EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - DESCONSTITUIÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA - RESPONSABILIDADE DO SÓCIO RETIRANTE - ATO PRATICADO APÓS DESLIGAMENTO DA SOCIEDADE - AVERBAÇÃO ALTERAÇÃO CONTRATUAL - ILEGITIMIDADE PASSIVA.A norma contida no art. 1.032 do CC é firme ao imputar responsabilidade, aos sócios, pelos atos praticados enquanto faziam parte do quadro societário da empresa, por um período de até 02 anos após seu desligamento, marco estabelecido pela averbação da respectiva alteração contratual na JUCEMG.Diante disso, o sócio retirante não poderá ser responsabilizado por dano decorrente de ato praticado em momento posterior a seu afastamento da sociedade, motivo pelo qual é considerado parte ilegítima para figurar no pólo passivo da execução.
AGRAVO N° 1.0024.04.436600-3/003 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - AGRAVANTE(S): ESTAEL MARIA DE ANDRADE RODRIGUES - AGRAVADO(A)(S): NILTON LUCAS CAETANO - RELATOR: EXMO. SR. DES. EDUARDO MARINÉ DA CUNHA
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 17ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR PROVIMENTO AO RECURSO.
Belo Horizonte, 06 de dezembro de 2007.
DES. EDUARDO MARINÉ DA CUNHA - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
Produziu sustentação oral, pela agravante, o Dr. Francis Vanine de Andrade Reis.
O SR. DES. EDUARDO MARINÉ DA CUNHA:
VOTO
Trata-se de agravo de instrumento aviado por ESTAEL MARIA DE ANDRADE RODRIGUES contra a decisão proferida nos autos da ação de cumprimento de sentença que lhe move NILTON LUCAS CAETANO, cuja cópia se encontra à f. 282, TJ, na qual o julgador primevo julgou improcedente a exceção de pré-executividade proposta pela agravante.
Sustenta a agravante que a decisão que julgou improcedente a exceção de pré-executividade se reveste de ilegalidade, uma vez que, além de negar a existência de questões de ordem pública, não apresentou fundamentação.
Informa que fora ordenada, pelo magistrado da 13ª vara cível desta Comarca, a desconstituição da personalidade jurídica da sociedade empresária figurante no pólo passivo da ação de cumprimento de sentença.
Valeu-se a agravante da exceção de pré-executividade, a fim de demonstrar sua ilegitimidade passiva na ação de cumprimento de sentença. Defende que, desde 23.10.2003, já não fazia parte dos quadros societários da empresa denominada Pampulha Eventos Ltda, o que se comprova pela primeira alteração contratual juntada aos autos, levada a registro em 28.10.2003.
Salienta, ainda, que o fato gerador do dano ao autor/agravado, objeto da ação de indenização, ocorreu em 04.07.2004, momento posterior ao desligamento da agravante em relação à sociedade executada.
Pugna por novo julgamento da exceção de pré-executividade, reformando-se a decisão primeva e, conseqüentemente, excluindo-se a agravante do pólo passivo da execução.
O recurso foi recebido nos efeitos devolutivo e suspensivo (f. 314-316, TJ).
O recorrido, devidamente intimado, apresentou contraminuta, defendendo a manutenção da agravante no pólo passivo, pois sua retirada da sociedade foi em data anterior a dois anos dos fatos que deram origem à ação de execução.
Manifestou-se o douto juiz a quo, informando a mantença da decisão vergastada e o cumprimento do art. 526, do CPC, por parte da agravante.
Presentes os requisitos de sua admissibilidade, conheço do recurso de agravo de instrumento.
Conforme relatado, cinge-se o presente recurso à análise da decisão primeva, que julgou improcedente a exceção de pré-executividade interposta pela recorrente, ao fundamento de que esta "(...) somente é admitida em casos especiais, quando há irregularidade flagrante no título executivo ou a matéria admitir conhecimento de ofício, o que não ocorreu na hipótese."
Primeiramente, insta salientar que, malgrado não haja expressa previsão legal, a exceção de pré-executividade é aceita pela doutrina e jurisprudência dos Tribunais como um instrumento de impugnação à execução ou cumprimento de sentença, desde que, existindo prova pré-constituída, tenha como objeto matéria passível de reconhecimento de ofício pelo juiz.
