- Acórdão: Apelação Cível n. 2005.015135-7, de Araranguá.
- Relator: Des. Wilson Augusto do Nascimento.
- Data da decisão: 16.12.2005.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE - REGISTRO DE NASCIMENTO DE FILHO NÃO BIOLÓGICO - ATO VOLUNTÁRIO E CONSCIENTE - IRRETRATABILIDADE E IRREVOGABILIDADE - VINDICAÇÃO CONTRÁRIA AO QUE CONSTA DO REGISTRO CIVIL - APLICABILIDADE DO ART. 1.604 DO NOVO CC - VÍCIO DE CONSENTIMENTO - NÃO COMPROVAÇÃO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO.
O registro de nascimento efetuado de forma voluntária e consciente, não admite retratação, salvo se aplicável ao caso as exceções do art. 1.604 do novo Código Civil, ou presente vício de consentimento.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível n. 2005.015135-7, da Comarca de Araranguá (1ª Vara Cível), em que é apelante J. C., sendo apelada A. M. C. representada por sua mãe L. da. S.:
ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, negar provimento ao recurso.
Custas na forma da lei.
I -RELATÓRIO:
J. C. interpôs recurso de apelação cível inconformado com a sentença prolatada pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da comarca de Araranguá, o qual julgou improcedente o pedido formulado nos autos da ação anulatória de registro de paternidade, ajuizada contra A. M. C. representada por sua mãe L. da. S.
O magistrado entendeu ser irrevogável, com base no art. 1.609, do novo Código Civil, a paternidade espontaneamente assumida pelo autor/apelante, tendo este plena ciência de que não era pai biológico da ré (fls. 56/58).
O apelante alegou não manter qualquer vínculo com a criança, além de ter restado plenamente demonstrado não ser o seu pai biológico, conforme exame de DNA realizado, sendo que o interesse da apelada não pode se reverter em seu prejuízo.
Afirmou possível a anulação do registro, mediante interpretação conjunta do art. 1.604 do novo Código Civil e art. 113 da Lei de Registros Públicos, uma vez comprovada a falsidade da relação de filiação.
Asseverou, ainda, a inaplicabilidade do art. 1.609 do novo Código Civil, não tendo sido a infante reconhecida como filho gerado fora do casamento, conforme previsto no dispositivo legal.
Requereu o conhecimento e provimento do recurso, para ver reformada a sentença hostilizada (fls. 63/72).
Devidamente intimada, a apelada apresentou contra-razões, rebatendo os termos consignados na peça recursal (fls. 82/84).
O promotor de justiça deixou de opinar, com base no art. 1º do Ato Conjunto da PGMP/CGMP (fl. 85).
Após alçarem os autos a este Egrégio Tribunal de Justiça, foram remetidos à douta Procuradoria-Geral de Justiça, que, por meio de seu representante, opinou pelo conhecimento e não provimento do recurso (fls. 93/98).
Vieram conclusos.
É o relatório.
II -VOTO:
Trata-se de recurso de apelação cível interposto com o desiderato de ver reformada a sentença prolatada nos autos da ação anulatória de registro de paternidade, julgada improcedente.
O apelante pretende a reforma da sentença de primeiro grau, que julgou irretratável e irrevogável o reconhecimento de paternidade, posto ter sido ato praticado de forma consciente.
De fato, com o razão o magistrado, uma vez que o apelante, tendo ciência de que não era o pai biológico da apelada ao tempo do registro, inexiste vício capaz de macular o instrumento público.
Assim dispõe o art. 1.604 novo do Código Civil: "Ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro."
O ato praticado de forma consciente pelo apelante à época dos fatos, exclui o direito de agora pleitear a anulação dos registros sob a assertiva de não ser o pai biológico dos apelantes exceto, se provado erro ou falsidade de registro.
É o entendimento do Supremo Tribunal Federal:
"Vindicação de estado contrário ao que resulta de registro de nascimento - Proibição não absoluta ante a exceção de erro ou falsidade de registro - Inteligência do art. 348 do CC...(STF, RT, 545/276)."
Neste termos, não há nos autos prova da exceção contida no artigo supra citado, ou seja, que o recorrente fora mantido em erro pela mãe da apelada, ou que houve falsidade de registro, mesmo porque, como dito acima, agiu de forma consciente, sabedor de que a infante não era sua filha.
