- Acórdão: Apelação Cível n. 1.0051.07.020501-1/001, de Bambuí.
- Relator: Des. Wander Marotta.
- Data da decisão: 08.04.2008.
- Número do processo: 1.0051.07.020501-1/001(1)
- Relator: WANDER MAROTTA
- Relator do Acordão: WANDER MAROTTA
- Data do Julgamento: 08/04/2008
- Data da Publicação: 23/04/2008
EMENTA: MENOR - PAI DA CRIANÇA FALECIDO -ADOÇÃO PELO PADRASTO - DIREITO DE VISITAS DA AVÓ BIOLÓGICA PATERNA - LEGITIMIDADE ATIVA - SENTENÇA CASSADA. - A adoção efetivada pelo cônjuge da mãe (padrasto), em virtude do falecimento do pai biológico, não tem o efeito de romper definitivamente o vínculo estabelecido pela filiação natural da criança com a família paterna, conforme prescreve o art. 1626 do Código Civil. - A realidade material dos fatos não é anulada pela ficção do ato legal da adoção, devendo ser preservados os vínculos afetivos e familiares do menor, cuja individualidade não é atingida por presunções artificiais da realidade que a lei, com outras razões, estabelece.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0051.07.020501-1/001 - COMARCA DE BAMBUÍ - APELANTE(S): M.L.X.C. - APELADO(A)(S): D.A.S.B. E OUTRO(A)(S) - RELATOR: EXMO. SR. DES. WANDER MAROTTA
ACÓRDÃO
(SEGREDO DE JUSTIÇA)
Vistos etc., acorda, em Turma, a 7ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR PROVIMENTO PARCIAL PARA CASSAR A SENTENÇA.
Belo Horizonte, 08 de abril de 2008.
DES. WANDER MAROTTA - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. WANDER MAROTTA:
VOTO
Trata-se de pedido de regulamentação de visitas ajuizada por M.L.X.C. em face de D.A.S.B, objetivando o restabelecimento do convívio com seu neto D.S. B., com a fixação das visitas em finais de semanas alternados.
Afirma a autora ser avó paterna do menor D.S.B., narrando que no ano de 2003 o pai dele veio a falecer, e toda a atenção dada pelo progenitor passou a ser prestada pela requerente, o que tornou ainda mais forte o vínculo entre avó e neto. Alega que a mãe da criança, procurando impedir que crescesse no convívio da família biológica paterna, impediu-o de visita-lá; que no dia 07/08/2006 o padrasto da criança ajuizou uma ação de adoção, que foi acolhida no dia 05/02/2007, tirando o sobrenome do pai biológico e acrescentando o dele próprio - adotante - , e, a partir desta data, as visitas da requerente - avó paterna - foram definitivamente proibidas.
A antecipação de tutela foi deferida às fls. 26/27, deferindo à requerente o direito de ter o seu neto em sua companhia em finais de semana alternados, podendo pegar a criança em sua residência às 8:00 horas da manhã de sábado e entregá-la às 17:00 horas do domingo.
Às fls.32/34, os requeridos requereram a revogação da liminar, sustentando que o menor não tem convivência com a requerente; que obrigá-lo a passar um final de semana inteiro com a avó vai prejudicar seu desenvolvimento. Alegam que ela não tem nenhum parentesco com o menor, já que, sobrevindo a adoção, os avós paternos são outros, o que torna o pedido juridicamente impossível.
Às fls.37/38 o MM. Juiz recebeu o pedido como agravo retido e deu provimento para revogar a decisão anterior; e julgou extinto o processo por ilegitimidade da parte autora e impossibilidade jurídica do pedido.
Inconformada com esta decisão recorre a autora às fls.46/53, sustentando que o ECA, em seu artigo 4º, garante ao menor o direito de convivência familiar, o que inclui o direito de encontrar todos os seus parentes. Alega que o ECA e o Código Civil não portam o efeito de "retirar do filho adotivo o direito de conhecer a sua origem genética".
