Acórdão: Apelação Cível n. 2004.035800-6, de Joaçaba.
Relator: Des. Monteiro Rocha.
Data da decisão: 30.11.2006.
Publicação: DJSC Eletrônico n. 117, edição de 19.12.2006, p. 33.
EMENTA: DIREITO CIVIL – OBRIGAÇÕES – CONTRATO – SEGURO DE VIDA E ACIDENTES PESSOAIS – COBRANÇA PROCEDENTE EM PRIMEIRO GRAU – INCONFORMISMO – OCORRÊNCIA DO RISCO CONTRATADO – COBERTURA PELA SEGURADORA – NEGATIVA – PREEXISTÊNCIA DE MOLÉSTIA – APÓLICE SEM EXAMES MÉDICOS – OCORRÊNCIA – PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ PELO CONSUMIDOR – RISCOS PELA SEGURADORA – SENTENÇA CONFIRMADA – APELO DESPROVIDO.
O segurador não pode subtrair-se ao pagamento dos seguros de vida e acidentes pessoais, a pretexto de moléstia preexistente, se não exige do segurado, por ocasião do contrato, exame médico conclusivo sobre as condições de saúde deste.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível n. 04.035800-6, Comarca da Joaçaba (2ª Vara Cível), em que é apelante Executivos S/A. Administração e Promoção de Seguros, sendo apelada Sirlei Luiza Zanatta:
ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Civil, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
Custas na forma da lei.
RELATÓRIO:
Tratam os presentes autos de Ação de Cobrança movida por Sirlei Luiza Zanatta em face de Executivos S/A. Administração e Promoção de Seguros, objetivando o recebimento de indenização pelo falecimento de seu marido.
Sustentou que é beneficiária do seguro de vida firmado por seu marido, Carlos Antônio Zanatta, em 16/12/1999.
Disse que após o falecimento do segurado em 07/08/2000, a requerida negou-se a efetuar o pagamento indenizatório, sob a alegação de moléstia preexistente.
Em razão do falecimento da autora, a mesma foi substituída no pólo ativo da demanda por seus filhos, Robson Luiz Zanatta e Danielle Zanatta.
Instruído o feito, sentença foi proferida às fls. 112/117, contendo a parte dispositiva o seguinte teor:
“Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido da autora para condenar a ré no pagamento do valor da apólice do seguro, por morte do cônjuge da contratante, no valor principal de R$ 25.000,00 acrescidos de juros de mora a partir da citação e correção monetária a partir do momento em que o valor tornou-se devido.
“Condeno, ainda, a ré no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que fixo em 20% sobre o valor da causa devidamente atualizada”.
Inconformada, Executivos S/A. Administração e Promoção de Seguros interpôs recurso de apelação, objetivando a reforma in totum do decisum objurgado, aduzindo que o segurado agiu com má-fé na contratação do seguro, pois não informou ser portador de moléstia preexistente, o que impede o pagamento indenizatório.
Contra-arrazoado o recurso, os autos ascenderam a esta Superior Instância.
É o relatório.
VOTO:
Conheço do recurso, porquanto tempestivo e instruído com os documentos necessários.
Objetiva a seguradora/apelante a reforma da sentença de 1º Grau, argumentando ser indevido o pagamento securitário, pois o segurado era portador de moléstia preexistente.
O reclamo desmerece prosperar.
Tratando sobre seguros, ensina ORLANDO GOMES:
“Pelo contrato de seguro, uma empresa especializada obriga-se para com uma pessoa, mediante contribuição por esta prometida a lhe pagar certa quantia, se ocorrer o risco previsto.
“As partes no contrato de seguro chamam-se segurador e segurado. Ao segurador compete pagar a quantia estipulada para a hipótese de ocorrer o risco previsto no contrato. Ao segurado assiste o direito de recebê-la, se cumprida a sua obrigação de pagar a contribuição prometida, que se denomina prêmio. O instrumento do contrato se seguro chama-se apólice” (Contratos, 7. ed., Forense, p. 501).
Os contratos de seguro são regidos pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), a teor do que dispõem os arts. 2º e 3º daquele diploma, com menção expressa aos serviços de natureza securitária.
Sobre a incidência do CDC aos contratos de seguro preconiza CLÁUDIA LIMA MARQUES:
Resumindo, em todos estes contratos de seguro podemos identificar o fornecedor exigido pelo art. 3º, do CDC e o consumidor. Note-se que o destinatário do prêmio pode ser o contratante com a empresa seguradora (estipulante) ou terceira pessoa, que participará como beneficiária do seguro. Nos dois casos há um destinatário final do serviço prestado pela empresa seguradora (Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 3. ed., RT, 1999, p. 196).