Acerca do assunto, pertinente a lição de Arnaldo Rizzardo:
"A segunda situação, que afasta a ação negatória, quando não fundamentada a ação em vícios de consentimento, mas no arrependimento do reconhecimento, é a seguinte. Uma pessoa reconhece o filho e depois de um determinado período volta atrás, dizendo que realizou o ato por princípios de humanidade, ou por ter-se unido à mãe do mesmo. Cabe, num lance inicial, lembrar que ninguém pode invocar a própria torpeza, ou beneficiar-se de uma ilegalidade praticada conscientemente. Seria absurdo admitir que o autor da falsidade, fazendo-se passar por pai, viesse depois desconstituir a própria afirmação consubstanciada em documento público." (Direito de família. 1. ed. Rio de Janeiro: Aide, 1994. v. II, p. 662/663)
Assim, mesmo tendo o apelante providenciado o registro de nascimento da apelada, com o intuito de proporcionar-lhes amparo médico, ou qualquer outra espécie de benefício, não pode agora pretender a retificação do mesmo.
Tal medida objetiva, sempre, amparar a criança, que não pode depender do sucesso ou insucesso dos relacionamentos de sua progenitora, para conhecer sua filiação paterna.
Ademais, por incorrer vício de consentimento capitulado pelo art. 147, II do CC, bem como por tratar-se de ato irrevogável e irretratável, deve o estado de filiação entre apelante e apelada ser mantido em todos seus termos.
Neste caso, inexistindo exceção quanto ao reconhecimento de filho não biológico, pertinente a aplicação do referido dispositivo à situação em apreço.
Não há dúvida, portanto, quanto à impossibilidade de retratação do ato praticado, sendo inaplicável a tese defendida pelo recorrente.
Deste relator:
"AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE C/C ANULAÇÃO DE REGISTROS DE PATERNIDADE EM CARTÓRIO - PRELIMINAR - CARÊNCIA DE AÇÃO - IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - INOCORRÊNCIA - CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA - INEXISTÊNCIA.
MÉRITO - REGISTRO DE NASCIMENTO - ATO VOLUNTÁRIO E CONSCIENTE - IRRETRATABILIDADE E IRREVOGABILIDADE DO REGISTRO - INTELIGÊNCIA DA LEI N. 8.560/92 - VINDICAÇÃO CONTRÁRIA AO QUE CONSTA DO REGISTRO CIVIL - APLICABILIDADE DO ART. 348 DO CC - VÍCIO DE CONSENTIMENTO - NÃO COMPROVAÇÃO - RECURSO NÃO PROVIDO - SENTENÇA MANTIDA.
O registro de nascimento efetuado de forma voluntária e consciente não admite retratação, salvo se aplicável ao caso as exceções do art. 348 do CC, ou presente vício de consentimento." (ACV n. 02.010522-3)
No mesmo diapasão:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL DE ALIMENTOS - ALEGAÇÃO DE NÃO SER O PAI BIOLÓGICO - RECONHECIMENTO VOLUNTÁRIO POR MEIO DO REGISTRO CIVIL DO INFANTE - ATO JURÍDICO IRREVOGÁVEL - EXEGESE DO ART. 1º DA LEI N. 8.560/92 - OBJETO ANALISADO EM AÇÃO PRÓPRIA DE NEGATÓRIA DE PATERNIDADE - QUANTUM ALIMENTAR RECHAÇADO - IMPOSSIBILIDADE DE SUPORTAR O ENCARGO - FIGURA DO PODER FAMILIAR - OBRIGAÇÃO DE AMBOS OS PAIS - MINORAÇÃO DE 25% (VINTE E CINCO POR CENTO) PARA 20% (VINTE POR CENTO) - ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA DEFERIDA POR MEIO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO - RECURSO PROVIDO" (ACV n. 03.025552-4 - Rel. Des. José Volpato de Souza).
Também:
"REGISTRO CIVIL - Assento de nascimento - Anulação - Reconhecimento voluntário - Pai não biológico - Irrelevância - Vício de consentimento não comprovado - Irrevogabilidade do ato - Ação improcedente." (TJSP - AC 246.462-1 - Rel. Des. Munhoz Soares)
Conclui-se, o registro de nascimento efetuado de forma voluntária e consciente não admite retratação, salvo se aplicável ao caso as exceções do art. 1.604 do novo Código Civil, ou presente vício de consentimento, o que não é o caso dos autos.
Ante o exposto, mantém-se incólume a sentença objurgada, negando-se provimento ao recurso.
III -DECISÃO:
Nos termos do voto do relator, decidiu a Câmara, por votação unânime, negar provimento ao recurso.
Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Marcus Túlio Sartorato e Sérgio Izidoro Heil.
Pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, lavrou parecer o Exmo. Sr. Dr. Sérgio Antônio Rizelo.
Florianópolis, 16 de dezembro de 2005.
Wilson Augusto do Nascimento
PRESIDENTE E RELATOR
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