Parecer do Ministério Público opinando pelo provimento parcial do recurso para "arredar a causa extintiva e determinar o prosseguimento do feito nos termos da lei" - fls. 71/73.
Conheço do recurso.
Entendo que o MM. Juiz não agiu com a ponderação razoável ao ignorar a realidade material dos fatos.
A adoção efetivada pelo padrasto do menor não porta o efeito de romper o vínculo definitivo da filiação e da ascendência que tem origem também na família paterna, conforme prescreve o art. 1626 do Código Civil:
"Se um dos cônjuges ou companheiro adota o filho do outro, mantêm-se os vínculos de filiação entre o adotado e o cônjuge ou companheiro do adotante e os respectivos parentes".
Anota-se, ainda, que o pai da criança é falecido e a avó paterna manifesta um interesse legítimo na regulamentação do direito de visitas, na intenção de participar do crescimento e desenvolvimento do neto. Até o momento não há qualquer prova nos autos que desabone a conduta da requerente - ou mesmo notícia de fato que possa impedir o convívio da avó com o neto.
Assim, é a avó paterna parte legítima para promover a ação, não havendo que se cogitar de ilegitimidade de parte e/ou de impossibilidade jurídica do pedido.
A propósito, Sílvio Neves Baptista, no que se refere ao direito de visita, assevera que:
"O direito de visita - melhor seria direito à visita - consiste no direito de ser visitado, e não no direito de ir visitar o outro. A expressão 'direito de visita' deve ser interpretada como a faculdade que alguém tem de receber visita, quer de pais, quer de parentes e amigos. Não é, pois, um direito do pai em relação ao filho, de acordo com o generalizado entendimento, mas um direito do filho em relação ao pai que não tem a guarda, ou em relação a toda e qualquer pessoa cuja conveniência lhe interessa. Não pode assim ser entendido como uma extensão do poder parental" (in A Família na Travessia do Milênio, Anais do II Congresso Brasileiro de Família, IBDFAM, 2000, pg. 294).
É importante consignar, pela sua importância, que o parecer da Assistência Social (realizado no momento da adoção) deixa patenteado que o menor mantém saudável ligação com a família biológica paterna:
"Necessário se faz mencionar, fundamentada nos relatos de D. e do adotante, que deverá ser tomado procedimento especial com relação ao contato do menor com a família biológica paterna, haja visto que D. os reconhece e parece nutrir pelos mesmos algum sentimento de afeto. Assim sugiro que, para um perfeito desenvolvimento psicológico e emocional do menor exista a preservação deste contato, observando o desejo de D.".
A requerente, em sua inicial, protestou pela produção de prova documental, testemunhal e pericial, além do depoimento pessoal dos requeridos (fls. 14), que não se efetivaram em razão do julgamento antecipado da lide.
Ora, não há como decidir a questão sem atentar para as particularidades do caso, e, principalmente, sem levar em consideração o bem estar da criança, tudo de forma a prestar uma jurisdição que seja adequada, isto é, que seja feita sob medida para este caso - e não para qualquer outro.
Antes de compromisso com a lei, o magistrado tem um compromisso com a função social do processo, evitando que se torne um instrumento de restrita observância da forma, com o risco de distanciar-se da necessária busca pela efetiva justiça.
Por tudo isto, é que considero essencial a instrução probatória por inexistirem, nos autos, até agora, elementos hábeis à formação de um convencimento capaz de ensejar a adequação que o caso requer - e sem a qual não se faz justiça.
Pelo exposto, dou parcial provimento ao recurso para declarar a legitimidade ativa da autora e, de ofício, casso a r. decisão hostilizada, para determinar o retorno dos autos á origem, facultando às partes a produção das provas requeridas - principalmente o estudo social do caso - prosseguindo-se regularmente com o processo.
Sem custas.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): HELOISA COMBAT e ALVIM SOARES.
SÚMULA : DERAM PROVIMENTO PARCIAL PARA CASSAR A SENTENÇA.
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