrescentar:
"SEGURO. PAGAMENTO EFETUADO AO CORRETOR E NÃO REPASSADO AO SEGURADO. RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE O SEGURADO E A SEGURADORA. INADIMPLEMENTO. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 934 DO CÓDIGO CIVIL. RECURSO NÃO PROVIDO. Se o pagamento não for feito ao credor ou a seu legítimo representante, será invalidado e não terá força liberatória, devendo ser ratificado". (TJ-SP; AC n. 3.400-4, de Ribeirão Preto; Oitava Câmara de Direito Privado; rel. Des. Antonio Carlos Debatin Cardoso, j. em 12/12/1997).
Assim, não se pode imputar ao banco apelado a responsabilidade pelo fato ocorrido, tampouco sua intenção de lesar, visto que tão-somente o apelante poderia ter evitado o acontecido.
Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso, mantendo-se incólume o decisum pugnado.
III - DECISÃO:
Nos termos do voto do Relator, a Câmara, por unanimidade, negar provimento ao recurso.
Participou do julgamento o Exmo. Sr. Des. Marcus Tulio Sartorato.
Florianópolis, 27 de julho de 2006.
Fernando Carioni
PRESIDENTE COM VOTO
Sérgio Izidoro Heil
RELATOR
Precisa estar logado para fazer comentários.