Incontroversos nos autos o contrato de seguro em que são beneficiários os autores, o pagamento dos prêmios, a ocorrência do risco (morte) e a negativa da seguradora em efetuar o pagamento indenizatório.
No caso concreto, o estabelecimento securitário não agiu de boa-fé com o segurado, ao não ter exigido deste, nas fases pré-contratual, contratual e pós-contratual exames médicos aquilatando seu real estado de saúde.
Nesse contexto, cuidando-se de pacto adesivo e arredada a livre discussão sobre as respectivas cláusulas, não pode a seguradora, uma vez adimplidos os prêmios mensais, subtrair-se ao pagamento da indenização nos seguros de vida e acidentes pessoais, a pretexto da preexistência de moléstia, se não informou adequadamente o consumidor de boa-fé (que se presume) acerca da referida restrição, de sua amplitude e de suas conseqüências na economia do pacto.
Ademais, na hipótese focalizada nos autos, conforme decorre da instrução do feito, não há provas de que o segurado, ao tempo da celebração da apólice, fosse portador dos males que lhe causaram o óbito (cirrose hepática).
Extrai-se dos autos, que o seguro foi firmado em 16/12/1999 (fls. 10) e o diagnóstico constatando a doença cirrose hepática somente foi efetuado dias depois. A morte do segurado se deu em 07/08/2000.
Ademais, os médicos que acompanharam o desenvolvimento da moléstia do segurado anotaram que:
“Atendeu Carlos Antônio Zanatta há algum tempo [...] que acha que foi no mês de agosto ou setembro , provavelmente no ano de 2000 [..] a doença existia a mais de ano, mas as manifestações eram recentes” (Walter Wendhausen Rothbart, fls. 96).
O médico Aluar de Oliveira Pinto consignou que “a doença apresentada pelo paciente, pode-se dizer era de longa data; que acha que o paciente foi tomado de surpresa pela doença” (fls. 97).
Por último, concluiu a testemunha, também médico, Carlos Alexandre Romeu de Souza que “a doença do paciente era crônica e pode observar que os caso de cirrose se manifestam até cinco a dez anos depois que tiverem início [...]; que isso significa que o paciente pode ser portador da cirrose sem ter conhecimento desse fato [...] que não pode afirmar com certeza se ele sabia ou não desse fato” (fls. 98).
Em decorrência do parecer médico de Carlos Alexandre Romeu de Souza, ao segurado não poderia ter sido exigido, por ocasião do contrato, a afirmação de que fosse portador de cirrose hepática porque “pode haver cirrose sem que o paciente tivesse essa certeza”, até porque a certeza pressupõe a necessidade e obrigatoriedade de levantamento médico diário, o que é inadmissível numa sociedade voltada ao ter e ao prazer.
A versão convergente e mais adequada à prova documental coligida é a de que o falecido segurado não tinha conhecimento de doença preexistente, paralelamente ao fato de que não lhe foi exigida a apresentação de atestados de saúde por ocasião do contrato sub judice.
Ainda que o segurado já fosse efetivamente portador da questionada moléstia, em hipótese alguma dela tinha conhecimento e tampouco era sabedor da gravidade dos males subseqüentes, pelo que não se lhe aplica o disposto no art. 1.444 do Código Civil de 1916 (art. 766 do CC vigente).
Nesse sentido há emblemático precedente:
“Compete à seguradora arcar com o risco de sua própria atividade, obrigando-se pelo pagamento do seguro, na hipótese de não ter tomado as prévias diligências para a sua contratação. Se foi omissa em tomar tais cautelas não pode vir alegar que a doença era preexistente à data da feitura do seguro” (Apelação cível n. 4/92, da Capital, Rel. Dr. Hildebrando Coelho Neto, 1ª Turma de Recursos/RS, 27.2.92).
Sobre o tema é uníssona a jurisprudência desta Corte:
“Se a empresa seguradora não realiza os exames médicos nos segurados antes de firmar o contrato, a fim de constatar se eles eram ou não portadores de doenças preexistentes, assume os riscos do negócio, não podendo recusar-se a pagar a indenização devida” (Apelação cível n. 01.001480-2, de Joinville, Rel. Des. Carlos Prudêncio).
Desta forma, conheço do recurso interposto para negar-lhe provimento.
É o voto.
DECISÃO:
Nos termos do voto do relator, esta Segunda Câmara de Direito Civil, à unanimidade, resolve conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
Participou do julgamento o Exmo. Sr. Desembargador Luiz Carlos Freyesleben.
Florianópolis, 30 de novembro de 2006.
MAZONI FERREIRA
Presidente com voto
MONTEIRO ROCHA
Relator
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