A respeito do instituto da exceção de pré-executividade, mister se faz destacar a doutrina de Alexandre Freitas Câmara, in Lições de Direito Processual Civil, V. II, ed. Lúmen Juris, 14ª ed., pág. 453:
Através da exceção de pré-executividade poderá o executado alegar qualquer matéria de ordem pública, ligada à admissibilidade da execução, e que poderia - em razão desta sua natureza - ser conhecida de ofício pelo juízo da execução.
Confiram-se, outrossim, os seguintes arestos do STJ:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. MATÉRIAS PASSÍVEIS DE CONHECIMENTO NESSA VIA: AQUELAS PASSÍVEIS DE CONHECIMENTO DE OFÍCIO PELO JUIZ E QUE NÃO DEMANDEM DILAÇÃO PROBATÓRIA. ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI. CABIMENTO. 1. A possibilidade de verificação de plano, sem necessidade de dilação probatória, delimita as matérias passíveis de serem deduzidas na exceção de pré-executividade, independentemente da garantia do juízo. Precedente: Resp n.º 767.622/RJ, 1ª Turma, Relator Min. Teori Zavascki, DJ de 07.03.2005). 2. Recurso especial a que se dá provimento. (STJ: REsp 775467 / SP ; Recurso Especial 2005/0139459-4, Órgão Julgador: Primeira Turma, Relator: Ministro Teori Albino Zavascki, Data do Julgamento: 12.06.2007)
TRIBUTÁRIO - EXECUÇÃO FISCAL - EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE - ILEGITIMIDADE PASSIVA - RESPONSABILIDADE DO SÓCIO - SÚMULA 07 DO STJ.
1. A exceção de pré-executividade tem sido admitida nas hipóteses em que a matéria objeto de defesa, pelo executado, seja de ordem pública e, portanto, cognoscível de ofício pelo juiz a qualquer tempo e grau de jurisdição como, por exemplo, as condições da ação e os pressupostos processuais (artigo 267, § 3º, do Código de Processo Civil). 2. É pacífico, inclusive, o entendimento no sentido de que a oposição da exceção pode ser admitida, em se tratando de nulidade do título, quando for desnecessária dilação probatória para a demonstração de que o credor não pode executar o devedor. (STJ: AgRg no REsp 752159 / AL ; Agravo Regimental no Recurso Especial 2005/0082696-4, Órgão Julgador: Segunda Turma, Relator: Ministro Humberto Martins, J. 07.11.2006)
Resta patente a utilidade da exceção de pré-executividade, mesmo após o advento das alterações trazidas pelas Leis nº. 11.232/05 e 11.382/06, uma vez que possibilita à parte, antes de ter o seu patrimônio afetado pelo início da expropriação judicial, defender-se de possíveis nulidades não observadas, de plano, pelo julgador.
Da análise dos autos, colhe-se que a recorrente, em petição de f. 195-210, TJ, opôs exceção de pré-executividade contra o cumprimento de sentença requerido pelo agravado, sustentando sua ilegitimidade passiva, matéria de ordem pública, reconhecível de ofício pelo julgador, sem exigir, a princípio, dilação probatória.
Dessa forma, versando sobre matéria de ordem pública a exceção de pré-executividade aviada pela recorrente, passível de reconhecimento de ofício, impõe-se o seu recebimento pelo julgador.
Dispõe o art. 1.032, do Código Civil, grifos nossos:
Art. 1.032. A retirada, exclusão ou morte do sócio, não o exime, ou a seus herdeiros, da responsabilidade pelas obrigações sociais anteriores, até dois anos após averbada a resolução da sociedade; nem nos dois primeiros casos, pelas posteriores e em igual prazo, enquanto não se requerer a averbação.
Vale ressaltar que o supracitado artigo, embora contido no capítulo disciplinador das sociedades simples, aplica-se subsidiariamente às sociedades limitadas, por autorização expressa do art. 1.053, também do CCB:
Art. 1.053. A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste capítulo, pelas normas da sociedade simples.
Como é cediço, é admissível a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade empresária, atingindo-se os bens dos sócios ou até mesmo os de outra empresa criada e/ou administrada fraudulentamente, para frustrar os direitos dos credores, desde que configurada hipótese de abuso da personalização da sociedade, ou de desvio de sua finalidade. É o que prevê o art. 50 do Código Civil:
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
Alega a recorrente que, desde 23.10.2003 já não fazia parte dos quadros societários da empresa denominada Pampulha Eventos Ltda, o que se comprova pela primeira alteração contratual juntada aos autos, levada a registro na JUCEMG, em 28.10.2003 (f. 216-218, TJ).
Salienta, ainda, que o fato gerador do dano ao autor/agravado, objeto da ação de indenização, ocorreu em 04.07.2004, momento posterior ao desligamento da agravante em relação à sociedade executada.
Analisando-se detidamente as datas, conclui-se pela impossibilidade de se responsabilizar a agravante pelo dano ocorrido em julho de 2004 (data alegada pela agravante e aceita pelo agravado, conforme f. 196 e 325, TJ).
Isso porque a norma contida no art. 1.032 do CC é firme ao imputar responsabilidade aos sócios, pelos atos praticados enquanto faziam parte do quadro societário da empresa, por um período de até 02 anos após seu desligamento. Em comento ao supramencionado artigo, nos ensina o doutrinador Arnoldo Wald:
Apesar de truncada a redação, foi acertada a intenção do legislador em manter o sócio excluído, o retirante e, no que diz respeito ao sócio falecido, os seus herdeiros, responsáveis pelas obrigações sociais anteriores, por um prazo definido de dois anos, após averbada a resolução da sociedade.Lembre-se, ainda, que o artigo 1.032, do novo Código Civil, impõe aos sócios retirantes a responsabilidade pelas obrigações sociais anteriores e posteriores à sua retirada, neste último caso enquanto não requerer a averbação da alteração do contrato social.
(Comentários ao Novo Código Civil. Livro II - Do Direito de Empresa. Coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira. Rio de Janeiro: 2005, 1ª. Ed, v. XIV, p. 246, 232).
Ainda sobre o tema, trago a lume o magistério de Maria Helena Diniz:
Responsabilidade do sócio retirante ou excluído e de herdeiro de sócio falecido pelas obrigações pendentes. O sócio retirante, ou excluído, ou o herdeiro de sócio falecido, apesar de ter ocorrido a dissolução parcial da sociedade, e o rompimento do vínculo que o prendia à sociedade, não terá a sua exclusão imediata da comunhão social, que subsistirá entre ele e os demais sócios em tudo que for alusivo às obrigações sociais anteriores, até dois anos após a averbação da resolução da sociedade. Continuará, ativa e passivamente, ligado à sociedade até que, nesses dois anos, se liquidem os interesses e responsabilidades que tiver nos negócios sociais pendentes. (Código Civil Anotado, 9ª ed. Saraiva, São Paulo: 2003, p. 658)
Dito isso, considerando que a retirada da sociedade, por parte da agravante, foi levada a registro em 28.10.2003 (f. 216-218, TJ), não poderá ela ser responsabilizada por fato ocorrido posteriormente à sua saída, em julho de 2004, o que gerou o dano objeto da ação de indenização.
Conclui-se, então, pela ilegitimidade passiva da agravante, devendo ser contra ela extinto o processo, por imposição do art. 267, VI, do CPC.
Com tais razões de decidir, dou provimento ao agravo de instrumento, a fim de anular a decisão de f. 282, TJ e, assim, julgar procedente a exceção de pré-executividade, extinguindo o processo em relação à agravante, nos termos do art. 267, VI, do CPC.
Custas recursais, pelo agravado.
O SR. DES. IRMAR FERREIRA CAMPOS:
VOTO
De acordo.
A SRª. DESª. MÁRCIA DE PAOLI BALBINO:
VOTO
De acordo.
SÚMULA : DERAM PROVIMENTO AO RECURSO.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi criado pela Constituição Federal de 1988 com a finalidade de preservar a uniformidade da interpretação das leis federais em todo o território brasileiro. Endereço: SAFS - Quadra 06 - Lote 01 - Trecho III. CEP 70095-900 | Brasília/DF. Telefone: (61) 3319-8000 | Fax: (61) 3319-8700. Home page: www.stj.jus.br
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STJ - Superior Tribunal de Justiça. TJMG - Civil. Desconstituição da personalidade jurídica. Responsabilidade do sócio retirante. Ato praticado após desligamento da sociedade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 jun 2011, 05:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/jurisprudências/24805/tjmg-civil-desconstituicao-da-personalidade-juridica-responsabilidade-do-socio-retirante-ato-praticado-apos-desligamento-da-sociedade. Acesso em: 24 nov 2024.
Por: TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Por: TRF3 - Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Por: TJSC - Tribunal de Justiça de Santa Catarina Brasil
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